Quais serviços pode suspender nas férias ?

12/11/2020 às 23:53
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Análise, em tempos de fim de isolamento horizontal, como se pode economizar com suspensão de pacotes de serviços em períodos de férias e outros aspectos de contratos de lazer.

Em um ano pra lá de atípico, o que se observa é que estão chegando as festividades de final de ano e as férias escolares (não obstante o clima de férias, por conta da pandemia por aulas on line dentro de casa), mas nesse período o mercado de lazer se aquece e as pessoas, após todo o stress de 2.020, planejam sair de casa por alguns períodos. Embora estejamos em novembro, as lojas já estão em clima de Natal e Ano Novo. De todo modo, resta sempre bom ver onde se pode economizar, evitando-se desperdício.

E sempre vem a questão: Serei obrigado a pagar por serviços que não vou utilizar ? Afinal não estarei em casa ? Terei que pagar faturas de despesas por coisas que apenas estarão à minha disposição mas não serão consumidas ? Quais são meus direitos em relação a isso ? Quais meus direitos em relação aos pacotes de viagens aos quais irei aderir ?

Em primeiro lugar, a aquisição de pacotes de viagens implicam em relações de consumo regidas pelo Código do Consumidor, sendo certo que, o que é relevante e diferente nesses casos, é o fato de que o objeto do contrato tem a finalidade de garantia do lazer - por isso, descumprimentos que normalmente não gerariam indenizações em outros tipos de contrato, geram indenizações por danos morais por conta de meros aborrecimentos (Cláudia Lima Marques).

Mas não é só. Hoje em dia, fazer as pessoas perderem tempo indevidamente, seja pela consunção do lazer indevidamente (frustração de direito de desconexão) seja pelo desvio de atividades produtivas, são situações que geram indenizações por danos morais.

Ainda, de acordo com a clássica lição de Rubens Limongi França, o lazer implica em direito de personalidade de integridade física (realmente, sem lazer em condições adequadas pelo óbvio que a saúde e a vida periclitarão), de sorte tal que quando o mesmo, contratualmente garantido, não resta cumprido, enseja a reparação pelo atingimento do setor não patrimonial da esfera jurídica do indivíduo (nos termos como preconizados por Pontes de Miranda a partir de prelados de Ennecerus).

Com isso, se não se atinge o objetivo de lazer tão relevante numa sociedade em que o stress impera e viagens podem ser tidas como investimentos necessários para se recarregar as baterias, as indenizações serão devidas, envolvendo toda a cadeia produtiva do lazer.

Ou seja, se ocorre o furto de seu celular no quarto de hotel ou se a mala se extravia, isso gera stress, antítese do lazer buscado, portanto, isso deve ser indenizado pela frustração da finalidade precípua do contrato (quem sai de férias, em tempos de Facebook não quer ficar sem seu celular, não quer ir para Delegacias de Polícia fazer boletim de ocorrência quando poderia estar na praia ou em um museu), o que pode englobar, no polo passivo o hotel ou a agência de viagens que indicou o hotel e lucrou com isso (afinal, de se aplicar a teoria do risco profissional que parte do princípio romano ubi commoda ibi incommoda, além da própria responsabilidade civil objetiva própria dos fornecedores em relação de consumo).

Reconhecendo, inclusive, que tais indenizações de danos morais se aferem in ré ipsa (danos presumidos), de se destacar: TJ-DF - Apelação Cível APC 20140110907433 (TJ-DF) Data de publicação: 27/8/15.

E, ainda, reconhecendo o dever de indenizar pela via da quebra de justas expectativas (portanto matéria afeita ao âmbito da boa-fé objetiva) de se pedir licença para apontar: TJ-RS - Recurso Cível 71004809489 RS (TJ-RS) Data de publicação: 02/07/2014.

Vale apontar no sentido de que, se o consumidor, por qualquer razão, pretender resilir o contrato, imposições de multas abusivas (há companhias que aplicam multas de quinze, vinte, trinta por cento), podem e devem ser revistas (o artigo 413 CPC estabelece que o controle da validade das multas pode ser feito até mesmo de ofício pelo Juiz, a partir de um juízo que sequer seria de proporcionalidade, mas de simples equidade).

Nesses casos, pelo óbvio, como as multas não são moratórias (simples atraso de pagamento - em que haveria limitação a 2% nos termos do artigo 52 e seus consectários CDC), mas compensatórias há limites de razoabilidade a serem observados.

A jurisprudência pátria tem fixado tais importes em torno de dez por cento (valor suficiente para cobrir eventuais prejuízos da operadora de pacotes turísticos, diante da desistência do consumidor). Sobre a questão: TJ-DF - Apelação Cível do Juizado Especial ACJ 20151110045639 (TJ-DF) Data de publicação: 18/3/16.

Outro aspecto pouco estudado, mas que atinge diretamente o patrimônio do consumidor em férias seria o de que há vários serviços públicos e privados que podem ser suspensos temporariamente nos períodos de férias, evitando-se dispêndios desnecessários, mas muitas vezes importantes na economia doméstica (mormente para tempos de crise, com férias econômicas).

Em serviços privados (telefonia móvel, telefonia fixa, TV por assinatura por exemplo – cada vez mais raros em tempos de streaming e telefones celulares mas ainda com milhões de usuários no setor, mesmo em tempos de nova economia), o regime jurídico é mais favorável ao consumidor, eis que a suspensão temporária pode ser pedida e o restabelecimento do serviço, ao final das férias não pode ser cobrado do consumidor - é um serviço gratuito. Para esses serviços já há normatização (resoluções da ANATEL que preveem suspensões de serviços por prazos que variam entre 30 e 120 dias, uma vez ao ano).

Mais alguns tipos de serviços privados não são normatizados pelo Poder Público, como é o caso das assinaturas de jornais e revistas impressos (isso está se tornando cada vez mais raro no mundo digital), internet etc. Para isso deve-se conferir a normatização particular, ou seja, o que diz o contrato firmado entre as partes, sempre lembrando que, se o contrato comportar dúvidas de interpretação, essas são sempre resolvidas no interesse e em favor do consumidor.

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Quando o serviço é público (fornecimento de água, luz e gás encanado, por exemplo), mesmo que tenha sido terceirizado, existem maiores dificuldades eis que se deve preservar a equação financeira desses contratos concedidos pelo Estado, daí há previsões para a cobrança de tarifas ou taxas para restabelecer o serviço ao final das férias - o consumidor deve avaliar se não sairá mais caro o molho do que o peixe como diz o dito popular (às vezes, simplesmente sai mais barato fechar o registro que permite a entrada de água da rua para a residência, por exemplo).

Mesmo em sendo um serviço público é feito por pessoas jurídicas privadas, ou seja, nada impede que se façam ajustes nesse sentido. Por exemplo, se o consumidor pleiteia que o serviço seja suspenso, sem custos e isso for aceito pela fornecedora, ela não poderá depois cobrar qualquer valor.

Mas alguns cuidados devem ser observados. O consumidor deve estar em dia para solicitar a suspensão dos serviços, do contrário não haverá religamento ao final - tem-se considerado que não abusividade se a fornecedora se recusar a tanto.

De igual modo, há que se registrar o pedido formal para que isso aconteça - não há impedimento para sejam feitos pelo Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) seja por ligações telefônicas (daí convém anotar o número de protocolo de atendimento para facilitar reclamar em caso de violação) ou mesmo por e-mail. Essas cautelas facilitam o processamento de demandas no Juizado Especial Cível - o assim chamado Juizado de Pequenas Causas, ou mesmo para reclamações junto ao Procon.

Como sabido, os estabelecimentos físicos destas prestadoras têm oposto cada vez mais resistência a que esses pedidos lá sejam efetuados, no que também há uma certa abusividade (como sabido, há consumidores idosos que podem ter dificuldade com tecnologia e mesmo pessoas com baixo grau de escolaridade, por exemplo), matéria, no entanto, para outros estudos mais aprofundados em outro artigo que verse, por exemplo, sobre o tema do desvio do tempo produtivo – tipo de indenização de dano moral que tem se tornado frequente no âmbito das relações de consumo por esse tipo de atitude que somente faz o consumidor perder tempo para desestimulá-lo a deixar de pagar pelo serviço, por exemplo.

Sobre o autor
Julio Cesar Ballerini Silva

Advogado. Magistrado aposentado. Professor da FAJ do Grupo Unieduk de Unitá Faculdade. Coordenador nacional dos cursos de Pós-Graduação em Direito Civil e Processo Civil, Direito Imobiliário e Direito Contratual da Escola Superior de Direito – ESD Proordem Campinas e da pós-graduação em Direito Médico da Vida Marketing Formação em Saúde. Embaixador do Direito à Saúde da AGETS – LIDE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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