O menor infrator e as medidas socioeducativas do Estatuto da Criança e do Adolescente

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Resumo

O artigo tem por fim investigar as causas que levam a criança e o adolescente à prática de atos infracionais bem como apontar métodos de prevenções e soluções de modo a evitar que adolescentes entrem para o mundo do crime e até mesmo a voltarem a praticar novos crimes, configurando a reincidência. Serão apontados os fatores essenciais para a participação do adolescente no mundo do crime, como a falta de estrutura de um país bem como as influências do meio em que o indivíduo vive, com base nos conceitos da Teoria da Associação Diferencial de Edwin Sutherland (1883-1950) aplicada no Brasil. Haverá o estudo das medidas socioeducativas que o Estatuto da Criança e do Adolescente aplica aos menores infratores, bem como a eficiência de sua aplicação e os resultados alcançados; mais especificamente sobre a medida de internação, ao passo que esta se mostra bem desviante quanto ao seu conceito e objetivo final, que é a ressocialização do menor infrator. Foca-se a discussão nas diretrizes do atendimento a adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, especialmente em instituições de ressocialização. E ainda, apontar as falhas presentes nas principais instituições de convívio do adolescente como família, sociedade e Estado, e o papel que cada uma deve exercer frente ao adolescente. Serão demonstradas as diferença entre punição e prevenção. Por fim, a análise dos direitos da criança e do adolescente previstos na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente. 

Palavras-chave: adolescente – criança – infrator – reincidência.

Abstract

The article aims to investigate the causes that lead children and adolescents to the practice of infractions as well as to point out methods of prevention and solutions in order to prevent adolescents from entering the world of crime and even re-committing new crimes, configuring recidivism. The essential factors for the participation of adolescents in the world of crime will be pointed out, such as the lack of structure of a country as well as the influences of the environment in which the individual lives, based on the concepts of the Theory of the Differential Association of Edwin Sutherland (1883-1950) applied in Brazil. There will be the study of the socio-educational measures that the Statute of the Child and Adolescent applies to juvenile offenders, as well as the efficiency of their application and the results achieved; more specifically on the measure of hospitalization, while it is very deviant in relation to its concept and final objective, which is the resocialization of the minor offender. A discussion is focused on the guidelines for assitings adolecents in compliance with sócio-educational measures, especially in resocialization institutions. Even so, pointing out how flaws presentsthe mais institutions of adolecents relief such as Family, society and the State, adn the role that each one must play aginst the adolescente. They will be demonstrated as the differnce between punishment and pevention. Finally, na analysis of the rights of children and adolescentes provided for in the Federal Constitution and the Statute of Children and Adolescents.

Keywords: adolescente – child – offender – recurrence.

1. CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRIMINALIDADE JUVENIL

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, á profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.” (Art. 227 da Constituição Federal do Brasil).

A adolescência sucede na passagem da fase da criança para a adulta, sendo o momento em que a pessoa sofre modificações corporais e transformações no comportamento, como rebeldia, dúvidas e curiosidades.

Sobre o tema, afirma Gorges (2008) que:

Nesta etapa da vida passa-se por alterações físicas, psíquicas e sociais, características desta fase. As alterações físicas são praticamente iguais para os grupos de adolescentes do sexo feminino e masculino, já as alterações psíquicas e sociais são interpretadas e significadas através da cultura em que está inserido. Portanto, podemos afirmar que adolescentes é aquele indivíduo que está em transformação, ou seja, passou da fase infantil para a adolescente e prepara-se para a fase adulta, de amadurecimento, de aumento de responsabilidades e desafios (GORGES, 2008, p. 17).

Mais sobre o tema, Martins (2007) caracteriza a adolescência da seguinte forma:

A adolescência corresponde ao período em que o ser humano sofre mudanças orgânicas, cognitivas, sociais e afetivas. As mudanças sofridas pelo adolescente têm consequências ao nível do seu relacionamento interpessoal, familiar, escolar e social (MARTINS, 2007).

A respeito dos adolescentes autores de ato infracional, menciona Martins (2004):

[...] visto que em primeiro lugar antes de tudo são adolescentes [...]. Em segundo lugar, estão em conflito buscando definição de uma identidade, de padrões éticos e morais. Estão muitas vezes em conflitos com a escola, com a família, enfim com o mundo [...]. Todos os adolescentes passam por estes conflitos, porém alguns passam por este período rodeados por intensas dificuldades e desafios, que além de gerar conflitos consigo, podem ocasionar e leva-los ao conflito com a lei (MARTINS, 2004, p. 38).

Desta forma, podemos observar que o adolescente não tem uma personalidade construída, ademais, esta passando por muitas transformações tanto no comportamento, e também na formação de identidade, considerando que a sociedade, a família e o próprio Estado contribuem para a formação e construção da personalidade do adolescente.

É nítido o crescimento da criminalidade infantil no Brasil, onde, cada vez mais, crianças e adolescentes abandonam as escolas, fogem de suas casas com o objetivo de se rederem ao mundo do crime. Este notável aumento dos atos infracionais cometidos por menores é um reflexo da inaplicabilidade das políticas de prevenções adotadas no nosso país, pelo descaso de muitos pais na criação dos seus filhos e, também, do preconceito da sociedade.

Vale ressaltar que a família, a sociedade e o Estado assumem um papel fundamental para a conscientização do menor para evitar a prática ou a reincidência de atos infracionais pelos adolescentes. A falta de suporte de qualquer destas três instituições facilita a entrada do menor no mundo do crime, e nos casos daqueles que já estão envolvidos na prática de atos infracionais, a consequência é maior; nestes casos, há o perigo da reincidência gerando no menor, já infrator, o desejo implacável de praticar mais crimes, tornando-se um criminoso em potencial. Ressalte-se que os pressupostos da proteção integral e do atendimento prioritário, dos quais se extrai também a superioridade do melhor interesse da criança e do adolescente, são mais do que apenas princípios, pois, segundo a melhor doutrina, traduzem verdadeiras regras jurídicas de cumprimento e observância obrigatórios.

O presente artigo pretende abordar a criminalidade juvenil, analisando as causas que levam o menor a praticar o ato infracional e os principais responsáveis pela inserção do adolescente e da criança no mundo do crime.

Ao longo deste trabalho, iremos percorrer sobre as medidas impostas aos adolescentes infratores, apontando as falhas atuais do sistema brasileiro e ao final apresentando possíveis soluções para o referido problema.

          a. PERFIL DOS ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI EM BELO HORIZONTE

Importante destacar o conceito de ato infracional, nos termos do artigo 103 do ECA, ato infracional é a conduta descrita como crime ou contravenção penal. Somente os menores de 18 anos serão sujeitos ativos do ato infracional.

A Vara Infracional da Infância e da Juventude de Belo Horizonte divulgou um relatório estatístico sobre o envolvimento de adolescentes com ocorrências infracionais, em 2017, na capital.

Segundo o relatório, o ano de 2012 teve o índice mais agudo, com 9.782 ocorrências, enquanto 2016, com 8.176. Em 2017, mais de 8.200 adolescentes foram encaminhados para o Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional (CIA-BH).

O relatório aponta que o tráfico de drogas é o que apresenta o índice mais alto (1.710 ocorrências), logo após vem o roubo (852 ocorrências), uso de drogas (640 ocorrências) e furto (470 ocorrências).

Há ainda o fornecimento dos dados que demonstram o perfil do adolescente atendido pelo CIA-BH, como idade, sexo e região de residência, além do dia da semana e bairros onde as infrações são mais cometidas. Outro dado muito relevante abordado no relatório é o perfil socioeconômico dos adolescentes, como características étnico-raciais, renda familiar, estado civil e escolaridade.

No relatório divulgado pelo CIA-BH, há a indicação da incidência de atos infracionais no ano de 2017, contendo comparações dos tipos de atos infracionais no período. Da análise do gráfico podemos perceber que o tráfico de drogas é o que possui o índice mais alto, seguido pelo roubo e pelo uso de drogas.

Um dado importante apresentado no relatório, e que não pode ser esquecido, é que houve um decréscimo de 1,64% no cometimento de aos infracionais entre os anos de 2016 e 2017, ao se considerar o conjunto de ocorrências.

Quanto ao perfil do adolescente, vejamos:

Idade e sexo: Os autores de atos infracionais são, de forma exponencial, do sexo masculino, com idade entre 15 e 17 anos. O gráfico 4 apresentado no relatório demonstra que 86,40% dos atos infracionais são cometidos por adolescentes do sexo masculino, enquanto que 13,60% são cometidos por adolescentes do sexo feminino. (CIA-BH. Relatório Estatístico da Vara Infracional da Infância e Juventude - 2017, p. 9).

Região de residência: As regiões Oeste, Nordeste, Leste e Venda Nova concentram os maiores índices de residência de adolescentes autores de atos infracionais. Da tabela apresentada é possível observar que 14,69% dos adolescentes, em um total de 713 atendimentos, residem em municípios da região Metropolitana, 0,06% que corresponde ao número de 3 adolescentes, são oriundos de outros Estados e 0,27% que corresponde a 13 adolescentes, são oriundos de outras cidades do Interior de Minas. Somando o número dos atos infracionais cometidos por adolescentes em cada região, chegamos ao resultado de 4.854 atos infracionais. (CIA-BH. Relatório Estatístico da Vara Infracional da Infância e Juventude - 2017, p. 11).

REGIÃO

2017

REGIÃO

2017

BARREIRO

431

PAMPULHA

231

CENTRO-SUL

426

VENDA NOVA

500

LESTE

526

REGIÃO METROPOLITANA

713

NORDESTE

542

OUTRA CIDADE MG

13

NOROESTE

493

OUTRO ESTADO

3

NORTE

364

SEM INFORMAÇÃO

65

Quanto à região de ocorrência, o Centro-Sul acusa o maior número de ocorrências de roubo (22,18%), registrando um número muito acima da que lhe segue que é a região de Venda Nova, concentrando 13,31%. A região Leste foi a que apresentou menor índice de ocorrência, registrando uma porcentagem de 5,83%.

REGIÃO

2017

BARREIRO

9%

CENTRO-SUL

22,18%

LESTE

5,83%

NORDESTE

9,25%

NOROESTE

13,05%

NORTE

8,11%

OESTE

7,48%

PAMPULHA

8,87%

VENDA NOVA

13,31%

Podemos afirmar que o índice de estrutura populacional, que engloba o total da população e a densidade de determinada região tem muita importância para o cometimento de atos infracionais pelos adolescentes, senão vejamos:

A região Centro-Sul situada no coração de Belo Horizonte reúne uma população de 283.776 habitantes e 31,7km² de extensão territorial, e é área com maior ocorrência de atos infracionais praticados por adolescentes. (PRFEITURA DE BELO HORIZONTE). A região Centro Sul é uma área com muita concentração de atividades econômicas e o alto padrão de ocupação e visitação da população de Belo Horizonte, bem como a presença de locais que são símbolos e se tornam referências para os cidadãos belo-horizontinos, tais como a Praça Sete de setembro, o Mercado central entre outros. Por ser uma área maior e mais densa, possui uma taxa maior na ocorrência de atos infracionais.

Quanto à região da Pampulha, podemos ver que é a área com menor número de adolescentes infratores residentes, e uma das que possuem um menor número de ocorrências ocupando o 6° lugar, registrando apenas 8,87% de ocorrências. A região da Pampulha, segundo informação retirada do site da Prefeitura de Belo Horizonte, é a região com o menor número de população, possuindo 141.855 mil habitantes.

Dados socioeconômicos: Foi utilizada a técnica de estimativa de Proporção Populacional para se aplicar os resultados amostrais na população de interesse.

Os questionários foram aplicados presencialmente aos adolescentes no período de 09/01 a 19/12 de 2017. A amostra utilizada pelo CIA-BH foi constituída de 495 indivíduos selecionados aleatoriamente de um universo de 4.854 adolescentes de atos infracionais.

Das características étnico-raciais dos adolescentes autores de atos infracional, a tabela apresentada no relatório aponta os seguintes dados:

RAÇA/COR

2017

AMARELA

1,01%

BRANCA

14,55%

INDIGENA

1,21%

PARDA

53,13%

PRETA

22,63%

NAO RESPONDEU

1,01%

NAO SABE

6,46%

1,01% são da raça/cor amarela, 14,55% são da raça/cor branca, 1,21% são da raça/cor indígena, 53,13% são da raça/cor parda, 22,63% são da raça/cor preta, 1,01% não responderam e 6,46% não sabem (CIA-BH. Relatório Estatístico da Vara Infracional da Infância e Juventude - 2017, p. 26).

Do estado civil dos adolescentes autores de ato infracional:

ESTADO CIVIL

2017

CASADO

0,61%

SOLTEIRO

94,95%

UNIÃO ESTÁVEL

3,84%

NÃO INFORMOU

0,61%

0.61% são casados, 94,95% são solteiros, 3,84% mantêm união estável e 0,61% não informaram. (CIA-BH. Relatório Estatístico da Vara Infracional da Infância e Juventude - 2017, p. 27).

Da paternidade e maternidade dos adolescentes autores de ato infracional:

FILHOS

2017

NÃO

93,54%

SIM

4,65%

NÃO RESPONDEU

1,82%

93,54% não tem filho(s), 4,65 tem filho(s) e 1,82% não responderam. (CIA-BH. Relatório Estatístico da Vara Infracional da Infância e Juventude - 2017, p. 28).

Da gravidez na adolescente autora de ato infracional:

GRAVIDEZ

2017

NÃO

85,37%

SIM

2,44%

NÃO RESPONDEU

12,20%

85,37% não eram gestantes, 2,44% eram gestantes e 12,20% não responderam. (CIA-BH. Relatório Estatístico da Vara Infracional da Infância e Juventude - 2017, p. 29).

Da escolaridade dos autores de ato infracional:

ESCOLARIDADE

2017

3º ANO - ENS FUND

1,01%

4º ANO - ENS FUND

0,61%

5º ANO - ENS FUND

3,43%

6º ANO - ENS FUND

13,74%

7º ANO - ENS FUND

18,59%

8º ANO - ENS FUND

12,12%

9º ANO - ENS FUND

17,17%

1º ANO - ENS MÉDIO

17,37%

2º ANO - ENS MÉDIO

3,03%

3º ANO - ENS MÉDIO

0,61%

EJA- ENS FUND

10,30%

EJA- ENS MÉDIO

1,21%

NAO RESPONDEU

0,81%

Da tabela apresentada no relatório é possível extrair a distribuição dos adolescentes, considerando o ano de ensino que indicaram cursar na época ou o último que cursaram. Encontramos a maior porcentagem de adolescentes infratores cursando ou que cursaram por último o 7° ano do Ensino Fundamental, que é de 18,59%, enquanto que 17,37% cursam ou cursaram por último o 1° ano do Ensino Médio. Vale ressaltar que 65,05% dos adolescentes infratores se enquadram no nível do Ensino Fundamental e 21,01% se enquadraram no nível do Ensino Médio. 10,30% se enquadram no EJA de nível fundamental e 1,21% no EJA de nível médio, 0,81% não responderam. A distribuição dos adolescentes, considerando a natureza da escola, extrai-se que 2,02% são de escola particular, 93,94% de escola pública e 4,04% não responderam. (CIA-BH. Relatório Estatístico da Vara Infracional da Infância e Juventude - 2017, p. 31 e 32).

Cabe destacar que, de acordo com Lochner (2011), as oportunidades para os jovens nas atividades ilegais, incluindo a escola, reforçam seus elos de sociabilidade, diminuindo chances futuras de envolvimento com ações transgressoras (Sutherland, 1973). Desta forma, o aumento da taxa de adolescentes frequentando as escolas, significaria num efeito indireto das oportunidades no mercado de trabalho e da maior escolarização para jovens sobre crimes.

Conclui-se que, o aumento do acesso à escola contribui para atenuar o ritmo de aumento da taxa de atos infracionais praticados por adolescentes.

Do trabalho atual:

TRABALHO ATUAL

2017

NÃO

72,12%

SIM

27,88%

72,12% dos adolescentes infratores não trabalham e 27,88% trabalham. (CIA-BH. Relatório Estatístico da Vara Infracional da Infância e Juventude - 2017, p. 33).

As oportunidades no mercado de trabalho, afetam os custos implícitos de se dedicar à atividades ilegais. Podemos ver que a taxa de desemprego e os rendimentos reais no mercado de trabalho exercem uma influência considerável para o ingresso do adolescente no mundo do crime. O efeito positivo da taxa de desemprego dos adolescentes contribui para o acesso ao crime. Com base na teoria racional de Becker (1968), podemos afirmar que o custo de oportunidade baixo do crime está associado a taxas de desemprego elevadas e baixos salários, considerando que estes fatores implicam menores oportunidades no mercado de trabalho. O ponto central é que a baixa empregabilidade vigorante para os adolescentes eleva a probabilidade de se envolver em atividades ilegais.

Da renda mensal do adolescente:

RENDA MENSAL

2017

ATÉ 1 SALÁRIO MÍNIMO

20,40 %

DE 1 A 2 SALÁRIOS MÍNIMOS

3,03 %

DE 3 A 4 SALÁRIOS MÍNIMOS

0,20%

ACIMA DE 4 SALÁRIOS MÍNIMOS

0,20%

NENHUMA RENDA

59,19%

NÃO RESPONDEU

16,97 %

Da tabela apresentada, podemos observar que mais da metade dos adolescentes infratores não possuem nenhuma renda, o que pode ser uma motivação para que o menor cometa um ato infracional, com o fim de obter renda de forma injusta. Isso nos leva a pensar o seguinte, será que faltam oportunidades para os adolescentes ingressarem no mercado de trabalho? Sabemos que existem programas que facilitam o ingresso dos adolescentes e jovens - de famílias em situação de vulnerabilidade social - no mercado de trabalho, por exemplo, ASSPROM (Associação Profissionalizante do Menor) e o Jovem Aprendiz. Estes programas realizam atividades de sociabilização, capazes de despertar, nos jovens, o comportamento solidário e o exercício da cidadania. Não podemos negar que a obtenção de um trabalho traz algum ganho financeiro para afastá-los do mundo do crime.

Natureza da moradia do adolescente:

TIPO DE MORADIA

2017

ABRIGO

2,22%

APARTAMENTO

7,88%

BARRACÃO

9,29%

CASA

79,60%

MORA NA RUA

0,61%

NÃO RESPONDEU

0,40%

Renda familiar do adolescente:

RENDA FAMILIAR

2017

ATÉ 1 SALÁRIO MÍNIMO

12,12%

DE 1 A 2 SALÁRIOS MÍNIMOS

16,16%

DE 2 A 3 SALÁRIOS MÍNIMOS

5,86%

DE 3 A 4 SALÁRIOS MÍNIMOS

2,22%

ACIMA DE 4 SALÁRIOS MÍNIMOS

1,21%

NENHUMA RENDA

4,65%

NÃO SABE

40,81%

NÃO RESPONDEU

16,97%

Observa-se que 40,81% dos adolescentes não sabem informar qual a renda familiar. Fica claro que a maioria desses adolescentes faz parte de uma família pobre em termos financeiros.

Quanto a este dado, vale citar uma teoria contrastante na definição das causa da criminalidade. Esta teoria nos diz que a criminalidade e a violência são eventos de origem ligada a fatores de natureza econômica, o que seria um estímulo decisivo para o comportamento criminoso (PARKER E SMITH, 1979; TAYLOR et al., 1980).

De certa forma, o aumento da renda da família do adolescente reduz o incentivo ou a necessidade desses jovens de se envolverem em atos infracionais. Nesse sentido, houve a expansão do Programa Bolsa Família (PBF), que paga um benefício às famílias pobres, que tem mais riscos de envolvimento no crime.

Quanto ao uso de drogas, tem-se o seguinte resultado:

USO DE DROGAS

2017

ÁLCOOL

43,84%

COCAÍNA

14,34%

CRACK

0,81%

ÊXTASE, REMÉDIOS DE TARJA PRETA, ANSIOLITICOS, ANTIDEPRESSIVOS.

8,48%

MACONHA

75,96%

SOLVENTES/INALANTES (THINNER, COLA, LOLÓ, LANÇA PERFUME)

4,65%

TABACO/CIGARRO

34,75%

OUTRAS

1,21%

NÃO USA

7,47%

NUNCA USOU

0,44%

NÃO RESPONDEU

13,94%

Ressalta-se que um adolescente pode usar mais de um tipo de droga.

Aqui temos um dado bastante relevante, pois, se analisarmos esta tabela, percebemos que mais da metade dos adolescentes que praticam atos infracionais são usuários de drogas, mais especificamente, a maconha, que atingiu o número de 75,96% dos entrevistados. Portanto, o crime, sem sombra de dúvidas, é estimulado, também, pelo consumo de drogas.

Importante destacar que os menores estão cada vez mais envolvidos com os entorpecentes. Conforme dados apresentados por João Evaldo dos Santos Lourido Júnior, há uma considerável parcela de nossos jovens perdidos no universo das drogas:

[...] cerca de 20 mil crianças e adolescentes, com idade entre 10 e 16 anos servem ao narcotráfico no Brasil. Por ano, cerca de 10 mil assassinatos de jovens estão relacionados com o tráfico de drogas, 90% das crianças envolvidas no narcotráfico consomem maconha (LOURIDO JÚNIOR, 2007, s.p.).

A família é o contexto social mais próximo dos adolescentes e é o primeiro contato social do adolescente, sendo responsável pela organização da personalidade deste. Os relacionamentos saudáveis neste âmbito têm implicações positivas para combater o uso de drogas. Considerando isto, os profissionais da saúde têm uma função importante de auxiliar os membros das famílias a encontrarem seus papeis de maneira a constituírem um sistema familiar mais harmônico (PERLINI, LEITE e FURINI, 2007).

Adiante veremos que o ato infracional mais cometido pelos adolescentes é o tráfico de drogas, disparado em primeiro lugar, com 1.710 casos registrados em 2017, seguidos pelo roubo e pelo uso de drogas.

Dos atos infracionais:

OCORRÊNCIAS

2017

AMEAÇA

326

CRIME DE TRÂNSITO

112

DANO

163

ESTUPRO

5

ESTUPRO DE VUNERÁVEL

8

FURTO

470

FURTO (TENTATIVA)

39

HOMICÍDIO

12

HOMICÍDIO (TENTATIVA)

32

LESÃO CORPORAL

385

PICHAÇÃO

23

PORTE/POSSE DE ARMA

306

RECEPTAÇÃO

299

ROUBO

852

ROUBO (§ 3º)

3

ROUBO (TENTATIVA)

69

SEQUESTRO

2

TRÁFICO DE DROGAS

1710

USO DE DROGAS

640

VIAS DE FATO

183

OUTROS

288

SEM INFORMAÇÃO

74

TOTAL

6001

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Podemos observar que há uma incidência muito alta do cometimento de atos infracionais análogos aos crimes de cunho econômico, ou seja, o tráfico de drogas, o roubo, o furto e o uso de drogas. Estes atos infracionais, somam mais da metade do total (53,36%). A pergunta que devemos fazer é, por que estes adolescentes decidem cometer crimes de cunho econômico? Podemos encontrar a resposta nos pressupostos das chamadas “Teoria econômica do Crime e Teoria das Oportunidades”.

O principal expoente da Teoria Econômica do Crime é o economista Gary Becker, que tem como pressuposto a ideia de que a tomada de decisão dos indivíduos em relação a cometer crimes que visem lucros financeiros é uma atividade ou setor da economia, como qualquer outro.

Em uma pesquisa realizada por Cezar Augusto Pereira dos Santos (2016), ao entrevistar um grupo de infratores, lhes perguntando quais os motivos que os levaram a realizar os delitos, obteve o seguinte resultado:

MOTIVOS

FREQUÊNCIA

Obter status junto ao grupo e influência de

Amigos

8

Ganho fácil

6

Sustentar o vício em drogas ilícitas

6

Cobiça e ambição

5

Sustentar a família

5

Efeito do uso de álcool

2

Podemos ver que na maioria dos casos os motivos que levaram estes criminosos a cometerem crimes era o desejo de obter status junto ao grupo e influência de amigos, em seguida o ganho fácil. Ou seja, a intenção é obter lucro econômico de forma fácil e ilícita a fim de alcançar status social. Mas não podemos ficar adstritos apenas à Teoria Econômica do Crime, uma vez que, muito mais do que a questão econômica, que representa a aparência dos delitos que envolvem ganhos financeiros, os fatores familiares, sociais e até psicológicos, estão na essência do fenômeno da criminalidade.

Quanto a Teoria das Oportunidades, Cohen e Felson (1979) argumentam que se a oportunidade gerar para os infratores uma vantagem financeira e o “alvo” esteja desprovido de proteção necessária, o delito irá ocorrer. Esta teoria, de certa forma, aplica-se a qualquer tipo de crime, uma vez que o infrator pretende praticar o ato criminoso quando possui as condições mais favoráveis para executá-lo.

2. A PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA, SOCIEDADE E ESTADO

O art. 4° do Estatuto da Criança e do Adolescente tem a seguinte redação:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. (grifo nosso) (Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n° 8.069/90 – ECA).

A família, a sociedade e o Estado, solidariamente, devem defender e garantir os direitos fundamentais assegurados à criança e ao adolescente. Não é um atarefa exclusiva de apenas um órgão ou entidade, mas deve ocorrer a partir de uma ação solidária e planejada entre família, sociedade e Estado (art. 4° do ECA e art. 227, caput da CF/88). Vale ressaltar que estas três instituições – família, sociedade e o Estado – assumem um papel fundamental para a conscientização do menor para evitar a prática de atos infracionais ou a reincidência.

A falta de suporte de qualquer destas três instituições facilita a entrada do menor na vida criminosa, e nos casos daqueles que já estão envolvidos na prática de atos infracionais, a consequência é maior; nestes casos, há o perigo da reincidência gerando no menor, já infrator, o desejo implacável de praticar mais atos infracionais, tornando-se um criminoso em potencial. Ressalta-se que os pressupostos da proteção integral e do atendimento prioritário, dos quais se extrai também da superioridade do melhor interesse da criança e do adolescente, são mais do que apenas princípios, considerando que, segundo a melhor doutrina, traduzem verdadeiras regras jurídicas de cumprimento e observância obrigatórios.

O artigo supracitado trata do princípio da prioridade absoluta à criança e ao adolescente, devendo conduzir o exercício de todas as entidades, em especial do Estado, a fim de promover a defesa dos direitos assegurados a crianças e adolescentes. Destaca-se a parte do artigo que diz “com absoluta prioridade” (ou seja, antes e acima de qualquer outra).

A nossa Constituição Federal também garante às crianças e aos adolescentes os seus direitos e garantias fundamentais, previsto no art. 227, caput:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Constituição Federal de 1988).

          a. O PAPEL DA FAMÍLIA

Nota-se que a família está situada em primeiro lugar das instituições responsáveis para atuarem na defesa dos direitos das crianças e adolescentes, pois todo trabalho exercido e desenvolvido em benefício destes ocorre, preferencialmente, no âmbito familiar (DIGIÁCOMO; DIGIÁCOMO 2017, p.20). ainda neste sentido, o art. 100, par. Único, incisos IX e X do Estatuto da Criança e do adolescente relaciona princípios que regem a aplicação das medidas socioeducativas observando a atuação da entidade familiar:

Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.

Parágrafo único.  São também princípios que regem a aplicação das medidas:

(...)

IX - responsabilidade parental: a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o adolescente;

X - prevalência da família: na promoção de direitos e na proteção da criança e do adolescente deve ser dada prevalência às medidas que os mantenham ou reintegrem na sua família natural ou extensa ou, se isso não for possível, que promovam a sua integração em família adotiva; (art. 100, par. Único, incisos IX e X do ECA).

Mesmo na aplicação das medidas socioeducativas, deve-se garantir o acesso do menor infrator no seio familiar, pois de acordo com o mencionado artigo, a família tem de assumir seus deveres com a criança e o adolescente. A partir dos artigos citados, pode-se afirmar que a família é o componente mais importante para o desenvolvimento adequado da criança e do adolescente. É o que nos diz Jason Albergaria:

Daí nota-se a importância que tem a família na participação na vida do jovem em acompanhar seu crescimento e desenvolvimento, pois esta entidade é considerada um dos fatores sociais de prevenção do abandono e da delinquência. São inúmeras as opiniões acerca da importância da família dentre elas destacamos a de Middendorff ao afirmar que o meio ambiente mais importante do menor e da pessoa humana é a sua família, a primeira responsável pela sua evolução: boa ou má. Na hierarquia do art. 227 da CF/88 a família é a primeira na corresponsabilidade pelo atendimento dos direitos da criança e do adolescente. A mesma por se tratar de um poder paternal que na definição de Albergaria consiste no conjunto de poderes e deveres destinados a assegurar o bem-estar moral e material dos filhos, tomando de conta destes, mantendo as relações pessoais e assegurando sua educação, sustento, representação legal e administração de seus bens. (1991, p. 110).

Deve-se destacar que a personalidade do menor é formada de acordo com a estrutura familiar deste, sendo fundamental na prevenção da delinquência. Ocorre que com tanta pobreza e falta de estrutura, as famílias muitas vezes não conseguem assegurar um sustento digno para suas crianças, tendo como consequência a marginalidade desses menores.

Segue jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. INTERNAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE. GRAVIDADE ABSTRATA DA CONDUTA. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. SÚMULA 492/STJ. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE SEMILIBERDADE QUE SE MOSTRA DEVIDA. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. A aplicação da internação, medida socioeducativa extrema, está autorizada apenas nas hipóteses taxativamente elencadas no art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. Apesar de o ato infracional praticado pelo paciente (ora agravado) ser análogo ao crime de tráfico de drogas, de caráter hediondo, e não obstante seja revestido de alto grau de reprovabilidade social, a jurisprudência deste Superior Tribunal possui orientação de que não se admite a aplicação da medida mais gravosa com esteio na gravidade genérica do ato infracional ou na natureza hedionda do crime de tráfico de drogas, dada a taxatividade do rol previsto no art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Súmula 492/STJ. 3. Uma vez que a conduta praticada pelo agravado é desprovida de violência ou grave ameaça à pessoa e considerando-se que não consta dos autos notícia de reiteração no cometimento de outras infrações graves ou descumprimento reiterado e injustificável de medida anteriormente imposta, não haveria como ser mantida a aplicação da medida socioeducativa de internação ao adolescente. 4. O fato de terem sido apreendidas tanto maconha quanto cocaína, somado à falta de estrutura familiar para amparar o adolescente, demostra a necessidade da aplicação de uma medida mais gravosa, que o conduza a refletir sobre sua conduta, sobretudo em se considerando a função protetiva e pedagógica das medidas socioeducativas, as quais visam, especialmente, afastar o adolescente da criminalidade e corrigir eventuais desvios em seu comportamento. 5. O fato de o adolescente integrar família desestruturada e não ter respaldo familiar não é fundamento contemplado no art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente como hipótese autorizadora da medida de internação. 6. Agravo regimental improvido. (AgRg no HABEAS CORPUS Nº 256.550 – SP – 2012)

  "[...] o legislador, primeiro fez questão de explicitar uma base principiológica que deve ser observada na aplicação das medidas, tais como: a presunção, iuris tantum, de que a família é o melhor ambiente para a criança (art. 100, IX e X, do ECA); a necessidade da intervenção estatal se limitar às ações indispensáveis à proteção das crianças e dos adolescentes e observar a proporcionalidade (art. 100, VII e VIII, do ECA) e; a obrigatoriedade de que a intervenção necessária seja efetuada, tão logo o risco que a criança ou adolescente corre, seja desvelado.” (REsp 1654099/MS RECURSO ESPECIAL 2015/0190993-3).

O respeitável Tribunal de Justiça de Minas Gerais, observando o melhor interesse do menor e o caráter pedagógico das medidas socioeducativas, posicionou-se pela manutenção do menor na medida socioeducativa de internação, considerando a estrutura familiar deste:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ATO INFRACIONAL ANÁLOGO A HOMICÍDIO - MEDIDA SÓCIOEDUCATIVA - INTERNAÇÃO - DESLIGAMENTO - CARÁTER PEDAGÓGICO - INTERESSE E PROTEÇÃO DO MENOR - NECESSIDADE DE ESTUDO INTERDISCIPLINAR SOBRE A REALIDADE DA ESTRUTURA FAMILIAR - CONCLUSÕES - DECISÃO JUDICIAL - VINCULAÇÃO À SUGESTÃO APONTADA - LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO - RECURSO NÃO PROVIDO. 
- As medidas socioeducativas são tomadas em benefício do infrator, com intuito pedagógico, servindo para imbuir parâmetros para um futuro de dignidade e respeito às normas de convívio social, além de prevenir futuras ações ilícitas. 
- É salutar, e coaduna-se com o espeque teleológico do ECA, a manutenção do menor na medida socioeducativa de internação em razão do aparente risco socioeconômico em que se encontra sua família. 
- O ato decisório é pluridimensional e complexo, necessitando, não raras vezes, de apoio dos demais ramos do conhecimento. Contudo, diante do dever de motivar, as decisões judiciais não estão vinculadas às conclusões apresentadas nos autos pelas demais áreas do conhecimento, se demonstrada a ineficácia do acolhimento da medida sugerida no laudo interdisciplinar.

(...)

Dos Relatórios Interdisciplinares abrocalhados junto aos autos constata-se que a vida familiar do menor é desestruturada, apontando o envolvimento de seus parentes com a marginalidade, tanto os irmãos quanto os pais. A própria genitora do adolescente relata ser negligente na educação do filho. Aludidos estudos interdisciplinares indicam, neste momento, a completa ausência de controle e estrutura familiar sobre as ações do adolescente, o que, de fato, compromete todos os objetivos almejados com a internação do menor.  (TJMG -  Agravo de Instrumento-Cr  1.0231.12.015631-1/001, Relator(a): Des.(a) Cássio Salomé , 7ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 25/04/2013, publicação da súmula em 03/05/2013).

Desta forma, com base no posicionamento do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, fica averiguado que a família é, e sempre será o principal fundamento para o desenvolvimento do menor; e a ausência da família ou a má estrutura familiar pode provocar no menor uma inclinação para a vida criminosa, deixando para o Estado a função de educar e repreender o infrator.

          b. O PAPEL DA SOCIEDADE

A segunda instituição responsável por assegurar os direitos da criança e do adolescente é a sociedade. A sociedade tem responsabilidade em caráter preventivo, ou seja, deve contribuir para a conscientização do jovem, a fim de evitar sua inserção no mundo do crime, pois a relação da sociedade com o menor infrator é determinante na vida das crianças e dos adolescentes.

Entretanto, ultimamente a sociedade não vem cumprindo com suas obrigações, ou melhor, com a sua função de garantir uma vida sadia para as crianças e adolescentes, isto porque, conforme nos afirma José Henrique Pierangeli, em seu artigo sobre menoridade, existe um esquecimento social:

Sentimos, não sem preocupação, a ausência da sociedade nessa luta contra a chamada delinquência juvenil, a qual assiste, quase que passivamente, à violência e brutalidade que orientam a ação de delinquentes de altíssima periculosidade, que permanecem acobertados pelo âmbito da menoridade. A disseminação das drogas, nefasta herança de uma sociedade consumista, e que sempre busca o ganho fácil ainda que ilícito, incrementa o tráfico, amordaça a advertência e anula a orientação da família no sentido de evitar o ingresso do jovem no mundo da criminalidade. (PIERANGELI, 2003).

A corresponsabilidade da sociedade está expressamente prevista no ECA, e a atuação dos “atores sociais” podem começar a partir da escolha dos responsáveis pela elaboração das leia de proteção à criança e ao adolescente e se estende, alcançando a cobrança para a implementação dos direitos legalmente previstos. E fica evidente que o menor, desse outros tempos, é vitima de abandono e de exploração econômica e social.

Não é erro dizer que o Estado e a sociedade devem agir unidos, pois o Estado é o responsável pela implementação das políticas públicas de bem estar da infância e juventude, porém, a sociedade tem sua corresponsabilidade prevista, cabendo a ela fazer o controle social. O autor e filósofo Manheim (1971, p. 178) define o controle social como o “conjunto de métodos pelos quais a sociedade influencia o comportamento humano, tendo em vista manter determinada ordem”. A partir desta definição de controle social, tem-se a conclusão de que a sociedade deve influenciar o comportamento humano, para cumprir e fazer cumprir os direitos e garantias legais inerentes às crianças e adolescentes.

          c. O PAPEL DO ESTADO

Cabe ao Estado a responsabilidade de assegurar os direitos da criança e doa adolescente por meio de políticas públicas. O Estado assume um papel de suma importância para garantir às crianças e aos adolescentes seus direitos de cidadania, respeitando sua condição de pessoa em desenvolvimento resguardado pelo princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. É dever do Estado, ainda, promover programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente.

Os dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente e da Constituição Federal evidencia a necessidade de que a “proteção integral e prioritária” prometida a todas as crianças e adolescentes se dê por meio de políticas públicas, a começar pelas políticas sociais básicas (saúde, educação, habitação, saneamento etc.).

O administrador público, aquele que está vinculado ao princípio da legalidade, fica obrigado a implementar as políticas públicas destinadas à garantia da plena efetivação dos direitos infanto-juvenis assegurados pela lei e pela Constituição Federal. Neste sentido, vale transcrever a seguinte jurisprudência:

Recurso Especial. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MATRÍCULA E FREQUÊNCIA DE MENORES DE ZERO A SEIS ANOS EM CRECHE DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL. DEVER DO ESTADO. 1. Hipótese em que o Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou Ação Civil Pública com o fito de assegurar a matrícula de duas crianças em creche municipal. O pedido foi julgado procedente pelo Juízo de 1º grau, porém a sentença foi reformada pelo Tribunal de origem. 2. Os arts. 54, IV, 208, III, e 213 da Lei 8.069/1990 impõem que o Estado propicie às crianças de até 6 (seis) anos de idade o acesso ao atendimento público educacional em creche e pré-escola. 3. É legítima a determinação da obrigação de fazer pelo Judiciário para tutelar o direito subjetivo do menor a tal assistência educacional, não havendo falar em discricionariedade da Administração Pública, que tem o dever legal de assegurá-lo. Precedentes do STJ e do STF. 4. Recurso Especial provido. (STJ. 2ª T. R.Esp. nº 511645/SP. Rel. Min. Herman Benjamin. J. em 18/08/2009).

O princípio constitucional da prioridade absoluta à criança e ao adolescente, exige a adequação dos orçamentos públicos dos entes federados às necessidades específicas da população infanto-juvenil, por meio de da previsão dos recursos indispensáveis à implementação de políticas básicas (art. 87, inciso I do ECA), políticas e programas de assistência social (art. 87, inciso II, do ECA) e programas de prevenção, proteção especial e socioeducativas (arts. 88, inciso III c/c 90, 101, 112 e 129, todos do ECA), com foco prioritário no atendimento de crianças, adolescentes e suas famílias (DIGIÁCOMO; DIGIÁCOMO 2017, p.10).

A Constituição atribuiu ao Estado a responsabilidade de prevenção das infrações, para que assim garanta a segurança, educação, saúde e lazer das crianças e adolescentes. Assim analisa o doutrinador Jason Albergaria:

[...] o Estado cooperará com a família nos programas oficiais de auxílio, em cumprimento ao art. 227 da Constituição. Se falham a família e a sociedade, caberá a intervenção do Estado. Se os pais se omitirem e abusarem do direito do menor de devolver harmoniosamente a sua personalidade, intervirá o Estado para garantia desse direito das crianças à vida e à perfeição ou realização de sua vocação de crescer. A intervenção do Estado é necessária no próprio lar, para proteção do direito à vida da criança, sobretudo ante a criança mártir, a criança maltratada pelos próprios pais. A crueldade dos pais destrói o destino do filho, obsta a sua inserção na vida familiar, escolar ou social, o que renderia ensejo à intervenção imediata do Estado, para a identificação precoce das relações entre pais e filhos. (1995, p. 108-109).

O Estatuto da Criança e do Adolescente acolheu a Teoria da proteção integral, que se baseia na total proteção dos direitos de seus destinatários. O art. 1° do referido estatuto, corrobora esse entendimento, quando diz que dispõe sobre a proteção integral da criança e do adolescente. E o art. 3° enfatiza que eles são titulares de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, prevalecendo, sempre, o caminho que leve ao desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade. Mesmo diante de tais preceitos, ainda assim, deparamo-nos com enormes dificuldades quando tratamos da aplicabilidade destes direitos e garantias conquistados em favor da criança e do adolescente. Não se trata de ineficácia, e sim de inaplicabilidade do texto normativo, o texto não é cumprido nos termos em que é traçado.

Desta forma, cumpre ao Estado executar, aprimorar e fazer cumprir as leis que editou, além de formular e regulamentar as que faltam.

Importante mencionar que a falta ou inoperância de escolas, abrigos, hospitais e demais instituições para atendimento das crianças e adolescentes, configura descumprimento por parte do ente responsável pelas atribuições apontadas como essenciais pelo ECA, podendo assim, pela conduta ou omissão, responder judicialmente, sem prejuízo de responsabilidade penal e administrativa.

Para finalizar, se entende que o Estado, a sociedade e a família seriam corresponsáveis para o desenvolvimento da infância e juventude no País, todavia a realidade não condiz com o que se deveria, pois inúmeras são violações dos direitos da criança e adolescente, são famílias maltratando e abusando de suas crianças, uma sociedade que não acredita em sua juventude e muitas vezes não dá o espaço necessário a ela, e por fim, um Estado corrupto que sequer consegue dar condições dignas de saúde e educação para o que deveria ser o futuro do Brasil, a juventude.

3. AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS PREVISTAS NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Capítulo IV

Das Medidas Sócio-Educativas

Seção I

Disposições Gerais

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I - advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semi-liberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.

§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.

§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições. (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 1990).

As medidas socioeducativas são aplicadas apenas a adolescentes acusados na prática de atos infracionais, devendo por força do art. 104, parágrafo único do Estatuto da Criança e do Adolescente, ser considerada a idade do agente à data do fato.

Como é sabido, a medida socioeducativa tem como principal objetivo a reeducação e ressocialização do adolescente, buscando proporcionar a ele um momento de reflexão sobre a gravidade e consequência de seus atos, de modo que este consiga redirecionar sua vida, e, não, a punição à sua conduta. Por isso mesmo as medidas socioeducativas não podem ser confundidas ou encaradas como “penas”, considerando que possuem natureza jurídica e finalidades distintas. A pena tem um caráter punitivo, as medidas socioeducativas têm um caráter exclusivamente pedagógico, com a finalidade de educar o adolescente que praticou o ato infracional, evitando sua reincidência. A aplicação das medidas socioeducativas está sujeita a princípios e regras específicas, previstas nos arts. 112, §1° e 113 c/c arts. 99 e 100, caput e par. Único, todos do ECA.

Vale ressaltar que a aplicação da medida socioeducativa deve ter correlação entre o ato infracional (circunstâncias, motivos, causas, conduta infracional etc.), evitando que adolescentes praticantes de atos infracionais recebam medidas socioeducativas completamente diversas, e sempre prezando pela celeridade da aplicação da medida, levando sempre em conta a condição do adolescente no momento em que a decisão for tomada. Neste sentido:

HABEASCORPUS. ECA. ADOLESCENTES INTERNADAS EM VIRTUDE DE SENTENÇA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO PRECISO E BEM FUNDAMENTADO. ENTENDIMENTO ADOTADO COMO RAZÕES DE DECIDIR. DECISÃO QUE ENGLOBOU AS TRÊS ADOLESCENTES, SEM ANALISAR SUAS PECULIARIDADES E SINGULARIDADES. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS BASILARES DO DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. SENTENÇA ANULADA. ADOLESCENTES DESINTERNADAS QUE DEVERÃO AGUARDAR NOVA DECISÃO SOB LIBERDADE ASSISTIDA. (TJPR. 2ª C. Crim. HC-ECA nº 0743893-3, de Pinhão. Rel. Des. Valter Ressel. J. em 17/02/2011); e APELAÇÃO CÍVEL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL. ROUBO. APLICAÇÃO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO COM POSSIBILIDADE DE ATIVIDADES EXTERNAS. MODIFICAÇÃO. ADEQUAÇÃO ÀS CIRCUNSTÂNCIAS PESSOAIS DE CADA ADOLESCENTE. ABRANDAMENTO DA MEDIDA. A medida socioeducativa a ser aplicada deve observar não somente o ato infracional praticado, mas também as circunstâncias pessoais do adolescente, pois que a finalidade principal do Estatuto da Criança e do Adolescente é de reeducar e ressocializar o adolescente. Deve ser diferenciada a medida aplicada ao adolescente que não possui antecedentes, daquele que possui poucos e, daqueles que possuem uma conduta reiterada na prática de atos infracionais. APELAÇÃO PROVIDA. (TJRS. 7ª C. Cív. Ap. Cív. nº 70031420938. Rel. Des. José Conrado de Souza Júnior. J. em 28/10/2009).


EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO - ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS - IMPOSIÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE ADVERTÊNCIA - IMPOSSIBILIDADE.- Afigura-se insuficiente a imposição da medida socioeducativa de advertência ao adolescente que praticou ato infracional análogo ao crime de tráfico de drogas, pois, em razão da gravidade da conduta, é necessário a imposição de medida que seja capaz de protegê-lo e reeducá-lo, afastando-o da criminalidade. V.V.- Para se promover a escolha da medida socioeducativa a ser aplicada ao menor infrator, é impossível se considerar apenas a gravidade do evento, necessária a análise de todas as circunstâncias que giram em torno do caso concreto, da realidade vivida pelo adolescente. Sendo assim, valorados todos os aspectos e comprovando-se que o adolescente está bem inserido no contexto social, estuda, trabalha e sendo o evento noticiado o único que ele se envolveu, possível a aplicação de advertência, mesmo diante da prática análoga ao delito de tráfico de drogas.  (TJMG -  Emb Infring e de Nulidade  1.0024.14.004223-5/002, Relator(a): Des.(a) Agostinho Gomes de Azevedo , 7ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 18/02/2016, publicação da súmula em 26/02/2016). (grifo nosso).

          a. ADVERTÊNCIA

Esta é a primeira medida prevista no art. 112 do ECA, considera-se a mais leve. Com a presença da prova de materialidade, esta medida poderá ser fundamentada apenas em indícios de autoria. Nesse sentido explica Moacir Rodrigues:

“[...] Basta que examine que ao exigir no artigo 114, provas suficientes de autoria e de materialidade para a imposição das medidas previstas nos incisos II a VI, do artigo 112, exclui a exigência de prova de autoria para aplicação da advertência”. (1995, p.21).

Para Válter Kenki Ishida,

Prevê o ECA a medida de advertência consistindo na admoestação, ou seja, a leitura do ato cometido e o comprometimento de que a situação não se repetirá. Assim, atos infracionais como de adolescentes que cometa, pela primeira vez, lesões leves em outro ou vias de fato, podem levar aplicação desta medida. (1998, p.76).

Conclui-se que a medida de advertência é uma forma de coação verbal, sendo necessária a presença dos pais ou dos responsáveis no decorrer do procedimento, com o fim de que o adolescente infrator mude e assim restabeleça a sociedade normalmente.

          b. OBRIGAÇÃO DE REPARAR O DANO

Esta medida é pouco utilizada, uma vez que para o infrator reparar o dano, este deverá ter boas condições financeiras, sendo assim, poderá ser aplicada outra medida adequada, conforme o artigo 116, par. Único do ECA:

Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima.

Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada.

Para a autora Cleide Lavoratti, a obrigação de reparar o dano consiste em:

[...] determinada quando o ato infracional é atribuído ao patrimônio, então, deve ser restituído o bem e ressarcida e/ou compensada a vítima. Esta medida deve ser medida considerada que o adolescente reconhece o seu erro e assim, o repara. Desta maneira, julga-se educativa, pois não deve ser transferida para outra pessoa. Quando se manifesta a impossibilidade da aplicação, pode ser substituída por outra medida que a autoridade competente julgue mais adequada. (2007, p. 261).

Para Jason Albergaria o objetivo dessa medida é “despertar e desenvolver no menor o senso de responsabilidade em face do outro do que lhe pertenece” (1991, p.119).

          c. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE

Sobre esta medida, dispõe o art. 117 do ECA que:

A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais.

Podemos perceber que esta medida tem uma aplicação bastante importante, considerando que o Estado não será onerado e ainda acarretará benefícios à sociedade.

Salomão Shecaira leciona que:

A medida jamais poderá consistir em tarefas humilhantes ou discriminatórias. Sua finalidade é induzir no infrator a ideia de responsabilidade, de apego as normas comunitárias, de respeito pelo trabalho, bem como produz na comunidade uma sensação de obediência às regras. Além disso, o órgão ou entidade beneficiada com a prestação do serviço do adolescente deve enviar relatório periódico ao juiz da infância e juventude que fiscaliza a execução da medida, narrar eventuais incidentes que possa ocorrer e controlar sua frequência. A duração máxima da medida é pelo período de seis meses. (2008, p. 198-199).

É uma medida que pode alcançar facilmente o seu objetivo, pois o adolescente mediante prestação de serviços não irá prejudicar o Estado e ainda irá gerar inúmera benfeitorias a sociedade.

          d. LIBERDADE ASSITIDA

A liberdade assistida está prevista no art. 118 e 119 do ECA:

Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.

§ 1º A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento.

§ 2º A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor.

Art. 119. Incumbe ao orientador, com o apoio e a supervisão da autoridade competente, a realização dos seguintes encargos, entre outros:

I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social;

II - supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula; III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho;

IV - apresentar relatório do caso.

O objetivo da medida da liberdade assistida é de não afastar o adolescente do seu meio natural, lar, escola ou trabalho, mas será acompanhado de um funcionário designado para orientá-lo.

Segundo Cleide Lavoratti, o procedimento funciona da seguinte maneira;

O orientador desta medida sócio educativa, deve ter o apoio e supervisão da autoridade competente, para acompanhar o adolescente no prazo máximo de seis meses, podendo a medida ser prorrogada, revogada ou substituída a qualquer tempo, deste que seja ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor. (2007, p. 262).

Os tribunais entendem que a aplicação da medida de liberdade assistida deve ser utilizada, pois visa a ressocialização do infrator, sendo possível fazer a substituição da medida pelas demais, vejamos entendimento do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e do Paraná:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ATOS INFRACIONAIS ANÁLOGOS AOS CRIMES DE HOMICÍDIO E OCULTAÇÃO DE CADÁVER - PRELIMINAR DE NULIDADE - AUSÊNCIA DO REPRESENTANTE MINISTERIAL DURANTE A OITIVA DAS TESTEMUNHAS - INOCORRÊNCIA - PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO - RECONHECIMENTO DA EXLUDENTE DE ILICITUDE DA LEGÍTIMA DEFESA - NECESSIDADE - USO DE MEIOS NECESSÁRIOS E MODERADOS PARA REPELIR AÇÃO ATUAL E INJUSTA PROVOCADA PELO OFENDIDO - SUBSTITUIÇÃO MEDIDA SOCIOEDUCATIVA - NECESSIDADE - MEDIDA DE LIBERDADE ASSISTIDA ADEQUADA AO CASO CONCRETO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
- Não há vício na hipótese em que, apesar de presente, o Ministério Público deixa de acompanhar a oitiva das testemunhas na audiência de instrução e julgamento, se o Magistrado formula perguntas às testemunhas sobre os fatos constantes da representação, sobretudo no caso em que não há demonstração de efetivo prejuízo à defesa do menor.
- Existindo prova segura de que o adolescente, ao ceifar a vida da vítima, agiu em legítima defesa própria e de terceiros, vez que todo o acervo probatório converge nesse sentido, mostra-se imperiosa a rejeição da representação criminal, no tocante ao ato infracional análogo ao delito de homicídio.
- Justifica-se a imposição da medida socioeducativa de liberdade assistida se o menor vivencia episódio potencialmente traumático, necessitando auxílio de profissionais capacitados a realizar seu acompanhamento pedagógico.  (TJMG -  Apelação Criminal  1.0702.16.072852-4/001, Relator(a): Des.(a) Beatriz Pinheiro Caires , 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 24/10/2019, publicação da súmula em 01/11/2019).

Ementa

DECISÃO: ACORDAM os julgadores da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, em composição fracionária, por unanimidade, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. EMENTA: APELAÇÃO-ECA. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO A TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, DA LEI Nº 11.343/06). INTERNAÇÃO DETERMINADA PELA SENTENÇA. RECURSO PEDINDO A PROGRESSÃO DA MEDIDA. POSSIBILIDADE. A INTERNAÇÃO FOI APLICADA FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ECA E A MEDIDA DE LIBERDADE ASSISTIDA DEMONSTRA SER MAIS ADEQUADA AO CASO. PARECER FAVORÁVEL DA PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA. MEDIDA EXTREMA DE INTERNAÇÃO APLICADA SOMENTE COM BASE NA GRAVIDADE EM ABSTRATO DO ATO INFRACIONAL. RECURSO PROVIDO. (TJPR- Processo 853682-5- 2ª Câmara Criminal – Relator: Valter Ressel- publicado em 13/04/2012).

Esta medida possibilita o acompanhamento da vida social do adolescente supervisionando-o na escola, promovendo-o socialmente e ainda buscando a inclusão no mercado de trabalho.

          e. REGIME DE SEMILIBERDADE

A finalidade desta medida é oportunizar o acesso a serviços e organizar a vida do adolescente infrator, visando ressocializá-lo. Esta medida versa sobre uma restrição de liberdade, ocorre que, tal liberdade não será restringida integralmente.

Desta forma, a doutrinadora Cleide Lavarotti conceitua a medida:

Artigo 120 (ECA) trata-se de medida restritiva de liberdade, porém, não é tão extrema quanto à medida de privação de liberdade, pois o adolescente não fica totalmente privado de seu direito de ir e vir. O Juiz pode aplicar esta medida, desde o início, ou como forma de regressão da medida de internação para a medida em meio aberto. (2007, p. 262-263).

Quanto ao conceito acima transcrito, o tribunal de Justiça do Paraná é claro, vejamos:

Ementa:

DECISÃO: ACORDAM os julgadores integrantes da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, em composição fracionária, por unanimidade de votos, em conceder a ordem não só para que o paciente passe a cumprir a medida socioeducativa de semiliberdade, mediante expedição do competente alvará de desinternamento, mas também para que sua família venha a ser inserida em programas de orientação, conforme dispõem os arts. 122, § 2º, e 129 do ECA. EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO APLICADA AO PACIENTE EM RAZÃO DA PRÁTICA DE ATO INFRACIONAL EQUIPARADO A HOMICÍDIO. PARECER TÉCNICO OPINANDO PELA SEMILIBERDADE. MANUTENÇÃO DA MEDIDA DE INTERNAÇÃO FUNDAMENTADA NA FINALIDADE DE SEDIMENTAR O PROGRESSO ATÉ ENTÃO OBTIDO COM A INTERNAÇÃO. DECISÃO QUE, EMBORA COERENTE, DESCONSIDEROU OUTROS FUNDAMENTOS IGUALMENTE RELEVANTES. NECESSIDADE DE SE CONFERIR UM CERTO GRAU DE LIBERDADE AO PACIENTE COMO MEIO DE AVALIAR SUA EFETIVA ADESÃO AOS COMPROMISSOS ASSUMIDOS DURANTE A INTERNAÇÃO. RISCO DE REGRESSÃO, AQUISIÇÃO DE CULTURA CARCERÁRIA E FENÔMENO DE PRISIONIZAÇÃO. FATORES QUE JUSTIFICAM A PROGRESSÃO DA MEDIDA. ART. 122, § 2º, DO ECA. INSERÇÃO DA FAMÍLIA EM PROGRAMA DE ORIENTAÇÃO. ART. 129 DO ECA. ENTENDIMENTO CONSENTÂNEO COM O PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE E COM OS DITAMES CONSTITUCIONAIS DO ECA. ORDEM CONCEDIDA. (TJPR- Processo: 809447-5. 2

Da mesma forma que há a possibilidade de egressão da medida de internação para a de semiliberdade, também poderá ocorrer a regressão da medida de semiliberdade para a de internação. Neste sentido, O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais decidiu:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO CRIMINAL - ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - REGRESSÃO DA MEDIDA DE SEMILIBERDADE PARA A DE INTERNAÇÃO - VIABILIDADE - RELATÓRIOS E PARECERES PSICOSSOCIAIS COMPLETAMENTE DISSOCIADOS DA VERDADE REAL ENCARTADA NOS AUTOS - DOCUMENTOS REFUTADOS - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

I - Fracassada a medida socioeducativa de semiliberdade, cometendo a agravada, ao longo da execução, inúmeras transgressões e outros atos infracionais de natureza grave, não há como se dar crédito aos relatórios e pareceres psicossociais que estranhamente atestaram reparo de personalidade e confiável conduta social.

II - Sendo de fácil percepção que a agravada incidiu em todas as hipóteses que ensejam a medida excepcional, justifica-se a regressão da medida socioeducativa de semiliberdade para a de internação, na conformidade do art. 122, do Estatuto da Criança e do Adolescente, especialmente porque não se evidenciou que a menor tivesse se comprometido com o seu desenvolvimento moral, espiritual, laboral e social, desejando, com dignidade e responsabilidade, reintegrar-se à vida em sociedade.  (TJMG -  Agravo de Instrumento-Cr  1.0024.12.024230-0/001, Relator(a): Des.(a) Corrêa Camargo , 4ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 16/12/2013, publicação da súmula em 19/12/2013)

          f. INTERNAÇÃO

A internação está prevista nos artigos 121 a 125 do ECA. É uma medida que sofre muitas mudanças, considerando o fato de que surgiu com o objetivo de ser altamente repressiva, mas nos dias atuais há um caráter mais educativo.

Dispõe o art. 121 do ECA:

Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

§ 1º Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário.

§ 2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses.

§ 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.

§ 4º Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semi-liberdade ou de liberdade assistida.

§ 5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade.

§ 6º Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público.

Nesse sentido o Superior tribunal de Justiça prevê:

Ementa

ECA. HABEAS CORPUS. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. APLICAÇÃO. ATOS INFRACIONAIS ANÁLOGOS AOS CRIMES DE ASSOCIAÇÃO E COLABORAÇÃO PARA O TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. NÃO OCORRÊNCIA DAS HIPÓTESES DO ARTIGO 122 DO ALUDIDO ESTATUTO. IMPOSSIBILIDADE. PACIENTE AMEAÇADO DE MORTE POR TRAFICANTES. SITUAÇÃO QUE NÃO JUSTIFICA APLICAÇÃO DE MEDIDA MAIS SEVERA. ORDEM CONCEDIDA. 1. A medida socioeducativa de internação somente pode ser imposta ao adolescente na hipótese de não haver outra mais adequada e menos onerosa à sua liberdade, e caso o adolescente incida em quaisquer das hipóteses previstas no artigo 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. Os atos infracionais análogos aos crimes de associação e colaboração para o tráfico ilícito de entorpecentes, não ensejam, por si só, a aplicação da medida socioeducativa de internação, já que a conduta não pressupõe violência ou grave ameaça a pessoa. Na espécie, consta dos autos que o adolescente fora ameaçado de morte pelos "chefes do tráfico". Nesse contexto, não é razoável restringir mais acentuadamente o direito de liberdade do paciente em nome do princípio da proteção integral. Tal primado destina-se ao Estado, à família e à sociedade civil que, juntos, devem zelar pelo bem-estar da criança e do adolescente. 3. Ordem concedida, em menor extensão, a fim de modificar a medida socioeducativa para a semiliberdade. (HC 217.983/RJ, Relatora: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 01/12/2011, DJe 14/12/2011)

Pode-se afirmar que a medida de internação só poderá ser aplicada em situações extremas, uma vez que ela restringe a liberdade do infrator. Além do mais, a internação deve cumprir o que preceitua o art. 122 do ECA, que prevê três situações de cabimento da medida. Nesse sentido afirma Moacir Rodrigues:

[...] a medida extrema de internação ficou restrita a três situações, insculpidas no art. 122, podendo ser imposta quando:

“I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;

II – por reiteração no cometimento de outras infrações graves;

III – por descumprimento reiterado e injustificável de medida anteriormente imposta.” (1995, p.33)

Vale destacar que o ECA prevê, expressamente, em seu artigo 125, a obrigação do Estado em garantir uma internação digna aos adolescentes, devendo ele zelar pela integralidade física e mental dos internos.

Recomenda-se que sempre após cada citação o autor comente o trecho, especialmente quando se tratar de jurisprudências ou longos trechos de citações em bloco.

4. EXECUÇÃO DA MEDIDA DE INTERNAÇÃO E SUA RELAÇÃO COM A REINCIDÊNCIA DA DELIQUÊNCIA JUVENIL

Será analisada a execução da medida socioeducativa de internação, sua aplicação e ainda a relação que ela tem com a reincidência da delinquência juvenil.

A medida de internação, que deve ser aplicada somente em casos graves, ou melhor, deverá ser aplicada como exceção, em último caso, sofre dificuldades na sua execução, com relação também na inexistência das unidades e ainda nas condições precárias das que existem. Com base em uma pesquisa realizada pelo Conselho Nacional de Justiça, ficou constatado que:

Equipes do projeto terminaram, no último dia 19 de agosto, o levantamento nos estabelecimentos da capital e região metropolitana de São Paulo. Em setembro, os grupos seguem para o interior paulista, onde há cerca de 70 unidades de internação. Com a conclusão deste trabalho, o CNJ fará um relatório nacional sobre a internação de adolescentes no Brasil. A expectativa é a de que o diagnóstico seja divulgado até o fim do ano. No entanto, com as visitas realizadas até o momento, já é possível notar falhas do sistema de internação. As equipes do CNJ constataram, em alguns dos estados por qual passou, carência de investimento nas unidades de internação; falta de investimento nas medidas socioeducativas em meio aberto; inexistência de programas para os egressos do sistema socioeducativo; descumprimento de normas administrativas; superlotação; adolescentes em cadeias; assim como escassez de cursos de capacitação para os magistrados, técnicos e servidores de varas da infância e juventude. (SOUZA, 2011).

A imposição da medida socioeducativa de internação ao adolescente infrator possui como desiderato principal fazer despertar no menor a consciência do desvalor de sua conduta, possuindo, além do caráter punitivo, a finalidade de reeducação do adolescente infrator, visando sua reabilitação social.

É fato que uma das politicas menos priorizadas é a que trata do atendimento socioeducativo, considerando que a grande maioria dos Estados brasileiros, sem receber apoio técnico e financeiro suficientes da União, ainda não implementou suficientemente os programas socioeducativos para a execução das medidas de internação e semiliberdade, na forma preconizada pela Lei do SINASE. (CONSELHO NCAIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, p. 11; 2019).

A violência se torna cada vez mais presente, inerente à superlotação, à falta de pessoal e à manutenção precária da maioria das unidades de execução da medida socioeducativa de internação. Estas mazelas afetam os adolescentes internados.

Para melhor entendimento, no que se refere à situação do sistema socioeducativo de internação, segue decisão proferida pelo tribunal de Justiça de Minas Gerais:

EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS - REEXAME NECESSÁRIO -INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - ÓBITO DE MENOR QUE CUMPRIA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA POR COMPANHEIRO DE CELA - AUSÊNCIA DE VIGILÂNCIA - CONDUTA OMISSIVA - AO ILÍCITO - RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA DO ESTADO - DEVER DE INDENIZAR - PENSÃO POR MORTE - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA - ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97. 1 - A morte de pessoa provocada por terceiro de pessoa custodiada pelo Estado caracteriza conduta ilícita, importando em responsabilidade subjetiva;

O descaso é tão grande que podemos encontrar casos como este citado, a morte de um menor que cumpria medida socioeducativa. O Estado, neste caso, foi condenado no pagamento de pensão mensal à Autora, mãe do menor. Podemos ver a omissão do Estado para manter a segurança do estabelecimento.

Quanto ao respeito à dignidade e à integridade física e emocional dos adolescentes internados, o CNJ publicou a seguinte avaliação:

Dos dados, destaca-se o número de estabelecimentos que registraram situações de abuso sexual sofrido pelos internos: em 34 estabelecimentos pelo menos um adolescente foi abusado sexualmente nos últimos 12 meses. Em 19 estabelecimentos houve registros de mortes de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas. Além disso, sete estabelecimentos informaram a ocorrência de mortes por doenças preexistentes e dois registraram mortes por suicídio nos últimos 12 meses. A violência sofrida por adolescentes no interior dos estabelecimentos enseja mais atenção do Estado, visto que é seu dever a proteção e a garantia das condições básicas para o desenvolvimento das crianças e dos adolescentes. Além desses crimes, outra situação preocupante é a violência física sofrida pelos adolescentes. Dos jovens entrevistados em conflito com a lei, 28% declararam ter sofrido algum tipo de agressão física por parte dos funcionários, 10%, por parte da Polícia Militar dentro da unidade da internação e 19% declararam ter sofrido algum tipo de castigo físico dentro do estabelecimento de internação. É possível observar a recorrente violação de direitos como o direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis (art.15 ECA); o direito ao respeito, que consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente (art.17); direito à dignidade, que preceitua ser dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondoos a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor (art.18). O quadro descrito mostra um “estado de violência” que se distancia de princípios como os elucidados. Denuncia uma rede de estabelecimentos que violam os direitos dos adolescentes que se tornam vítimas no cumprimento de medidas socioeducativas. Diante deste cenário, o que se espera é o incessante combate à forma como muitos adolescentes estão sendo tratados no cumprimento das medidas socioeducativas. (CNJ, 2012, págs. 127/128)

Na segunda edição do relatório, é novamente revelada a superlotação nas unidades de internação para adolescentes (CNMP, 2015, p. 85):

As informações deste relatório comprovam que o cumprimento das medidas socioeducativas, especialmente as restritivas de liberdade – internação e semiliberdade – está muito longe do que preconiza a Lei do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) e o modelo do ECA: há superlotação, poucas oportunidades de formação educacional e profissional, espaços insalubres, rebeliões nas unidades, fugas, dificuldades de atendimentos de saúde, entre tantos outros. O que se verifica, pelos dados colhidos, no que se refere aos adolescentes em conflito com a lei, é uma grande indiferença à doutrina da proteção integral trazida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Como se pode analisar nos dados e gráficos, faltam, em muitas unidades, os espaços para escolarização, profissionalização, práticas esportivas, lazer e cultura. Ademais, é preciso incentivar o protagonismo, a participação e a autonomia dos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas. [...] As mudanças mais substanciais somente virão com muitos investimentos em todo o sistema e com a elaboração dos Planos Estaduais e Municipais do SINASE [...].

Com todo exposto, pode-se observar que as execuções da medida socioeducativa de internação estão contribuindo para a reincidência dos infratores, verifica-se também que as dificuldades mais visíveis se encontram na infraestrutura de um sistema defasado ou ainda uma fiscalização inadequada.

5. HIPÓTESES

Educar e oferecer oportunidades de emprego são hipóteses para solucionar o aumento da delinquência juvenil. A falta de perspectivas profissionais é um dos motivos para os adolescentes ingressarem no mundo do crime. A criação de incentivos para que  empresas, prefeituras, bancos e o serviço público contratem, como aprendizes ou estagiários, crianças e adolescentes que vivem em condições socioeconômicas precárias.

A situação de sagrava quando se trata de menor que foi submetido à medida socioeducativa de internação, pois quando o adolescente as da clínica de internação, ele retorna ao mesmo contexto social em que estava inserido antes, isto é, retoma sua vida sem emprego, sem qualificação e com o crime como via mais próxima de se sustentar. As oportunidades que antes eram poucas, vão diminuindo cada vez mais quando se trata de um menor infrator. Com esta realidade, a única alternativa de sustento do menor é o crime, onde o dinheiro é conquistado de forma mais fácil e é aqui que dá o desacerto, quando o menor volta para a internação, configurando a reincidência.

O roubo e o tráfico de drogas estão entre os principais atos infracionais cometidos por adolescentes, e frequentemente eles são motivados pelo vício. Assim, melhorar as opções de tratamento para os adolescentes viciados é, também, uma maneira de tirá-los da criminalidade. A solução seria expandir a rede de atendimento psicossocial, os abrigos e clínicas para manter os adolescentes que precisam de atendimento especializado para lidar com o vício. Os chamados centros de atenção psicossocial para álcool e drogas já funcionam no Brasil, mas eles são poucos e não são especializados no atendimento de adolescentes.

Investir em educação é fundamental para impedir que os jovens optem pela criminalidade. Um jovem mais bem qualificado tem melhores condições de conseguir um emprego e é menos suscetível de se envolver com o crime. Mas, além do acesso universal e da qualidade do ensino, há outro ponto importante: que os estudantes sejam acompanhados por profissionais, como psicólogos e assistentes sociais, com objetivo de detectar problemas de indisciplina e evitar que o adolescente deixe a escola. “A evasão escolar é o primeiro sinal de que o adolescente pode vir a se envolver com a criminalidade”, afirma o advogado Ariel de Castro Alves, assessor jurídico da ONG Aldeias Infantis SOS. Assim, a presença de uma equipe técnica nas escolas, formada por psicólogos e assistentes sociais, é um passo importante para impedir a evasão escolar e, com ela, a possibilidade de um jovem optar pelo crime.

6. CONCLUSÃO

Este trabalho esclarece a importância que o tema traz ao País e que os responsáveis têm o dever de garantir uma execução efetiva dos direitos das crianças e dos adolescentes. A relevância técnica do tema deste trabalho traduz-se na importância que o Estado, a família e a sociedade têm para evitar a entrada de novos adolescentes na vida do crime e a evitar a reincidência daqueles que já foram apreendidos em outra oportunidade.

Analisou-se em relação à família, sociedade e Estado as principais falhas que pudessem levar a conduta atípica dos adolescentes, resultando na reincidência da delinquência dos menores.

Ficou claro que a família deveria ter o maior cuidado com suas crianças e adolescentes, uma vez que o futuro delas está ligado diretamente com a estrutura familiar.

Neste estudo entendeu-se que os erros cometidos, pelas famílias, sociedade e/ou por parte do Estado, não permitem a execução efetiva das medidas do ECA, provocando a prática reiterada de atos infracionais pelos adolescentes. Pode concluir que o ECA, no que tange as medidas socioeducativas está completo, bem elaborado, ocorre que a sua execução não funciona, seu cumprimento não é eficaz, já que o sistema é precário.

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LOURIDO JÚNIOR, João Evaldo dos Santos. DROGAS: a classe média frente a Lei 11.343/06. Revista Jus Vigilantibus, 2007. Disponível em: Acesso em: 28 de abril de 2011.

PERLINI, N.M.O.G.; LEITE, M.T.; FURINI, A.C. Em busca de uma instituição para a pessoa idosa morar: motivos apontados por familiares. Rev Esc Enferm USP, v.41, n.2, p229-36, 2007.

RODRIGUES, Moacir. Medidas sócioeducativas: teoria-prática-jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey, 1995.

SHECAIRA, Sérgio Salomão. Sistema de garantias e o direito penal juvenil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

SUTHERLAND, E. H. Development of the theory. In: SCHUESSLER, K. (Ed.). Edwin Sutherland on analyzing crime. Chicago, Illinois: Chicago University Press, p. 30-41, 1973.

Sobre os autores
Samuel Santana de Sousa Santos

Acadêmico do curso de Direito pela Una Instituição de Ensino Superior

Gabriel Morato Chagas Santos

Acadêmico do curso de Direito pela Una Instituição de Ensino Superior

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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