Toxicômanos e a internação compulsória: O conflito entre o direito à vida e o direito à liberdade no ordenamento jurídico brasileiro

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O presente trabalho aborda a internação compulsória dos dependentes químicos crônicos, dando ênfase ao conflito gerado entre o Direito à vida e o Direito à liberdade, ambos consolidados como direitos fundamentais pela Constituição da República de 1988.

Resumo

 

O presente trabalho aborda a temática da internação compulsória dos dependentes químicos crônicos, dando ênfase ao conflito gerado entre o Direito à vida e o Direito à liberdade, ambos consolidados como direitos fundamentais pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Busca-se, portanto, através da análise da historicidade da temática e dos conceitos históricos sobre tais direitos fundamentais, discutir e observar a necessidade de um prevalecer perante o outro, sem ferir o princípio da dignidade humana e tendo como base sua correlação com os Direitos Humanos. Nesse sentido, é necessário que tal conflito seja resolvido através do uso da teoria da ponderação de valores ou ponderação de interesses, ou seja, é necessário pesar os valores envolvidos e assim estabelecer o direito que deverá prevalecer perante o outro. Não obstante, a temática da internação compulsória dos dependentes químicos, analisando-a sob a perspectiva da Lei nº 13.840, de 5 de junho de 2019, mostra-se de suma importância quanto à efetivação dos direitos fundamentais para essa minoria marginalizada, buscando restabelecer a dignidade destes indivíduos.

 

Palavras-chave: Dignidade Humana. Internação Compulsória. Toxicômanos. Direito à vida. Direito à liberdade.

 

Abstract

 

The present work addresses the theme of compulsory hospitalization of chronic drug addicts, emphasizing the conflict generated between the Right to Life and the Right to Freedom, both consolidated as fundamental rights by the 1988 Constitution of the Federative Republic of Brazil. Therefore, it seeks, through the analysis of the historicity of the theme and historical concepts about such fundamental rights, to discuss and observe the need for one to prevail over the other, without harming the principle of human dignity and based on its correlation with Rights Humans. In this sense, it is necessary that such conflict be resolved through the use of the theory of weighting of values ​​or weighting of interests, that is, it is necessary to weigh the values ​​involved and thus establish the right that should prevail before the other. Nevertheless, the theme of compulsory hospitalization of drug addicts, analyzing it from the perspective of Law No. 13,840, of June 5, 2019 and its correlation to human rights, is of paramount importance as to the implementation of fundamental rights for this marginalized minority, seeking to restore the dignity of these individuals.

 

Key-words: Human dignity. Compulsory internment. Toxicomes. Right to life. Right to freedom.

 

1 INTRODUÇÃO

 

Os Direitos Humanos demonstram-se imprescindíveis à proteção dos indivíduos sobre o sistema jurídico organizacional em que estão inseridos. A sistemática, independentemente da sociedade a qual pertença, elenca direitos e deveres para a satisfação dos anseios sociais que, na contemporaneidade, tem-se constantemente expandido diante da complexidade da coletividade e a busca por segurança jurídica em inúmeros aspectos da vida social.

A temática da internação compulsória dos dependentes químicos, analisando-a sob a perspectiva da Lei nº 13.840, de 5 de junho de 2019 e sua correlação aos direitos humanos, mostra-se de suma importância quanto à efetivação dos direitos fundamentais para essa minoria marginalizada.

Evidencia-se então, a necessária tutela jurídica das minorias no corpo social, mesmo que haja deturpações aos valores e aos anseios sociais, deve-se permanecer o dever de assegurar a todos uma vida digna. Essas deturpações ocasionam na ineficácia da aplicação do Direito e a relativização do direito à vida por parte das instituições sociais e estatais as quais, “na realidade, os indivíduos são produtos da sociedade e da socialização familiar e todas as suas escolhas e opiniões refletem essa herança” (BRASIL, et al. 2016, p.29).

Sendo assim, observa-se, como objeto de estudo, uma minoria excluída socialmente, no que se refere à tutela dos direitos humanos: Os “Toxicômanos” - sujeitos dominados pelo vício crônico em drogas de maneira extremamente nociva, em que só a droga pode preencher o seu “eu”. Logo, torna-se necessário questionar se a intervenção estatal, em relação à internação compulsória dos dependentes químicos fere direitos fundamentais. Assim, será analisado o conflito entre o direito à vida e o direito à liberdade, ambos presentes na Carta Magna de 1988.

            Diante disso, e considerando a relevância do assunto na atualidade, o objetivo deste estudo é proporcionar o debate acerca da polêmica discussão da internação compulsória, promovendo uma reflexão sobre o fato de o Estado possuir ou não poderes para intervir compulsoriamente na vida dos dependentes químicos crônicos. Ademais, metodologicamente será empregada análise bibliográfica, histórica e qualitativa, para expor a historicidade das políticas públicas sobre drogas no Brasil, a capacidade civil dos toxicômanos e, assim permitir uma análise do conflito quanto à promoção dos direitos fundamentais destes indivíduos.

 

2 CONTORNOS INTRODUTÓRIOS SOBRE OS TOXICÔMANOS

 

Para iniciarmos os contornos introdutórios sobre os toxicômanos, vê-se a importância do esclarecimento sobre o modo que desencadeia essa condição, as drogas. As drogas são substâncias que, ao serem introduzidas em um organismo vivo modificam processos bioquímicos resultando em mudanças fisiológicas e comportamentais (GIANESI, 2005).

Destarte, o uso de drogas psicoativas acompanha a evolução humana, porém, não se torna necessário voltarmos muito no tempo para analisarmos a influência que tais substâncias têm no organismo humano, como no caso da cocaína e da maconha (Cannabis sativa) que até o ano de 1938 eram comercializadas normalmente nas farmácias brasileiras. Fato é que, ao nos depararmos com o tema, logo relacionamos o termo “drogas” apenas às substâncias ilícitas no ordenamento jurídico. Contudo, é necessário lembrarmos que existem aqueles tipos lícitos e comercializados no dia-a-dia, tais como os “fármacos” ou, até mesmo o álcool que, na maioria das vezes, servem como porta de entrada para o mundo da dependência química (RIBEIRO, 2011).

A intoxicação por meio de substâncias psicoativas é utilizada pelos indivíduos como forma de alívio, já que, tais indivíduos as ingerem buscando fugir do mundo real e, consequentemente, do mal-estar que sentem. Mas, há quem use por prazer, embora essa seja uma maneira ainda mais perigosa e instável. Em algum momento as consequências dessa intoxicação podem vir à tona, passando a transformar o “simples” e prazeroso uso de drogas em dependência química (RIBEIRO, 2011).

Nesse sentido, é de suma importância sabermos como surgiu o termo “toxicômanos”. Sendo um termo advindo do discurso proferido pela psiquiatria que, em meados do século XIX passa a considerá-lo, isoladamente, como categoria clínica específica relacionada a inclinações impulsivas de atos maníacos (RIBEIRO, 2011).

Essa mudança deu-se por meio do conhecimento médico emergente da época para explicar determinados fenômenos. Iniciou-se, então, o processo de elaboração de fundamentos diagnósticos os quais passaram a descrever a relação de dependência que determinados indivíduos estabeleciam com uma ou mais substâncias psicoativas. Os diferentes tipos de drogas também tiveram descrições detalhadas de seus efeitos, cuja, a elaboração de fundamentos expunha o poder de causar dependência aos usuários (RIBEIRO, 2011).

Para melhor explicar esse termo “toxicômanos”, menciona-se o texto “O mal-estar na civilização” de Freud (1996) no qual afirmou que, o mal-estar que afeta o homem é proveniente tanto da cultura, como do desenvolvimento psíquico individual que impõem uma renúncia parcial à sexualidade e agressividade humana.

Diante disso, observa-se que, a temática toxicomania segundo o ponto de vista da psicanálise, é fruto de um discurso de afirmação em que, não há um sujeito em questão, mas sim algo resultante de uma determinada e bastante específica interação entre o organismo e ambientes diversos (GIANESI, 2005).

Assim, nota-se que diante da opressão feita pela sociedade e pelas instituições repressoras aloja-se um mal-estar que, apenas pode ser tolerado através do que Freud designou como medidas paliativas. Dentre as medidas paliativas existentes, Freud (1996) considerou a denominação tóxicos como “o método mais grosseiro a ser utilizado, embora esse seja o mais eficaz”, uma vez que, o uso de substâncias tóxicas evitam o sofrimento humano influenciando o nosso corpo e alterando a química de forma a nos tornar insensíveis à nossas desgraças (RIBEIRO, 2011).

Ainda nesse contexto, Cynara Teixeira Ribeiro (2011) citando Freud (1996) afirma que:

O uso de drogas à dependência química, fez uma sutil diferenciação entre o “emprego de veículos intoxicantes” e a “intoxicação crônica”. Enquanto o primeiro é considerado um método na luta pela felicidade e afastamento da desgraça “tão altamente apreciado que tanto indivíduos como povos lhes concederam lugar permanente na sua economia libidinal” (p. 86), o segundo é um consolo para “o homem que, em anos posteriores, vê sua busca de felicidade resultar em nada” (p.92)” (RIBEIRO, p. 92, 2011).

 

Quando um sujeito pode ser considerado como um toxicômano, segundo Nogueira Filho (1999):

 

[...] No âmbito psicanalítico, é apenas a partir da escuta a cada sujeito singular que se torna possível concluir quando uma determinada configuração de uso de drogas chega a constituir uma ‘toxicomania’. Isso porque uma toxicomania não pode ser definida somente pela frequência e tipo de droga que o sujeito usa, mas sim pelo lugar que ela ocupa na subjetividade do paciente” (NOGUEIRA FILHO, 1999).

 

Nesse viés, a dependência química surge como fator de transformação radical na vida dos usuários. Na maioria das vezes, o uso de drogas e entorpecentes ocorre quando o indivíduo ainda é muito jovem, o que por sua vez ocasiona abandono de suas famílias, seus estudos e, até mesmo, de sua profissão, tudo para adentrar ao vício incontrolável.

As sensações boas oriundas do uso logo passam, sendo seguidas de um grande vazio, depressão, perturbações, sensação de fracasso e a sensação de desconforto é tamanha que os usuários são praticamente obrigados a consumirem mais, gerando assim, o vício. Os usuários viciados podem desenvolver transtornos emocionais, perda de peso e a depender da droga, o indivíduo perde até as noções de higiene e tentam o suicídio. O uso constante de algumas substâncias podem causar deterioração física e mental (DETONI, 2006).

Entre os fatores associados à personalidade que podem desencadear a dependência química estão a instabilidade emocional acentuada, baixa alto-estima, sentimentos crônicos de vazio e tédio, incapacidade de lidar com frustrações e críticas, insegurança, medo de rejeição, necessidade de imitar ou de se exibir e dificuldade de aceitar os aspectos imutáveis da realidade (DETONI, 2006).

Por sua vez, ao mudarmos um pouco o foco do individualismo para observarmos os impactos em âmbito coletivo, é nítido que tais fatores ocasionam insegurança a sociedade em geral. O indivíduo usuário crônico não possui controle sobre o vício ou até mesmos sobre suas atitudes, como é o caso daqueles que se tornam agressivos no meio familiar ou social. A visão social do assunto é que, para o Estado, essa situação é geradora de gastos tanto na saúde pública quanto na segurança pública.

Após embarcar no mundo das drogas o indivíduo entra em um círculo de autodestruição. Sofre preconceito, humilhações, fome, medo, falta de moradia e segurança, falta de lazer, alguns são obrigados a se prostituírem para o sustento do vício, caracterizando um rebaixamento moral e emocional. Com a decadência da pessoa a família é quem se envolve afetivamente também sofrendo junto. Nota-se que, para com o indivíduo há uma exclusão tanto da família quanto da sociedade (DETONI, 2006).

 

3 HISTORICIDADE DAS POLÍTICAS SOBRE DROGAS NO BRASIL

 

O papel do Estado é atuar como um agente vigoroso em prol da proteção e bem-estar da população na qual, progressivamente o sustenta. Esta instituição retribui tal sustentação através da concretização das garantias fundamentais constitucionais para que o desenvolvimento da sociedade se concretize. Assim, um dos mecanismos usados para prestações positivas é o de criação de políticas públicas que têm definição compreendida para Neuza Guareschi (2004), como:

 

O conjunto de ações coletivas voltadas para a garantia dos direitos sociais, configurando um compromisso público que visa a dar conta de determinada demanda, em diversas áreas; expressa ainda, a transformação daquilo que é do âmbito privado em ações coletivas no espaço público (GUARESCHI, et al. 2004. p. 180).

 

Observa-se, então, que as políticas públicas são diretrizes de ação do poder público que visam suprir anseios sociais principalmente de grupos marginalizados da sociedade. A aplicação de política públicas resulta na ampliação e efetivação de direitos de cidadania, para que esses grupos vulneráveis passem a ser reconhecidos institucionalmente.

Quanto à política públicas, o Brasil em 1938 constituiu a primeira legislação no que se refere à consolidação de ações de prevenção, tratamento e repressão na área de drogas, o Decreto Lei nº 891. Nos seguintes anos, criaram-se diversos projetos referentes a esse assunto, como:

 

(1976) Aprovada a Lei de 6368, de 21 de outubro de 1976, que dispõe sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica.

(1980) Aprovado o Decreto nº 85.110, de 2 de Setembro de 1980, que Institui o Sistema Nacional de Prevenção, Fiscalização e Repressão de Entorpecentes, bem como normatiza o Conselho Nacional de Entorpecentes.

(1986) A Lei 7560, de 19 de dezembro de 1986, criou o Fundo de Prevenção, Recuperação e de Combate às Drogas de Abuso, dispõe sobre os bens apreendidos e adquiridos com produtos de tráfico ilícito de drogas ou atividades correlatas

(1993) Criada, no âmbito do Ministério da Justiça, pela Lei 8764, de 20 de dezembro de 1993, a Secretaria Federal de Entorpecentes, órgão de supervisão técnica no que tange às atividades de prevenção, fiscalização e repressão ao uso indevido de produtos e substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica, buscando dar estrutura para organização do Sistema Nacional de Prevenção, Fiscalização e Repressão de Entorpecentes. 

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(1998) O Brasil dá início à discussão de uma nova política nacional específica que articule os temas da redução da demanda (ações referentes à prevenção do uso de drogas lícitas e ilícitas que causem dependência, bem como aquelas relacionadas ao tratamento, à recuperação, à redução de danos e à reinserção social de usuários e dependentes) e da oferta de drogas (atividades inerentes à repressão da produção não autorizada, ao tráfico ilícito de drogas e ao controle de substâncias precursoras da fabricação de drogas ilícitas e de drogas lícitas, tais como o álcool e o cigarro). Foi depois da realização da XX Assembleia Geral Especial das Nações Unidas, na qual foram discutidos os princípios diretivos para a redução da demanda de drogas, aderidos pelo Brasil, que as primeiras medidas foram tomadas. O então Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN) foi transformado no Conselho Nacional Antidrogas (CONAD) e foi criada a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD), diretamente vinculada à, então, Casa Militar da Presidência da República (BRASIL, 2018).

 

Após esse período de 1938 à 1998 de criações de leis que dispunham sobre a temática das drogas, coube ao órgão da Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) mobilizar os atores envolvidos à concretizarem uma reformulação da política de drogas brasileira. Assim, por meio de Decreto Presidencial nº 4.345 de 2002, foi instituída a Política Nacional Antidrogas (PNAD) no país. Além disso, o governo sancionou a Lei nº 10.409 de 2002 que fazia uma série de modificações na antiga Lei nº 6368/1976 (BRASIL, 2018).

No ano de 2004, foi efetuado o processo de reajuste de tal política pública instituída no ano de 2002, desenvolvendo-se uma nova Política Nacional sobre Drogas (PNAD) e utilizando-se muito da antiga política, além de estabelecer novas diretrizes e uma nova maneira de implantação (BRASIL, 2018).

Em 2006 foi aprovada a Lei nº 11.343 que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD). Essa lei suplantava as legislações anteriores de nº 6.368/1976 e 10.409/2002. Em seu art.1º descreve:

 

Art. 1º - Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes (BRASIL, 2006).

 

Além disso, o SISNAD apresenta em seu art. 3º e incisos à sua finalidade que é de “articular, integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas com a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas.” (BRASIL, 2006).

Ademais, observa-se que, tal lei regulamenta-se pelo Decreto nº 5.912/2006 e que este, por sua vez, em seu art. 2º apresenta os órgãos integrantes do SISNAD:

 

Art. 2o - Integram o SISNAD:

I - o Conselho Nacional Antidrogas - CONAD, órgão normativo e de deliberação coletiva do sistema, vinculado ao Ministério da Justiça; (Redação dada pelo Decreto nº 7.426, de 2010)

II - a Secretaria Nacional Antidrogas - SENAD, na qualidade de secretaria-executiva do colegiado;

III - o conjunto de órgãos e entidades públicos que exerçam atividades de que tratam os incisos I e II do art. 1o:

a) do Poder Executivo federal;

b) dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, mediante ajustes específicos; e

IV - as organizações, instituições ou entidades da sociedade civil que atuam nas áreas da atenção à saúde e da assistência social e atendam usuários ou dependentes de drogas e respectivos familiares, mediante ajustes específicos (BRASIL, 2006).

 

Tendo em vista a integração do CONAD e na qualidade de órgão superior do SISNAD, no art. 4º do Decreto nº 5912/2006 é expresso o que lhe compete. Contudo, em virtude da introdução de alterações pelo Decreto nº 7426/2010, regulamentou-se as competências dos Órgãos do Poder Executivo no que se refere às ações de redução da demanda de drogas (BRASIL, 2018).

Dispõe sobre a transferência da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas - CONAD e da gestão do Fundo Nacional Antidrogas - FUNAD do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República para o Ministério da Justiça, bem como sobre remanejamento de cargos para a Defensoria Pública da União (BRASIL, 2011).

 

4  A CAPACIDADE CIVIL DOS TOXICÔMANOS

 

De acordo com a legislação civil brasileira, no que diz respeito à capacidade das pessoas naturais, “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil” conforme dispõe o artigo 1º do Código Civil de 2002. Tal capacidade pode ser definida como capacidade de direito, sendo esta, uma “aptidão para adquirir e contrair deveres”. Há a capacidade de fato, a qual “nem todas as pessoas possuem [...], pois trata da aptidão para praticar, pessoalmente, por si só, os atos da vida civil” (QUEIROZ, p.99, 2016).

O Código Civil após a Lei nº 13.146 de 2015, em seu artigo 4º, enumera os relativamente incapazes, dentre os quais, no inciso II, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos. Em virtude de lei, sujeitam-se a estas pessoas o dever de:

 

[...] Praticar os atos da vida civil devidamente assistidos por terceira pessoa, isto é, o ato deverá ser praticado em conjunto por ambos. Isso porque na incapacidade relativa, não se despreza de todo a vontade do incapaz. Caso o relativamente incapaz pratique atos na vida civil sozinho, esses atos são passíveis de anulação (QUEIROZ, p.99, 2016).

 

Expõe-se assim, que os toxicômanos por serem relativamente incapazes em razão da dependência química, podem praticar os atos da vida civil. É imposta a necessidade de comprovação dessa incapacidade por estarem sujeitos ao procedimento de interdição por meio de curatela, dispostos no Código Civil pelos artigos 1.767, inciso III e 1.768 expressando em seu inciso IV, a promoção dos termos pela própria pessoa. Em suma, o grupo dos toxicômanos com a mudança legislativa, pode praticar atos da vida civil, desde que sejam devidamente assistidos pela família ou representante legal.

 

5 MODALIDADES DE INTERNAÇÃO E SUAS APLICAÇÕES LEGISLATIVAS

 

5.1 Modalidades de internação às pessoas portadoras de transtornos mentais: Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001

 

Inicialmente, no tocante à internação de paciente acometido de transtorno mental, tal condição é regida pela Lei 10.216, de 6 de abril, de 2001, na qual prevê, em seu artigo 6º, parágrafo único, três tipos de internação psiquiátrica – voluntária, involuntária e compulsória - as quais deverão sempre serem avaliadas por médico. Vejamos:

 

Art. 6º A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos.

Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica:

I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;

II - internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e

III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça (BRASIL, 2001).

 

 Vale ressaltar que, a Organização Mundial da Saúde (OMS), classifica a dependência química como um transtorno psiquiátrico, sendo considerada uma doença crônica primária, isto é, progressiva, geradora de outras doenças conforme citado pelo Ministério da Saúde (2019):

 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que a dependência em drogas lícitas ou ilícitas é uma doença. O uso indevido de substâncias como álcool, cigarro, crack e cocaína é um problema de saúde pública de ordem internacional que preocupa nações do mundo inteiro, pois afeta valores culturais, sociais, econômicos e políticos (BRASIL, 2019).

 

Acerca da Lei 10.216/2001, quanto à internação involuntária – a que se dá sem o consentimento do paciente e a pedido de terceiro -, esta modalidade não possui necessidade de intervenção judicial ou do órgão do Ministério Público, sendo preciso apenas à comunicação do estabelecimento hospitalar ao Ministério Público, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, como estabelecido no artigo 8º, §1º da referida lei.

Ademais, outro ponto valoroso, é a possibilidade de determinação do término da internação involuntária por solicitação escrita do familiar ou do responsável legal ou, quando estabelecido pelo especialista responsável pelo tratamento, de acordo com o artigo 8º, § 2º do mesmo dispositivo legal.

Destaca-se que, diferentemente da modalidade anterior, a internação compulsória é determinada pela Justiça, visto à necessidade de intervenção estatal em prol da saúde pública. Não há solicitação de familiar ou representante legal para essa modalidade internação. Neste caso, tanto o Ministério Público quanto o setor próprio da área de saúde pública podem formular ao Judiciário o pedido de internação compulsória do paciente, segundo o artigo 9º da mesma lei. Diante disso, exprime-se a fala da D. Juíza Dra. Sirlei Martins da Costa (2012):

 

O pedido de internação compulsória deve ser direcionado ao Juiz da Vara de Família, pois o fundamento do pedido é o fato de o usuário de substância entorpecente estar impossibilitado, momentaneamente, de decidir acerca do próprio interesse, no caso sua saúde. De qualquer forma, a medida, deferida em caráter emergencial e temporária, deve preceder de manifestação do Ministério Público e será sempre deferida no intuito de proteger o interesse do usuário. O magistrado jamais deve fixar o tempo da internação, pois caberá ao especialista responsável pelo tratamento decidir sobre o término da internação (§ 2º do Art. 8º) (COSTA, 2012).

 

Por sua vez, apesar da OMS reconhecer a dependência química como transtorno psiquiátrico e a legislação acerca da internação de pacientes com transtornos mentais ser guiada pela Lei nº 10.216/2001, o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas não aplica esta lei no que concerne ao tratamento de usuários e de dependentes químicos.

 

5.2 Modalidade de internação involuntária aos usuários ou dependentes de drogas: Lei nº 13.840, de 5 de junho de 2019

 

Diante de todas as intenções legislativas do Governo em relação às políticas sobre drogas no país, apenas no ano de 2019 que, de forma mais incisiva, foi regulamentado um mecanismo legislativo de maior repercussão social, a Lei nº 13.840. Publicada em 6 de junho de 2019, no Diário Oficial da União, esta lei foi sancionada pelo presidente Jair Messias Bolsonaro permitindo a internação involuntária de dependentes químicos sem a necessidade de autorização judicial, além do acolhimento de usuários de drogas em comunidades terapêuticas e o uso de bens apreendidos do tráfico (ALMEIDA, 2019).

À vista disso, torna-se necessário expor as definições de internação segundo a nova lei. Sendo assim, em seu art. 23-A, §3º e incisos, afirma-se que:

 

Art. 23-A. (...)

§ 3º São considerados 2 (dois) tipos de internação:

I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do dependente de drogas;

II - internação involuntária: aquela que se dá, sem o consentimento do dependente, a pedido de familiar ou do responsável legal ou, na absoluta falta deste, de servidor público da área de saúde, da assistência social ou dos órgãos públicos integrantes do Sisnad, com exceção de servidores da área de segurança pública, que constate a existência de motivos que justifiquem a medida (BRASIL, 2019).

 

Ademais, no mesmo dispositivo, nos §§ 4º e 5º e seus incisos, a lei informa sobre as medidas as quais se dará os tipos de internação, sendo que:

 

Art. 23-A. (...)

§ 4º A internação voluntária:

I - deverá ser precedida de declaração escrita da pessoa solicitante de que optou por este regime de tratamento;

II - seu término dar-se-á por determinação do médico responsável ou por solicitação escrita da pessoa que deseja interromper o tratamento.

§ 5º A internação involuntária:

I - deve ser realizada após a formalização da decisão por médico responsável;

II - será indicada depois da avaliação sobre o tipo de droga utilizada, o padrão de uso e na hipótese comprovada da impossibilidade de utilização de outras alternativas terapêuticas previstas na rede de atenção à saúde;

III - perdurará apenas pelo tempo necessário à desintoxicação, no prazo máximo de 90 (noventa) dias, tendo seu término determinado pelo médico responsável;

IV - a família ou o representante legal poderá, a qualquer tempo, requerer ao médico a interrupção do tratamento (BRASIL, 2019).

 

No entanto, quando observados os dispositivos atentamente, vê-se que, a possibilidade de internação involuntária é baseada em uma série de requisitos de análise médica. Destarte, que a validade dessa modalidade de internação ocorrerá quando comprovado que o usuário ou dependente químico não pode ser tratado de nenhuma outra maneira através da rede de saúde; analisando o tipo de droga consumida e; quando os recursos hospitalares forem insuficientes para o tratamento de um paciente.

Na realidade, o caráter compulsório fornece às famílias e aos representantes legais a possibilidade administrativa de internação diretamente no estabelecimento, em se tratando do Sistema único de Saúde (SUS). Caso o dependente não possua responsável legal, poderá o servidor público da área da saúde, assistência social ou de órgãos integrantes do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD) requerer a internação. A internação do dependente químico terá, no máximo, 90 (noventa) dias, sendo este o período de desintoxicação do uso de drogas. Ressalta-se, a existência da possibilidade de requerimento, a qualquer momento, pela família ou representante legal que seja interrompido o período de internação.

A internação, tanto voluntária como involuntária somente será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes à situação do dependente químico, sendo que, as internações e altas deverão ser informadas aos órgãos Ministério Público, Defensoria Pública e a outros órgãos de fiscalização, no máximo de 72 (setenta e duas) horas pelo sistema informatizado único, segundo o artigo 23-A, §§ 6º ao 8º da Lei nº 13.840/2019.

Ademais, ressalta-se, ainda, a vedação de internação tanto voluntária, como involuntária nas comunidades terapêuticas acolhedoras, uma vez que, a maioria dessas comunidades não são regulamentadas, segundo o § 9º, do artigo 23-A.

Contudo, a mesma lei não veda o acolhimento nessas comunidades, de acordo com o artigo 26-A da mesma lei, visto que, diferentemente do acolhimento que busca promover o desenvolvimento individual do dependente, a internação requer regulamentação técnica tendo em vista a aplicação de mecanismos de tratamento da dependência química.

Outrossim, observa-se que o dispositivo normativo, em seu artigo 23-B, dispõe sobre a avaliação prévia por equipe técnica multidisciplinar e multissetorial na qual o usuário ou dependente de drogas será submetido, estabelecendo um plano individual de atendimento (PIA) elaborado no prazo de 30 (trinta) dias da data de ingresso, que funcionará como o primeiro projeto terapêutico para atendimento, sendo atualizado ao longo das diversas fases do atendimento. Esse plano deverá contemplar a participação dos familiares ou responsáveis, os quais possuem o dever de contribuir com o processo de tratamento. No caso de crianças e adolescentes, os familiares ou responsáveis serão passíveis de responsabilização civil, administrativa e criminal, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.

 

6 DIREITOS FUNDAMENTAIS: ANÁLISE DO DIREITO A VIDA E DO DIREITO A LIBERDADE

 

O tema em questão levanta forte debate na atualidade em que, de um lado defende-se o direito à liberdade do indivíduo e, do outro, defende-se a necessidade de intervenção estatal para garantir o direito à vida deste mesmo indivíduo.

Não obstante, o ser humano possui direitos e deveres, tais quais garantem ou deveriam garantir o mínimo existencial, que corresponde a uma vida digna, com acesso a saúde, alimentação e educação, cabendo ao estado proteger e garantir estes direitos. Ou seja, aquele que não tiver condições deverá ser auxiliado pelo estado e pela sociedade.

 

6.1 ANALISE DO DIREITO À LIBERDADE

O direito à liberdade, previsto na Constituição Federal, em seu art. 5º, II, aduz que: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” - lei no sentido formal. Diante disso, observa-se que, a aplicabilidade da Lei 13.840/2019, na qual dispõe sobre a compulsoriedade de internação não concretiza ato de inconstitucionalidade, devendo ser interpretada em strito sensu.

Para Kant (2002), o conceito de liberdade é, basicamente, compreendido como autonomia, isto é, a capacidade de controlar a própria vida e fazer escolhas a partir da razão. Contudo, sendo as escolhas desejos ou necessidades, poderão estar sendo determinadas por condicionantes ou fatores biológicos, externos os quais não há controle. Assim, o ser humano durante sua vida cria e determina leis pessoais (legislações morais) as quais servem como parâmetro para viver supostamente com dignidade. Nesse sentido, é necessário observar os conceitos de autonomia e heteronomia. Na autonomia age-se de acordo com as regras pré-determinadas pelo próprio indivíduo, conquanto, na heteronomia, age-se de acordo com regras as quais fatores externos determinam (KANT, 2002).

No caso dos toxicômanos, evidencia-se o predomínio da heteronomia visto que, o indivíduo vive conforme as regras que as substâncias psicoativas definem para o seu cotidiano. O usuário vive para o consumo descontrolado destas substâncias, colocando o uso como prioridade frente à alimentação, a higiene e a saúde.

Conforme veremos, o conflito gerado entre dois direitos fundamentais ante a internação compulsória prevista na Lei 13.840/2019, vê-se necessária a análise do direito fundamental à liberdade como direito relativo, ou seja, passível de cerceamento.

           

 

6.2 ANALISE DIREITO À VIDA

           

Destarte, observa-se o direito à vida como sendo o direito mais importante do nosso ordenamento jurídico, pois dele decorrem outros direitos fundamentais. Desse modo, torna-se necessário analisar tal direito a partir do ponto de vista do meta-princípio da dignidade da pessoa humana. Isto porque, no caso dos dependentes químicos, a dignidade deste indivíduo é abalada e, na maioria das vezes, lhe é subtraída, assim como a vida.

Nos casos mais graves, estes indivíduos vivem em situação de rua, na qual passam fome e em alguns casos até mesmo se prostituem para sustentar o vício, ocasionando grande incidência de doenças sexualmente transmissíveis. Diante desses fatos, afirma-se a importância da análise de ambos direitos fundamentais quanto aos toxicômanos, haja vista torna-se necessário avaliar a aplicação da referida lei em relação a ambos os direitos.

 

6.3 REFLEXÕES SOBRE O CONFLITO ENTRE O DIREITO À VIDA E O DIREITO A LIBERDADE

 

De fato, existe o conflito, porém para boa parte dos doutrinadores os direitos fundamentais seriam dotados de algumas características comuns, quais sejam, a relatividade, a imprescritibilidade, a inalienabilidade, a irrenunciabilidade, a inviolabilidade, a universalidade, a diferença entre direitos e garantias, a efetividade, a interdependência, a complementariedade, a historicidade e a aplicabilidade.

Então, se levarmos em conta que os direitos fundamentais apresentam tais características, não há que se falar em direito fundamental absoluto, mas sim relativo. Sendo assim, é necessário que tal conflito seja resolvido através do uso da teoria da ponderação de valores ou ponderação de interesses, ou seja, é necessário pesar os valores envolvidos e assim estabelecer o direito que deverá prevalecer no caso. No caso da internação compulsória, observados estes valores, pode se dizer que existe vida sem liberdade, todavia não há liberdade sem vida.

Assim sendo, o direito à liberdade em questão é relativo se pesado com o direito à vida, também é necessário observar a efetividade do direito conforme supracitado, pois não há como o direito à liberdade ser efetivo se não houver vida, ou nesse mesmo sentido, observar a interdependência ou complementariedade de ambos direitos, ou seja, tais direitos não poderiam ser interpretados isoladamente, e sim integrados.

Portanto, para que o indivíduo de fato goze do seu direito à liberdade é necessário poder usufruir do mínimo existencial e de dignidade humana, que no caso dos dependentes químicos já fora perdida, sendo assim, é necessária intervenção para restabelecer a capacidade de discernimento deste indivíduo.

 

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Este estudo buscou proporcionar o debate sobre a temática da internação compulsória, tema este tão polêmico no ordenamento jurídico pátrio e seu conflito entre dois direitos fundamentais, o direito à liberdade e o direito à vida. Importante ressaltar a diferença entre Direitos Humanos e Direitos fundamentais, comumente utilizados erroneamente como sinônimos, sendo que o primeiro abrange ou visa direitos universais (internacionais) e o segundo possui uma perspectiva individualista, focado nos direitos de cada indivíduo perante o Estado, que de fato é o que nos interessa neste artigo.

O presente trabalho destacou a Lei nº 13.840, de 5 de junho de 2019 que, de forma mais incisiva, regulamentou um mecanismo legislativo de maior repercussão social, permitindo a internação involuntária de dependentes químicos sem a necessidade de autorização judicial, além do acolhimento de usuários de drogas em comunidades terapêuticas como medida política de saúde pública, indo de conflito direto com o direito fundamental à liberdade.

Para boa parte dos doutrinadores os direitos fundamentais seriam dotados de algumas características comuns, quais sejam, a relatividade, a imprescritibilidade, a inalienabilidade, a irrenunciabilidade, a inviolabilidade, a universalidade, a diferença entre direitos e garantias, a efetividade, a interdependência, a complementariedade, a historicidade e a aplicabilidade.

Sendo assim, é necessário que tal conflito seja resolvido através do uso da teoria da ponderação de valores ou ponderação de interesses, ou seja, é necessário pesar os valores envolvidos e assim estabelecer o direito que deverá prevalecer. No caso da internação compulsória, observados estes valores, pode se dizer que existe vida sem liberdade, todavia não há liberdade sem vida.

Portanto, analisando a Lei nº 13.840, de 5 de junho de 2019, observando a historicidade das políticas públicas sobre drogas e utilizando da teoria da ponderação para resolução do conflito, resta evidente que tal lei não fere ou viola direitos humanos e fundamentais, observa-se também que a mesma não atinge a dignidade humana dos dependentes, muito pelo contrário, tal norma busca resgatar tal dignidade perdida pelo uso crônico de drogas.

Não obstante, fica claro que os dependentes químicos crônicos não possuem mais condições normais de tratamento e recuperação, sendo necessária intervenção seja familiar ou estatal, pois os mesmos não possuem discernimento da realidade, muitas vezes tornando-se agressivos para consigo mesmos e terceiros.

Visto que apreensões, prisões e condenações não são as únicas formas de combate ao uso de drogas, torna-se evidente à necessidade de políticas públicas objetivando a reinserção social em relação ao apoio ao usuário e às suas famílias. Outras ações devem coexistir como agentes atuantes nesse processo de combate, como a inclusão da educação e informação para crianças e adolescentes, além de investimento em saúde para o tratamento desses grupos vulneráveis. Dessa forma, parafraseando (BRASIL, et al, 2016) haverá a construção de um ser humano com um mínimo de capacidade de ação no meio social à sua volta.

A Lei nº 13.840, de 5 de junho de 2019, busca de forma incisiva, suprir o que as normas jurídicas antecessoras não foram capazes, visualizando o tema como uma política de saúde pública necessária. Ressalta-se que a própria OMS (Organização Mundial da Saúde) classifica a dependência química como doença mental e progressiva, ocasionando outras doenças e, classificando o uso dessas substâncias como problema de saúde pública de ordem internacional.

Ao longo da elaboração deste trabalho, foi possível observar que historicamente as normas jurídicas pátrias que já versaram sobre o tema, não foram de fato efetivas. Com o passar dos anos sempre foram surgindo alterações necessárias nestas normas, visando ampliar a capacidade de intervenção estatal. Observando atentamente nota-se, que embora a intenção da nova lei seja positiva, ainda restam pontos a serem analisados e repercutidos, como por exemplo, como funcionarão as medidas assistenciais pós-tratamento do dependente e como se dará a reinserção deste indivíduo na sociedade.

Por fim, ao longo deste trabalho analisou-se a real necessidade da privação da liberdade de ir e vir dos dependentes químicos, ainda que compulsoriamente, acompanhada por prescrição médica, para fins de proporcionar a recuperação deste indivíduo e sua reinserção social.

Portanto, a internação compulsória é conveniente, a qual busca restabelecer a dignidade humana e os direitos fundamentais dos dependentes químicos crônicos.

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Sobre os autores
Carlos Roberto Campos

Bacharel em Direito Pós-graduando em Direito Trabalhista e Previdenciário

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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