O título deste singelo artigo visa instigar uma reflexão mais aprofundada acerca dos eventos que, por sua própria natureza, costumam mobilizar e “aglomerar” centenas de pessoas de uma só vez, que é o “Dia D” dos concursos públicos, qual seja, a data das provas.
Antes de mais nada, pretendo aqui fazer uma análise desprovida de qualquer escolha político-partidária, mas, tão somente, focada numa visão prudencial acerca dos desdobramentos envolvendo o binômio: realização de provas de concursos públicos X ação preventiva em prol da saúde pública.
De um lado temos o princípio vetor da acessibilidade aos cargos públicos por meio de concursos públicos (inciso I do art. 37 da Constituição Federal). Do outro, a garantia da saúde pública, que está ameaçada diante desse mal do século que é a pandemia da COVID-19 (arts. 196 e 197 da CF/88). Ao Estado é dever assegurar ambos!
É preciso bom senso e ponderação de interesses neste momento. Não há dúvida de que a máquina pública, sobretudo de áreas essenciais como saúde, segurança e educação, não pode parar e, para tanto, é imprescindível uma força humana para a execução das ações típicas da Administração Pública, em respeito ao princípio da continuidade do serviço público.
Por outro norte, já diziam meus avós: “é melhor prevenir do que remediar”. É um adágio popular sempre aplicável diante de situações em que há risco de prejuízo iminente.
Ora, os estudiosos de saúde pública têm, rotineiramente, afirmado que o coronavírus, precursor da doença COVID-19, tem grande potencial de propagação com a simples aproximação de uma pessoa contaminada ou de quem já foi infectado. Neste último caso, temos o mais recente fenômeno do surgimento de novas linhagens do vírus que escapam à imunidade alcançada com a primeira contaminação. Conforme afirmado por Átila Iamarino, Doutor em Microbiologia, “o consenso entre cientistas da área, no entanto, é de que é fundamental manter medidas de isolamento social por enquanto, inclusive para ganhar tempo a fim de trabalhar em alternativas”.
É indiscutível que a mais eficaz solução para a pandemia é imunizar toda a população. Nas palavras do Dr. Átila, somente “com imunidade permanente, se ninguém pega o vírus mais de uma vez, ele desapareceria em 5 anos; sem imunidade permanente, não se tem perspectiva de quando ele some; ainda não sabemos qual o caso e o próprio estudo recomenda testes de imunidade das pessoas para saber melhor”.
Voltando para o mundo dos concursos públicos, em recente decisão do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF) – SL 1431, suspendendo as provas do certame da Polícia Miliar do Estado do Pará, ele registrou que “a concentração presencial de tantos candidatos em momento de agravamento da crise sanitária vivenciada pelo Brasil e também pelo Estado do Pará representaria grave risco de lesão à saúde pública”. Ressaltou, também, que “as provas poderão ser adequadamente realizadas em data oportuna, quando relativizadas as restrições de circulação estabelecidas pelo próprio Estado do Pará”.
É nesse ponto que alerto ser indispensável um sopesamento dos interesses em jogo. Não podemos fechar os olhos à situação de milhares de candidatos que, durante anos, se preparam arduamente para participar de uma seleção pública, buscando realizar um sonho de ocupar um cargo/emprego público, tendo, para isso, que despender um esforço físico e mental inimaginável aos olhos de muitos. Este que vos escreve é prova disso, pois, por muitos anos, estudou para concursos e há mais de 11 anos exerce o mister de ajudar pessoas a ingressarem no serviço público por meio de um concurso público!
Contudo, trago uma reflexão recente do ilustre professor vocacionado na preparação para concursos públicos, Ridison Lucas de Carvalho, ao comentar em sua rede social no facebook sobre o certame para a Polícia Federal e Policia Rodoviária Federal, que também tiveram provas adiadas: “Sei que mudar a data de uma prova é difícil, mas é necessário. As provas somente podem ser realizadas se houver TOTAL CERTEZA da ausência de risco. Afinal, na dúvida NÃO ULTRAPASSE? Não é assim que dizem as regras [placas de trânsito]?”
Referido mestre, continua: “Além dos fiscais e de toda a organização, temos os motoristas de aplicativos, taxistas, pais, mães, filhos, avós e outros que transportarão diversos candidatos. Numa conta simples, temos a previsão de um movimento maior de 1 MILHÃO DE PESSOAS nos dois finais de semana das provas da PF e PRF pelo Brasil. [...] Urgência nas provas? Pelo amor de Deus! Urgência é para a contratação de médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, técnicos e demais profissionais da saúde. URGENTE É PRESERVAR A VIDA!”
Indubitável que o poder público deve tomar medidas preventivas com o mínimo de prejuízo à população. No caso dos concursos, concordo que adiar a realização das provas em cima da hora gera, além de uma frustração nos candidatos, com dano psíquico evidente, perdas financeiras, pois, por muitas vezes, vários dos concorrentes saem de um extremo para o outro do Brasil em busca da concretização de um sonho e, para isso, têm custos com passagens, hospedagens, alimentação, etc.
Na prática, é bom registrar que os concursos públicos não acabaram. Quando muito há uma restrição temporária de criação de novas vagas, que não atinge a reposição dos cargos vagos ou a vagarem (Lei Complementar n. 173/2020). O que se evidencia do momento é um retardamento dos certames, visando conter o avanço dessa terrível doença. É fato que muitos órgãos públicos precisam sim de gente para recompor seus quadros de pessoal. Porém, é necessária, nesta ocasião, uma estratégia interna com o máximo de otimização de pessoal para atender as demandas nessa circunstância sazonal pela qual passa o Brasil.
Em tudo há um ponto positivo. Quem sabe não é o momento ideal para você, que está na “pegada” dos estudos com “sangue no olho”, aproveitar essa folga para fortalecer seu aprendizado e “fechar a prova” no “Dia D” que se avizinha?
Ilustres concurseiros, acredito que melhor é sofrer uma frustração em vida, na certeza de que seu sonho se mantém vivo e apto a se tornar realidade, a ter que correr o risco de ver seu sonho interrompido em vida por uma ação açodada. Mais uma vez, trago à baila um ditado popular: “o apressado come cru”. Na atual conjuntura, caso haja uma postura com desdém ao momento crítico na saúde pública, pode ser que nem cru você consiga comer!
Da mesma forma, nós, professores, estamos, há mais de um ano, sentindo a falta dessa “vibe” positiva de vocês, alunos aguerridos, dentro de uma sala de aula, ávidos por conhecimento. Quanta saudade de tudo isso! Mas, finalizo parafraseando o nobre professor Ridison Lucas, na dúvida, SEJA PRUDENTE!
“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu.” (Eclesiastes 3:1)