Traçamos algumas linhas sobre o poder, onde comentamos o fenômeno do poder, mormente aos seus resultados quando atinge formas não-jurídicas.
Dentro do escopo de nossa investigação, detida no que tratamos e comentemos como a revolução do ser, em sua acepção material, do homem e seus espaços, cada vez mais conquistados com seu agir e pensar, criando a sua própria forma de expressão, derivada de sua singularidade.
Mas hoje, vemos uma cena pitoresca: o homem refém da tecnologia. O antropoceno, que é esta grande imagem do todo construída há milênios, resta consignada em termos dependentes de algo que nem se sabe ao certo o que é. Poucos detém o conhecimento técnico e o usam como instrumento de dominação. São mistificadores e aproveitadores. Dificultam o acesso dos outros a conhecimento, pois muito lucrativo conservar as coisas assim como estão.
A tecnologia, ou o espaço tecno-social é mais um espaço onde carece cidadania. A proteção do homem digital deve ser a mesma do homem real. Direitos, deveres e justiça dentro deste espaço multidimensional.
As concepções de tecnologia são vistas como pobres e miseráveis (HUI), posto que fundadas em um tecnocentrismo onde o homem é rendido à técnica. Entretanto, tanto a técnica quanto o homem estão em baixo desenvolvimento.
Impende observar que a tecnologia não transcende a natureza. O campo técnológico é mais um campo do saber que produz soluções, e não problemas.
A questão do poder manifestado por meio da tecnologia é o mesmo problema do poder em geral: falta de participação, exclusivismo, má-fé e sobretudo, um uso indiscriminado da tecnologia pelo chamado "estado brurocrático", visando à dominação, a "vida dos outros", ou seja, vigilância permanente de tudo e de todos. Um delírio típico dos dias atuais. Baixo desenvolvimento, acentuo.
O dominium é uma ilusão tão antiga quanto o próprio poder. A ganância e a disputa sem limites por poder tem levado a um resultado: a apolitização. Perda do interesse da pessoa por participação no processo político. A apolitização é o resultado de um processo político inflexivo e reflexivo. É um movimento político. É um não-ser o que-se-é.
Aquela revolução do ser que está em curso passa por essa perda da política. O cidadão perde o seu status politicae para readquirí-lo depois. Ele estratégicamente retira-se do campo político por aversão até redescobrir o seu eu-político. Toma o fracasso das vivências passadas como um elixir e cria as forças necessárias a um grande salto evolutivo. Ele chegará ao auto-governo. Onde governe ele mesmo.
Novamente quero frisar que tratamos aqui da soberania do cidadão. Este de onde emana o poder, em uma dada democracia. A democracia é um marco civilizatório. Não há como seguir em frente sem ele. Ele resiste duramente, dentro de uma gramática de poder lacunosa e obscura, de pobre vocabulário e formas jurídicas.
Urge aparelhar o cidadão de meios para a sua emancipação. E é por meio da técnica e da ciência do Direito que há uma luz no fim do túnel. A tecnologia do Direito medeia todos os campos do saber e tem uma vantagem, é uma ciência normativa. Ela é prescritiva, e não descritiva como as outras.
Portanto, no campo dos saberes e das técnicas, o Direito e suas ciências auxiliares é, na nossa visão, o único meio legítimo de romper as amarras que a ignorância trouxe: opressão, fome, miséria e morte. Tudo por conta do baixo desenvolvimento do ser humano, que, buscando seus próprios interesses egoísticos, afastou-se do Direito.
O poder é uma experiência ruim de ser vivida. Muito mais por quem é oprimido por ele. Essa experiência é ruim por falta de mediação dentro de uma dada sociedade. A mediação cria suas formas jurídicas para o poder, ele se manifesta nas formas.
Na realidade, a opressão produzida por um poder a que se deu forma, implementa apenas uma forma determinada de poder, a saber, pobre de mediação. Verdadeiramente, o poder produz. Ele produz força, ordena, determina. Ele não serve para inibir, delimitar ou aniquilar o indivíduo. mediação do poder produz um poder muito mais ativo do que um poder imediado.
As pessoas vivenciam as coisas pressionadas a vivenciá-las como escolhas próprias graças às suas posições inferiores. A técnica atual permite posições inferiores e posições superiores. Assim, nós temos duas categorias de pessoas: os privilegiados e os não-privilegiados. Aqueles que lutam para manter os privilégios e os que querem algum privilégio. É preciso reconstruir nossa visão de mundo, onde deixe de haver categorias de homens. Onde todos sejam o que quiserem ser, desde que mantida a eticidade como valor integrativo.
Existe o que eu poderia dizer de um campo inimaginável hoje, as possibilidades são infinitas, desde que abandonadas as posições individualistas de outrora. Hoje, é possível tecer comentários concretos sobre o auto-governo dos anarquistas. É mesmo um projeto ousado, mas que está fincado no solo rochoso da modernidade. O cidadão vivendo da maneira que quer, dentro de sua pólis. Verdadeiramente livre de tudo e de todos. Uma vida pacífica e fraterna.