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Starlink: Anatel, proíba se tiver coragem

03/03/2021 às 03:38
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Depois de longa espera pelos entusiastas de tecnologia, neste fevereiro de 2021, a SpaceX, companhia do trilionário Elon Musk, começou a cadastrar futuros clientes no Brasil para os serviços da internet Starlink, com previsão de iniciar os serviços “até o

Depois de longa espera pelos entusiastas de tecnologia, neste fevereiro de 2021, a SpaceX, companhia do trilionário Elon Musk, começou a cadastrar futuros clientes no Brasil para os serviços da internet Starlink, com previsão de iniciar os serviços “até o final de 2021”. Basta pagar $99 (noventa e nove dólares estadunidenses) e colocar seu CEP e nome para a fila de espera. Este valor é apenas para reservar um lugar na fila, não cobrirá qualquer tipo de custo vindouro, tais como equipamentos, impostos ou mensalidades.

Para quem está desinformado, o sistema da Starlink difere de seus concorrentes pela posição dos satélites na esfera global. Eles estão mais baixos, mais próximos ao solo, e são em quantidade muito maior, de tal forma a garantir uma velocidade, estabilidade e latência muito melhores que os outros. Os relatos disponíveis (facilmente localizável na internet) dos que já testaram - em algumas latitudes específicas no hemisfério norte - são empolgantes: fácil instalação, podendo utilizar energia de baterias de carros e auto sintonizar-se, ou seja, a antena do cliente localiza sozinha a melhor posição para comunicar-se com o satélite. Algo inexistente nos concorrentes (que ainda exigem técnicos especializados para instalação e sintonia das antenas). E claro, a velocidade é incrível.


O direito

Mas o que nos interessa aqui é o direito, ou, no caso brasileiro, a falta do direito de utilizar estas novidades dos gringos.

Embora esteja na CF/88 textos bonitos, tais como:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil [...] tem como fundamentos: [...] IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;” e este outro: “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; [...]”

...fatalmente os poderes burocráticos tentarão atazanar a chegada da Starlink.

Será que uma internet livre, rápida e via satélite tem relação com o texto constitucional quando este fala da sociedade livre?


A autorização

Segundo AMARAL (periódico Teletime), este solicitou informações à Anatel sobre a Starlink, no que a agência respondeu: "Até o presente momento informamos que não há qualquer pedido de autorização de direito de exploração de satélite, ou sistema de satélites, associado à empresa em questão em curso na Anatel".

E continua AMARAL que a Anatel exige a outorga de autorização, uma empresa brasileira como representante legal para a prestação de serviços e o pagamento da taxa de R$ 102.677.

Esta outorga de uso de exploração de sistema satelital é complicada de ser fornecida.

A Anatel exige que companhias que preste qualquer tipo de telecomunicações com alguma importância no Brasil solicite suas bênçãos, baseada na lei 9472/97:

Art. 22. Compete ao Conselho Diretor: [...]

III - propor o estabelecimento e alteração das políticas governamentais de telecomunicações; [...]

IV - editar normas sobre matérias de competência da Agência;

VI - aprovar o plano geral de autorizações de serviço prestado no regime privado;

VII - aprovar editais de licitação, homologar adjudicações, bem como decidir pela prorrogação, transferência e extinção, em relação às autorizações para prestação de serviço no regime privado, na forma do regimento interno;

VIII - aprovar o plano de destinação de faixas de radiofreqüência e de ocupação de órbitas;

IX - aprovar os planos estruturais das redes de telecomunicações, na forma em que dispuser o regimento interno;

Eis que a lei fala na ocupação de órbitas, destinação de radiofrequências, redes de telecomunicações, licitações (com o fito de arrecadar) dos espaços virtuais na telecomunicação, além de sua soberania para tratar de matérias deste assunto. É uma agência que nasceu poderosa.

O caput art. 53. do regulamento dos serviços de telecomunicações (resolução Anatel n. 73/1998) assim dispõe:

Art. 53. A exploração de serviço no regime privado dependerá de prévia autorização e de notificação à Agência pela interessada, nos termos da regulamentação.

Ou seja, para funcionar no Brasil a Starlink deve primeiro pagar a taxa de mais de R$ 100.000,00 (cem mil reais), se submeter à legislação “extremamente simples” e efetuar o pedido para funcionar no Brasil.

Para isto, deve localizar no arcabouço legal, a qual serviço seu sistema se enquadra. Os principais serviços da Anatel são estes:

  1. Serviço Móvel Especializado - SME

  2. Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC

  3. Serviço de Radioamador

  4. Serviço Móvel Pessoal – SMP

  5. Serviço de Rádio do Cidadão

  6. Serviço de Acesso Condicionado (SeAC)

  7. Serviço de Comunicação Multimídia

  8. Serviço Limitado Privado

  9. Serviço Limitado Móvel Aeronáutico

  10. Serviço Limitado Móvel Marítimo

Acontece que os serviços satelitais no Brasil até então eram - por assim dizer - “fixos”, com antena fixa, instalada por um técnico devidamente treinado, com uso de equipamentos sofisticados e próprios para localização do satélite, com remoção e reinstalação em outro lugar demasiadamente difícil. Mas o sistema da Starlink é facilmente transportável, móvel, com antena (relativamente) pequena e dotado de sistema autosintonizante, o que não se enquadra nos regulamentos pré-existentes.

Provavelmente a Anatel já está se preparando para tomar as providências negativas caso a SpaceX a ignore (leia-se: não pague as taxas).


Anatel processa revendedor de sinal de provedor de internet

Segundo FREITAS, no artigo “Serviço de provedor de internet não precisa de autorização da Anatel” consta que esta nossa Anatel em conjunto com o MPF chegaram a denunciar um cidadão que revendia internet obtida de outra empresa (esta com a autorização da agência).

Se a Anatel busca processar um “pobre coitado” que revende sinal, o que fará então com uma empresa que atuará provavelmente em nível nacional? Claro que exigirão no mínimo o fornecimento das “bênçãos” estatal brasileira (leia-se pagamento de muitas e altas taxas).

A Anatel é quem deveria buscar as empresas que operam radiofrequência e fazer suas análises de forma não invasiva e isentas de taxas, visto que o interesse na operação da empresa é de toda a sociedade; e apenas com o fito de orientação e organização do setor. A presença do Estado nesta área pode ser nefasta e trazer atrasos incomensuráveis.

Cadê a eficiência constitucional? A eficiência aplicada à Anatel significa que esta agência é quem deve efetuar as fiscalizações e buscar o melhor para quem a paga, que são os cidadãos. E não exigir que as empresas a busque. E isto tem uma grande diferença para quem é de outro país e não entende o emaranhado de leis e regulamentações artesanais-artísticas brasileiras.


Internet para todos

Aqui foi lançado em 2017 o programa Internet para todos, que segundo dados da página do programa “no Brasil há mais de 30.000 localidades sem a conexão [...]” e que conta “com investimentos estimados em R$ 2,7 bilhões”, investidos “no satélite será utilizado para prover conexão, especialmente nas regiões mais remotas”. Ainda, segundo o governo, “o equipamento tem capacidade para cobrir todo o território brasileiro”. Tomara que o Elon Musk não veja esta última frase e dê risada do que a União faz aqui, pois tecnicamente a quantidade de satélites e a altura deles é o que faz a diferença entre a qualidade. Isto é lógico e dispensa maiores estudos neste sentido.

Mas, ainda não conseguimos testar o único satélite brasileiro, que é capaz de fazer um milagre de fornecer internet de excelente qualidade para toda a nação, pois, segundo VIEIRA, o Conselho de Políticas Fazendárias (Confaz), “graças a questionamentos sobre segurança jurídica da isenção do ICMS para os provedores parceiros, o programa se encontra congelado.”

E está assim desde 2019. Isto mesmo, um programa de extrema importância para o desenvolvimento das comunidades isoladas, que visa fornecer algo de grande importância que é a internet, encontra-se congelado desde então no CONFAZ, que precisa de uma decisão unânime de todos os Estados sobre o ICMS deste programa.

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A Rússia e outros países

Alguns países anunciaram que já autorizaram a Starlink e outros proibiram, como a Rússia, sob a alegação que os satélites poderiam estar a serviço militar dos EUA, e que todo o tráfego de rede naquele país deve passar pelas estações de controle de rede do governo.

Como é tecnicamente impossível evitar o seu uso, já que os mísseis russos não alcançam os satélites, situados a 550km, o governo daquele país então optou por estipular uma multa para quem for flagrado com os equipamentos SpaceX. Como será que funcionará esta multa? Interesse artigo a ser feito daqui alguns meses.

Se fosse o Brasil quem resolvesse multar (ou criminalizar) os usuários, será que esta atribuição ficaria a cargo da polícia militar e civil? Os nobres oficiais e delegados estarão encarregados de mais esta missão social. A defesa Estatal da propriedade privada e da vida provavelmente continuarão esquecidos no Brasil.

Segundo o ministro russo Dmitry Rogozin (by TECNOMUNDO), A SpaceX é uma rival no campo dos voos espaciais e utiliza de "uma política bastante predatória, inteligente, poderosa e altamente tecnológica para atender aos interesses militares dos Estados Unidos.”

Ou seja, na pobre Rússia - país com nível de desenvolvimento semelhante ao Brasil - os problemas são muitos para entender o que significa a internet livre para todos.

Já a Reino Unido, Alemanha, Austrália e Grécia (segundo AEROFLAP), já aprovaram a Starlink.

Quem o Brasil seguirá? A ditadura russa, ou as ricas Alemanha, Austrália e Grã-Bretanha?


Conclusão

Esta postura estatal brasileira, ao exigir taxas altíssimas e que as empresas busque a Anatel, além de estar em desacordo com a livre iniciativa e não contribuir para a “liberdade” da sociedade, ambos princípios pétreos constitucionais, tem grande chance de nos colocar em risco, com a negativa (ou atraso) da SpaceX em fornecer os serviços aqui nas terras Tupiniquins.

E se a SpaceX colocar o Brasil no fim da fila para entrega dos aparelhos? A Anatel nos fornecerá a Internet para todos?

A contrario sensu ajuda a explicar: se a Starlink funciona sem a necessidade de outorga, para que pedir isto? Até onde o Brasil será um mero empecilho ou um banal carimbador de papéis para os projetos americanos?

Tecnicamente a Starlink deverá funcionar no Brasil, independente do que a Anatel se pronunciar, a diferença será se os cidadãos serão ilegais (ou criminosos) ou serão "regulamentados". Havendo negativa, provavelmente serão perseguidos os usuários também, isto num eventual primeiro momento, pois em curto espaço de tempo estes deverão ser milhões; quando a agência nada poderá fazer.

Pessoalmente este que escreve já está na fila e ansioso pelo envio do kit Starlink.


Referências

STARLINK, www.starlink.com

Amaral, Bruno, Starlink ainda não pediu autorização à Anatel para prestar serviços no Brasil, acessado em 03/03/2021, no endereço: https://teletime.com.br/17/02/2021/starlink-ainda-nao-pediu-autorizacao-a-anatel-para-prestar-servicos-no-brasil/

Freitas, Danielli Xavier, Serviço de provedor de internet não precisa de autorização da Anatel, https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/noticias/143838076/servico-de-provedor-de-internet-nao-precisa-de-autorizacao-da-anatel

Brasil, Ministério da Ciência e Tecnologia, Internet para Todos, https://internetparatodos.mctic.gov.br/portal_ipt/opencms

VIEIRA, Nathan, 2019, Programa Internet para Todos aguarda liberação no Confaz por tempo indeterminado, acessado em https://canaltech.com.br/governo/programa-internet-para-todos-aguarda-liberacao-no-confaz-por-tempo-indeterminado-147595/

Revista Tecmundo, Rússia multará cidadãos que usarem a internet Starlink da SpaceX, https://www.tecmundo.com.br/mercado/209330-russia-multara-cidadaos-usarem-internet-starlink-spacex.htm

Revista AEROFLAP, Reino Unido aprova uso de internet Starlink do bilionário Elon Musk, https://www.aeroflap.com.br/reino-unido-aprova-uso-de-internet-starlink-do-bilionario-elon-musk/

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Sobre o autor
Daniel Tiago Inácio Salina

Doutorando em ciências jurídicas, servidor (TRE-AM)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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