Direito Constitucional: o que dispôs o Ato Institucional nº 5?

27/12/2020 às 22:25
Leia nesta página:

Ato Institucional Nº 5. AI-5.

Com certa frequência ouvimos pessoas falando acerca do Ato Institucional nº 5/1968, inclusive alguns movimentos populares defendem a imposição, pelo Poder Executivo, de um novo AI-5[1].

O tema é sempre muito polêmico, porém, a pretensão do artigo não é formar um juízo de valor acerca, tampouco induzir o leitor à determinada conclusão, mas apresentar de maneira clara e objetiva o teor do AI-5, para que cada um possa concluir de acordo com sua visão de mundo.  

De proêmio, é preciso regredir um pouco na história para melhor compreendermos o tema proposto.

Em março de 1964, ainda na vigência da Constituição de 1946, depois de período de conturbação política, as Forças Armadas intervieram na condução do país por meio de atos institucionais e por uma sucessão de emendas à Constituição vigente. De toda sorte, o Diploma não mais correspondia ao novo momento político[2]. Em 1967, o Congresso Nacional, que se reuniu de dezembro de 1966 a janeiro de 1967, aprovou uma nova Constituição, gestada sem mais vasta liberdade de deliberação. A Constituição era marcada pela tônica da preocupação com a segurança nacional – conceito de reconhecida vagueza, mas que tinha por eixo básico a manutenção da ordem, sobretudo onde fosse vista a atuação de grupos de tendência de esquerda, máxime comunista. A Constituição de 1967 tinha cariz centralizador e entregava ao Presidente da República copiosos poderes. Possuía um catálogo de direitos individuais, permitindo, todavia, que fossem suspensos, ante certos pressupostos. O Presidente da República voltou a poder legislar, por meio de decretos-leis.

A crise política se agravou nos anos subsequentes e chegou às ruas. Em 13 de dezembro de 1968, o Governo editou o Ato Institucional nº 5 (AI-5), que ampliava ao extremo os poderes do chefe do Poder Executivo, ao mesmo tempo em que tolhia mandatos políticos e restringia direitos e liberdades mais básicos dos brasileiros. Com supedâneo nas disposições do AI-5 (art. 2º), por exemplo, o Presidente da República podia fechar as casas legislativas das 03 (três) esferas da federação (União, Estados e Municípios).

 

Ademais, o AI-5 autorizava o Presidente da República, no interesse nacional, decretar intervenção federal nos Estados e Municípios, sem quaisquer limitações previstas na Constituição (art. 3º); suspender direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 (dez) anos e cassar mandatos eletivos federais, estaduais e municipais (art. 4º). Foram suspensas, outrossim, as garantias constitucionais ou legais de vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade, bem como a de exercício em funções por prazo certo (art. 6º) e a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular (art. 10).

Finalmente, o Presidente da República estava autorizado, mediante decreto, a demitir, a remover, a aposentar ou pôr em disponibilidade quaisquer membros do Poder Judiciário, Ministério Público, servidores públicos, empregados de autarquias, empresas públicas ou sociedades de economia mista, e a demitir, transferir para a reserva ou reformar militares ou membros das polícias militares (art. 6º, § 1º), além de decretar confiscos de bens, sem prévio contraditório e exercício da ampla defesa (art. 8º).

Todos os atos praticados pelo chefe do Poder Executivo federal, baseados no AI-5 e em atos complementares, não poderiam ser submetidos à apreciação do Poder Judiciário, conforme estabelecia o art. 11.

Descritos todos os principais dispositivos do AI-5, fica livre o leitor para concluir e formar seu juízo de valor acerca do objeto do artigo e se é realmente esse o modelo constitucional que julga adequado para nosso país.          

 

Bibliografia

 

BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. – 15. ed. São Paulo : Malheiros Editores, 2004.

BRASIL, Ato Institucional nº 5 de 13 de dezembro de 1968. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ait/ait-05-68.htm>. Acesso em: 27-12-2020.  

MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. – 8. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2013.

PGR pede a STF inquérito sobre atos que defenderam novo AI-5. Disponível em: < https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2020/04/20/interna_politica,1140381/pgr-pede-a-stf-inquerito-sobre-atos-que-defenderam-novo-ai-5.shtml>. Acesso: 27-12-2020.  

 

 


[1]PGR pede a STF inquérito sobre atos que defenderam novo AI-5. Disponível em: < https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2020/04/20/interna_politica,1140381/pgr-pede-a-stf-inquerito-sobre-atos-que-defenderam-novo-ai-5.shtml>. Acesso: 27-12-2020.  

[2]Fenômeno que pode ser considerado um hiato constitucional, isto é, quando há um descompasso entre o texto da Constituição e a realidade social.  

Sobre o autor
Marcelo Cheli de Lima

Atualmente é aluno pesquisador da USP, monitor das disciplinas Direito da Dívida Pública e Orçamentos Públicos do curso de graduação em Direito (USP), Advogado (Cheli - Advocacia e Consultoria), Procurador Jurídico Municipal, ex-membro do Conselho Municipal da Pessoa Idosa, ex-membro do Conselho Municipal de Gestão Documental, ex-membro da Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE), mestrando em Direito Financeiro (USP) pós graduando em Direito e Economia pela Unicamp e em Direito Tributário e Aduaneiro pela PUC Minas. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Tributário, Financeiro, Econômico, Administrativo e Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em análise de impacto regulatório e análise econômica do Direito. Exerceu os seguintes cargos e empregos públicos: Soldado Temporário da Polícia Militar do Estado de São Paulo, Agente de apoio sócio-educativo da Fundação Casa, Agente de Leitura e Fiscalização SANASA e Oficial Administrativo da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, Oficial Administrativo do Conselho Regional de Corretores Imobiliários - CRECI. Foi estagiário na Defensoria Pública do Estado de São Paulo (2º lugar no processo seletivo), Tribunal Regional do Trabalho (1º lugar no processo seletivo) e na Procuradoria Regional do Trabalho (1º lugar no processo seletivo).

Informações sobre o texto

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