Questão de grande discussão na esfera trabalhista após a edição da Lei 13.467/17 (Reforma Trabalhista) diz respeito à legitimação da vítima no que tange o dano extrapatrimonial.
Segundo leitura do artigo 223-A da CLT, o dano extrapatrimonial (aqui compreendido o dano moral), deve ser regido unicamente pelas regras do texto consolidado e o artigo 223-B determinou que a pessoa física ou jurídica é titular exclusiva do direito à reparação pelo dano sofrido em decorrência da ofensa moral ou existencial sofrida.
Como se percebe, pela leitura e interpretação gramatical da norma, apenas aquele que sofre a lesão está legitimado a receber indenização, excluindo, por essa regra, a possibilidade dos herdeiros e dependentes serem titulares da reparação.
Surge, aqui, a controvérsia: pode um filho requerer indenização extrapatrimonial do empregador de seu genitor em decorrência do óbito deste em acidente de trabalho típico?
Conforme visto acima, analisando o texto de maneira fria, positivista, com a morte do trabalhador cessa o direito à indenização, posto que apenas a vítima, exclusivamente ela, é titular da pretensão da reparação extrapatrimonial.
Verifica-se de plano, que o espólio não está, portanto, legitimado a pleitear indenização por danos extrapatrimoniais, apenas possuindo legitimidade para requerer valores decorrentes de eventuais infrações ao contrato de trabalho, tais como horas extras, adicionais de periculosidade/insalubridade, ausência do pagamento de verbas rescisórias, entre outras.
Já no que tange ao dano moral suportado pela família do trabalhador falecido em acidente de trabalho, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) vinha se posicionando no sentido de que compete a cada herdeiro ou dependente, desde que comprovada a lesão sofrida em sua esfera subjetiva, pleitear a indenização, contudo, diante da reforma à legislação trabalhista, sendo a vítima a titular exclusiva do direito à reparação extrapatrimonial, esse entendimento, em regra, deveria ser revisto.
Contudo, as linhas de interpretação são das mais diversas, havendo resistência pelo Judiciário Trabalhista em aplicar a reforma legislativa nesse aspecto, visto que para muitos a morte do trabalhador, por si só, é motivo suficiente para gerar o direito ao dano moral de seus familiares, visto que o falecido deixará de prover a manutenção e subsistência de seus dependentes.
Com efeito, afastando-se da interpretação literal do artigo 223-B, CLT, o Judiciário pode se valer do artigo 8º do mesmo diploma legal, para aplicar de forma subsidiária as regras do Código Civil, em especial o artigo 943, segundo o qual “o direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança”.
Na esteira desse entendimento, em 02 de dezembro de 2020, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou a edição da Súmula 642, estabelecendo que “o direito à indenização por danos morais transmite com o falecimento do titular, possuindo os herdeiros da vítima legitimidade ativa para ajuizar ou prosseguir na ação indenizatória”.
Percebe-se, por esse raciocínio, que as decisões não irão afastar os chamados danos em ricochete, ou seja, aqueles sofridos pelos familiares do trabalhador em caso de falecimento, inclusive pelo fato desses danos, segundo parte da doutrina, possuírem natureza de reparação civil, ainda que competente a Justiça do Trabalho.
Nesse sentido, se já havia uma tendência pelo Judiciário de que os herdeiros possuíam legitimidade para requerer indenização por danos extrapatrimoniais (morais), a Súmula 642, STJ, chegou para reforçar essa teoria, havendo grande possibilidade da magistratura trabalhista abraçar esse entendimento e tornar letra morta ou adequar, por assim dizer, a interpretação da regra de exclusividade prevista no artigo 223-B, CLT, em caso de óbito do trabalhador por acidente de trabalho.