Orçamento público e direito fundamental a saúde

Em face a reserva do possível

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O presente artigo tem por objetivo analisar o tema da reserva do possível diante dos Direitos Fundamentais e sua confrontação frente à escassez de recursos alegada pelo Poder Público.

INTRODUÇÃO

O orçamento público é um instrumento de planejamento e execução das finanças públicas, que permite estabelecer a previsão de receitas públicas e a estimativa das despesas públicas num determinado período para sua execução. O plano plurianual - PPA, as Leis de Diretrizes Orçamentárias –LDO e a Lei de Orçamento Anual –LOA formam um conjunto que materializam o planejamento e a execução das políticas públicas federais.

A Constituição Federal de 1988, também conhecida como “Constituição Cidadã”, inaugura um novo cenário político no Brasil ao consolidar o Estado Democrático de Direito e definir políticas de proteção social, incluindo a saúde como um direito social de cidadania.

As deficiências na prestação do serviço público de saúde, a falta de estrutura e investimentos no setor, entre outros fatores, geram questionamentos judiciais que precisam de uma atenção especial principalmente no que tange ao orçamento.

A busca pela efetividade do direito à saúde, garantido constitucionalmente por meio do poder judiciário, é um assunto que sempre gerou muita discussão por ser uma contradição entre o prometido e o concedido, um contra ponto entre a luta da sociedade quando ingressa no judiciário em busca de um direito ora denegado sob a alegação de falta de recurso o qual infelizmente muitas vezes é acatado pelos juízes.

Neste sentido, busca-se neste trabalho realizar uma breve discussão sobre a tão fala da ausência de recursos para financiar e garantir os direitos contidos na Constituição, inclusive os fundamentais, colocando em risco a observância obrigatória da dignidade da pessoa humana e da proteção do mínimo de cada prerrogativa assegurada pelo legislador.

A política pública, ao condicionar os recursos que são escassos, acaba por determinar que se façam escolhas trágicas quanto a sua aplicação, programas e prioridades, gerando assim certo distanciamento muitas vezes conflituoso, entre a sociedade e os objetivos constitucionais.

A ideia de que os direitos fundamentais estão positivados constitucionalmente, é a base para se dizer que esses direitos não se esgotam nos que já estão constituídos no nosso ordenamento pátrio, mas estão o tempo todo sendo submetidos a um processo de expansão permanente todo o tempo. A relação entre direitos fundamentais e sua vinculação com a dignidade da pessoa humana em conexão como o direito a saúde estão constitucionalmente positivados.

O sistema jurídico é normativo na medida em que se dispõe a regular os comportamentos sociais, para sanar excessos e estabelecer limites o Poder Judiciário se utiliza da técnica de ponderação nos casos de conflito entre o direito a saúde e a reserva do possível, a solução pode ser resolvida, segundo Daniel Sarmento, “mediante uma ponderação de interesses, informada pelo princípio da proporcionalidade, e atenta às peculiaridades de cada caso concreto”. (2016, p. 257).

Este tema por buscar analisar brevemente a Reserva do Possível e a alegação de escassez do orçamento público, tem relevância social importante, pois podem justificar de fato a denegação de direitos fundamentais no Brasil.

O complemento das garantias fundamentais constitucionais representa um dever, seja financeiro, seja social, o que aufere grande relevância acadêmica com a visibilidade atual que se tem aos princípios fundamentais dispostos nos art. 5° de nossa Magna Carta.

O entendimento sobre os direitos fundamentais a reserva do possível e o orçamento público tem sua relevância acadêmica, pois, é de grande interesse fazer-se saber que a reserva do possível é uma fundamentação judicial que não pode ser em hipótese alguma utilizada para limitar o exercício dos direitos fundamentais previstos constitucionalmente, pois, tal instituto só pode ser utilizado pelo judiciário para condicionar a pessoa o acesso ao direito, à possibilidade orçamentária e política do Estado, sem que haja detrimento das políticas de implementação dos direitos fundamentais.

Nesse sentido, pessoalmente vejo que a importância do bom senso e de uma certa flexibilidade, quando da interpretação de normas de direitos fundamentais, como ensina Robert Alexy, ao dispor sobre uma "reserva do possível no sentido daquilo que o indivíduo pode requerer de modo razoável da sociedade". Para o referido autor, os direitos sociais não seriam meras proposições programáticas, mas sim normas dotadas de eficácia, as quais, dentro de uma lógica razoável, poderão ser exigíveis, sem que se imponha o impossível aos decisores políticos (Alexy, 2011, p. 64-69).

Analisar a prestação do direito fundamental a saúde tendo como base a reserva do possível dentro do orçamento público é o objetivo geral e os específicos consistem em abordar sobre o que é o orçamento público, compreender sobre o direito fundamental a saúde, descrever a respeito da teoria da reserva do possível no orçamento público e analisar a prestação do direito fundamental a saúde dentro do orçamento público.

Antes de enfrentar o tema “direito à saúde” será primeiramente exposto sobre o que é “saúde”. Eis aí um grande debate, pois o conceito sobre o que é saúde passou por muitas mudanças ao longo do tempo e cada constituição, cada doutrinador tem seu próprio conceito do que seja saúde, depois será demonstrado sobre a história do orçamento público voltamos aos tempos onde os reis ou imperadores eram o Estado, quando não havia diferença entre as finanças do Governo e as finanças particulares do soberano. No Brasil, foi à vinda do rei D. João VI e a abertura dos portos com consequente aumento nos impostos aduaneiros que iniciou o “processo de organização das finanças públicas, culminando com a criação, em 1808, do Erário Público e do Regime de Contabilidade” (PIRES E MOTTA, 2006, p. 20).

Isso demonstra o quão importante historicamente o orçamento público é para o Brasil. Tanto que, desde o Império, todas as constituições e leis orgânicas possuem dispositivos sobre o assunto.

Em seguida, será tratado sobre a normatização constitucional do Controle orçamentário público no Brasil, que segundo Giacomoni (1992), as primeiras normativas datam da Constituição do Império, de 25 de março de 1824, já determinando as competências legais para cada tipo de poder. Daí para frente foram feitas inúmeras alterações regulamentando decisivamente a estrutura de organização do orçamento público. Um marco na história brasileira com relação ao orçamento público são as mudanças trazidas pela Constituição Federal de 1988, como normativas para a elaboração, aprovação e o controle do Orçamento Público no Brasil.

Bernardoni e Cruz (2010) destacam a importância dada à função de planejamento através da Constituição de 1988, introduzindo mudanças extremamente significativas durante o processo ao aliar o Plano Plurianual –PPA, a Lei de Diretrizes Orçamentárias –LDO e a Lei Orçamentária Anual –LOA ao orçamento público.

Posteriormente, será tratado sobre o conceito de Orçamento Público, com relação à conceituação, de forma simplista, a maioria dos autores consultados define o orçamento público como sendo um instrumento de planejamento legal, que contém a previsão de receitas e de despesas que serão realizadas por um governo em um prazo determinado.

De acordo com Haddad e Mota (2010, p. 16), “o orçamento público é um documento que dá autorização para se receber e para se gastar recursos financeiros”, devendo “estar vinculado às atividades de planejamento”.

Diversos doutrinadores entendem que o mínimo existencial foi extraído do princípio da dignidade da pessoa humana. Para Barcellos “o chamado mínimo existencial, formado pelas condições materiais básicas para a existência, corresponde a uma fração nuclear da dignidade da pessoa humana à qual se deve reconhecer a eficácia jurídica positiva ou simétrica.”

Por fim, tratar-se-á da chamada teoria da ‘reserva do possível’ que surgiu em 1972 no Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, no julgamento do caso “numerus clausus” que discutia a restrição do acesso ao ensino superior versus a Lei Fundamental que garantia a liberdade de escolha da profissão. Neste Julgamento o Tribunal alemão decidiu que mesmo que o Estado dispusesse dos recursos, segundo a reserva do possível não se poderia impor a ele uma obrigação que fugisse aos limites do razoável e do possível.

A política pública, ao condicionar os recursos que são escassos, acaba por determinar que se façam escolhas trágicas quanto a sua aplicação, programas e prioridades, gerando assim certo distanciamento muitas vezes conflituoso, entre a sociedade e os objetivos constitucionais.

A reserva do possível foi uma prática jurídica alemã importada e perfeitamente adequada à realidade brasileira a partir da década de 1990, sendo invocada como um limite fático e intransponível diante de uma alegada escassez de recursos.

A análise do tema foi desenvolvida em uma metodologia teórica-descritiva, a partir de uma pesquisa bibliográfica, incluindo livros, artigos científicos, legislação constitucional, a  partir da qual se busca evidenciar conceitos e posicionamentos de diferentes estudiosos e  doutrinadores a fim de expor o arcabouço teórico do tema conforme sua inserção na atualidade,  procedendo-se a devida e indispensável crítica no esclarecimento quanto ao objeto investigado.

Quanto aos seus objetivos, o presente trabalho é caracterizado como exploratório em que o mínimo conhecimento sobre o tema pode ser ampliado de modo significativo para que este trabalho pudesse ser compreendido de forma mais sucinta para o leitor. Já quanto aos procedimentos técnicos, o método a ser adotado será pesquisa bibliográfica (GIL, 2010).

2                 DO INSTITUTO DO ORÇAMENTO PÚBLICO NO DIREITO FINANCEIRO 

O Direito Financeiro é um ramo jurídico forte, autônomo e independente. O orçamento público é um instrumento de planejamento e execução das finanças públicas, que permite estabelecer a previsão de receitas públicas e a estimativa das despesas públicas num determinado período para sua execução. O plano plurianual - PPA, as Leis de Diretrizes Orçamentárias – LDO e a Lei de Orçamento Anual – LOA formam um conjunto que materializam o planejamento e a execução das políticas públicas federais.  

A Constituição Cidadã, estabelece um novo cenário político no Brasil com o Estado Democrático de Direito e com a definição de políticas de proteção social, incluindo a saúde e a previdência como direitos sociais de cidadania. 

A Constituição da República Federativa do Brasil prescreve com destaque em seu texto os Direitos Fundamentais. Tal elevação de um direito à fundamental não é um fato sem consequências jurídicas, ao revés, como se pretende demonstrar no decorrer desse estudo, a constitucionalização dos direitos implica aumento de sua força normativa, do qual surge a intensa necessidade de garantir sua eficácia no plano fático, distanciando-se o mínimo quanto possível o dever ser constante na norma e o ser visível na realidade social.

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Assim, torna-se de particular relevância ter os Direitos Fundamentais como objeto de estudo sob o prisma constitucional, fazendo-se referência aos limites e possibilidades da sua implementação pelo Poder Judiciário, tendo como arrimo a teoria dos Direitos Fundamentais que vem sendo desenvolvida paulatinamente no Brasil e em todo mundo.

Analisando a origem da Constituição brasileira verifica-se que o poder responsável por sua elaboração (Poder Constituinte Originário) aspirou e, assim, impôs a edificação de um Estado Democrático de Direito de cunho social, tendo como parâmetro de conduta a redução de desigualdades sociais.

A dignidade da pessoa humana é o ponto central, o núcleo essencial dos direitos fundamentais. É a partir desse princípio que os direitos fundamentais se irradiam, sendo que o Poder Legislativo, Executivo e Judiciário, devem realizar os direitos fundamentais na maior extensão possível, tendo como limite mínimo o núcleo essencial destes direitos. 

O Estado constitucional de direito gira em torno da dignidade da pessoa humana. A forma como está estruturada o sistema público de saúde nos Estados, retrata a particularidade em tratar o desafio de garantir-lhes o direito social e fundamental a saúde. 

Após décadas de ditaduras repressão, vetos e desatenção a diversos direitos humanos, principalmente em relação ao direito a saúde em face dos recursos públicos, o Brasil pôde finalmente acompanhar o movimento do constitucionalismo social, na busca de uma saúde pública socialmente mais justa e menos desigual. 

As políticas públicas implementadas pelo Poder Executivo, autorizadas pelo Legislativo, não têm sido suficientes para garantir e dar eficácia aos Direitos Fundamentais, pois tendem a minimizar as funções estatais, enfraquecendo a prestação de serviços públicos e transferindo esta obrigação estatal para a iniciativa privada.

Diante dessa insuficiência das atitudes executiva e legislativa, o que se pretende enfrentar é exatamente a possibilidade de o Poder Judiciário impor a implementação de políticas públicas voltadas para efetivar os direitos fundamentais, mormente, o direito à saúde.

o estudo a ser realizado tem como condão vislumbrar as possibilidades e os limites à atuação do Poder Judiciário para garantir a concretização social dos direitos fundamentais, diante da negligência dos Poderes Executivo e Legislativo que pelo constitucionalismo clássico seriam os principais destinatários das normas constitucionais previstas com a função de garanti-los.

3                 DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 

Os direitos do homem, tem uma abrangência muito maior que outros, pois são todos os direitos e condições inerentes a todo e qualquer ser humano pelo simples fato de existir, já os  direitos humanos são tais direitos positivados no pano internacional e os fundamentais possuem  natureza constitucional, são positivados e representam uma ordem jurídica especifica, está de  ordem interna. Já no que tange os direitos fundamentais, existem duas faces a serem observadas no que tange a sua efetivação. Em um primeiro momento, deve-se considerar as omissões legislativas. Para estas, a Carta Magna contém alguns meios de suprimento, quais sejam, o mandado de injunção, a ação declaratória de inconstitucionalidade por omissão e arguição de descumprimento de preceito fundamental. Em segundo lugar, deve-se analisar a exigibilidade jurídica dos Direitos Fundamentais através de imposições de obrigações de fazer e não fazer ao Estado Administração e assim vislumbrar a possibilidade de compeli-lo a realizar positivamente políticas públicas, como por exemplo, fornecer um medicamento ou tratamento; ou a se abster de impedir e dificultar o exercício do direito a saúde, através de uma anulação de atos administrativos.

 Um empecilho à efetivação dos Direitos Fundamentais é que sua expressão normativa, por deter um caráter axiológico, contém conceitos abstratos e pouco densos. Sendo assim, tais normas já foram classificadas como programáticas, necessitando de uma regulamentação pelo legislador infraconstitucional para dar-lhes exigibilidade.

O direito fundamental a suade é um dos mais importantes na Constituição Federal 

brasileira, pois devem ser prestadas os serviços dignos a todos os cidadãos e sendo uma imposição aos Entes Federados, na Constituição o direito fundamental a saúde encontra-se nos arts. 196 a 200, dos quais chama-se a atenção para os seguintes: 

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. Grifo nosso.

O direito fundamental a saúde recebeu um tratamento diferenciado dentre os outros direitos, dado a sua tamanha relevância e importância, está diretamente ligado ao fundamento e o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, no art. 1o, III da Constituição Federal de 1988, a proteção pelo constituinte originário nos mostra o tratamento  e o cuidado que se teve com esse bem jurídico, o direito à saúde, por estar intimamente atrelado ao direito à vida, manifesta a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana” (MOURA, 2013). 

A Lei no 8.080/ 1990, diz no seu art. 1º, “Esta lei regula, em todo o território nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de direito Público ou privado” (BRASIL, 1990). 

  

4                 A EFICÁCIADOS DIREITOS FUNDAMENTAIS A LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

Nota-se no artigo 5°, §1º Za Constituição Federal, inserindo em sua interpretação os elementos trazidos pela eficácia dos direitos fundamentais, para chegarmos a algumas conclusões acerca da aplicabilidade desses direitos. Seguindo a preocupação voltada para a realização dos Direitos Fundamentais, prevê o referido artigo que “as normas definidoras de Direitos Fundamentais têm aplicação imediata”. Significa dizer, a priori, que tais normas não necessitam de nenhuma legislação ulterior para que sejam utilizadas.

A doutrina sustenta que a norma contida no artigo 5º, § 1º, da CF, faz com que seja exigível do aparelho estatal a função de maximizar a eficácia dos direitos fundamentais. Além disso, a norma detém um conteúdo dirigente, ou seja, demonstra como deve ser a efetivação dos direitos fundamentais, no sentido de que esta, além do objetivo de “assegurar a força vinculante dos direitos e garantias de cunho fundamental, tem por finalidade tornar tais direitos prerrogativas diretamente aplicáveis pelos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, (...) investindo os poderes públicos na atribuição constitucional de promover as condições para que os direitos e garantias fundamentais sejam reais e efetivos” .

Verifica-se, portanto, que a norma que define a aplicabilidade imediata, em caso de conflito com as demais normas que preveem os direitos fundamentais exigindo-se lei integradora deverá ser ponderada guardando um grau de eficácia de acordo com o caso concreto.

5                 A RESERVA DO POSSÍVEL

 A reserva do possível foi aplicada pela primeira vez no Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, pioneiros no tema tratado, no famoso números Clausius, em dois processos envolvendo o acesso de cidadãos ao curso de medicina nas Universidades de Hamburgo e Munique. Momento em que as cortes administrativas solicitaram uma decisão da Corte Constitucional Federal a respeito da compatibilidade entre certas regras legais estaduais que restringiam esse acesso à educação e a Lei Fundamental, de modo que, a reserva do possível, origina-se da jurisprudência alemã, que migrou para o direito brasileiro, sendo bastante utilizada em nossos tribunais. Um dos casos Alemão, tratou sobre a aplicação da teoria da reserva do possível, quando determinados estudantes ajuizaram uma ação visando ter assegurado para si o direito de cursar o ensino superior público baseando-se na livre escolha do trabalho, ofício ou profissão.

A expressão “reserva do possível” tem recebido os mais variados tratamentos na doutrina. Não existe acordo em relação a sua natureza e seu significado. “Reserva do Possível” é uma expressão que define a limitação dos recursos econômicos disponíveis pela administração pública, a fim de suprir as necessidades dos cidadãos, que a priori, é de sua obrigação. Infelizmente os recursos materiais que deveriam ser suficientes para a sociedade, não são, tendo assim o cidadão que dele necessita recorrer ao judiciário para ver cumprido seus direitos. (BARCELLOS, 2008)

A ideia central sobre a reserva do possível é a de que os indivíduos não têm direito subjetivo frente ao Estado senão nos limites da razoabilidade. Para nós existe uma obrigação expressa para o Estado destinar recursos necessários a satisfação dos direitos fundamentais. Essa distinção é imprescindível para a interpretação e aplicação do chamado “princípio da reserva do possível”, em especial para evitar a tese da inviabilidade econômica da realização dos direitos fundamentais, segundo o alerta de ANDREAS J. KRELL (2002, p. 108): “Há um paradoxo: vários autores brasileiros tentam se valer da doutrina constitucional alemã para inviabilizar um maior controle das políticas sociais por parte dos tribunais. Invocando a autoridade dos mestres germânicos, estes autores alegam que os direitos sociais deveriam também no Brasil ser entendidos como “mandados”, “diretrizes” ou “fins do Estado”, mas não como verdadeiros Direitos Fundamentais.”

Por conta de todos estes encalços é que o Judiciário tem exercido um papel importante na efetivação do direito social à saúde, inclusive o  Superior Tribunal de Justiça – STJ, já possui entendimento  firmado e  consolidado  no sentido de que em havendo demora do Poder  competente, em caráter excepcional poderá o Poder Judiciário implementar medidas de  políticas  públicas de interesse social,  sem  que  haja  invasão  da discricionariedade ou afronta à reserva   do  possível, conforme se pode verificar dos julgados: AREsp  1.069.543/SP, da relatoria do Ministro  Benedito  Gonçalves, da Primeira  Turma, publicado no DJe em 02/08/2017; no REsp 1.586.142/SP,  da relatoria do Ministro  Humberto  Martins, da Segunda Turma, publicado no DJe

Em 18/04/2016, além de outros.

Destaco ainda, as palavras do Ministro Og Fernandes: "o  controle  jurisdicional  de  políticas públicas se legitima   sempre   que  a  'inescusável  omissão  estatal'  na  sua efetivação atinja direitos essenciais inclusos no conceito de mínimo existencial", conforme se vê do acórdão do AgInt   no   REsp  1.304.269/MG, Segunda Turma, publicado no DJe em 20/10/2017.

6                 CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Verifica-se que os Direitos Fundamentais Sociais encontram na reserva do possível um limite a sua efetividade, principalmente no que tange os direitos prestacionais, os quais devem ter especial atenção do Poder Judiciário, para não cair no vácuo o ínfimo direito aos mais primordiais certames constitucionais. Embora tenha surgido na Corte Constitucional Alemã como um mandado de observância da proporcionalidade daquilo que se exige do Estado e da sociedade, no Brasil, a reserva do possível passou a ser aplicada pelos tribunais 465 Revista Acadêmica, Vol. 83, 2011 brasileiros como um elemento a inviabilizar a realização dos direitos a prestações materiais, eximindo o Estado de suas obrigações em virtude da alegação de ausência de recursos e encontrando no Poder Judiciário um suporte para que o direito social à saúde seja respeitado.

REFERÊNCIAS 

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BAPTISTA, Tatiana Wargas de Faria et al. Responsabilidade do Estado e Direito à Saúde no Brasil: Um Balanço da Atuação dos Poderes. Revista Ciência & Saúde coletiva, São Paulo, v. 13, n. 3, p. 829-839, 2009

BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

BERNARDONI, D. L; CRUZ, J. A. W. Planejamento e orçamento na administração pública. 2. ed. rev., atual. e ampl. Curitiba: Ibpex, 2010 (série Gestão Pública).

BRASIL. Constituição Federal (1988). Vade Mecum Acadêmico de Direito Rideel / Anne Joyce Angher, organização. 17. ed. São Paulo: Rideel, 2013.

BRASIL. LEI Nº 8.080, de 19 de setembro de 19900. Lei do SUS, Sistema Único de Saúde. Disponível em:

 https:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm Acesso em 20 mar.2019

BRASIL. Lei no 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Lei do SUS, Sistema Único de Saúde. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8142.htm Acesso em 20 mar.2019

______. Superior Tribunal Justiça. AREsp1.069.543/SP . Primeira Turma  T1. Ministro Benedito  Gonçalves. Julgado em 28/11/2012, publicado no DJe 02/08/2017. Disponível em:< https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1617110&num_registro=201700547058&data=20170802&formato=PDF> Acesso em: 20 abr 2019.

______. Superior Tribunal Justiça. REsp 1.586.142/SP. Segunda Turma  T2. Ministro Humberto  Martins. publicado no DJe 18/04/2016. Disponível em:<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1500880&num_registro=201600415340&data=20160418&formato=PDF> Acesso em: 20 abr 2019.

______. Superior Tribunal Justiça. AgInt no REsp 1304269 / MG. Segunda Turma  T2. Ministro Og Fernandes. publicado no DJe 20/10/2017. Disponível em:< https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1648232&num_registro=201200320156&data=20171020&formato=PDF> Acesso em: 20 abr 2019.

GIACOMONI, J. Orçamento público. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1992.

GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 5 ed. São Paulo: Atlas, 1999.

HADDAD, R. C.; MOTA, F. G. L. Contabilidade pública. – Florianópolis: Departamento de Ciências da Administração / UFSC; Brasília: CAPES : UAB, 2010.

LEITE, George Salomão e SARLET, Ingo Wolfgang (coord.) Direitos Fundamentais e Estado Constitucional: estudos em homenagem a J.J.Canotilho. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais; Coimbra (Pt): Coimbra Editora, 2009.

MOURA, Elisangela Santos de. O direito à saúde na Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3730, 17 set. 2013. Disponível em:

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OLSEN, Ana Carolina Lopes. Direitos fundamentais sociais: efetividade frente à reserva do possível. Curitiba: Juruá, 2008.

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 10. ed., rev., atual. e ampl.; 3. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011. 

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