Bens Digitais

Ação de Cobrança ou Execução e a existência de Criptoativos

Leia nesta página:

Solicito a penhora dos Bitcoins, Requer-se o bloqueio das contas e a penhora das criptomoedas do devedor. Serão estes os pedidos comuns futuramente?

          Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o direito de propriedade ficou evidenciado em seu artigo 5º. Quando tratamos de bens corpóreos (dinheiro, carro, casa...) esta proteção pode ser mais fácil de ser colocada em prática, haja vista que se está visualizando determinado bem, seja um imóvel cravado em um terreno, seja um saldo da conta bancária ou um automóvel que possui registro no Departamento nacional de trânsito. Nesses casos, conseguimos, claramente, visualizar esses bens e, assim, ter uma maior efetividade na sua proteção.

Recentemente, visualizamos muitas mudanças tecnológicas e o surgimento de novos bens, os bens digitais. Como exemplo, explicitamos os livros digitais, músicas armazenadas em plataformas, jogos eletrônicos e, até mesmo, uma nova moeda, a criptomoeda, capaz de substituir aquela forma tradicional de comprar com cartão de crédito ou dinheiro em espécie. Dessa forma, questionamos o fato de como adaptar essa nova modalidade de bens à legislação atual, haja vista a intangibilidade deste tipo de patrimônio.

          Sempre que alguém deve algum valor e seu credor sabe que ele tem bens é possível, na esfera judicial, pedir o bloqueio das contas correntes assim como o bloqueio de imóveis e veículos. Tal estratégia é utilizada para garantir que o devedor não irá dilapidar o patrimônio e que o direito do credor poderá ser satisfeito através do pagamento.

Como rastrear a existência e pedir o bloqueio ou penhora de Bitcoins , criptomoedas  ou criptoativos?

Esta pergunta pode ser feita para a cobrança de quaisquer dívidas, desde uma pensão alimentícia até uma execução judicial entre empresas.Apesar de ser obrigatória a declaração de criptomoedas no Imposto de Renda , de acordo com a Instrução Normativa n.º 1.888/2019, ainda não existe no Brasil um “órgão regulador” das moedas digitais.

          Mesmo sendo consideradas como “Bens e Direitos”, hoje, no Brasil, as criptomoedas não são consideradas como moeda pelo Banco Central, tampouco como valor mobiliário pela CVM, o que já foi reconhecido pelo STJ no Conflito de Competência nº 161.123, em 2018. No documento com a decisão (Ofício Circular nº 1/2018/CVM/SIN), a Comissão ressalta o risco de envolvimento com práticas ilícitas, como a lavagem de dinheiro, e orienta os gestores brasileiros a verificar se os fundos estrangeiros adquirem seus criptoativos por meio de exchanges reguladas e que tenham poder para interferir caso sejam identificadas práticas desse tipo.

Art. 5º Para fins do disposto nesta Instrução Normativa, considera-se:

I - criptoativo: a representação digital de valor denominada em sua própria unidade de conta, cujo preço pode ser expresso em moeda soberana local ou estrangeira, transacionado eletronicamente com a utilização de criptografia e de tecnologias de registros distribuídos, que pode ser utilizado como forma de investimento, instrumento de transferência de valores ou acesso a serviços, e que não constitui moeda de curso legal; e

II - exchange de criptoativo: a pessoa jurídica, ainda que não financeira, que oferece serviços referentes a operações realizadas com criptoativos, inclusive intermediação, negociação ou custódia, e que pode aceitar quaisquer meios de pagamento, inclusive outros criptoativos.

Parágrafo único. Incluem-se no conceito de intermediação de operações realizadas com criptoativos, a disponibilização de ambientes para a realização das operações de compra e venda de criptoativo realizadas entre os próprios usuários de seus serviços.

A pergunta central do artigo é acerca da rastreabilidade das moedas digitais, para que satisfaça o direito de recebimento da parte autora. Como não existe um órgão regulador como exemplo o Banco Central, as exchanges que são as intermediadoras é que fazem esta própria gestão.

Para tanto, existe também a Instrução Normativa RFB nº 1.888/19 para instituir às intermediadoras (exchanges) o dever de prestar informações relativas às operações realizadas com criptoativos

          Em caso de ações de cobrança o credor deverá descobrir se o devedor possui o criptoativo, apontar qual é a Exchange e pedir ao judiciário a ordem judicial, dirigida a exchanges ,  para que ocorra o bloqueio do criptoativo.

Difícil mesmo é conseguir rastrear estes valores, porque o blockchain permite o acesso a moeda virtual (como a Bitcoin) apenas por quem possui a chave privada da wallet (consequentemente, aquele que pode assinar uma transação). Trata-se de um modelo de segurança extremo.

Para mensurarmos a complexidade do tema quando se trata de uma Pessoa Jurídica, na qual seu balanço patrimonial é divulgado é possível identificar a existência de criptoativos, porém nem todas as empresas divulgam seu balanço, porque a depender do tipo societário não existe a obrigatoriedade da divulgação do balanço patrimonial.

Quando se trata de uma pessoa física, fica mais complexo ainda. Seria necessário, pedir a declaração do importo de Renda da pessoa Física IRPF, para analisar a declaração do Bem/Direito, identificar qual é a Exchange onde estará a movimentação e só depois pedir o bloqueio ou penhora do bem.

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          O novo sistema de busca de ativos do Judiciário ,SisbaJud, objetiva futuramente , ainda sem data determinada, a possibilidade do bloqueio online das criptomoedas, usando o modelo atual que já é interligado com BACEN e Bancos .

Em nota o CNJ reitera a dificuldade do bloqueio em função da complexidade do tema.

“As moedas virtuais, a exemplo do Bitcoin e Ethereum, não têm sua emissão regulada e controlada pelo Banco Central e não são operadas pelas instituições financeiras que compõe o Sistema Financeiro Nacional. Ainda não temos dados precisos do movimento financeiro envolvendo as moedas virtuais, porque, pela sua própria natureza, elas não ficam depositadas nas exchanges, dificultando sua localização para fins de penhora.”

É perceptível a importância do assunto, uma vez que há inversão de valores e que a legislação atual possui fragilidades para proteger os interesses da parte credora.

Pois bem, o que se vê diante disso é uma situação nova e complexa, e que merece atenção dos juristas e do legislativo, visto que estamos vivenciando uma evolução rápida da forma que é visto e gerenciado o patrimônio, além de que pessoas de má-fé poderão se utilizar dessa lacuna jurídica para deixar de cumprir com suas obrigações.

Ao Falarmos de recuperação de valores e pagamento de dívidas é importante procurar uma consultoria jurídica especializada no assunto, para que todas as medidas cabíveis inerentes ao interesse do credor sejam tomadas.

Autores

Dra. Ludmila Vianna 

Dr. Thiago Moura Pereira

 

 

Fontes:

http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=100592

http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?visao=anotado&idAto=102230

https://www.cnj.jus.br/sistemas/sisbajud/

https://www.ibet.com.br/tributacao-de-criptomoedas-e-regulacao-global/

https://www.empiricus.com.br/artigos/investimentos/o-que-voce-deve-saber-sobre-regulacao-do-bitcoin-no-brasil-e-no-mundo

Sobre os autores
Ludmila Vianna

Sólida experiência como Administradora de Empresas e em Gestão Financeira. Advogada e Admiradora convicta do Direito. Membro da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente da OAB-MG Graduada em Gestão de Recursos Humanos, Bacharel em Administração de Empresas, Bacharel em Direito, MBA em Administração Estratégica.

Thiago Moura Pereira

Advogado atuante em Direito Civil e Pós-Graduando em Direito Previdenciário

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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