O Estado não existe sem recursos financeiros, pois necessita deles para cobrir as necessidades públicas – obrigações coletivas que o próprio Estado assumiu por decisão política e norma jurídica – como fornecer segurança, educação, saúde, previdência, justiça, diplomacia, alimentação, transporte, lazer etc. (arts. 3º, 21, 23, 25 e 30, CF). Quanto maiores forem as necessidades públicas que o Estado assumir, maiores deverão ser os recursos que o Estado terá de produzir ou arrecadar para suprir essas necessidades. A atividade financeira do Estado (AFE) estuda os meios para satisfazer as necessidades públicas, obtendo, criando, gerindo e gastando o dinheiro necessário, por meio das mais variadas fontes de recursos públicos, como: exploração de recursos naturais, empréstimos, fabricação de dinheiro etc.
Existem dois tipos de recursos públicos: os ingressos e as receitas. Os ingressos ou entradas públicos são recursos que entram nos cofres públicos com o caráter provisório, pois acabarão sendo devolvidos ao contribuinte. Por isso, não podem ser gastos para a aquisição de bens ou serviços para o Estado, e possuem diversas reservas e condições para serem devolvidos. Alguns exemplos são: a caução ou fiança dadas em licitações públicas, os depósitos recursais, os depósitos compulsórios dos bancos, o fundo de garantia por tempo de serviço (FGTS), os empréstimos compulsórios etc. Por outro lado, as receitas públicas são os recursos que entram nos cofres públicos com o caráter definitivo, e serão empregados na aquisição de bens e serviços pelo Estado, que os utilizará para satisfazer nas necessidades públicas que assumiu. Não possuem reservas e condições, justamente porque não serão devolvidos de forma direta ao contribuinte. Exemplos: os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria e as contribuições especiais.
A principal classificação das receitas públicas é quanto à sua origem, dividindo-se em originárias e derivadas. Receita originária é quando o Estado arrecada recursos utilizando um meio patrimonial (rendas sobre seus próprios bens) ou empresarial (rendas sobre os serviços prestados), e o particular tem liberdade para contratar com o poder público. Será aplicado o direito privado (direito dos contratos). Exemplos: alugueres, tarifas, dividendos etc. Por outro lado, nas receitas derivadas, o Estado impõe por lei que o particular que praticar determinado ato ou se enquadrar em certas situações (fato gerador) estará obrigado a entregar valores de seu patrimônio pessoal ao poder público. É a invasão do Estado no patrimônio do particular. Aplica-se o direito público. Exemplos: impostos, taxas, contribuições, multas etc.
O direito tributário é um ramo do direito público, em que existe a prevalência do interesse público acima do privado, pois o Estado representa a coletividade, e não se solicita a manifestação da vontade do particular (é obrigacional). Dentro do direito público, o direito tributário é um ramo do direito financeiro. Mas, enquanto o direito financeiro regula a atividade financeira do Estado (AFE), verificando orçamentos, receitas, despesas e controle público, o direito tributário trata da criação, arrecadação e fiscalização de tributos na relação jurídica entre o Fisco e os contribuintes.
Fontes Formais do Direito Tributário
As fontes formais, normas jurídicas que orientam o direito tributário, se dividem em primárias ou principais (art. 59, CF) e secundárias ou complementares. A legislação tributária abrange as duas fontes, mas quando se fala de lei tributária, ela faz partes somente das fontes formais primárias. A importância de se diferenciar legislação de lei tributária é que somente a lei pode criar tributos. As principais fontes formais primárias no direito tributário são:
1. Constituição Federal (CF): estabelece os princípios e normas básicas sobre tributação, como as limitações ao poder de tributar e a repartição de receitas tributárias entre os entes públicos (arts. 145 ao 162, CF). Os princípios tributários são cláusulas pétreas, e não podem ser reduzidos/excluídos por Emendas Constitucionais (art. 60, § 4º, I e IV, CF). A CF não cria tributos, apenas fixa a competência informando qual tributo cada ente pode criar.
2. Leis Ordinárias (LO): é a lei mais comum em matéria tributária e serve para criar, extinguir, aumentar ou reduzir tributos, definir o sujeito passivo, o fato gerador e a alíquota, estipular as multas por infrações e as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção dos créditos tributários (art. 97, CTN). Tem votação de maioria simples (com mais da metade do voto dos parlamentares presentes). Pode ser federal, estadual ou municipal. Se um tributo não tiver matéria reservada para LC mas for criado por LC, poderá ser alterado ou extinto por uma LO, naturalmente.
3. Leis Complementares (LC): complementam a CF em certas matérias que lhe faltam eficácia. Tem votação por maioria absoluta (mais da metade dos votos dos parlamentares existentes). As matérias reservadas à LC não podem ser objeto de MP. É a exceção em direito tributário, sendo usada apenas em três situações:
- Fixar normas gerais de matéria tributária, dirimir os conflitos de competência e limitar o poder de tributar (art. 146, CF). Atualmente, a lei que trata da matéria é a Lei 5.172/66, o Código Tributário Nacional (CTN) que, apesar de ter sido aprovada como lei ordinária formal, foi recepcionada pela CF/88 com status de LC. Assim, o CTN só pode ser modificado/revogado por outra LC. Enquanto a União não cria nenhuma LC definindo as normas gerais dos tributos estaduais ou municipais, os Estados e Municípios têm competência legislativa plena para legislar sobre a matéria.
- Fixar os limites mínimos e máximos da alíquota do ISS municipal (art. 156, § 3º, I, CF). Atualmente a LC 116/2003 faz isso.
- Criar quatro tributos federais: o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) (art. 153, VII, CF), os Empréstimos Compulsórios (art. 148, I e II, CF), os Impostos residuais (art. 154, I, CF) e as Contribuições sociais-previdenciárias residuais (arts. 154, I; 195, § 4º, CF).
4. Decretos: servem para cinco funções:
- Criar os regulamentos técnicos para cada imposto, que definem, entre outras coisas, os modelos e formatos dos documentos fiscais.
- Alterar as alíquotas de impostos nas exceções ao princípio da legalidade.
- Estabelecer as regras sobre obrigações tributárias acessórias.
- Fixar os índices oficiais de correção monetária para a atualização da base de cálculo dos impostos.
- Estabelecer o prazo para o pagamento dos impostos.
5. Medidas Provisórias (MP): apesar de não constarem expressamente em lei, mas doutrina e STF se posicionam que MP federal pode criar e majorar impostos. Somente matéria reservada a LC é vedada ser objeto de MP (art. 62, § 1º, III, CF).
6. Resoluções do Senado Federal (RSF): como órgão representativo dos Estados, o Senado Federal (SF) determina os limites mínimos e máximos das alíquotas dos impostos estaduais (ICMS, IPVA e ITCMD) (art. 155, § 2º, IV e V, CF).
7. Tratados Internacionais (TI): os tratados e as convenções internacionais são firmados pelo Poder Executivo e revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha (art. 98, CTN). O STJ definiu que o artigo não institui uma hierarquia entre tratados internacional e direito positivo interno, mas institui o tratado como uma norma especial ordinária, que prevalece sobre a norma geral. Exemplo: Brasil e EUA assinam um tratado pactuando a não tributação de IPI nas importações entre os dois países. As regras do IPI só são alteradas em relação aos fatos geradores com os EUA.
Aplicação, interpretação e integração das normas tributárias
Em regra, a aplicação da legislação tributária não retroage no tempo, salvo em três exceções, quando a lei nova: a) for expressamente interpretativa (art. 106, I, CTN); b) for mais benéfica em relação às penalidades, trazendo uma multa menos severa que a prevista na legislação da época em que o fato gerador foi praticado, para atos ainda não definitivamente julgados (art. 106, II, c, CTN); e c) traz novos critérios ou procedimentos de apuração e fiscalização (art. 144, § 1º, CTN).
A interpretação da legislação tributária deve ser literal/restritiva quando esta tratar de suspensão ou exclusão de crédito tributário, de isenção ou de dispensa do cumprimento de obrigação acessória (art. 111, CTN). Exemplos: a isenção tributária aos taxistas não se estende aos motoristas de vans; a dispensa em escriturar livros de entradas e saídas de mercadorias não dispensa a escrituração de outros livros contábeis.
A integração da legislação tributária se dá, em ordem, por meio de: analogia, princípios gerais do direito tributário, princípios gerais do direito público e equidade (art. 108, CTN). A analogia só pode ser utilizada na ausência de disposição expressa, mas nunca para se cobrar tributo não previsto em lei (art. 108, § 1º, CTN).
Competências dos entes federativos em Direito Tributário
É preciso frisar que existem duas competências em direito tributário: a competência para legislar em direito tributário e a competência para se criar tributos.
A competência para legislar em direito tributário pode ser concorrente ou suplementar. A competência concorrente para legislar cabe à União, aos estados e ao Distrito Federal (DF) (art. 24, I, CF). Desta forma, a União estabelece as normas gerais, e os estados e o DF estabelecem normas específicas, com competência legislativa suplementar em caso de existência de normas gerais ou competência legislativa plena em caso de inexistência de normas gerais. Apesar de os municípios não aparecerem expressos com competência legislativa tributária concorrente, doutrinadores apontam que a própria CF os autoriza quando diz que podem suplementar a legislação federal e estadual, no que couber (art. 30, I e II, CF).
Se a União não exercer a sua competência legislativa sobre normas gerais de direito tributário, não existindo nenhuma lei federal que trate do assunto, os estados e o DF poderão exercer a competência legislativa para atender às suas peculiaridades. Posteriormente, sobrevindo nova lei federal que trate das mesmas normas gerais estipuladas em lei estadual anterior, os artigos da lei estadual contrários à nova lei federal ficarão com a eficácia suspensa. Note-se que a lei estadual não é revogada, mas apenas suspensa, podendo voltar a ter eficácia caso a lei federal geral seja revogada. Não se trata do instituto da repristinação, que no Brasil precisa ser expresso para trazer de volta uma norma revogada, mas da simples retirada tácita da suspensão da lei estadual (art. 24, §§ 1º ao 4º, CF).
Por sua vez, a competência para criar um tributo é a habilidade atribuída pela Constituição Federal ao ente público federal, estadual, municipal e distrital para que este possa tributar os particulares (arts. 153 ao 156, CF). A competência tributária está incluída dentro da competência legislativa plena de cada ente federativo (art. 6º, CTN). A competência tributária é facultativa, ou seja, o ente federativo pode ou não criar o tributo, mas se o fizer, deverá cobrá-lo. Enquanto a competência tributária é indelegável, intransferível, inalterável e irrenunciável, a capacidade tributária ativa, que é a função de arrecadar e fiscalizar os tributos, pode ser delegável a outras pessoas jurídicas de direito público, como autarquias (arts. 7º, caput e § 1º; 119, CTN). Existem 6 tipos de competência tributária para criar tributos:
- Exclusiva: a própria Constituição define o imposto que cada ente federativo pode criar. Assim, a União pode criar 8 impostos: IR, II, IE, IOF, IPI, ITR, IGF e IEG (art. 153, CF). Os estados e o Distrito Federal podem criar 3 impostos: ICMS, IPVA e ITCMD (art. 155, CF). Os municípios e o Distrito Federal podem criar 3 impostos: IPTU, ISS e ITBI (arts. 147 e 156, CF);
- Comum: todos os entes federativos podem criar taxas e contribuições de melhoria, conforme o ente que prestar o serviço ou realizar a obra pública. Desta forma, existem taxas federais (como a emissão de passaporte), taxas estaduais (como as custas processuais) e taxas municipais (como os alvarás e licenciamentos) (arts. 145, II e III; 149, CF);
- Especial ou privativa: em regra, é somente para a União, para instituir empréstimos compulsórios e contribuições especiais (arts. 148-149; 195, CF; 15, CTN), mas existem duas exceções: a) todos os entes federativos podem instituir contribuições para custear seus Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) (art. 149, § 1º, CF); e b) os municípios e o Distrito Federal podem instituir contribuição para custear o serviço de iluminação pública (CIP ou COSIP) (art. 149-A, CF);
- Cumulativa ou múltipla: é quando um ente federativo cobra os impostos definidos pela CF como sendo outros entes, por eles inexistirem. É o caso dos territórios federais, onde a União cria, cobra ou isenta os impostos estaduais. Se o território não for dividido em municípios, a União também cumula a criação dos impostos municipais. Outro caso é o do Distrito Federal, que cria, cobra ou isenta tanto os impostos estaduais quanto os impostos municipais (art. 147, CF);
- Residual ou remanescente: somente para a União, por meio de lei complementar, para instituir novos impostos ou novas contribuições sociais além daqueles autorizados pela CF, desde que tenham fato gerador e base de cálculo diferentes dos impostos e contribuições já existentes (arts. 154, I; 195, § 4º, CF);
- Extraordinária: a União pode instituir o imposto extraordinário de guerra (IEG), em caso de guerra ou de sua iminência (arts. 154, II, CF; 76, CTN).
Em síntese, podemos afirmar que nem todos os entes federativos possuem todas as competências tributárias para criar tributos.