Seis modos de suspender a cobrança de um tributo

12/04/2021 às 14:32
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A lei tributária traz hipóteses para suspender a exigibilidade (cobrança) do crédito tributário, quando: 1) for estipulado novo prazo para o pagamento; 2) existir discussão sobre aspectos da cobrança; ou 3) houver garantia em juízo.

Constituído o crédito tributário, seja pelo lançamento ou pelas demais formas, como confissão da dívida ou determinação pelo Poder Judiciário, o Fisco passa a ter o direito de exigir (cobrar) o crédito de modo administrativo ou judicial. Isto ocorre porque o crédito tributário, diferente da obrigação tributária, é líquido, certo e exigível. Caso não efetue o pagamento no valor e data de vencimento estipuladas, o devedor poderá ser executado na Justiça em uma ação de execução fiscal, incluindo na cobrança multa, juros de mora e correção monetária.

Porém, a lei tributária traz hipóteses para suspender a exigibilidade (cobrança) do crédito tributário, quando: 1) for estipulado novo prazo para o pagamento; 2) existir discussão sobre aspectos da cobrança; ou 3) houver garantia em juízo. São seis causas de suspensão elencadas nos incisos do art. 151, do CTN:

Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:

I - moratória;

II - o depósito do seu montante integral;

III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo;

IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança.

V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial;

VI – o parcelamento.

A lista acima é taxativa, o que significa que somente se o caso concreto se enquadrar em uma dessas seis hipóteses é que haverá a suspensão da exigibilidade do crédito tributário (arts. 97 e 141, do CTN). Regra geral, as hipóteses de suspensão ocorrem após o lançamento. Apenas uma delas pode ocorrer antes, a concessão de liminar em mandado de segurança preventivo que, apesar de ocorrer antes mesmo da existência do crédito tributário, busca o mesmo objetivo: suspender a exigibilidade futura do crédito. Aliás, neste caso, a suspensão não impede o Fisco de fazer o lançamento, mas apenas o impede de fazer a cobrança do crédito constituído.

A suspensão é benéfica para o sujeito passivo porque: 1) impede que o Fisco de cobrar o crédito de forma administrativa (avisos de cobrança, protestos) ou judicial (ação de execução fiscal); 2) autoriza a emissão de certidões positivas com efeitos de negativa (CPEN) durante este período; 3) impede a inscrição ou suspende o registro no Cadastro Informativo dos Créditos Não Quitados de Órgãos e Entidades Federais (CADIN) (art. 7º, II, da Lei 10.522/02); e 4) impede que o Fisco faça a compensação de ofício entre os créditos e débitos referentes aos mesmos sujeitos ativo e passivo.

Por outro lado, a suspensão também acaba sendo benéfica para o Fisco porque: 1) não se estende às obrigações acessórias (art. 151, § único, do CTN); e 2) suspende o prazo de prescrição para o Fisco cobrar a dívida na Justiça, que só volta a correr após o fim da suspensão.

 

MORATÓRIA

A moratória estende o prazo para o pagamento do tributo, seja parcelado ou em cota única, antes de ocorrer o seu vencimento (arts. 152 ao 155, do CTN). Exemplo: o pagamento do IPVA em parcelas, concedido pelo Estado, é um tipo de moratória.

A moratória pode ser dividida em individual ou geral. A moratória individual ou específica é aquela concedida por lei que: 1) beneficia as pessoas que preencherem determinados requisitos e 2) é reconhecida por meio de despacho da autoridade administrativa (art. 152, II, do CTN). Pode ser anulada, pois não gera direito adquirido caso o sujeito passivo deixe de cumprir os requisitos estabelecidos por lei ou acordados, como deixar de pagar o parcelamento. Se o motivo da anulação for dolo ou fraude, o sujeito passivo pagará os tributos com juros e multa.

Por outro lado, a moratória geral é a concedida por lei para um conjunto de sujeitos passivos, e não precisa de reconhecimento por despacho administrativo. Essa moratória se subdivide em dois tipos: a autônoma e a heterônoma. A moratória autônoma é a regra geral, sendo concedida pelo próprio ente competente tributário (art. 152, I, a, do CTN). Exemplo: a moratória de IPTU concedida pelo Município. A moratória heterônoma é uma exceção, sendo concedida pela União nos tributos de competência dos Estados, Municípios ou Distrito Federal, com a condição de que a União também conceda a mesma moratória em seus próprios tributos (art. 152, I, b, do CTN). Exemplo: a moratória de IPVA concedida pela União por causa do Covid-19.

A moratória também pode ser classificada como total ou parcial, em relação a abrangência territorial. Exemplo: se ocorre uma calamidade pública, enchente ou catástrofe em determinada região do Estado, este pode conceder moratória para o pagamento de ICMS apenas aos contribuintes da região afetada.

A moratória precisa ser instituída por lei ordinária, que não precisa ser específica. Significa dizer que a lei ordinária pode tratar de outros assuntos junto com a moratória.

Existem elementos obrigatórios que devem constar na lei moratória deve, mas ela também pode incluir alguns elementos facultativos (arts. 150, § 6º, CF; 153, CTN). Dentre os elementos obrigatórios estão o prazo da moratória e as condições e requisitos para a sua concessão. Dentre os elementos facultativos, a lei pode informar quais tributos vão ser abrangidos pela moratória, a quantidade de parcelas concedidas e o vencimento delas, além das garantias que o beneficiário precisa conceder.

Em regra, a moratória só se aplica aos créditos tributários já constituídos ou com o lançamento já iniciado, salvo se a lei determinar o contrário (art. 154, do CTN). Uma situação em que a moratória abrangeria créditos ainda não constituídos seria a que alcançasse os tributos lançados por homologação, em que o sujeito passivo antecipou o pagamento para depois a autoridade administrativa homologar.

 

DEPÓSITO DO MONTANTE INTEGRAL

O depósito do montante integral é um direito e uma garantia do sujeito passivo que quer suspender a exigibilidade do crédito tributário sem o receio de sofrer os atos executórios da instauração de um processo fiscal. Não é obrigatório, mas pode ser feito tanto se a discussão estiver no âmbito administrativo quanto se estiver no âmbito judicial. Neste ponto, na área tributária o depósito do montante integral é diferente da consignação em pagamento, pois quem consigna quer pagar, quem deposita quer discutir o débito.

Na via administrativa, o depósito ocorre como uma forma de defesa durante o recurso administrativo. O depósito é mais comum na via judicial, embora não seja um requisito para a discussão do tema no Judiciário (art. 5º, XXXV, CF; Súmula Vinculante 28, STF). Desta forma, fica afastado em Direito Tributário o princípio do Direito Civil solve et repete (pague e depois reclame). O depósito precisa ser integral, o que acaba tornando-o pouco atraente, já que na primeira instância judicial não se exige nenhum depósito. Considera-se valor integral a soma de tributo + juros + multas que o Fisco entenda como corretas, e não que o contribuinte considere como corretas. O depósito precisa ser em dinheiro (Súmula 112, STJ).

Súmula Vinculante 28, STF. É inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade do crédito tributário.

Terminada a demanda administrativa ou judicial, se o sujeito passivo sair vitorioso, o depósito deve ser devolvido integralmente com juros e correção monetária, sendo vedado ao Fisco reter o valor para compensação, mesmo que o sujeito passivo possua outras dívidas tributárias em aberto (Súmula 179, STJ). Se o sujeito passivo sair vencido, o depósito é convertido em renda destinada aos cofres públicos, e extingue-se o crédito tributário (art. 156, VI, CTN). Se o procedimento judicial for extinto sem resolução do mérito, o depósito é convertido em renda pública, salvo se o tributo for indevido ou se o Fisco não for o titular do tributo. O processo pode ser extinto sem a resolução do mérito por vários motivos, dentre eles: se ficar parado mais de um ano por culpa das partes (prescrição intercorrente), se o autor abandonar a causa por mais de 30 dias, se houver desistência, se a parte falecer etc. (art. 485, I a X, do CPC).

 

RECLAMAÇÃO E RECURSO ADMINISTRATIVOS

A reclamação, impugnação ou defesa tributária ocorre quando é aberto um processo administrativo fiscal (PAF) para a discussão do crédito tributário na primeira instância administrativa (Seção de Julgamento). O recurso ocorre quando a mesma discussão é levada à segunda instância administrativa (Órgão colegiado).

Não há custas processuais ou a necessidade de advogado. Desde 2009, é vedado exigir para o recurso administrativo que o sujeito passivo faça depósito recursal ou arrolamento de bens (Súmula Vinculante 21, STF). Enquanto o crédito tributário está em discussão no âmbito administrativo o contribuinte pode solicitar a certidão positiva com efeitos de negativa (CPEN) e não pode ser alvo de uma ação de execução fiscal ou ser inscrito na dívida ativa (art. 206, do CTN).

Para tanto, é requisito para se utilizar da reclamação e do recurso não estar inscrito na dívida ativa. Os procedimentos têm prazo de 30 dias para serem protocolados após a notificação.

 

LIMINAR E TUTELA ANTECIPADA

As duas são causas de suspensão que ocorrem por ordem do Poder Judiciário. Quando alguém busca o Poder Judiciário, está buscando a tutela jurisdicional, a proteção que o Estado fornece em determinado assunto, por meio de uma ação. Esta tutela será efetivamente prestada quando a sentença for proferida e transitar em julgado (não havendo mais recursos).

O Mandado de Segurança (MS) é o nome da ação judicial que defende o direito líquido e certo violado ou prestes a ser violado por uma autoridade que age com coação. Se o MS for proposto antes do lançamento tributário, é chamado de MS preventivo; se for depois do lançamento será MS repressivo. O MS será utilizado quando não existirem outras ações próprias para se buscar o direito pretendido. Exemplos: a ação declaratória de inexistência de obrigação tributária ocorre antes do lançamento, enquanto a ação anulatória de crédito tributário ocorre depois do lançamento.

Em alguns casos é possível que a tutela a qual se pleiteia seja dada, em todo ou em parte, antes da sentença, quando preenchidos certos requisitos, surgindo o instituto da tutela antecipada. A tutela antecipada tem caráter provisório, pois pode ser revogada ou modificada pelo juiz a qualquer momento durante o processo (art. 296, CPC). Enquanto a tutela antecipada (incidental) pode ser requerida a qualquer momento no processo, a liminar somente é deferida de imediato, antes da abertura do contraditório (arts. 294 ao 311, CPC).

Caso a tutela antecipada seja dada antes da abertura do contraditório, isto é, antes da contestação pela parte demandada (o Fisco, por exemplo), teremos uma liminar. Assim, a liminar é uma tutela antecipada que é dada sempre antes de aberto o contraditório. Quando se pede “requer seja concedida a tutela antecipada em caráter liminar”, demonstra domínio técnico e entendimento dos institutos pelo advogado. É como se a tutela fosse um substantivo e o caráter liminar o adjetivo.

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A tutela antecipada pode ser incidente ou antecedente. A tutela incidente ocorre dentro da ação principal, não havendo o pagamento de custas adicionais (art. 295, CPC). Já a tutela antecedente é um pedido requerido antes de se entrar com a ação principal, que será adicionada posteriormente (arts. 303 e 305, CPC).

Mesmo durante o trâmite de ações judiciárias contestando a obrigação tributária ou o crédito tributário, o Fisco deverá efetuar o lançamento do tributo, para a apuração do valor correto a ser cobrado e para evitar a decadência tributária. O Fisco só está vedado de fazer a inscrição na dívida ativa e abrir ação de execução fiscal. Caso não efetue o lançamento, o Fisco deverá aceitar os valores apurados e recolhidos pelo sujeito passivo caso ocorra a decadência.

 

PARCELAMENTO

O parcelamento é o pagamento do débito tributário em parcelas pelo sujeito passivo que não efetuou o pagamento do tributo até a data do vencimento, estando em mora. Não deve ser confundido com a moratória, apesar das regras desta serem aplicadas subsidiariamente quando não existir alguma norma própria do parcelamento (art. 155-A, § 2º, do CTN). O parcelamento precisa ser instituído por lei ordinária e específica (como no caso do REFIS) e suspende o crédito enquanto as parcelas estiverem sendo pagas.

Se as parcelas deixarem de ser pagas, o contribuinte pode ser excluído do programa de parcelamento. É inconstitucional a cláusula/condição no parcelamento que exija a renúncia da discussão dos débitos tributários no Poder Judiciário. No caso de recuperação judicial de empresa, deve existir uma lei ordinária específica de cada ente federativo trazendo as formas de parcelamento aceitas (art. 155-A, §§ 3º e 4º, CTN). Sem esta lei para o parcelamento da recuperação judicial, serão aplicadas as normas da Lei 10.522/2002, a Lei de Parcelamento Geral.


REFERÊNCIAS

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 10. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Forense, 2016.

DESMISTIFICANDO. Tutela Antecipada no Novo CPC: entenda os tipos de tutelas provisórias de uma vez por todas! Disponível em http://www.desmistificando.com.br/tutela-antecipada-no-novo-cpc/. Acesso em: 12 abr. 2021.

LADO DIREITO. Diferenças entre Tutela Antecipada e Liminar. Disponível em http://www.blogladodireito.com.br/2013/07/tutela-antecipada-ou-liminar.html. Acesso em: 12 abr. 2021.

PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 11. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 9. ed. - São Paulo: Saraiva, 2017.

ZANELLO, Cristina. Relevância Prática da Diferença entre Moratória e Parcelamento de Débitos Tributários. Fiscosoft, 05/2003. Disponível em http://www.fiscosoft.com.br/main_artigos_index.php?PID=287345. Acesso em: 12 abr. 2021.

Sobre o autor
Jefferson Luiz Maleski

Advogado previdenciarista, palestrante pela Escola Superior de Advocacia (ESA) da OAB Seccional Goiás e professor universitário. Pós-graduado em Direito e Prática Previdenciária e mestrando em Educação Profissional e Tecnológica. Juiz do Tribunal de Ética da OAB Goiás no triênio 2022-2024. Perito judicial. Membro da banca Celso Cândido de Souza Advogados, em Anápolis/GO.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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