As garantias no contrato de locação e a responsabilidade ou não em caso de prorrogação por prazo indeterminado.

Com ênfase nas exceções

03/12/2020 às 09:50
Leia nesta página:

Podemos concluir que as garantias se mantêm mesmo nos casos em que o contrato se torne indeterminado, salvo casos em que haja cláusula expressa que desobriga após o prazo inicialmente estabelecido.

O Código Civil traz em seu capítulo V a Locação de Coisas. A redação do Art. 565 do já citado código traz a seguinte redação: 

“Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição.” 

Em outras palavras, a locação é um contrato bilateral, oneroso, comutativo, consensual e de execução continuada onde um indivíduo, chamado de locador, cede seu bem a outrem, o locatário, em troca de uma remuneração por tempo determinado ou não.

Explicando os termos do Art. 565 do Código Civil, onde temos o verbo usar, devemos entender como direito de uso, de se servir do bem locado. Enquanto gozar seria o mesmo que dispor dos frutos do bem locado. Em regra, a locação é sobre bens não fungíveis. Dizer que o bem é não fungível significa que ele pode ser utilizado sem se esgotar após o uso. Contudo, podemos ter o aluguel de bem fungível, um quadro de um pintor renomado exclusivamente para uma festa beneficente,por exemplo.

A locação do bem, não importando se fungível ou não fungível, se finda ao término do prazo pré estabelecido e não depende de prévio aviso por parte do locador. No entanto, nos casos em que após o fim do prazo o locatário continuar na posse por mais de trinta dias sem oposição do locador, o prazo torna – se indeterminado segundo analogia ao que prevê o Art. 46 da Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato). 

No caso de o locatário ter sido previamente notificado, deverá pagar o aluguel arbitrado pelo locador.É permitido ao locador exigir algumas modalidades de garantia: o calção; fiança; seguro de fiança locatícia e cessão fiduciária de quotas de fundos de investimento.

O calção, que pode ser em bens móveis ou imóveis, em títulos e ações em dinheiro. Sendo em dinheiro, não podendo exceder 3 meses de aluguel. Consiste no valor depositado para o locador visando garantir a obrigação ou indenização de possível dano ao bem. Segundo Marcus Vinícius Gonçalves:

“Pode ser real ou fidejussória. Real, quando dada em garantia coisa móvel ou imóvel, e fidejussória, quando a garantia dada é pessoal. Note-se que, quando a lei não especificar a espécie da caução, poderá ser prestada mediante depósito em dinheiro, papéis de crédito, títulos da União ou dos Estados, pedras e metais preciosos, hipoteca, penhor e fiança.”

Sendo vedada a exigência de mais de uma garantia, sob pena de nulidade contratual (Art. 37 em seu parágrafo único e Art.38 do Lei nº 8.245), A saber:

"Artigo 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:

I - caução;

II - fiança;

III - seguro de fiança locatícia.

Parágrafo único. É vedada, sob pena de nulidade, mais de uma das modalidades de garantia num mesmo contrato de locação".

Art. 38. A caução poderá ser em bens móveis ou imóveis.

§ 1º A caução em bens móveis deverá ser registrada em cartório de títulos e documentos; a em bens imóveis deverá ser averbada à margem da respectiva matrícula.

§ 2º A caução em dinheiro, que não poderá exceder o equivalente a três meses de aluguel, será depositada em caderneta de poupança, autorizada, pelo Poder Público e por ele regulamentada, revertendo em benefício do locatário todas as vantagens dela decorrentes por ocasião do levantamento da soma respectiva.

§ 3º A caução em títulos e ações deverá ser substituída, no prazo de trinta dias, em caso de concordata, falência ou liquidação das sociedades emissoras.

Contudo, há divergência doutrinária sobre esse aspecto. Rocha de Barros salienta a importância do locador se resguardar e expressar em via contratual a subsistência da garantia adotada até a devolução do imóvel.

Segundo posicionamento adotado por Silvio de Salvo Venosa e Maria Helena Diniz, essas garantias são validas até a devolução das chaves, salvo dispositivo contratual contrário, seguindo o Art.39 da Lei de Inquilinato. 

Em regra, o mesmo se aplica aos contratos que passam a ter seu prazo indeterminado, sendo válido a todas as garantias: caução em dinheiro, bens móveis ou imóveis, no seguro-fiança na cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento.

No caso de o contrato ter sido prorrogado por prazo indeterminado, em regra, ocorre manutenção da fiança, salvo casos de haver no contrato contrária manifestação. Durante o período de prorrogação o fiador pode ser exonerado de suas obrigações por meio de notificação, segundo entendimento do STJ se adequando ao Art. 39 da Lei de Inquilinato 8.245/91, “Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta Lei.” Antes desse artigo o STJ somente admitia prorrogar fiança nos contratos locatícios prorrogados por prazo indeterminado quando expressamente previstos no contrato.

Atualmente a Súmula 214 do STJ traz que o fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento que não anuiu. Segundo o relator, Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, se o fiador deseja pedir a exoneração, deve informar no período de prorrogação contratual. 

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Segundo a notificação prevista no Art. 835 do CC, mesmo quando houver expressa renúncia ao direito à exoneração, mas antes do início da inadimplência e da cobrança pelo afiançado, contra o fiador, do crédito por ele garantido.

Importante salientar o fato de os contratos de locação só serão válidos se todos os envolvidos tiverem ciência de sua participação. A fiança é uma garantia, um meio para existência do contrato principal. Obviamente se faz necessária a ciência da prorrogação ao fiador para sua anuência. A desobrigação nascida no pedido de exoneração somente terá eficácia ao término do prazo de 60 dias, contados a partir da citação ou notificação de exoneração.

"Em que pese a possibilidade de exoneração, ela não produz efeitos retroativos em relação aos débitos verificados antes do pedido exoneratório e, ademais, há de respeitar o prazo de 60 dias previsto no CC, artigo 835, em relação às fianças não locatícias, contado, na hipótese, da citação do demandado",. 

REsp 1.673.383

Destaca-se que esse entendimento se faz desde 2009, porque antes de 2009 o entendimento era de que nos casos em que houvesse prorrogação automática o fiador estava desobrigado de sua função acessória. Entretanto, em 2009 houve alteração legislativa na lei de locações onde seu Art. 39 traz a seguinte redação “Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que, prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta lei”.Ou seja, não havendo previsão contratual, o fiador segue responsável até a entrega das chaves, independente da sua anuência.

É relevante citar novamente a Súmula 214 do STJ, pois quando sua redação traz “por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu” traz à luz os casos em que haja um novo contrato de locação. Nesses casos, após o curso do contrato em que o fiador anuiu sua participação precisa ser novamente expressa, do contrário, anula se o contrato.

Tal entendimento vale apenas para contratos celebrados após nova redação do Art. 3939 da Lei 8.245/91 (Lei do Inquilinato), introduzida pela Lei 12.112/09. Isto foi decidido durante o julgamento do Recurso Especial 1.326.557.

A troca do fiador também pode ser exigida em caso de morte, declaração judicial de ausência, interdição, recuperação judicial, falência ou insolvência do fiador, alienação ou gravação de todos os seus bens, mudança de residência sem comunicação e quando o contrato por tempo determinado é encerrado. Este último caso levou ao Recurso Especial 902.796, que envolvia uma ação de despejo. Encerrado o contrato de aluguel, que tinha prazo determinado e não possuía previsão de prorrogação, o locador exigiu um novo fiador, o que não ocorreu.

Em razão do já disposto no texto anteriormente podemos concluir que as garantias se mantêm mesmo nos casos em que o contrato se torne indeterminado, salvo casos em que haja cláusula expressa que desobriga após o prazo inicialmente estabelecido.

Sobre a autora
Beatriz Sanches

Estudante de Direito na Universidade Candido Mendes e atualmente estagiando na Gerência Executiva do INSS. Pesquisadora, tema atual: Empregabilidade da pessoa com Deficiência:evolução do conceito de pessoa com deficiência, aspectos sociais e jurídicos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Texto elaborado para obtenção de nota referente a avaliação na faculdade que foi aprovada com louvor pela professora da disciplina de Direito Civil IV.

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