1. CONCEITO
Com o cometimento da infração penal, surge o poder-dever do Estado em punir o infrator do delito (jus puniendi).
Poder-dever derivado do artigo 5º, caput, da Constituição Federal, que diz: todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.
Conforme se observa, o direito à segurança está expressamente protegido em nossa Carta Magna.
No Brasil, a persecução penal (persecutio criminis), direito do Estado em perseguir o infrator do delito, é constituída por duas partes, uma pré-processual e outra processual.
O procedimento mais comum para iniciar a persecução penal (fase pré-processual), embora não seja o único, é o inquérito policial.
Termo que surge primeira vez no ordenamento brasileiro com o advento da Lei nº. 2.033, de 20 de setembro de 1871, regulamentada pelo Decreto-Lei nº. 4.824, de 28 de novembro de 1871, mais precisamente em seu artigo 42.
Determinava o aludido artigo que o inquérito policial consistia em todas as diligências necessárias para o descobrimento dos fatos criminosos, suas circunstâncias, seus autores e cúmplices, devendo ser reduzido a instrumento escrito.
Embora a denominação tenha surgido somente em 1871, já havia no Código de Processo Penal de 1832 alguns procedimentos sobre a colheita de elementos de informação.
2. FINALIDADE
O inquérito policial é procedimento administrativo, desenvolvido pela policia civil e policia federal, cada qual em sua circunscrição, presidido pela autoridade policial, que tem por finalidade a colheita de elementos de informação acerca da autoria e materialidade da infração penal, a fim de possibilitar que o Ministério Público (titular da ação penal) possa exercer o jus persequendi in judicio.
Encontra fundamentação normativa no Título II do Código de Processo Penal, nos artigos 4º a 23 do referido diploma.
Outrossim, as investigações realizadas pela autoridade policial e seus agentes, contribuem para que pessoas inocentes não passem pelo vexatório processo criminal.
Segundo Guilherme de Souza Nucci, esse mecanismo auxilia a Justiça Criminal a preservar inocentes de acusações injustas e temerárias, garantindo um juízo inaugural de delibação, inclusive para verificar se se trata de fato definido como crime (2011, p. 149).
Nota-se a importância deste procedimento, haja vista que além da apuração de infrações penais e a capacitação de eventual ação penal, desempenha, ainda, importante papel na defesa da dignidade da pessoa humana, princípio fundamental da República Federativa do Brasil, que repousa no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal.
Perceba-se que o inquérito tem por finalidade a colheita de elementos de informação e, não a colheita de provas, nota-se a distinção de nomenclaturas.
Isto ocorre devido às mudanças produzidas no artigo 155 do Código de Processo Penal pela Lei nº. 11.690 de 2008, que introduziu a seguinte alteração: o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
A redação do artigo 155 do Código de Processo Penal deixa claro que PROVA só é produzida perante o juízo (ação penal), com a participação das partes e observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Já os ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO são aqueles colhidos na fase de investigação, sem a necessária participação das partes. Ou seja, nesta fase, não é necessária a participação das partes, bem como não é necessária à observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa.
À vista disso, é defeso ao magistrado formar sua livre convicção somente com base nos elementos colhidos na fase investigatória, haja vista que se assim o fizesse, cercearia o direito do, agora, acusado, bem como configuraria cristalina violação do inciso LV, do artigo 5º da Constituição Federal.
Em que pese o magistrado não poder fundamentar sua decisão somente com base nos elementos colhidos na primeira fase da persecução penal, nada impede que tais elementos possam ser utilizados subsidiariamente, complementando a prova produzida em juízo, sob a égide da ampla defesa e do contraditório.
Neste sentido ensina Julio Fabbrini Mirabete que, certamente, o inquérito serve para a colheita de dados circunstanciais que podem ser comprovados ou corroborados pela prova judicial e de elemento subsidiário para reforçar o que for apurado em juízo (2006, p. 63).
No mesmo sentido explica Renato Brasileiro de Lima:
No entanto, tais elementos podem ser usados de maneira subsidiária, complementando a prova produzida em juízo sob o crivo do contraditório. Como já se manifestou o Supremo, “os elementos do inquérito podem influir na formação do livre convencimento do juiz para a decisão da causa quando complementam outros indícios e provas que passam pelo crivo do contraditório em juízo. (LIMA, 2013. p. 74).
Embora tais elementos de informação não sejam produzidos com observância do artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal, são de imprescindível importância para a persecutio criminis, haja vista que, além de auxiliar na fomentação da opinio delicti do membro do Ministério Público, serve como embasamento da decretação de medidas cautelares pelo Juiz, desde que, a representação da autoridade policial esteja devidamente fundamentada.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
[1] REIS, Alexandre Cebrian Araújo Reis; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito Processual Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2012.
[2] LIMA, Renato Brasileiro. Curso de Processo Penal. Volume único. Niterói: Impetus, 2013.
[3] MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. 2ª ed. Campinas: Millenium, 2000.
[4] Julio Fabbrini. Processo Penal. 18ª ed. São Paulo: Atlas S.A, 2006.
[5] Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal. 7ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
[6] TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8ª ed. Salvador: Juspodivm, 2013.