Esforço conjunto contra as milícias

A grave situação exigirá cooperação da sociedade e de todos os Poderes da República

30/12/2020 às 19:35
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O princípio da cooperação deve reger as relações entre os entes federados e os Poderes da República — e o mesmo espírito cooperativo deve orientar a postura do Legislativo e do Judiciário. Não poderia a União, portanto, omitir-se acerca do caos instalado na segurança pública do Estado do Rio de Janeiro. Afinal, diferentemente de Gotham City, não dispomos de um Batman para salvar a capital fluminense do grave problema das milícias — grupos de extermínio que ofereciam proteção em favelas da Zona Oeste carioca nos anos 1990 e, hoje, estão sendo combatidos em pelo menos 12 estados.

O modo de agir é semelhante ao estabelecido no Rio: milicianos financiam negócios irregulares, fazem grilagem de terra, contratam policiais responsáveis por ameaças, extorsões e homicídios, e agora estendem seus tentáculos criminosos assumindo mandatos no Poder Legislativo.

Qualquer um de nós pode ingressar na estatística dos assassinatos, como aconteceu, com a vereadora Marielle Franco, em 2018; com a Juíza Patrícia Acioli, em 2011; e com a diretora da Penitenciária de Bangu,  Sidnéia Santos de Jesus, em 2000. Desembargadores do Rio recebem treinamento semelhante ao ministrado aos policiais, oferecido pelo Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope).

Onde impera o descrédito institucional forma-se um caldo de cultura para a atuação das empresas (regulares ou irregulares) de segurança privada, cujos “serviços” envolvem desde a instalação de câmeras, de grades e cercas elétricas ao fechamento de vias públicas por meio de cancelas, em violação às normas urbanísticas e de trânsito. O enfrentamento da criminalidade requer mais do que uma dotação orçamentária; afinal, 134 policiais foram mortos (em combate ou executados), somente em 2017, dados que indicam uma média de um policial morto a cada dois dias.

Nas favelas do Rio, menores de idade trabalham no tráfico de drogas, o que é considerado uma das piores formas de trabalho infantil pela Organização Internacional do Trabalho, e nos permite dizer que o Brasil possui um “exército” infantojuvenil destinado à narcotraficância.

A grave situação exigirá muito esforço e cooperação da sociedade e de todos os Poderes da República. É preciso, urgentemente, aprimorar os órgãos de segurança pública, provendo-lhes as condições  para o cumprimento das atribuições: investimentos em formação e treinamento, inteligência, tecnologia e equipamentos (armamentos, viaturas, coletes balísticos), acompanhamento da saúde física e mental do policial. E, principalmente, formar  batalhões de educação e de saúde para atender  a população de baixa renda.

Sobre o autor
Reis Friede

Desembargador Federal, Presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (biênio 2019/21), Mestre e Doutor em Direito e Professor Adjunto da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Graduação em Engenharia pela Universidade Santa Úrsula (1991), graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1985), graduação em Administração - Faculdades Integradas Cândido Mendes - Ipanema (1991), graduação em Direito pela Faculdade de Direito Cândido Mendes - Ipanema (1982), graduação em Arquitetura pela Universidade Santa Úrsula (1982), mestrado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1988), mestrado em Direito pela Universidade Gama Filho (1989) e doutorado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991). Atualmente é professor permanente do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Local - MDL do Centro Universitário Augusto Motta - UNISUAM, professor conferencista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército. Diretor do Centro Cultural da Justiça Federal (CCJF). Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região -, atuando principalmente nos seguintes temas: estado, soberania, defesa, CT&I, processo e meio ambiente.

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