A Constituição Federal brasileira apenas dirige o princípio da anterioridade da lei ao crime e à pena, possibilitando assim, a aplicação de medida de segurança após o fato, as medidas de segurança voltam-se ao presente e futuro, apoiado na periculosidade manifesta pelo agente no presente e se esse irá reincidir no futuro (BRASIL, 1988).
A legislação penal vigente limita a aplicação de medida de segurança a inimputáveis ou semi-imputáveis, e define locais de internação como hospitais de custódia e tratamento psiquiátricos HCTP, e o tratamento ambulatorial, portanto quem recebe medida de segurança não pode ser preso no sistema penitenciário comum e caso receba tratamento ambulatorial, este deve ser realizado no Sistema Único de Saúde - SUS (MIRABETE, 2019).
A medida de segurança tem por objetivo salvaguardar a sociedade da periculosidade do indivíduo que comete o crime, influenciado por doença mental, e para este tem o objetivo de oferecer tratamento, para que ele possa estar em segurança dentro da sociedade e não oferecer riscos a ela quando terminar de cumprir a medida de segurança (PALOMBA, 2016).
A retroatividade na aplicação de medida de segurança é garantido ao réu, pois o beneficia, conforme artigo 5°, inciso XL da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988).
Na medida de segurança é considerada a periculosidade do agente que praticou o ilícito penal, Bitencourt define periculosidade como estado subjetivo, com considerável duração de antissociabilidade e juízo de probabilidade fundamentado na conduta antissocial e psicopatológica do indivíduo, e a possibilidade dele voltar a cometer novo ilícito (BITENCOUT, 2020).
Segundo PALOMBA (2016), periculosidade criminal é a potência que o indivíduo que já praticou um crime detém para reincidir na prática de novo crime, e a periculosidade social a potência real e presumida do indivíduo reincidir na prática de crimes, porque seu transtorno mental lhe confere essa condição.
A definição dada por Palomba refere-se ao âmbito da psiquiatria forense, no qual é possível verificar a periculosidade criminal e a periculosidade social antes do indivíduo são, ou doente mental praticar um delito, porém no entendimento da lei, apenas é possível falar em periculosidade após prática de pelo menos um delito.
O Código Penal prevê dois tipos de periculosidade, sendo a primeira a periculosidade presumida, na qual o sujeito é considerado inimputável nos termos do artigo 26, caput, e a segunda, chamada periculosidade real, também conhecida como judicial ou identificada pelo juiz, na qual o agente é considerado semi-imputável, e é entendido pelo juiz a necessidade de especial tratamento curativo, conforme prevê artigo 26, parágrafo único (BITENCOURT, 2020; BRASIL, 1940).
Artigo 97 e 26 do Código de Processo Penal falam na cura do doente mental, mas muitos casos não há cura, apenas tratamento, e para o transtorno de personalidade antissocial não existe nem o tratamento específico, apenas a contenção da impulsividade com medicamentos e a intervenção mínima de terapias comportamentais (CHAVES, 2018; BRASIL, 1940).
A aplicação de medida de segurança ao semi-imputável não é uma regra, e sim uma exceção, caso for verificada a necessidade de tratamento curativo e a condição de total ou parcial ausência de consciência no momento da prática do ato ilícito, aplica-se a medida de segurança (BITENCOURT, 2020).
Os tratamentos aplicados nas medidas de segurança dividem-se em internação e tratamento ambulatorial, a internação, que é a regra, acontece em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, ela também é conhecida como medida detentiva, e na ausência de hospital de tratamento, esta poderá ser cumprida em outro estabelecimento que seja adequado, ela é aplicada aos inimputáveis e semi-imputáveis, conforme texto do artigo 97, caput e artigo 98, ambos do Código Penal. O tratamento ambulatorial está previsto nos crimes puníveis com detenção, que são crimes de menor potencial ofensivo, com pena máxima não superior a dois anos, porém não é o único requisito para o tratamento ambulatorial, é preciso verificar a condição do agente, se ela é compatível com a medida mais liberal. O tratamento ambulatorial consiste na submissão do indivíduo a tratamento em meio aberto, através de cuidados médicos, porém se essa medida não for efetiva para o tratamento, aqui o Código faz referência novamente a “cura”, poderá a qualquer momento ser convertida em medida de segurança na modalidade internação, conforme prevê o artigo 97, parágrafo 4º do Código Penal (BITENCOURT, 2020; BRASIL, 1940).
Algumas doenças mentais e psiquiátricas são incuráveis, e a medida de segurança apesar de não ter caráter perpetuo, ela é por tempo indeterminado, depende da cessação da periculosidade do indivíduo, porém algumas doenças como a demência pode se agravar durante o cumprimento da medida de segurança, e com isso a periculosidade vir a diminuir e em alguns casos cessar, pois com a evolução da demência o doente fica incapacitado de praticar crimes, mesmo tendo um doente mental grave, ele não apresenta periculosidade social, porém mesmo recebido alta da medida de segurança necessita de tratamento em decorrência de sua condição de saúde (PALOMBA, 2016).
A periculosidade criminal é verificada através do exame criminológico, que tem a finalidade de classificar o criminoso e indicar a possibilidade de progressão de pena (PALOMBA, 2016). A exigibilidade do exame criminológico está na Lei n° 7.210 de junho de 1984, (Lei de Execuções Penais) no artigo 5° prevendo que os condenados serão classificados, segundo seus antecedentes e personalidade, tendo como objetivo a orientação e individualização da execução penal (BRASIL, 1984).
A periculosidade social é verificada no exame de cessação de periculosidade, será realizado após decorrido o prazo mínimo que vai de um a três anos, após esse prazo a medida passa a valer por tempo indeterminado e passará a ser realizado uma vez ao ano o exame e um mês antes do final da medida de segurança, ou quando for solicitado pelo juiz da execução conforme o artigo 97, parágrafo 1° do Código Penal (BRASIL, 1984; PALOMBA, 2016; BRASIL, 1940).
REFERÊNCIAS
CHAVES, Anna Cecília Santos; CAMPOS, Roberto Augusto de Carvalho. Crimes violentos e suas relações com transtornos da personalidade: implicações jurídico-penais. 2016.Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Coleção Tratado de Direito Penal volume 1: Parte Geral, arts.1º a120. 26.ed. rev., atual. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
BRASIL. Código Penal: Decreto Lei n° 2.842. Brasília, 7 dez. 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 20 ago. 2020.
BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. [S. l.], 11 jul. 1984. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7210.htm. Acesso em: 3 nov. 2020.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 04 set. 2020.
MIRABETE, Júlio Fabbrini; FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal: parte geral, arts. 1° 120 do CP. Vol.1. 34.ed. rev., atual. São Paulo: Atlas, 2019.
PALOMBA, Guido Arturo. Perícia na psiquiatria forense. São Paulo: Saraiva, 2016. ISBN 978850262972-1. E-book.