Partindo da premissa do âmbito constitucional e criminal, é notório que se faz necessário o uso de medidas que possam proteger não apenas a sociedade, mas também os agentes atuantes do Direito como os magistrados e representantes do Poder Judiciário, desde que sejam resguardados os preceitos constitucionais, assim sendo, os princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1o, III, da Constituição Federal), do juiz natural (art. 5o, XXXVII e LII, da CF), e da publicidade (art. 5o, XXXIII, da CF).
À vista disso, sabemos que o princípio da dignidade da pessoa humana é a ponte entre a igualdade, a segurança e a justiça, não se podendo privilegiar um em detrimento de outro com igual dignidade ou direito, portanto este princípio também deve ser aplicado e utilizado pelos magistrados, principalmente no que diz respeito ao uso de suas funções como detentor do poder punitivo, visto que, o juiz não deve ser um objeto descartável do poder judiciário, antes de tudo é pessoa que merece ter assim como os outros cidadãos seu direito a vida e a segurança resguardadas.
1. DO INSTITUTO DO JUIZ SEM ROSTO
Este instituto caracteriza-se como sendo uma forma de prevenção, qual seja, para o resguardo físico dos magistrados envolvidos em investigações e julgamentos nos casos de organizações criminosas, uma vez que essas organizações são assustadoramente poderosas e estruturadas, detendo uma influência direta sobre a população, agindo sempre através do medo e de represálias, é valido mencionar que este instituto já foi anteriormente adotado por outros ordenamentos jurídicos, como nos países da Colômbia, Peru e da Itália, entre outros.
Sendo assim, a utilização da figura do juiz sem rosto caracteriza-se como sendo um método pelo qual o processado não terá o direito à identificação do responsável pelo processamento e posterior julgamento do seu caso, o que, por conseguinte ocorrerá com a sentença apócrifa (ausência de assinatura do juiz que prolatou a sentença).
2. DA RECEPÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Na intenção de ouvir a sociedade que cada dia mais clama e sente necessidade de justiça e segurança, bem como no intuito de tornar o sistema penal brasileiro mais severo, alguns doutrinadores e juízes defendem o implemento do “juiz sem rosto” no ordenamento jurídico brasileiro, alegando que se faz necessário o uso de instrumentos que garantam a proteção para os magistrados que atuam nos casos de organizações criminosas.
Ocorre que devido aos assassinatos dos magistrados Alexandre Martins Castro Filho e Antônio José Machado Dias, ambos em 2003, foi encaminhado para o Senado Federal o Projeto de Lei nº 87/03, possuindo como objetivo principal à institucionalização do juiz sem rosto no Brasil, tais características assemelham-se ao modelo de “juiz sem rosto” utilizado na Colômbia, qual seja, os atos seriam publicados apenas através de cópias apócrifas da decisão, sendo autenticadas com selo do Tribunal.
O Senador Hélio Costa (autor do projeto) alegou que a criação desta lei se deu em razão do protesto popular em favor da segurança pública. No entanto, por entender que o projeto não estava em conformidade com a nossa Constituição Federal de 1988, em se tratando dos princípios do juiz natural e da publicidade dos autos, entendeu a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania por rejeitar o Projeto de Lei através de um parecer.
3. DA ANÁLISE DA LEI Nº 12.694 /12 E A POSSÍVEL VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
Primordialmente a Lei nº 12.694, de julho de 2012, não instituiu a figura do “juiz anônimo” no Brasil, apenas possibilitou a criação de um colegiado de juízes para a prática de quaisquer atos processuais nos casos em que houvesse envolvimento de organizações criminosas, desde que o requerimento seja motivado e fundamentado. Ocorre que esta lei surgiu de um anteprojeto apontado pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJFB) como uma forma de tentar resguardar a integridade física e psíquica dos magistrados, bem como de suas famílias, diante dos inúmeros homicídios que estavam ocorrendo naquela época.
Podemos dizer que esta lei trouxe um grande avanço ao ordenamento jurídico brasileiro, ainda que em passos curtos e que não se faz inconstitucional, pois não estabelece a figura do “Juiz sem rosto” no nosso ordenamento jurídico.
Compreende-se que, ao permitir a criação de um órgão colegiado em primeiro grau nos casos em que envolvam organizações criminosas, no que diz respeito ao princípio das decisões fundamentadas, não há que se falar em inconstitucionalidade, posto que, tão logo o magistrado visualize que o processo refere-se às organizações criminosas, poderá de imediato utilizar-se da Lei de nº 12.694/12 e convocar desde o início mais dois outros juízes criminais de primeiro grau, sendo estes escolhidos através de sorteio eletrônico (preservando o princípio do juiz natural), não causando assim qualquer tipo de impedimento no exercício da ampla defesa e contraditório por parte do indiciado que terá acesso a todos os atos processuais e consequentemente poderá compreender o motivo das decisões que venha condena-lo ou absolve-lo, portanto os juízes serão imparciais, ou seja, apesar de se tratar de um órgão colegiado, o rito a ser observado é o procedimento comum dos juízes singulares.