Ato jurídico perfeito, coisa julgada e direito adquirido

24/02/2021 às 18:15
Leia nesta página:

Dia de Direito constitucional sobre o tema de atos jurídicos.

  • Considerações preliminares

O direito, por sua natureza, deve existir para disciplinar o futuro, jamais o passado, não sendo razoável entender que normas criadas a posteriori possam dar definições e c    consequências novas a eventos já ocorridos no mundo fenomênico.

Segundo a João Baptista Machado,

“a doutrina dos direitos adquiridos e doutrina do facto passado. Resumidamente, para a primeira doutrina seria retroativa toda lei que violasse direitos já constituídos (adquiridos); para a segunda seria retroativa toda lei que se aplicasse a factos passados antes de seu início de vigência. Para a primeira a Lei nova deveria respeitar os direitos adquiridos, sob pena de retroatividade; para a segunda a lei nova não se aplicaria (sob pena de retroatividade) a fatos passados e aos seus efeitos (só se aplicaria a factos futuros.” (Cf. João Baptista Machado, Introdução, cit., p. 232.)

Conforme vimos, a retroatividade foi objeto de duas doutrinas principais, sendo: direito adquirido e fato realizado.

A doutrina também nomeia o fato passado de teoria objetiva, e a teoria do direito adquirido é a teoria subjetiva.

De acordo com Moreira Alves, em nossa tradição domina a teoria subjetiva do direito adquirido. Isto é, podemos ter a confirmação no voto proferido na ADI 493, sendo:

Por fim, há de salientar-se que as nossas Constituições, a partir de 1934, e com exceção de 1937, adotaram desenganadamente, em matéria de direito intertemporal, a teoria subjetiva dos direitos adquiridos e não a teoria objetiva da situação jurídica, que é a teoria de Roubier. Por isso mesmo, a Lei de Introdução ao Código Civil, de 1942, tendo em vista que a Constituição de 1937 não continha preceito da vedação da aplicação da lei nova em prejuízo do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada, modificando a anterior promulgada com o Código Civil, seguiu em parte a teoria de Roubier, e admitiu que a lei nova, desde que expressa nesse sentido, pudesse retroagir. Com efeito, o artigo 6º rezava: ‘A lei em vigor terá efeito imediato e geral. Não atingirá, entretanto, salvo disposição expressa em contrário, as situações jurídicas definitivamente constituídas e a execução do ato jurídico perfeito’. Com o retorno, na Constituição de 1946, do princípio da irretroatividade no tocante ao direito adquirido, o texto da nova Lei de Introdução se tornou parcialmente incompatível com ela, razão por que a Lei n. 3.238/57 o alterou para reintroduzir, nesse artigo 6º, a regra tradicional em nosso direito de que ‘a lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada’. Como as soluções, em matéria de direito intertemporal, nem sempre são coincidentes, conforme a teoria adotada, e não sendo, a que ora está vigente em nosso sistema jurídico, a teoria objetiva de Roubier, é preciso ter cuidado com a utilização indiscriminada dos critérios por estes usados para resolver as diferentes questões de direito intertemporal” (ADI 493, Rel. Moreira Alves, RTJ, 143(2) /724.)

Por fim, para concluir, Moreira Alves enfatiza o princípio do direito adquirido dizendo que, “se aplica a toda e qualquer lei infraconstitucional, sem qualquer distinção entre lei de direito público e lei de direito privado, ou entre lei de ordem pública e lei dispositiva”.  ademais, enfatiza que “(...), no Brasil, sendo o princípio do respeito ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada de natureza constitucional, sem qualquer exceção a qualquer espécie de legislação ordinária, não tem sentido a afirmação de muitos – apegados ao direito de países em que o preceito é de origem meramente legal – de que as leis de ordem pública se aplicam de imediato alcançando os efeitos futuros do ato jurídico perfeito ou da coisa julgada, e isso porque, se se alteram os efeitos, é óbvio que se está introduzindo modificação na causa, o que é vedado constitucionalmente” (Cf. transcrição na RTJ, 143(2)/746.)

Conceito

É a lei aplicável à dadas situações jurídicas, que somente produzirão efeitos no futuro, eventualmente no regime de uma lei nova, ou seja, é forma que se deva adotar em determinados atos. A alteração posterior não afeta o ato jurídico perfeito já efetivado. Neste sentido, a alteração posterior não pode repercutir no plano de sua validade, tendo em vista o ato jurídico perfeito.

Em suma, todo título ou fundamento que faz surgir o direito subjetivo é a ação lícita que tenha a finalidade imediata de adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos, chame-se ato jurídico perfeito. Portanto, ato jurídico perfeito é aquele sob o regime de determinada lei torna-se apto para dar nascimento aos seus efeitos desde que seja feita a devida verificação de todos os requisitos que lhe são indispensáveis.

Vale apenas frisar que o ato jurídico perfeito é negócio fundado na lei, isto é, não emana dela.

  • Natureza jurídica

O legislador estabeleceu o conceito de direito adquirido, ato

jurídico perfeito e coisa julgada no art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito brasileiro (LINDB):

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

§ 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei

vigente ao tempo em que se efetuou

§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem. 

§ 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso.

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Ademais, a constituição resguarda esses pilares no art. 5º, XXXVI (a lei não prejudicará o direito adquirido, a coisa julgada e o ato jurídico perfeito), prevendo assim o princípio da segurança jurídica no qual “a segurança jurídica consiste no 'conjunto de condições que tornam possível às pessoas o conhecimento antecipado e reflexivo das consequências diretas de seus atos e de seus fatos à luz da liberdade reconhecida'. Uma importante condição da segurança jurídica está na relativa certeza que os indivíduos têm de que as relações realizadas sob o império de uma norma devem perdurar ainda quando tal norma seja substituída".

Tal princípio apresenta o aspecto objetivo, da estabilidade das relações jurídicas, e o aspecto subjetivo, da proteção à confiança ou confiança legítima.

  • Coisa julgada – Diante ao poder-dever de impedir os conflitos surgidos no âmbito social, por imperativo de segurança jurídica, há de ser definitivo, resolvendo, de uma vez por todas, a queixa que estava pendente.  Se a resolução não se revestisse da autoridade de definitividade, não se alcançaria a pacificação social, porquanto os descontentes retornariam a litigar perante o Judiciário, tornando instável a relação jurídica.

Observando que o exercício da atividade jurisdicional tem como finalidade restabelecer a ordem jurídica, quebrada diante do conflito surgido entre os litigantes.

Por fim, como podemos observar no art. 6º, §3º da LINDB, coisa julgada é a decisão judicial que não caiba recurso para impetrar através de Habeas Corpus, ou seja, a impossibilidade de modificar a sentença, no mesmo processo em que ela foi proferida, devendo ser respeitada não apenas pelas partes, como também por todos os juízes.

  • Direito adquirido – Os Direitos Adquiridos na vigência de uma Constituição anterior, por força de uma norma formalmente constitucional, não são extintos, desde que a Constituição nova consagre o mesmo conceito de direito adquirido. Se materialmente constitucional são revogados pela Constituição nova se expressamente mencionar a matéria.

É importante ressaltar que só se fala em direito adquirido em normas formais.

Portanto, direito adquirido é o direito que seu titular pode exercer, ou alguém por ele. Vantagem jurídica, líquida, lícita e concreta que alguém adquire de acordo com a lei vigente na ocasião e incorpora definitivamente, sem contestação, ao seu patrimônio.

REFERÊNCIA:

Barroso, Luís Roberto: Curso de Direito Constitucional – 2º edição, editora Saraiva: https://amzn.to/39k3oRB

Mendes, Gilmar: Curso de Direito Constitucional – 14º edição, editora Saraiva: https://amzn.to/365OQmL

Sobre o autor
Jonathan Ferreira

Acadêmico de Direito pela universidade Estácio de Sá com foco em Dir. Penal, Dir. Proc. Penal, Dir. Constitucional Brasileiro. Administrador e fundador da página Âmbito Criminalista, no qual ajudo pessoas a entenderem o Direito Penal de forma simples e descomplicada. Amante da Sabedoria e estudante da psicanálise lacaniana em conjunto com a seara penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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