Suicídio assistido: uma reflexão

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O objetivo deste trabalho é: refletir sobre a livre escolha pela vida. O método utilizado neste trabalho foi a revisão da doutrina e da legislação. Os resultados apontam que há uma lacuna de uma carta que sucedeu a Constituição Federal de 1988.

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como tema o Suicídio Assistido. No panorama  mundial este assunto vem recebendo destaque uma vez que países como Holanda, Suíça, Bélgica Estados Unidos (Estado de Oregon, Montana, Vermont, Washington e Califórnia), Colômbia, Argentina, Canadá e Alemanha já obtiveram aprovação do procedimento (MISHARA BL, WEISS TV DN, 2013).

O objetivo deste trabalho é refletir sobre o suicídio assistido e analisar o panorama normativo dele no Brasil.

O método utilizado para elaboração deste trabalho, foi pesquisar sobre o tema, revisão de doutrinas, análise de leis e jurisprudência, e, notícias veiculadas pela mídia para que obtivéssemos maiores esclarecimentos sobre o tema.

Esta pesquisa se justifica na medida em que a sociedade necessita de mais respostas acerca deste tema, porque entende-se que quanto mais se estuda essa problemática, mais se faz avançar a ciência do Direito.

1. CONCEITO DO SUICÍDIO ASSISTIDO

Goldim (s/d) afirma que o suicídio assistido nada mais é, do que a vontade do paciente em interromper sua vida, de maneira indolor. Por motivos especificamente de doenças em fases terminais, seja ela um câncer incurável, uma paralisia total, entre outras. Devendo ele mesmo cometer tal ato.

Segundo Engelhardt Junior (2013), o paciente deve expressar verbalmente mais de uma vez, em um período de 15 dias, sua vontade de cessar sua vida, na presença de um ou mais médicos, e parentes. Além do pedido verbal, ele deverá ainda solicitar o ato por escrito, na presença de pelo menos, duas testemunhas, tornando-se então a morte assistida.

[...] designa a retirada da própria vida com auxílio ou assistência de terceiros. O ato causador da morte é de autoria daquele que põe termo à própria vida. O terceiro colabora com o ato, quer prestando informações quer colocando à disposição do paciente os meios e condições necessárias à prática. (BARROSO, 2010, p.8).

 2. DIFERENÇA ENTRE SUICÍDIO ASSISTIDO E A EUTANÁSIA.

A doutrina de Diniz (2011), conceitua que a Eutanásia consiste no ato de abreviar a vida de pacientes em fase terminal ou que estejam sentindo dores insuportáveis, ela tem como tradução “morte boa”. Deve ser praticada por ato de terceiros.

Existem duas formas de Eutanásia:

Ativa: É quando os métodos utilizados podem pôr fim a vida do paciente por meio de medicamentos em doses altas ou até mesmo a injeção letal.

Passiva: A morte do paciente ocorre quando, faltam recursos a manutenção das funções vitais sejam elas a falta de alimentos, cuidados médicos, falta de água, entre outros.

Já o Suicídio Assistido consiste no acompanhamento de profissionais ou parentes para que o paciente consiga pessoalmente conduzir o ato de pôr fim a sua própria vida, levando em consideração o sofrimento e vontade dele. O ato necessita do pedido da própria pessoa, devendo ser analisado em um processo entre profissionais, família e paciente. Devendo ser essa prática sem dor e sofrimento para quem está cometendo, segundo a organização Dying With Dignity Canadá.

2.1. SUICÍDIO ASSISTIDO: VISÃO RELIGIOSA E FILOSÓFICA. 

Segundo Sá (2005, p. 61) a morte “é parte integral da vida, tão natural e previsível quanto nascer” e “além de um evento científico, é evento moral, religioso e cultural”, por isso, este tema é abordado em todas as esferas, principalmente, nas religiosa e filosófica. 

Em pensamentos religiosos, vale destacar duas diferentes denominações, sendo elas, judaísmo e budismo. 

Para o judaísmo, a morte faz parte da vida, é considerada a outra “face da mesma moeda”. Este evento é a separação do homem da sua vida terrena para encontrar o seu verdadeiro lar com Deus, por isso, deve ser enfrentada diretamente e entendida como natural. Quando perto de morrer, a pessoa deve ter convicção de seu arrependimento a fim de ser aceito por Deus. E como um processo natural, a morte deve ocorrer no seu momento devido, não havendo qualquer interferência humana.  Vale considerar que, no judaísmo tradicional, o indivíduo só é considerado, realmente, morto quando há parada cardiorrespiratória.

Já para o budismo, a morte é vista como uma transição. Tem como linhas de pensamento o karma – relação entre causa e efeito – e o renascimento. A ideia do suicídio não é vista como um ato de “escape” e nem apoiada quando envolve pensamentos negativos, dessa forma, pode ser entendida em determinadas situações, como por exemplo, quando não há mais o que fazer em relação ao doente e o fim dele, de qualquer forma, seja a morte, ou se o motivo para tal ato seja a compaixão.

O suicídio assistido vem definindo-se como “um ato que tem muitos pontos em comum com a eutanásia, na medida em que há uma colaboração de uma pessoa, geralmente de um médico, com o doente para lhe terminar a vida” (DURKHEIN, 2001, p. 348).

Na Antiguidade clássica, Grécia e Roma, existia uma legislação a respeito do suicídio assistido. Mas para a pessoa conseguir cometer tal ato, ela deveria fazer uma solicitação formalmente as devidas autoridades, explicando a real motivação. Se a mesma, entendesse que os motivos eram coerentes, só então o procedimento do suicídio assistido seria concedido.

2.2. SUICÍDIO ASSISTIDO: LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

O Direito à vida é garantido constitucionalmente no art. 5º como pressuposto lógico da existência. De tal forma, que a Carta Magna concede proteção especial à vida como direito fundamental do próprio ser humano.

CRFB. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

Afastando a ideia de que este seria um direito absoluto, entramos na questão central deste trabalho, nas palavras da doutrina, “ao pleitear o direito de morrer, estamos diante de uma afronta a direito fundamental ou apenas fazendo com que a dignidade da pessoa humana seja respeitada?” (CAMPOS; MEDEIROS, 2001).” 

Segundo o Código Penal, induzir, instigar ou auxiliar alguém a suicidar-se é considerado crime no Brasil.

Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena – reclusão de 2 a 6 anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão de 1 a 3 anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.

O mesmo código prevê ainda:

Constrangimento ilegal Art. 146 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa. ... § 3º - Não se compreendem na disposição deste artigo: I - a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida; II - a coação exercida para impedir suicídio.

Por fim, tipifica o código penal a omissão de socorro:

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.”

Acrescenta-se a isso o princípio da legalidade, que se encontra assim previsto:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ... II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

2.3. SUICÍDIO ASSISTIDO: HISTÓRICO DO SUICÍDIO ASSISTIDO

Vale a pena refletir: A vida deve ser preservada a qualquer custo? Todos devemos concordar com os recursos biotecnológicos para estender, cada dia mais, a vida de pacientes terminais e paliativos? Devendo eles serem acompanhados por profissionais capacitados com procedimentos terapêuticos, cujos efeitos serão inalteráveis, tornando o tratamento mais agressivo e sofrido, ao invés de progressivo? Transformando-se assim, um paciente com sua qualidade de vida negligenciada. 

“Ninguém quer morrer sofrendo, chorando, gritando. Eu, pelo menos, não. Quero morrer numa boa.” (CONY, CH, 2017). Quando lemos uma frase dessa de um escritor, que tem um câncer linfático, incurável, perdeu os movimentos do lado direito em 2003, após descobrir um tumor na cabeça, que tem o tamanho de uma maçã, e até hoje é obrigado a conviver com essa enfermidade, pode-se perceber a necessidade de compreender, a fundo, a relevância do Suicídio Assistido.

“Manter alguém vivo contra a sua vontade é derradeira indignidade” (HAWKING, 2017). Fala de um físico britânico que desde os 21 anos sofre de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). Hoje, aos 73 anos, ele vive com uma doença degenerativa e incurável, alega que, se tivesse que se tornar um fardo para as pessoas ao seu redor, consideraria dar cabo a sua própria vida.

A intenção do Suicídio Assistido é evitar que a pessoa seja obrigada a viver quando os remédios já não fazem mais efeito, apenas aumentam o seu sofrimento. Além do paciente se manifestar a favor desse procedimento, precisará de aprovação de quatro ou mais familiares, e, o médico precisar fazer um atestado comprovando que o paciente está em fase terminal e o estado é irreversível.

O querer morrer expressa, pelo menos num primeiro momento, espanto para aquele que ouve alguém dizê-lo. A impressão inicial é que ainda estamos propensos a acreditar que a vida segue um fluxo que retira de nós mesmos a possibilidade de deliberar sobre ele.” (SÁ, 2012).

Vale ressaltar que o Suicídio Assistido só será válido para pessoas que têm enfermidades fatais. Há muitos relatos de indivíduos que possuem doenças, porém, essas não afetam o seu cotidiano e não dependem de outras pessoas, o nosso foco é simplesmente o contrário, queremos garantir às pessoas, as quais suas enfermidades os impedem de se desenvolverem, ou, que vivem com dores e nenhum remédio faz mais efeito, o direito de decidirem se vivem ou não.

Após tentar morrer de forma digna, tendo sua opção de escolha violada, acabou por atentar contra sua própria vida, “à vida assim não é digna para mim … viver é um direito não uma obrigação” (Ramon Sampedro). Ramon, 26, ficou tetraplégico, e lutava na justiça espanhola com a solicitação do direito de morrer, por já não aguentar mais viver. Conviveu mais 29 anos, demorando cinco anos sua luta judicial.

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Em 1996, Ramón Sampedro redigiu uma carta aos tribunais, a qual foi ignorada.

“Senhores Juízes,

Negar a propriedade privada de nosso próprio ser é a maior das mentiras culturais. Para uma cultura que sacraliza a propriedade privada das coisas – dentre elas – a terra e a água – é uma aberração negar a propriedade mais privada de todas, a nossa Pátria e reino Pessoal. Nosso corpo, vida e consciência – nosso universo. (SAMPEDRO, 2005, p.63 apud NETO, 2010, p.3).”

Consciente, querendo apenas lutar pelo seu direito de morrer, e vendo seu pedido ser ignorado pelo Tribunal dos Direitos Humanos de Estrasburgo. Por não obter a autorização do poder judiciário, Ramon planejou sua morte com o auxílio de seus amigos, visando não querer prejudicar sua família. Ele necessitava da ajuda de terceiros para cumprir suas atividades, pois, por conta das suas condições, não conseguia fazer sozinho. 

Em 1998, foi encontrado morto por uma amiga após ingerir uma dose de cianureto. Foi comprovado que os amigos colocaram um copo com um canudo próximo a Ramon, porém, por meio de uma gravação pode ser visto que ele mesmo ingeriu a solução líquida. 

Em 2003, o caso virou tema para o filme “ Mar Adentro”, com direção de Alejandro Amenábar.

2.4. SUICÍDIO ASSISTIDO: PAÍSES EM QUE A PRÁTICA É LEGALIZADA

Quadro 1 - Países onde o suicídio assistido é legalizado.

Local

Ano

Descrição

Suíça

1918

Legalizada no Código Penal de 1918 (artigo 115), é permitido desde que não seja por “motivos egoístas”.

Uruguai

1934

Incluída no Código Penal a possibilidade do “Homicídio Piedoso.

EUA (Oregon)

1997

Primeiro Estado Norte Americano a legalizar o Suicídio Assistido (Ato de Morte com Dignidade).

Holanda

2002

Aprovado através do (Pedido Voluntariamente e ser portador de Condições crônicas que causam Sofrimento).

Bélgica

2002

EUA (Washington) 

2009

Segundo Estado Americano a dar a liberdade aos doentes terminais de escolher sobre a vida e a morte (Ato de Morte com Dignidade).

EUA (Montana)

2009

Terceiro Estado Americano a legalizar a morte com dignidade.

Luxemburgo

2009

Aprovado sobre a (Disposição de fim da vida).

EUA (Vermont)

2013

Quarto Estado Americano a legalizar o Suicídio Assistido (Escolha do paciente e controle no final da morte).

EUA (Califórnia)

2015

Quinto Estado Americano a aprovar o Suicídio Assistido (Ato de opção do fim da vida). “End. of Life Option Act”.

Colômbia 

2015

Aprovada sobre consentimento prévio e inequívoco (Homicídio por Piedade) Resolução 1216/2015 do Ministério da Saúde e Proteção Social.

Canadá

2015/2016

Aprovado sobre o (Ato sobre Cuidados no fim da Vida).

Alemanha

2020

Aprovada pela Suprema Corte alemã.

Fonte – Do próprio autor (2020).

ANÁLISE DA DOUTRINA E DA LEGISLAÇÃO

O estabelecimento de requisitos na regulamentação do Suicídio Assistido, bem como da Eutanásia, para que a conduta do médico não seja punida no país, trouxe mais segurança jurídica ao profissional médico:

O Artigo 2° da lei, mencionado no §2° do artigo 293 do Código Penal, é de extrema importância, porque é nele que estão configurados os requisitos de cuidado que o médico precisa observar, a saber: 1 – tenha se convencido que o pedido do paciente tenha sido meditado e voluntário; 2 – tenha se convencido de que o padecimento do paciente é insuportável e sem esperanças de melhora; 3 – tenha informado ao paciente sua real situação e suas perspectivas de futuro; 4 – tenha se convencido, juntamente com o paciente, de que não há outra solução razoável para a situação em que se encontra esse último; 5 – tenha consultado, pelo menos, um médico independente que, examinando o paciente, emitiu seu parecer por escrito sobre o cumprimento dos requisitos de cuidado; e 6 – tenha praticado a eutanásia ou auxílio ao suicídio com máximo de cuidado e esmero profissional. (SÁ; MOUREIRA, 2015. p. 151-152)

A legislação holandesa, visa fortalecer a relação médico-paciente, possibilitando a autonomia do paciente e a conduta do médico. O paciente decide se quer viver ou não e o médico obedece se os critérios pré-estabelecidos se encaixarem nos requisitos essenciais para o Suicídio Assistido.

[...] o paciente deve conscientemente, requisitar a morte assistida, que deve ser autorizada e supervisionada por um médico especialista, um advogado e um psiquiatra ou psicólogo. E tendo em vista a recente legalização neste país, é necessário investir na capacitação de médicos e profissionais de saúde para lidar com dilemas éticos do fim da vida. (CASTRO, et.al., 2016, p. 357).

Castro nos explica que requisitar a morte assistida não é tão simples, tem que reunir uma junta médica para dar o diagnóstico e um advogado para sua legalização, capacitar os médicos para que eles consigam lidar com dilemas éticos.

A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. (MORAIS, 2018).

Alexandre de Morais nos deixa claro que a dignidade da pessoa humana tem que ser respeitada, o estatuto jurídico deve assegurar isso, sendo que limitações são feitas, sem menosprezar as pessoas enquanto seres humanos.

A própria Declaração dos Direitos Humanos das Nações Unidas, expressamente, em seu artigo 29 afirma que:

Toda pessoa tem deveres com a comunidade, posto que somente nela pode-se desenvolver livre e plenamente sua personalidade. No exercício de seus direitos e no desfrute de suas liberdades todas as pessoas estarão sujeitas às limitações estabelecidas pela lei com a única finalidade de assegurar o respeito dos direitos e liberdades dos demais, e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. Estes direitos e liberdades não podem, em nenhum caso, serem exercidos em oposição com os propósitos e princípios das Nações Unidas. Nada na presente Declaração poderá ser interpretado no sentido de conferir direito algum ao Estado, a um grupo ou uma pessoa, para empreender e desenvolver atividades ou realizar atos tendentes à supressão de qualquer dos direitos e liberdades proclamadas na Declaração.

A constituição assegura o direito à vida, porém traz omissão nos casos que a vida não é mais desejada, como no caso do enfermo que se encontra em estado de extremo sofrimento que vive momentos no qual permanecer vivo é pior do que a morte. Dessa forma, perante o princípio da inviolabilidade da vida o suicídio assistido seria inaceitável em nosso ordenamento jurídico. No entanto, temos dois princípios adotados por determinadas correntes doutrinarias que defendem a prática do suicídio assistido, sendo eles o princípio da dignidade da pessoa humana e o da autonomia da vontade como veremos a seguir.

Temos ainda o conceito de vida como direito fundamental da visão de José Afonso Silva nos termos da Constituição Federal:

[...] Vida, no texto constitucional (art. 5o, caput), não será considerada apenas no seu sentido biológico, mas na sua acepção biográfica mais compreensiva. Sua riqueza significativa é de difícil apreensão porque é algo dinâmico, que se transforma incessantemente sem perder sua própria identidade. É mais um processo (processo vital), que se instaura com a concepção (ou germinação vegetal), transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até que muda de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte. (SILVA, 2017, p. 199).

Temos a visão de Canotilho que afirma que o direito à vida pode ser entendido como um direito de defesa subjetivo, pois o indivíduo tem direito perante o Estado de não ser morto por este, o Estado tem a obrigação de não promover qualquer ato atentatório a vida do indivíduo, e por fim, o indivíduo tem a obrigação de não cometer atos que atentem contra a vida de outros indivíduos. Logo, conclui-se que o direito à vida apesar de ser um direito não se trata de uma liberdade. Alguns doutrinadores sustentam a teoria de que os direitos fundamentais possuem a função de limitar o poder do povo sobre si mesmo, assim Alexandre de Moraes cita Canotilho:

A função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva: (1) constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual; (2) implicam, num plano jurídico-subjetivo, o poder de exercer positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa) (MORAES, 2016, p. 68).

Ressalta-se ainda que os direitos fundamentais possuem relatividade, como trata Alexandre de Moraes citando Quiroga Lavié; “os direitos fundamentais, nascem para reduzir a ação do Estado aos limites impostos pela Constituição, sem, contudo, desconhecerem a subordinação do indivíduo ao Estado, como garantia de que eles operem dentro dos limites impostos pelo direito”

Devemos ainda se atentar a visão de Adriano de Cupis que esclarece em sua obra: “[...] o direito à vida é reconhecido como o direito mais essencial entre os essenciais, uma vez que sem a vida não há existência da pessoa e do próprio direito da personalidade. O caráter essencial da vida faz com que nenhum outro bem exista separadamente deste. (CUPIS, 2014, p. 52).”

Nosso código civil com vigência desde 2002 estabelece em seu art. 6º que a existência da pessoa natural termina com a morte, sendo assim temos 14 segundo a doutrina mais de uma espécie de morte: a natural e a presumida. Na qual a morte natural é “o limite do ciclo vital do homem” (França, 1996, p. 62), isto significa dizer que a é com a morte natural que a pessoa humana perde sua vida biológica, extinguindo assim sua personalidade natural.

Para falar sobre o direito à morte, precisamos retomar o direito à vida: 

Dentre os bens jurídicos tutelados pela lei penal não constitui novidade o fato de que a vida é, na generalidade dos ordenamentos jurídicos, o bem considerado mais precioso, estando normal e precipuamente em patamar superior aos demais, ainda que possa restar também, em certas sociedades e em determinados momentos históricos, em próximo grau de relevância em relação a outros valores essencialmente caros, como os da dignidade humana, liberdade de ir e vir, de expressão de crença”(GUIMARÃES; 2011, p. 68).

Não podemos ignorar a importância do Código de Ética que existe na medicina, código esse em que está sempre atualizando, e que é de extrema importância para a classe médica. Entrou em vigor em 2010, quando visava a importância da autonomia da vontade do paciente, prevista em alguns artigos. E permitindo que o paciente passe a poder optar pelo andamento do seu tratamento, aplicando-se principalmente para aqueles diagnosticados com doenças degenerativas, incuráveis e terminais.

É vedado ao médico, conforme o Código de Ética Médica:

Artigo 24 - Deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo.

Artigo 31 - Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte. 

Artigo 34 - Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal.

Artigo 41 Parágrafo único - Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações, diagnósticos ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Devemos salientar que o paciente, assim como qualquer outro ser humano, é garantido sobre a autonomia da vontade, direito à dignidade e opção de escolha entre a vida e a morte. Devendo então, a opinião e decisão do mesmo ser respeitada pela sociedade, bem como pelo Estado, tornando então relevante o término de sua dor.

O objetivo deste trabalho foi fundamentar o entendimento do Suicídio Assistido, que é juridicamente praticável, o intuito é mostrar que o Suicídio assistido é uma medida médica, que deve sim ser vista como direito fundamental, não estamos lutando por um direito a morte e sim a uma morte digna.

O suicídio assistido é muito criticado porque a visão geral é que estamos violando os princípios éticos, morais e religiosos, mas acima de tudo excluindo o direito à vida, sem se preocupar com as condições em que as pessoas vivem.

É importante salientar que o ser humano é composto de uma parceria entre físico e psíquico , onde ambos caminham juntos, a partir do momento em que o paciente tem uma patologia de grau avançado, interfere diretamente no seu psicológico, fazendo com que o mesmo entenda que optar pelo fim da vida é a melhor solução.

Na prática, o assunto é um tanto contraditório, tendo em vista que na legislação Brasileira, está previsto no artigo 122 do código penal, que induzir, instigar e auxiliar é considerado crime. O interessante é que durante a Ditadura Militar, os soldados que eram gravemente feridos, lhes eram dados punhais para que ele colocasse fim ao seu sofrimento, resumindo o soldado tinha que decidir se cessaria a sua vida ou se continuaria sangrando até a sua morte.

Até o presente momento o debate é apenas doutrinário, tendo em vista que ainda não há projeto de lei em trâmite para a sua aprovação. O Conselho Federal de Medicina, fala sobre o dever ético dos médicos, autorizando os pacientes terminais quando solicitado a interrupção de procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente.   O paciente junto com um representante legal pode pedir ao seu médico que está insustentável viver com essa enfermidade, sendo que os efeitos das medicações são de curto prazo e a cada dia sua dose tem que ser maior para amenizar o seu sofrimento.

Conforme foram mencionados os Países, em que a prática do Suicídio Assistido é legalizada, podemos observar que a principal motivação resulta exclusivamente na vontade do paciente em cessar sua dor e sofrimento, sendo ele diagnosticado com doença terminal e paliativa. Considerando a solicitação expressamente do auxílio. 

Tendo em vista os aspectos mencionados conclui-se que o Suicídio Assistido gera um grande debate, causando polemica. Crava-se uma luta entre a autonomia do paciente decidir sobre o fim da vida e das leis previstas no Código Penal que diz respeito ao assunto.

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Sobre as autoras
Luci Mendes de Melo Bonini

Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, Professora de Filosofia e Pesquisadora no Mestrado em Políticas Públicas da Universidade de Mogi das Cruzes. Área de interesse: Direitos Humanos e Políticas Públicas.

Larissa Antunis Matias Pimentel

Bacharel em Direito pela Universidade de Mogi das Cruzes

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Trabalho de pesquisa que resultou do Trabalho final de curso, do Curso de Direito da Universidade de Mogi das Cruzes.

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