A ADI número 6.298, ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE) teve como objetivo impugnar os artigos 3-A ao 3-F do CPP, possuindo como um dos fundamentos: i) impacto financeiro relevante no poder judiciário; ii) A ausência de prévia dotação orçamentária para a instituição de gastos por parte da União e dos Estados viola diretamente o artigo 169 da Constituição e prejudica a autonomia financeira do Poder Judiciário; iii) altera materialmente a divisão e a organização de serviços judiciários em nível tal que enseja completa reorganização da justiça criminal do país.
A implementação do intitulado “juiz das garantias” causou mudanças consideráveis na investigação preliminar, mudanças estas necessárias para pôr fim a iniciativa do juiz da instrução na fase pre-processual. Uma das modificações é a possibilidade de prorrogação do inquérito policial, por mais 15 dias uma única vez, quando o preso encontra-se indiciado, mediante representação do Delegado de Polícia após o juiz das garantias ouvir o MP, pois o mesmo é o destinatário da investigação e o órgão de acusação. Logo, é notório que, não mais terá efeitos, o artigo 10, §3 do CPP, pois não encontra-se na órbita de competências do juiz das garantias a prorrogação do prazo da peça inquisitorial quando o indiciado estiver solto que tem prazo de 30 dias fixo. Assim, o prazo inicia-se no primeiro dia útil subsequente, por ser um prazo processual, previsto no artigo 789, §1 do CPP, e termina ao chegar até o trigésimo dia, devendo a autoridade policial pôr fim ao inquérito policial.
Dessa forma, com a implementação do juiz das garantias, tal cenário não mais acontecerá e, mais um artigo do Código de Processo Penal não surtirá efeitos. Pois, não é possível enxergarmos entre os artigos que disciplinam o juiz das garantias, a possibilidade de o mesmo atuar como intermédio entre a autoridade policial e o Ministério Público, mas somente atuar no controle da legalidade das investigações, assegurar direitos fundamentais, ser informada sobre a instauração de qualquer investigação preliminar, o que é importante para manter o controle da legalidade das investigações etc. Logo, mais uma vez, demonstrado por nós em face de uma leitura literal e sistêmica da Lei 13.964\19, nos artigos 3-B ao 3-F do CPP, não mais o juiz da instrução poderá ao mesmo ter a possibilidade de se contaminar com os elementos de informação obtidos na investigação preliminar anteriormente o oferecimento da denúncia, pois também será o juiz das garantias que fará o juízo de admissibilidade da denúncia e, acautelará todos os elementos de informação que for da sua reserva constitucional de jurisdição, ficando a disposição das partes, como previsto no artigo 3-C, §3 e§4 do CPP.
Diante o exposto, após a autoridade policial remeter os autos do inquérito policial diretamente para o Ministério Público, o parquet possui algumas opções: i) denunciar; ii) “requerer” o arquivamento (ordenará com o novo artigo 28 que também encontra-se suspenso. Será alvo de nossas provocações no tópico seguinte); iii) oferecer o ANPP; iv) requisitar diligências a autoridade policial. Dessa forma, é mister nos debruçarmos sobre a possibilidade de o parquet requisitar diligências a autoridade policial, como previsto no artigo 16 do CPP. O respectivo artigo diz em sua redação que, “O Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito à autoridade policial, senão para novas diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia”. Logo, a devolução dos autos do inquérito somente ocorrerá em duas hipóteses: requisição de diligências e desarquivamento do inquérito policial, no qual se o Ministério Público perceber que não é o caso de deflagração da ação penal, o mesmo poderá requisitar diligências para a autoridade policial realizar novas diligências que também será requisitada pelo parquet na sua fundamentação de requisição, pois tais diligências são imprescindíveis para o oferecimento da denúncia.
Contudo, a problemática diante a requisição de diligências encontra-se no termo “devolução do inquérito”, pois como dito supra, o inquérito policial, na atual conjuntura inquisitiva, devido a suspensão da eficácia pelo Ministro Luiz Fux, os autos da peça de informação ainda estão presentes no juizo competente e, para que haja a devolução da peça, é necessário que o Ministério Público além de requisitar as diligências ao Delegado, requeira ao juiz a devolução dos autos. Dessa forma, o juiz que não é o órgão de acusação e, nem tampouco o destinatário da investigação, possui a discricionariedade de aceitar o requerimento de devolução ou negar, o que caberia uma correição parcial. “Afinal, não cabe ao Poder Judiciário, substituindo-se indevidamente ao titular da ação penal pública, formar juízo acerca da necessidade (ou não) da realização de determinadas diligências reputadas indispensáveis”¹, elucidado com maestria pelo Professor Renato Brasileiro. Assim, com a implementação do juiz das garantias, não mais é necessário que o requerimento do Ministério Público ao juiz, pois o inquérito policial, como dito supra, não ficará acautelado no juiz das garantias, pois não é da reserva constitucional de jurisdição do mesmo, podendo, como entende a 5° turma do STJ, a remessa direta do inquérito policial para o parquet, como nas centrais de Inquérito, que já existe em Salvador-Ba.
Referência:
¹ LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal: Volume Único/ Renato Brasileio de Lima - 8° ed. - Salvador: Ed. Juspodivm, 2020.