POPULAÇÃO CARCERÁRIA

direito fundamental a saúde

19/12/2020 às 08:25
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Palavras-Chave: Sistema Penitenciário. População Carcerária. Direitos Fundamentais. Assistência Médica e Higiênica.

AUTOR: RAPHAEL OLIVEIRA DA SILVA

Possui Graduação em Direito - Faculdade Sudamérica de Cataguases - MG (2013). Especialista em Direito Penal e Processual Penal - Universidade Estácio de Sá (2016). Atualmente matriculado no curso de Doutorado em Direito Penal na Universidade de Buenos Aires em convênio com a Associação Nacional dos Docentes Mestrandos e Doutorandos do Brasil.

 

 

                         POPULAÇÃO CARCERÁRIA: direito fundamental a saúde

 

 

RESUMO

O presente artigo tem como finalidade avaliar o sistema penitenciário brasileiro, abordando sobre a assistência médica e higiênica prestadas aos encarcerados. Neste trajeto, será analisado os direitos fundamentais, o direito a saúde e o plano nacional de saúde no sistema carcerário.

Palavras-Chave: Sistema Penitenciário. População Carcerária. Direitos Fundamentais. Assistência Médica e Higiênica.

 

 

 

SUMÁRIO           

1 - INTRODUÇÃO. 2 - DIREITOS FUNDAMENTAIS. 3 - DIREITO A SAÚDE. 4 - ASSISTÊNCIA MÉDICA E HIGIÊNICA. 5. PLANO NACIONAL DE SAÚDE NO SISTEMA CARCERÁRIO. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.

 

 

1 INTRODUÇÃO

   Observa-se que a dignidade da pessoa humana é uma virtude interna e que distingue cada ser humano, fazendo-o mais digno do respeito por parte do Estado, a dignidade humana é uma característica da pessoa e não pode ser mensurada por um único fator, pois tal direito se incide na combinação dos aspectos morais, políticos, econômicos e sociais.

   Essa dignidade serve como uma garantia de condições existenciais mínimas para assim um ser humano ter uma vida saudável, sendo um princípio fundamental garantido pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

   Ao transcorrer do tempo a relação existente entre quem comete um delito e a pena, passou por inúmeras transformações, vale salientar que antes o acusado era visto como um mero objeto, desprovido de direitos fundamentais e taxado como culpado até que conseguisse provar o contrário.

   Nos dias atuais houve um grandioso avanço, sendo que na atualidade o acusado passou a ser considerado como um sujeito de direitos e presumivelmente inocente até que seja comprovada sua culpabilidade, após a sentença condenatória transitada em julgado e no momento em que tenham sido garantidos os seus direitos, como o contraditório, da ampla defesa, para assim continuar sendo preservada a dignidade e a honra da pessoa humana.

 

2 DIREITOS FUNDAMENTAIS

   Da mesma forma que os encarcerados devem obedecer às normas de uma penitenciária, tal instituição carcerária tem a obrigação de garantir todos os direitos fundamentais dos encarcerados que não forem alcançados pela sentença ou pela lei, a dignidade da pessoa humana é, de suma importância, o princípio norteador que o Poder Público deve respeitar, independentemente de merecimento social ou pessoal, sendo assim tal direito inerente à pessoa.

   Não há limites para delimitar uma dignidade, entre os direitos pertencentes à dignidade, cita-se os que se referem às condições mínimas e básicas para a vida do ser humano na sociedade, como os direitos fundamentais que são referentes à vida, educação, saúde e alimentação.

   Dentre todos os direitos fundamentais para o mínimo de dignidade que o ser humano necessita, destaca-se o direito à saúde, previsto no artigo 196 da Constituição Federal de 1988.

   Sendo ainda tal preceito legal complementado pela Lei número 8.080, de 19 de setembro de 1990, a qual ilustra no seu artigo 2° que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”.

   Ao analisarmos a situação precária da saúde pública que todos os cidadãos necessitam para ter sua dignidade adquirida, imagina-se a situação da população carcerária no tocante a saúde, pois necessitam de uma vida saudável para assim conseguirem uma ressocialização adequada na sociedade ao saírem em liberdade.

         

3 DIREITO A SAÚDE

    A saúde é o momento em que adquirimos um bem estar mental, social e físico, não pensando somente na ausência de doenças, sendo assim um direito de todo ser humano usufruir de um bem estar.

  A grave situação das pessoas que se encontram em cárcere, privadas de sua liberdade, com precariedade de espaço físico e com carência de um atendimento à saúde é uma triste realidade que ocorre no Brasil.

   Saliento que, embora existam tantas leis e tratados internacionais para proteger a dignidade da população carcerária que se encontram nas cadeias e penitenciárias do Brasil, fica claro que estas não vêm sendo cumpridas, acabando assim com a dignidade da pessoa humana.

   No instante em que o Estado se recusa a fornecer tais direitos ao cidadão encarcerado, o Estado estará transgredindo preceitos legais infraconstitucionais e internacionais, conforme supracitado no artigo 196 da Constituição Federal.

 

4 ASSISTÊNCIA MÉDICA E HIGIÊNICA

   Segundo a Lei número 7.210, de 11 de julho de 1984, denominada Lei de Execução Penal, em seus artigos 12 e 14, ilustram que:

“Artigo 12: A assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas.

“Artigo 14: A assistência do preso e do internado de caráter preventivo e curativo compreenderá no atendimento médico, farmacêutico e odontológico.”

   Se comparada tal situação apresentada nos artigos 12 e 14 da Lei de Execuções Penais supracitados com a situação dos estabelecimentos carcerários brasileiros, observamos que está totalmente fora dos preceitos legais.

   Conforme relatos, as situações das unidades carcerárias se encontram precárias, com condições de higiene desumana, com espaço físico apertado, com superlotação, vale ressaltar a situação feminina dentro das unidades carcerárias, todavia sendo que tais unidades foram criadas pensadas no sexo masculino, compete dar atenção as mulheres encarceradas, pois as mesmas não tem os cuidados necessários com sua saúde ginecológica e obstétrica, sendo que muitas vezes não há meios de transporte para levá-las ao atendimento médico especializado, outro exemplo de higiene precária seriam os banheiros coletivos.

   Vale destacar também a falta de acompanhamento psicossocial, o qual é deficiente nas unidades carcerárias, principalmente na forma para se prevenir doenças mentais e contagiosas, como o caso da Aids, além de manter o foco em se conseguir uma adequada ressocialização do detento na sociedade. Discorrendo sobre a doença que mata milhões de pessoas, mas que pode ser controlada com o tratamento, a Aids, que por diversas vezes o preso chega ao estado terminal da doença, sem ter tido qualquer assistência médica por parte da direção da unidade carcerária.

   Cabe acrescentar ainda que, por ser um ambiente que tem uma falta excessiva de higiene, com uma convivência com outras pessoas sem o apoio psicossocial e, com o uso excessivo do tabaco, podem surgir doenças crônicas como dermatites, ulceras, pneumonias, doenças urológicas e doenças gástricas, que várias vezes a população carcerária não é atendida como deveria.

         

5 PLANO NACIONAL DE SAÚDE NO SISTEMA CARCERÁRIO

   Um dos problemas fundamentais para a efetivação de políticas públicas voltadas à saúde das pessoas privadas de liberdade é a superação das dificuldades impostas pela própria condição de confinamento, que dificulta o acesso às ações e serviços de saúde de forma integral e efetiva. 

   A portaria interministerial número 1777, de 09 de setembro de 2003, instituiu o Plano Nacional de Saúde no Sistema Carcerário, tal plano seria para inclusão da população carcerária no Sistema Único de Saúde (SUS), garantindo-se, de acordo com todos os preceitos legais, que o direito à cidadania se efetive na perspectiva dos Direitos Humanos.

   O Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário é direcionado para a população recolhida em penitenciárias, presídios, colônias agrícolas e hospitais de custódia, mas vale ressaltar que tal plano não inclui presos no regime aberto e presos provisoriamente recolhidos nos distritos e cadeias públicas.

   Segundo o citado plano de saúde, para que se consiga atender corretamente a população carcerária, cada unidade prisional deveria contar com uma equipe médica, a qual deveria ser integrada por um médico, um enfermeiro, um dentista, um psicólogo, um auxiliar de enfermagem, um auxiliar de consultório odontológico e um assistente social, entretanto, na prática, não é o que realmente acontece.

   No tocante ao que já foi descrito acima, vale destacar o artigo 5°, inciso XLIX, da Constituição da República Federativa do Brasil: “é assegurado aos presos à integridade física e moral”.

   Advirta-se que o Estado não garante a execução da lei, seja por descaso do governo, seja pelo descaso da sociedade que muitas vezes se sente aprisionada pelo medo e insegurança, ou seja, pela corrupção dentro dos presídios.

   Conforme pesquisa realizada com os detentos da Unidade de Cadeia Pública do município de Ribeirão do Pinhal - PARANÁ, teremos uma noção mais aprofundada do estado deplorável que se encontram os detentos, esquecidos em uma cela pela sociedade e pelos governantes. A seguir se encontra, em porcentagem, a opinião de todos os 50 detentos que residem na carceragem de Ribeirão do Pinhal - PR:

Opinião da População Carcerária da Cadeia Pública de Ribeirão do Pinhal - PR, a respeito da Saúde

Homens                                         98% Péssima                                        2% Ruim

 

Mulheres                                      100% Péssima

                                                                                Fonte: Cadeia Pública de Ribeirão do Pinhal – PR

 

   Salienta-se que tal pesquisa foi efetuada no ano de 2018, com 50 detentos, dentre eles, duas mulheres.

   Além desta pesquisa, há também relatos de alguns detentos que representam os encarcerados, como é o caso do depoimento abaixo, narrado por um dos representantes da população carcerária do Município de Ribeirão do Pinhal - PR:

“Eu estou doente, como todos aqui estão com algum problema de saúde, cadê o médico para nos socorrer, estamos todos morrendo aos poucos aqui, não consigo respirar direito devido ao abafamento da cela, a qual não há ventilação alguma. O posto de saúde da cidade não fornece nenhum tipo de remédio para amenizar os problemas dos detentos, como por exemplo, remédios para dores de cabeça, dores de estômago, gripe, alergias, dentre outros considerados básicos.”

                                                                                                                                                    Detento.

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   Saliento ainda as condições femininas que não tem contato com atendimento médico, conforme depoimento da detenta citado logo abaixo, onde relata a condição em que vive com sua companheira de cela.

“Estamos muito apertadas aqui, temos falta de ar e o banheiro é uma imundície, sempre que precisamos de um médico nunca somos atendidas, tenho muita cólica, mal-estar e tonturas. Ficamos aqui esquecidas e abandonadas por todos. ”

                                                                                                                                                    Detenta.

   Conforme depoimentos acima narrados, cabe advertir o detalhe de que a saúde dentro das unidades carcerárias, em que tais detentos vivem na mais degradante, sem dignidade nenhuma, sendo tratados piores que animais, com alimentação ruim, trancados em lugares extremamente pequenos, vivendo em condições desumanas.

 

CONCLUSÃO

   O artigo 5°, inciso XLIX, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 prevê que “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”, mas o Estado não garante a execução da lei.

   Infelizmente, o que podemos observar atualmente nas instituições carcerárias é o descaso dos entes do Poder Público. Não podemos negar o fracasso de nosso sistema prisional, que não cumpre o papel que lhe é destinado por lei, ou seja, o de reeducar e ressocializar o preso. Os detentos vivem em estado precário, passando por condições subumanas e às vezes de extrema violência, principalmente quando se tornam depósitos humanos, gerando assim uma superlotação.

   O Poder Público deveria colocar em prática soluções que ajudassem a atingir objetivos da pena e procurar respeitar cada direito do ser humano, seja ele preso ou não, a fim de que as penitenciárias se tornem um lugar mais digno e salubre.

 

 

REFERÊNCIAS

 

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm > Acesso em: 19 de dezembro de 2020.

DINIZ, Debora. Cadeia, Relatos Sobre Mulheres. Editora Civilização Brasileira. 2015.

LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/leis/L7210.htm > Acesso em: 19 de dezembro de 2020.

LEI Nº 8.080, DE 19 DE SETEMBRO DE 1990. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm > Acesso em: 19 de dezembro de 2020.

MINAYO, Maria Cecília de Souza. Deserdados Sociais. Condições de Vida e Saúde dos Presos do Estado do Rio de Janeiro. Editora Artmed. 2015.
OLIVEIRA, Walter Ferreira de. Saúde e Atenção Psicossocial nas Prisões. Editora Hucitec. 2016.

PLANO NACIONAL DE SAÚDE NO SISTEMA PENITENCIÁRIO. Disponível em < http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cartilha_pnssp.pdf > Acesso em: 19 de dezembro de 2020.

PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 1777, DE 09 DE SETEMBRO DE 2003. Disponível em < http://www.crpsp.org.br/sistemaprisional/leis/2003Portaria1777.pdf > Acesso em: 19 de dezembro de 2020.

SMANIO, Gianpaolo Poggio; BERTOLIN, Patrícia Tuma Martins. O Direito e as Políticas Públicas no Brasil. Editora Atlas. 2013.
Sobre o autor
Raphael Oliveira da Silva

Possui Graduação em Direito - Faculdade Sudamérica de Cataguases - MG (2013). Especialista em Direito Penal e Processual Penal - Universidade Estácio de Sá (2016). Atualmente matriculado no curso de Doutorado em Direito Penal na Universidade de Buenos Aires em convênio com a Associação Nacional dos Docentes Mestrandos e Doutorandos do Brasil.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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