A efetivação dos direitos humanos pela atuação ética dos empresários e demais agentes econômicos: boas práticas de governança corporativa e combate à corrupção privada
La efectividad de los derechos humanos por el desempeño ético de los empresarios y otros agentes económicos: buenas prácticas del gobierno corporativo y lucha contra la corrupción privada
Antonio Evangelista de Souza Netto[1]
RESUMO: O estudo aborda e discute o comportamento ético dos empresários, as práticas de governança corporativa e a censura à corrupção privada, à luz dos Direitos Humos. São analisados o tratamento normativo e doutrinário sobre o tema, com maior ênfase nas regras da governança corporativa e da Lei Anticorrupção. Demonstra-se a necessidade de que os empresários adotem rigorosos padrões éticos de comportamento, notadamente com a criação de códigos de ética pautados nas boas práticas de governança corporativa, preferencialmente alinhados com a agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU). O estudo se assenta na revisão bibliográfica do tema, com utilização de método preponderantemente qualitativo.
PALAVRAS-CHAVE: Direitos Humanos. Empresários. Ética Empresarial. Governança Corporativa. Combate à Corrupção Privada.
RESUMEN: Este estudio aborda y analiza el comportamiento ético de los emprendedores, las prácticas de gobierno corporativo y la censura de la corrupción privada a la luz de los derechos de Humanos. Se analiza el tratamiento normativo y doctrinal sobre el tema, con mayor énfasis en las reglas del gobierno corporativo y la Ley Anticorrupción. Demuestra la necesidad de que los empresarios adopten normas éticas estrictas de comportamiento, en particular con la creación de códigos de ética basados en buenas prácticas de gobierno corporativo. El estudio se basa en la revisión de la literatura del tema, utilizando un método predominantemente cualitativo.
PALABRAS CLAVE: Derechos Humanos. Empresarios. La ética empresarial. Gobierno Corporativo. Lucha contra la corrupción privada.
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988, que incorporou os Direitos Humanos como garantias jurídicas universais destinadas à proteção da dignidade da pessoa humana, determina que as normas jurídicas sejam aplicadas e interpretadas em conformidades com tais preceitos, inclusive as que regulam a atividade empresarial. Não é outra, aliás, a recomendação do art. 8º, do Código de Processo Civil, de acordo com o qual, o juiz deve, por ocasião da aplicação do ordenamento jurídico, resguardar e promover a dignidade da pessoa humana.
Os Direitos Humanos são garantias jurídicas universais que se destinam à proteção da dignidade da pessoa humana, maior referência da Constituição Federal de 1988 e núcleo axiológico do constitucionalismo brasileiro. Essa condição essencial determina que todas as normas jurídicas sejam aplicadas e interpretadas conforme a dignidade da pessoa humana, o que inclui o campo empresarial. Não é outra, aliás, a recomendação do art. 8º, do Código de Processo Civil, de acordo com o qual, o juiz deve, por ocasião da aplicação do ordenamento jurídico, resguardar e promover a dignidade da pessoa humana.
Considerando que os empresários e demais agentes econômicos devem atuar de acordo com os princípios constitucionais, o cumprimento dessas obrigações pode ser favorecido pela ampliação dos padrões éticos de comportamento, pelo estímulo das práticas de governança corporativa e pelo combate à corrupção privada.
O dever empresarial de respeito à dignidade da pessoa humana se justifica pelos Princípios da Função Social dos Negócios Jurídicos, da Função Social da Empresa, e da Função Social da propriedade, nos termos do artigo 5º, XXIII da Constituição Federal de 1988, além dos demais princípios norteadores do Código Civil, como o Princípio da Eticidade e da Operabilidade. De acordo com o Princípio da Sociabilidade e da teoria da eficácia horizontal, os direitos coletivos são mais importantes que os direitos privados e os direitos fundamentais devem ser respeitados em todas as relações jurídicas, inclusive as de natureza empresarial.
Os gestores das sociedades empresárias devem agir com retidão, cuidado e diligência, evitando qualquer conduta que posa configurar violações à dignidade da pessoa humana ou aos direitos fundamentais. Nesse sentido, o administrador deverá agir para o cumprimento das finalidades societárias sem descurar dos interesses público e social.
O respeito à dignidade da pessoa humana no contexto empresarial também poderia ser pautado pelas Diretrizes Nacionais sobre Empresas e Direitos Humanos (DNEDH), alinhadas às orientações do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), que trata da responsabilidade empresarial na efetivação dos direitos humanos em diversos aspectos.
Entende-se que as atividades empresariais, deveriam estar alinhadas tanto às normas e princípios constitucionais como aos parâmetros e objetivos da Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU).
No âmbito empresarial, a efetivação dos direitos humanos pelo combate à discriminação e pelo respeito da diversidade, entre outras medidas, pode se dar com: i) a criação de políticas que permitam o acesso do jovem, deficiente e idoso ao mercado de trabalho; ii) a criação de políticas de promoção de acesso ao mercado por pessoas tradicionalmente discriminadas; iii) o estímulo e a promoção do trabalho da mulher; e iv) o respeito à orientação sexual dos colaboradores.
Tendo em vista a importância da ética empresarial para a garantia do respeito à dignidade da pessoa humana e à efetivação dos direitos fundamentais, defende-se que os empresários criem códigos éticos com boas práticas de governança corporativa, alinhadas aos mencionados parâmetros e aos objetivos da Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU).
Finalmente, destacamos o combate à corrução privada é essencial para garantir o exercício adequado da livre iniciativa, a produção de efeitos empresariais que prestigiem a efetivação dos direitos fundamentais e o respeito à dignidade da pessoa humana;
Lenvando em conta que “A metodologia é o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da realidade”[2], o trabalho foi realizado com base na pesquisa bibliográfica, por meio de fontes primárias e secundárias. Optou-se pelo método descritivo e pela revisão de literatura, A propósito, a revisão narrariva permite a compreensão do pesquisador sobre o tema, sem que se configure abordagem imparcial.
1. Direitos Humanos e dignidade da pessoa humana
Em sentido amplo, os direitos humanos são garantias jurídicas universais que visam proteger as pessoas tanto contra ações como contra omissões que ferem as liberdades, os direitos fundamentais e a dignidade humana.[3] No momento em que os direitos humanos se inserem no ordenamento jurídico interno passam a compor o standart de direitos fundamentais.
Assim, denominam-se direitos fundamentais as normas que dão concretude jurídica à dignidade da pessoa humana numa ordem jurídica de determinado Estado, ou seja, numa ordem jurídica interna. Já os direitos humanos são amplas garantias jurídicas universais que, entre outros aspectos, consagram a dignidade da pessoa humana no plano transnacional.
Substancialmente, direitos humanos e direitos fundamentais se equivalem. A diferença entre eles radica-se apenas no plano de positivação normativa.[4]
Adverte-se que a locução “direitos humanos” poderia ser redundante, considerando que todos os direitos seriam relacionados ao homem. Não obstante essa ressalva, é recomendável que a expressão “direitos humanos” continue sendo utilizada, pois, além de já ter se tornado consagrada, expressa, com vigor, o objeto que representa.
Além de estar tutelada pelos Direitos Humanos, a Dignidade da Pessoa Humana é a referência central do constitucionalismo atual. Ela representa o núcleo axiológico do constitucionalismo contemporâneo, ou dos valores mais expressivos no núcleo constitucional.
Por compor o núcleo axiológico da constituição, a dignidade da pessoa humana deve ser concebida como vetor determinante para aplicação e interpretação de todas as normas do sistema jurídico, sobretudo no âmbito empresarial[5].
O art. 8º do Código de Processo Civil, aliás, determina que: “ Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. ”
No que se refere à atividade empresarial, a ética tem suma importância por ser o vetor de gestões pautadas no respeito à dignidade. Sobre ética e dignidade, Guerra destaca que a dignidade da pessoa humana representa um significativo vetor interpretativo, um valor-fonte que conforma e inspira todos ordenamentos jurídicos dos Estados de Direito. A atuação ética em todos os seguimentos privados, de certa forma, é aquela que se orienta pela atenção à dignidade da pessoa humana.[6]
Nesse sentido, a pessoa humana não deve ser compreendida apenas como uma das categorias jurídicas reconhecidas pelo ordenamento, mas como fundamento da existência do próprio sistema normativo. É a pessoa humana que justifica a existência do Estado e não o Estado que justifica a existência da pessoa humana. Como ensina Canotillho, a pessoa humana é o limite e fundamento do domínio político da República.[7]
2. Empresa e Direitos Humanos
Para garantir o respeito à dignidade da pessoa humana e contribuir para a efetivação dos direitos fundamentais, entre outras providências, os empresários e demais agentes econômicos devem, por meio das suas responsabilidades coorporativas, respeitar a dignidade da pessoa humana e atuar de acordo com os preceitos elencados na Carta Maior. Para tanto, se faz necessário a ampliação dos padrões éticos de comportamento, da estimulação das boas práticas de governança corporativa e do combate a corrupção privada.
As políticas de Responsabilidade Social Corporativa (RSC) e de Responsabilidade Social Empresarial (SER), no campo da ética, estão cada vez mais regulamentadas para se ajustarem aos valores definidos como essenciais pelos Direitos Humanos.[8]
Os paradigmas da atividade econômica empresarial relacionados à temática “Empresa e Direitos Humanos” se referem ao respeito pela dignidade da pessoa humana e à efetivação de tais direitos, no contexto empresarial. Por ser elemento central da tutela dos direitos humanos, a dignidade da pessoa humana deve ser objeto de atenção constante pelos agentes econômicos e empresários, em todos os campos de atuação, sobretudo nos contextos corporativos.
A efetivação dos direitos humanos, no âmbito da Responsabilidade Social Corporativa (RSC)[9] se dá pela criação de empregos, desenvolvimento da tecnologia em benefício da sociedade, geração de renda, preservação do meio ambiente, igualdade, comportamento ético e combate à corrupção privada.
De acordo os dados da Global Justice Now, em 2015[10], das 100 maiores economias mundiais, 31 (trinta e uma) eram Estados e 69 (sessenta e nove) eram empresas multinacionais, com faturamento anual superior ao Produto Interno Bruto de inúmeros países. Esses números indicam a relevância dos impactos que as atividades das empresas podem causar à sociedade e direta ou indiretamente na efetivação dos direitos humanos.
O compromisso da empresa com a dignidade da pessoa humana e com a efetivação dos direitos humanos decorre, entre outros fundamentos, da sua função social. O Princípio da Função Social da Empresa tem fundamento no artigo 5º, XXIII da Constituição Federal de 1988, no artigo 966 do Código Civil, além de outras normas infraconstitucionais, a exemplo do artigo 154 da Lei 6404/1976, segundo o qual o administrador da sociedade anônima deve exercer suas atribuições legais e estatutárias no em busca da satisfação do interesse da companhia, do interesse público e da função social da empresa.
No Projeto do Novo Código Comerical, o Princípio da Função Social da Empresa está previsto no art. 8º, o qual asinala que a empresa cumpre sua função econômica e social ao gerar empregos[11], tributos e riqueza, ao contribuir para o desenvolvimento econômico da comunidade em que atua, e ao adotar práticas empresariais com observância de toda legislação aplicável à sua atividade.
No mesmo sentido, ao reconhecer que o contrato empresarial deve cumprir a sua função social, o art. 371 do Projeto do Novo Código Comercial (PNCC) aponta que o contrato cumpre a sua função social e econômica quando, atendendo ao interesse das partes, não causa prejuízo ao interesse público[12]. Além disso, o art. 372 do PNCC, prevê que as cláusulas dos contratos empresariais devem ser interpretadas tendo em vista o cumprimento da função sócio-econômica do contrato.
Entende-se que, por se tratar de matéria de ordem pública, o Princípio da Função Social da Empresa deve ser aplicado pelo juiz, independentemente do pedido da parte[13].
O desempenho da função social da empresa e a proteção dos humanos estão relacionados, ainda, ao cumprimento dos deveres societários ou corporativos que, por seu turno, são informados pelos Princípios Norteadores do Código Civil, sendo eles: o Princípio da Socialidade, o Princípio da Eticidade e o Princípio da Operabilidade.
Em síntese, o Princípio da Sociabilidade, indica que os direitos coletivos prevalecem sobre os direitos individuais, bem como que os direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana devem ser respeitados em todas as relações de direito privado. Desse princípio decorrem os princípios da função social do contrato, da função social da propriedade e da função social da empresa[14].
O Princípio da Eticidade[15], de outro lado, estabelece que todas as pessoas participantes das relações de direito privado, inclusive no âmbito empresarial, devem se comportar eticamente, segundo o princípio da boa-fé objetiva.
Finalmente, o Princípio da Operabilidade recomenda a utilização de instrumentos jurídicos mais práticos e eficientes para a efetivação dos direitos, de modo que eles possam concretizados com mais rapidez e eficiência.
Os efeitos do Princípio da Função Social do contrato são amplos e abrangem todas as modalidades negociais privadas, incluindo as relações societárias contratuais e estatutárias. Logo, a prevalência dos direitos coletivos sobre os direitos individuais, a observância dos direitos fundamentais e o respeito à dignidade da pessoa humana são referências que precisam ser observadas em todas as relações empresariais, notadamente no âmbito societário e corporativo.
A propósito, segundo a teoria da eficácia horizontal, ou eficácia externa, os direitos fundamentais devem ser aplicados nas relações jurídicas que envolvem particulares. Essa teoria é também denominada de teoria da eficácia privada, tendo em vista que defende a projeção dos direitos fundamentais sobre as relações travadas entre particulares. A jurisprudência brasileira adota majoritariamente o posicionamento da teoria da eficácia horizontal direta[16]. Nesse sentido, entre outros, são os seguintes julgados do Supremo Tribunal Federal: RE 158.215-4/RS, no qual se reconheceu o direito ao contraditório e à ampla defesa nos casos de exclusão de sócios de pessoas jurídicas privadas, e o RE 161.243-6/DF, cujo julgamento reconheceu a necessidade de estatuto comum para todos os colaboradores da companhia aérea Air France, sem diferenciação entre cidadãos franceses e cidadãos de outros países.
A mesma amplitude tem o Princípio da Eticidade, outro paradigma essencial do Código Civil de 2002, que conferiu lugar de destaque ao princípio da boa-fé objetiva. O princípio da boa-fé objetiva e o dever de lealdade são parâmetros fundamentais de todas as relações jurídicas, seja no plano negocial privado, nas relações corporativas ou mesmo nas relações familiares, como se nota do art. art. 1.724, do Código Civil, ao estipular que as relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência etc.
O princípio da boa-fé objetiva se expressa pelos seus deveres anexos: i) dever de cuidado: as partes devem agir com cuidado, para evitar danos aos demais sujeitos que possam sofrer os efeitos das relações negociais; ii) dever de respeito: as partes devem conferir tratamento respeitoso entre si, agindo sempre de maneira cordial e urbana; iii) dever de informar: as partes devem prestar todas as informações relacionadas às questões que envolvem o negócio jurídico; iv) dever de não frustrar: considerando as expectativas que as suas condutas provocam nos demais, a parte não pode frustrar a confiança dos demais sujeitos que participam da relação negocial; v) dever de lealdade e probidade: as partes devem ser leais e agir com probidade em todos os planos e momentos da relação negocial; vi) dever de honestidade: todos os contratantes devem agir honestamente, de maneira transparente e franca com os demais sujeitos; vii) dever de ser razoável: as partes devem atuar de maneira razoável para com os demais sujeitos que participam da relação de direito privado.
Além de agir para alcançar os objetivos econômicos da empresa, os administradores das sociedades devem agir com retidão, cuidado e diligência, de modo que não sejam tomadas quaisquer decisões administrativas capazes, em tese, de desrespeitar a dignidade da pessoa humana ou violar direitos fundamentais.
O dever de diligência determina que o administrador das sociedades atue de modo cuidadoso e diligente. Nesse sentido, espera-se que o administrador detenha conhecimento técnico específico, esteja ciente da função social da empresa e saiba que, apesar dos propósitos negociais, a sociedade empresária não pode tolerar qualquer violação de direitos humanos, sob pena de responsabilização.[17] O dever de diligência é de meio e não de resultado. Logo, só poderá haver responsabilização por violação do dever de diligência se o administrador agir ao menos com culpa.[18] Conforme indicado por Marlon Tomazette, o ordenamento jurídico brasileiro adotou o duty of care, do direito norte-americano. Trata-se, em linhas gerais, dos deveres atribuídos aos administradores de sociedades no sentido de que devem atuar sempre orientados pela boa-fé, praticando condutas com cautela e prudência, para atender da melhor maneira aos interesses da companhia e cumprir os seus fins sociais.[19]
Além disso, o administrador deverá sempre procurar dar cumprimento aos propósitos sociais da companhia, buscando a obtenção dos melhores resultados, de modo que, juntamente com as vantagens econômicas, sejam preservados os interesses público e social. Nesse sentido, o art. 154, da Lei nº 6.404/1976 (Lei das Sociedades Anônimas) prevê expressamente que o administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem, para lograr os fins da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa.
Portanto, para que se repute que o administrador da sociedade agiu com retidão, e que o seu comportamento foi cuidadoso e diligente, é preciso que os atos praticados pelo gestor estejam alinhados à função social da empresa e às diretrizes constitucionais fundamentais de respeito à dignidade da pessoa humana. O descumprimento desses deveres poderá implicar responsabilidades civis, administrativas e até criminais dos administradores e das próprias sociedades empresárias.[20]
3. Diretrizes Nacionais sobre Empresas e Direitos Humanos – DNEDH
Para reforçar o respeito aos direitos humanos é importante que as empresas também sigam as Diretrizes Nacionais sobre Empresas e Direitos Humanos (DNEDH), instituídas pelo Decreto nº 9.571/2018. Essas diretrizes estão alinhadas às orientações do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3`), aprovado pelo Decreto nº 7.037/2009, que trata da responsabilidade empresarial na efetivação dos direitos humanos em diversos aspectos.
Tanto o PNDH-3 como as DNEDH reconhecem que a empresa tem, não apenas, a obrigação de respeitar os direitos humanos, mas, inclusive, de contribuir para a ampliação e efetivação desses direitos. Além disso, o PNDH-3 e as DNEDH destacam a importância da fiscalização do respeito aos Direitos Humanos nos projetos implementados pelas empresas transnacionais, bem como seus impactos na manipulação das políticas de desenvolvimento.
Entre outros, o PNDH-3 trata dos seguintes temas: i) fiscalização do respeito aos direitos humanos nos projetos implementados pelas empresas transnacionais, bem como dos seus impactos na manipulação das políticas de desenvolvimento; ii) valorização da pessoa humana como sujeito central do processo de desenvolvimento e recomendação da adoção de código de conduta em direitos humanos; iii) necessidade da adesão de empresas ao compromisso de responsabilidade social e direitos humanos; iv) importância do fortalecimento dos diálogos e das parcerias permanentes com os membros de movimentos populares, entidades não governamentais, empresários e congêneres; e v) conquista do compromisso ético com a afirmação histórica dos direitos humanos; e vi) relevância estratégica dos meios de comunicação de massa na construção da cultura de respeito e proteção aos direitos humanos, com participação dos profissionais e empresários.
As DNEDH se assentam sobre os seguintes eixos orientadores: i) obrigação do Estado com a proteção dos direitos humanos em atividades empresariais; ii) responsabilidade das empresas com o respeito aos direitos humanos; iii) acesso aos mecanismos de reparação e remediação para aqueles que, nesse âmbito, tenham seus direitos afetados; e iv) implementação, monitoramento e avaliação das diretrizes.
Em que pese o Decreto nº 9.571/2018 não tenha força de lei, e se refira apenas às médias e grandes empresas, entendemos que todas as empresas precisam respeitar os direitos humanos e adotar medidas adequadas para a efetivação desses direitos. Nesse caso, até mesmo as microempresas e as empresas de pequeno porte, dentro das suas possibilidades, devem tomar providências favoráveis aos direitos humanos, inclusive seguindo as DNEDH.
Como meio de incentivo à adoção das referidas diretrizes, caso as empresas adotem as DNEDG elas poderão utilizar o selo “Empresa e Direitos Humanos”, nos limites impostos pelo então Ministério dos Direitos Humanos. Naturalmente, a certificação de alinhamento com os mencionados direitos amplia a legitimidade da empresa no mercado e atrai mais investidores. Trata-se, portanto, de eficiente recurso de incentivo à adoção de medidas protetivas aos direitos humanos.
O PNDH – 3 e as DNEDH, em síntese, realçam a necessidade de que os direitos humanos e a dignidade da pessoa humana sejam utilizados como parâmetros pelos agentes econômicos e por todos os sujeitos ligados, direta ou indiretamente, às atividades empresariais, sejam no âmbito privado, público, interno ou internacional.
Como dito, todos os empresários, em sentido amplo, precisam respeitar a dignidade da pessoa humana e contribuir para a efetivação dos direitos humanos. Para, isso, sem prejuízo da observância das diretrizes assinaladas acima, os empresários devem fortalecer a ética empresarial[21], estimular as boas práticas de governança corporativa, censurar severamente todo tipo de preconceito, promover a inclusão de pessoas tradicionalmente excluídas do mercado de trabalho, contribuir para a ampliação da presença das mulheres nos ambientes corporativos e combater a correção privada.[22]
Não há dúvidas de que a efetivação dos direitos fundamentais pelo empresário pode se dar pelo combate à discriminação nas relações de trabalho e pelo respeito da diversidade, inclusive com a assunção das seguintes medidas: i) atribuição de igualdade de remuneração para colaboradores que exerçam atividades semelhantes; ii) desenvolvimento de políticas de metas percentuais para preenchimento de vagas por pessoas vulneráveis à discriminações; iii) promover acesso da juventude à formação para o trabalho; iv) promover acesso do idoso ao trabalho; v) promover acesso ao trabalho de pessoas com deficiência; vi) promover acesso ao trabalho de pessoas que façam parte de grupos populacionais tradicionalmente discriminados; vii) estimular e promover o trabalho da mulher; viii) respeitar a orientação sexual dos trabalhadores e colaboradores.
O tratamento especial conferido para algumas categorias jurídicas, objetivando justamente o equilíbrio dos direitos e garantias, é legitimado pela Constituição Federal, como se nota no caso dos índios[23], das mulheres [24], dos eclesiásticos[25], portadores de necessidades especiais, idosos etc.
Com relação às mulheres, a Declaração adotada na III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em Durban, em 2001, ressalta o dever dos Estados de “adotar uma perspectiva de gênero que reconheça as múltiplas formas de discriminação que podem afetar as mulheres e que o gozo de seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais é essencial para o desenvolvimento das sociedades em todo o mundo”.[26]
Para que tais objetivos sejam possíveis, a governança corporativa, o estimulo das boas práticas e o combate à corrupção privada tem papel fundamental, tanto norteador como reeducativo.
4. Ética empresarial e as boas práticas de governança corporativa
No contexto corporativo, a ética empresarial é um dos fatores mais importantes para se garantir o respeito à dignidade da pessoa humana e promover a efetivação dos direitos fundamentais.
A criação de códigos de conduta e a adoção de boas práticas de governança corporativa[27], por outro lado, são meios eficientes para fortalecer a ética empresarial.
É possível se falar em ética profissional, relacionada às atividades profissionais gerais, sobretudo no campo intelectual, e ética empresarial, relacionada às atividades econômicas desenvolvidas por empresários. [28] Os códigos de boa prática de governança corporativa cuidam dessa segunda modalidade.
A adoção de padrões éticos no âmbito empresarial passou a ser estimulada principalmente em normas anticoncorrenciais (antitruste)[29]. O Act for the prevention and supression of combinations formed in restraint of trad, lei antitruste canadense de 1889 e o Shelman Act, lei antrituste americana de 1890, posteriormente complementada pelo Clayton Act, em 1914, são dois marcos importantes nesse tema. Essas normas criaram alguns padrões comportamentais de natureza ética que deveriam ser seguidos pelas empresas. A Shelman Act, por exemplo, censurava a estipulação discriminatória de preços de produtos oferecidos aos clientes por sociedades empresárias. A fiscalização desses comportamentos seria realizada pela Federal Trade Comission, agência antitruste americana, que serviu de modelo para a criação, no Brasil, do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), pela lei nº 8.884/94, posteriormente revogada pela lei nº 12.529/2011[30].
A governança corporativa, intimamente relacionada à ética empresarial e à dignidade da pessoa humana, foi internacionalmente reconhecida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que criou o Business Sector Advisory Group on Corporate Governance, ambiente de discussão sobre questões relacionadas à governança corporativa. Essas orientações internacionais de comportamentos éticos aos poucos vão servindo como referências para a criação de normas internas, reformas legislativas e atuação de órgãos de fiscalização de vários países do mundo[31].
A governança corporativa é conjunto de boas práticas de gestão empresarial, pautado na ética e destinado a conferir mais segurança, objetividade e eficiência às atividades empresariais.[32] O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC)[33], a define como um sistema de direção, monitoramento e incentivo de empresas, que envolve os relacionamentos entre os sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização, controle e demais interessados. De acordo com o IBGC, essas boas práticas transformam princípios abstratos básicos de boa gestão em recomendações objetivas, mediante o alinhamento de interesses relacionados à empresa para preservar seus valores e contribuir para sua longevidade.
As boas práticas de governança corporativa se assentam sobre os seguintes eixos: a transparência das informações, o tratamento isonômico, a prestação de contas e a responsabilidade corporativa[34]. Princípios de orientação para o cumprimento das práticas.
De acordo com o primeiro eixo, as sociedades empresárias precisam prestar informações amplas, claras e objetivas para todos os interessados em conhecer as suas condições (stakeholders). Além das informações exigidas pela lei, como a divulgação de balanços periódicos, os empresários precisam oferecer aos interessados todas as informações que possam ser por eles reputadas relevantes.
As companhias devem conferir tratamento isonômico para todos os sujeitos que se relacionam direta ou indiretamente com elas[35]. O princípio da isonomia ou da equidade recomenda que os empresários confiram tratamento isonômico a todas as pessoas que possam ter algum interesse nas sociedades empresárias (stakeholders), inclusive os sócios minoritários. A propósito, em atenção ao princípio da isonomia, as companhias devem adotar normas que protejam os acionistas minoritários de eventuais abusos praticados por acionistas majoritários.
Além disso, a prestação de contas deve ser desenvolvida por meios de sistemas seguros, com adoção de critérios objetivos, eficientes e internacionalmente aceitos (accountabillity).
Por fim, a responsabilidade corporativa exige que os gestores e controladores das companhias tomem medidas para garantir a sustentabilidade e contribuir para o desempenho da função social da empresa.
Esses eixos da governança corporativa servem como parâmetros gerais para a adoção das boas práticas de governança nas sociedades empresárias e, por conseguinte, resguardar a dignidade da pessoa humana e respeitar os direitos fundamentais. No entanto, sua efetivação no âmbito das atividades empresariais, pressupõe o cumprimento de uma série de deveres por parte dos sócios, acionistas e administradores da sociedade.
Ao adotar as boas práticas de governança corporativa e assumir comportamentos éticos, além de evitar responsabilidades civis, administrativas e criminais, as companhias podem ter vantagens de mercado, por exemplo com acesso a determinados seguimentos de listagens de títulos, restritos às empresas que adotam certos parâmetros comportamentais. A BM&F Bovespa (atualmente B3 S.A.) criou em 2002 segmentos especiais para companhias que adotassem certos padrões de governança corporativa. Essa iniciativa buscou ampliar os interesses dos investidores e aumentar a valorização de companhias abertas que praticassem políticas de governança corporativa.
5. Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU)
É de fundamental importância que os códigos de ética, pautados nas boas práticas de governança corporativa, estejam alinhados com a Agenda 2030[36] para o desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU)[37], uma vez que visa à proteção dos seres humanos, à preservação e prosperidade do planeta, além do fortalecimento da liberdade e da paz universal, cujas implementações devem ser feitas em parcerias colaborativas por todos os países e partes interessadas. A concepção do plano se assenta na premissa de que o maior desafio atual é, em todos os seus aspectos, garantir uma vida digna para todos.
A agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU) é um plano de ações destinadas à proteção dos seres humanos, à preservação e prosperidade do planeta, além do fortalecimento da liberdade e da paz universal, cujas implementações devem ser feitas em parcerias colaborativas por todos os países e partes interessadas. A concepção do plano se assenta na premissa de que o maior desafio atual é a erradicação da pobreza, em todos os seus aspectos.
Fazem parte da Agenda 2030 objetivos de desenvolvimento sustentável e metas, construídos sobre o legado dos objetivos de desenvolvimento sustentável do milênio. São 17 (dezessete) objetivos de desenvolvimento sustentável e 169 metas que se destinam à concretização dos direitos humanos, à igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres e meninas. Todas as ações, integradas e indivisíveis, estão conjugadas às dimensões econômica, social e ambiental do desenvolvimento sustentável.
Os objetivos de desenvolvimento sustentável buscam o seguinte: i) erradicação da pobreza, em todos os seus aspectos e lugares do planeta; ii) eliminação da fome em todo o planeta, promoção da agricultura sustentável, obtenção de segurança alimentar e melhoria da nutrição dos seres humanos; iii) garantia de vida saudável e de bem-estar para todas as pessoas, independentemente das condições e idades; iv) desenvolvimento da educação inclusiva, equitativa e de qualidade, com oferta de oportunidades de aprendizagem para todas as pessoas no decorrer de suas vidas; v) garantia da igualdade de gênero e do empoderamento de todas as mulheres e meninas; vi) promoção do acesso à água e saneamento para todos; vii) estímulo do acesso à energia sustentável com preço acessível; viii) impulsionamento do crescimento econômico, inclusivo e sustentável, estímulo do emprego pleno, produtivo e do trabalho digno para todos; ix) incentivo à industrialização inclusiva, sustentável e inovadora; x) diminuição das desigualdades em todos os sentidos, dentro e fora dos países; xi) contribuição para que as cidades e os assentamentos humanos sejam amplamente inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis; xii) desenvolvimento de padrões sustentáveis de produção e consumo; xiii) adoção de medidas urgentes para o combate de mudanças climáticas prejudiciais ao planeta; xiv) preservação e uso sustentável dos oceanos e dos recursos aquáticos; xv) proteção, preservação e recuperação dos ecossistemas terrestres; xvi) criação de sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, com promoção do acesso à justiça para todos e consolidação de instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis; xvii) ampliação e fortalecimento dos meios de implementação das parcerias globais para o desenvolvimento sustentável.
No contexto desse último objetivo, a agenda 2030 se compromete a promover a criação de um sistema multilateral aberto, equitativo e não discriminatório de comércio universal, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). A criação desse sistema decorre, inclusive, da finalização das negociações assinaladas na Agenda de Desenvolvimento de Doha. Na agenda 2030 também há comprometimento com o incentivo do aumento das exportações globais dos países em desenvolvimento e da implementação de acesso a mercados livres de cotas e taxas, de forma duradoura, para todos os países menos desenvolvidos.
A respeito das metas de natureza sistêmica, pretende-se: i) o aumento da estabilidade macroeconômica global, sobretudo pela conjugação das políticas correspondentes; ii) a ampliação da compatibilidade e coerência das políticas destinadas ao desenvolvimento sustentável; iii) a criação de espaços políticos e lideranças em cada país, para o estabelecimento e ampliação de políticas voltadas à erradicação da pobreza e ao desenvolvimento sustentável; iv) o reforço das parcerias globais para o desenvolvimento sustentável, com colaborações de vários setores para compartilhamento de conhecimentos, tecnologias e recursos financeiros; v) o incentivo e a promoção de parcerias eficazes, no âmbito público e privado, segundo as experiências das estratégias anteriores.
Para monitorar a eficiência das ações é preciso ampliar a disponibilidade de dados de alta qualidade, atuais e confiáveis, segmentados, entre outros, por critérios de renda, gênero, idade, raça, etnia, status migratório, deficiência e localização.
São esses os objetivos e metas gerais da Organização das Nações Unidas (ONU) para o desenvolvimento sustentável que, segundo nosso entendimento, deveriam servir de referências para as atividades empresariais e, sobretudo, como parâmetros para os códigos de boas práticas de governança corporativa.
6. Combate à corrupção empresarial
Além das diversas referências já assinaladas, a importância do comportamento ético das empresas e do combate à corrupção empresarial, também são formas de garantir o exercício adequado da livre iniciativa, a produção de efeitos empresariais que prestigiem a efetivação dos direitos fundamentais e o respeito à dignidade da pessoa humana.
A partir de 2005, foi reafirmada pelo Pacto Empresarial pela Integridade e Contra a Corrupção - PEICC, elaborado pelo Instituto Ethos, com a colaboração das Relações Governamentais & Políticas Públicas, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, do Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime – ENODC e do Comitê Brasileiro do Pacto Global.[38] As diretrizes do Pacto Empresarial pela Integridade e Contra a Corrupção - PEICC se apoiam na Carta de Princípios de Responsabilidade Social, na Convenção da ONU contra a Corrupção, no 10º princípio do Pacto Global e nas diretrizes da OCDE.
O combate eficaz da corrupção privada depende da criação de canais adequados para o encaminhamento de denúncias e meios eficientes de responsabilizações dos agentes envolvidos.[39] Embora a corrupção privada no Brasil ainda não esteja tipificada como crime, diversas normas jurídicas do ordenamento procuram contribuir para a diminuição da corrupção no âmbito empresarial e ampliar a adoção de posturas éticas por agentes econômicos que atuam no mercado.
A lei nº 12.846/2013, denominada Lei Anticorrupção ou Lei da Anticorrupção Empresarial, trata da responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas de direito privado pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. A mencionada lei procura punir agentes econômicos que praticam ou colaboram com a prática de atos lesivos ao interesse público. A apuração das responsabilidades das empresas ocorrerá sempre por meio de um Processo Administrativo de Responsabilização (PAR).
Na referida Lei Anticorrupção também são elencadas algumas diretrizes para que as empresas construam ou aperfeiçoem instrumentos destinados à prevenção, detecção e remediação de atos lesivos à administração pública, tais como suborno de agentes públicos nacionais ou estrangeiros, fraude em processos licitatórios ou embaraço às atividades de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos. De acordo com o artigo 5º da Lei da Anticorrupção Empresarial, são lesivos à administração pública os atos que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.
Com relação à responsabilização administrativa, o art. 7º, inciso VIII, da Lei da Anticorrupção empresarial, prevê que, além de outros aspectos, será considerada na aplicação das sanções a (in)existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades, além da aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da empresa.
De acordo com o art. 41, do Decreto nº 8.420/2015, que regulamenta a Lei da Anticorrupção Empresarial, os programas de integridade das empresas são conjuntos de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades, com previsão de aplicação efetiva de normas de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes, com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
É possível dizer, em linhas gerais, que os programas de integridade focalizam medidas de anticorrupção adotadas pelas empresas, notadamente as que objetivam à prevenção, detecção e remediação dos atos lesivos contra a administração pública e violadores dos direitos fundamentais.
Atualmente, muitos empresários têm seu próprio código de ética, ainda que não atuem em seguimentos que ensejam contratações frequentes com o Poder Público. Entre outros, podem ser citados o Grupo Malwee, Saraiva, L’oréal e Natura.
Considerando que o acesso à informação é um direito fundamental, merecem aplausos algumas medidas da Lei da Anticorrupção Empresarial que prestigiam a publicidade e, indiretamente, desestimulam a prática de condutas antiéticas. Assim, foram criados o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas Suspensas (CEIS) e do Cadastro Nacional de Empresas Punidas (CNEP). Além de outros dados indicados pela Controladoria-Geral da União (CGU), os mencionados cadastros indicam empresas punidas e os detalhes das sanções aplicadas, nos termos dos artigos 43 e seguintes do Decreto nº 8.420/2015. Essa publicidade contribui para a divulgação de dados públicos, desestimula a prática da corrupção e, por conseguinte, amplia a efetivação do direito fundamental de acesso à informação.
Para finalizar, é indispensável lembrar que, segundo o artigo 8º, do Código de Processo Civil, sempre que for aplicar normas jurídicas, inclusive as de direito empresarial, “o juiz deve atentar para os fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência”.
Conclusão
Pelo exposto, se conclui que os Direitos Humanos são garantias jurídicas universais que visam proteger as pessoas tanto contra ações como contra omissões que ferem as liberdades, os direitos fundamentais e a dignidade humana.
Como a dignidade da pessoa humana é elemento central da tutela dos direitos fundamentais, ela deve ser respeitada por todos, nos mais variados seguimentos, inclusive nos ambientes corporativos.
Demonstramos que o empresário, assim como os demais agentes econômicos, tem o dever de respeitar a dignidade da pessoa humana e contribuir para a realização dos direitos fundamentais. A temática “Empresa e Direitos Humanos” trata justamente dos meios de proteção e efetivação dos direitos humanos no contexto empresarial.
Ademais, vimos que o compromisso da empresa com a dignidade da pessoa humana e com a efetivação dos direitos humanos tem fundamento, entre outros, no Princípio da Função Social da Empresa, no Princípio da Função Social dos Negócios Jurídicos, no Princípio da Função Social da Propriedade, no Princípio da Eticidade, no Princípio da Boa-fé e no Princípio da Operabilidade.
Além disso, foi demonstrado que o respeito à dignidade da pessoa humana e a efetivação dos direitos fundamentais, no âmbito empresarial, pode ser alcançado pela ampliação dos padrões éticos de comportamento, pelo estímulo das boas práticas de governança corporativa e pelo combate à corrupção privada.
Os direitos humanos, incorporados pela CF, norteiam o aparato legal do Estado, que deverá regular todas as suas atividades, bem como consolidar direitos e obrigações. No que concerne à atividade empresarial, busca-se, cada vez mais, estabelecer o respeito à função social da empresa com respeito à dignidade da pessoa humana. Ademais, procura-se consolidar direitos humanos como a igualdade em suas diferentes facetas: gênero, idade, capacidades físicas, respeitadas suas especificidades.
Para tanto, a regulamentação da matéria tem como elemento central as diretrizes da ONU, a Constituição Federal as novas infraconstitucionais, notadamente as mencionadas no corpo do trabalh. Essa construção vem sendo elaborada pelo próprio setor empresarial e pela sociedade.
Apensar dos avanços, contudo, há muito que se evoluir para lograr uma maior efetivação dos direitos humanos e, assim, garantir a dignidade da pessoa humana.
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