O Princípio do Juiz Natural e o Princípio do Promotor Natural

14/04/2021 às 09:20
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Neste trabalho é trazido o entendimento do Princípio do Juiz Natural e do Promotor Natural, segundo a jurisprudência a doutrina e a importância de tais institutos para o devido processo legal.

1.O Princípio do Juiz Natural

O princípio do juiz natural, também dito o princípio do juiz legal ou ainda o princípio do juiz constitucional ou o princípio do juiz competente é o entendimento entre juristas do mundo inteiro, não exclusivamente no Brasil, que a autoridade julgadora seja constituído previamente por lei, antes da ocorrência do fato. Além disso, tal autoridade julgadora deve também possuir competência fixada em lei, condizente ao fato que será apreciado.

A necessidade dessas prerrogativas, juizo legalmente constituído antes do fato e competência legalmente conferida para julgamento, está em se coibir a formação de tribunais criados exclusivamente para julgar situações pontuais, ao bel prazer do poder estatal, bem como direcionar julgamentos para tribunais que não estão habilitados legalmente para tal.

Esses tribunais criados após o fato e destinados a julgar tal situação são os chamados tribunais de exceção. Esses tribunais não estão previstos em normativa legal alguma. Por exemplo, o Tribunal de Nuremberg, criado exclusivamente após a Segunda Guerra Mundial para julgar os crimes contra a Humanidade, praticados por ex-nazistas. No Brasil, no Governo de Getúlio Vargas (1930 – 1945), foi criado o Tribunal de Segurança Nacional, cujo objetivo era julgar crimes políticos, principalmente de integrantes da Intentona Comunista de Carlos Prestes.

Durante o regime militar brasileiro (1964 – 1984), foram criados pelo poder executivo os Atos Institucionais, dezessete ao todo, que eram normativas legais acima da própria Constituição Federal. Esses Atos Institucionais previam, entre outras coisas, o julgamento de pessoas civis por tribunais militares, uma atitude absolutamente contrária ao Princípio do Juiz Natural, bem como ao Princípio da Dignidade Pessoa Humana.

O Princípio do Juiz Natural é compatível com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, que exige, entre outras coisas, que todos devem ter um julgamento justo, dentro das conformidades da lei vigente, com direito a ampla defesa. Todos têm o direito, portanto, de conhecer seus julgadores e saber porque estão sendo julgados.

Apenas com a existência de um poder judiciário independente, livre e inviolável, que é possível a existência de um juiz natural e a existência do mesmo é prerrogativa de um Estado Democrático de Direito.

1.1 Evolução Histórica do Princípio do Juiz Natural

Os estudiosos da História do Direito afirmam que o Princípio do Juiz Natural surge pela primeira vez na Carta Magna do Rei João Sem Terra, em 1215, na Inglaterra:

Art. 39 – Nenhum homem livre será preso ou detido em prisão ou privado de suas terras, ou posto fora da lei ou banido ou de qualquer maneira molestado; e não procederemos contra ele, nem o faremos vir a menos que por julgamento legítimo de seus pares e pela lei da terra.

Depois, em 1627, na Inglaterra, cria-se o Petition of Rights:

III – E considerando igualmente que, pelo estatuto chamado A Grande Carta das Liberdades da Inglaterra, é declarado e ordenado que nenhum homem livre seja detido ou preso, ou espoliado de suas terras e liberdades, ou de seus livres costumes, ou banido e exilado, ou de qualquer maneira exilado, ou de qualquer maneira destruído, senão pelo legítimo julgamento de seus pares, ou pela lei da terra.

Em 1688, também na Inglaterra, institui-se o Bill of Rights:

Art. 3° - [...] a comissão que instituiu a ex-corte dos comissários e cortes da mesma natureza, é ilegal e nociva.

Neste último exemplo, vemos que a criação de juízes extraordinários após o fato ocorrido era proibido em 1688 no ordenamento jurídico inglês, criando a figura do juiz natural, dando mais garantia ao povo de um julgamento justo e livre de vícios.

Na França, na Lei de 16-24 de agosto de 1790, em seu artigo 17, do título II, expressa:

Art. 17. - A ordem constitucional das jurisdições não pode ser perturbada, nem os jurisdicionados subtraídos de seus juízes naturais, por meio de qualquer comissão, nem mediante outras atribuições ou evocações, salvo nos casos determinados pela lei.

Na Espanha, o Princípio do Juiz Natural surge na Constituição em 1876, em seu artigo 16, explicitamente como juiz competente e posteriormente na Constituição de 1931 em seu artigo 28.

Na Alemanha, a Constituição de Weimar, em 1919, em seu artigo 105 determinava a vedação da criação de tribunais de exceção, bem como ninguém poderia ser subtraído de seu juiz legal.

A Lei Fundamental de Bonn, Alemanha Ocidental, em 1949, no seu artigo 101 afirma que não pode ser criada jurisdição de exceção e ninguém deve ser subtraído de seu juiz legal.

Na Itália, no Estatuto Albertino de 1848, em seu artigo 71, dizia que não poderiam ser criados comissões ou tribunais de exceção. Hoje essa garantia está na Constituição italiana em seu artigo 102, desde 1948.

Na Constituição da Argentina de 1853, em seu artigo 18; também na Constituição do Chile de 1980, em seu artigo 19; na Constituição portuguesa de 1822, em seu artigo 212 e na Constituição japonesa de 1947, em seu artigo 76, todos garantindo a não existência de juízo ou tribunal de exceção.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem, proclamada em 1949 pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, afirma que toda pessoa tem direito, em condições de plena igualdade, de ser ouvida publicamente e com justiça por um tribunal independente e imparcial, para a apreciação de seus direitos e obrigações ou para o exame de qualquer acusação em assunto penal.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também conhecida como o Pacto de São José da Costa Rica, em 1969, diz em seu artigo 8°, n° 1 que:

1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.

Vemos, portanto, que o Princípio do Juiz Natural, desde a Idade Média, vem norteando o ordenamento jurídico das nações, criando condições reais para a instauração de um Estado Democrático de Direito, com direitos e garantias fundamentais da pessoa humana normatizados pelas Constituições. É o caminho natural de um povo civilizado.

1.2 O Princípio do Juiz Natural nas Constituições Federais Brasileiras

O Princípio do Juiz Natural é encontrado em praticamente todas as Constituições brasileiras, com uma exceção apenas na Constituição de 1937, no Chamado Estado Novo de Getúlio Vargas:

1.2.1 CONSTITUIÇÃO POLITICA DO IMPÉRIO DO BRAZIL (DE 25 DE MARÇO DE 1824)

[…]

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte.

[…]

XI. Ninguem será sentenciado, senão pela Autoridade competente, por virtude de Lei anterior, e na fórma por ella prescripta.

[…]

XVII. A' excepção das Causas, que por sua natureza pertencem a Juizos particulares, na conformidade das Leis, não haverá Foro privilegiado, nem Commissões especiaes nas Causas civeis, ou crimes.

[...]

1.2.2 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL ( DE 24 DE FEVEREIRO DE 1891)

[…]

Art.72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes: (Redação dada pela Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926)

[…]

§ 15. Ninguem sera sentenciado, senão pela autoridade competente, em virtude de lei anterior e na fórma por ella regulada. (Redação dada pela Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926)

[…]

1.2.3 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 16 DE JULHO DE 1934)

[...]

Art 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

25) Não haverá foro privilegiado nem Tribunais de exceção; admitem-se, porém, Juízos especiais em razão da natureza das causas.

26) Ninguém será processado, nem sentenciado senão pela autoridade competente, em virtude de lei anterior ao fato, e na forma por ela prescrita.

[...]

1.2.4 CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 10 DE NOVEMBRO DE 1937)

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL,

ATENDENDO às legitimas aspirações do povo brasileiro à paz política e social, profundamente perturbada por conhecidos fatores de desordem, resultantes da crescente a gravação dos dissídios partidários, que, uma, notória propaganda demagógica procura desnaturar em luta de classes, e da extremação, de conflitos ideológicos, tendentes, pelo seu desenvolvimento natural, resolver-se em termos de violência, colocando a Nação sob a funesta iminência da guerra civil;

ATENDENDO ao estado de apreensão criado no País pela infiltração comunista, que se torna dia a dia mais extensa e mais profunda, exigindo remédios, de caráter radical e permanente;

[...]

Art. 173 - O estado de guerra motivado por conflito com País estrangeiro se declarará no decreto de mobilização. Na sua vigência, o Presidente da República tem os poderes do art. 166 e a lei determinará os casos em que os crimes cometidos contra a estrutura das instituições, a segurança do Estado e dos cidadãos serão julgados pela Justiça Militar ou pelo Tribunal de Segurança Nacional. (Redação dada pela Lei Constitucional nº 7, de 1942)

[...]

Esse é o único exemplo que o Princípio do Juiz Natural foi deixado de lado no ordenamento jurídico brasileiro.

1.2.5 CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 18 DE SETEMBRO DE 1946)

[...]

Art. 141. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos têrmos seguintes:

[…]

§ 26 Não haverá fôro privilegiado nem juízes e tribunais de exceção.

§ 27 Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente e na forma de lei anterior.

[...]

1.2.6 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1967

[...]

Art. 150. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pais a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos têrmos seguintes:

[...]

§ 12. Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita de autoridade competente. A lei disporá sôbre a prestação de fiança. A prisão ou detenção de qualquer pessoa será imediatamente comunicada ao Juiz competente, que a relaxará, se não fôr legal.

[...]

§ 15. A lei assegurará aos acusados ampla defesa, com os recursos a ela inerentes. Não haverá fôro privilegiado nem tribunais de exceção.

[...]

1.2.7 EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 1, DE 1969

[...]

Art. 153. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos têrmos seguintes:

[...]

§ 12. Ninguém será prêso senão em flagrante delito ou por ordem escrita de autoridade competente. A lei disporá sôbre a prestação de fiança. A prisão ou detenção de qualquer pessoa será imediatamente comunicada ao juiz competente, que a relaxará, se não fôr legal.

[…]

§ 15. A lei assegurará ao acusado ampla defesa, com os recursos a ela inerentes. Não haverá fôro privilegiado nem tribunais de exceção.

[...]

1.2.8 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

[...]

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;

[...]

LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;

[...]

Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias:

[...]

II - inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, na forma do art. 93, VIII;

[...]

Vemos que nossa Carta Magna repudia explicitamente os tribunais de exceção e a justiça de conveniência. Também observamos a garantia constitucional da independência funcional e hierárquica do judiciário, tornando o Poder Judiciário parte legítima da afirmação do Estado Democrático de Direito de nosso país. Sem essa garantia, não seria possível um judiciário independente e não coagido.

1.3 O Princípio do Juiz Natural na Legislação Vigente

Atualmente o Princípio do Juiz Natural está implícito na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, XXXVII, LIII, onde trata dos Direitos e Garantias Fundamentais, e no artigo 95, II, onde trata dos direitos e garantias do magistrado.

Em combinação à legislação constitucional, temos o DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941, que institui o Código de Processo Penal, em diversos artigos, preceitua a existência do juiz competente:

[…]

Art.10. O inquérito deverá terminar no prazo de 10 dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 dias, quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela.

§ 1o A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará autos ao juiz competente.

[…]

Art. 19. Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado.

[...]

Art. 23. Ao fazer a remessa dos autos do inquérito ao juiz competente, a autoridade policial oficiará ao Instituto de Identificação e Estatística, ou repartição congênere, mencionando o juízo a que tiverem sido distribuídos, e os dados relativos à infração penal e à pessoa do indiciado.

[...]

Art. 75. A precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente.

[...]

No próprio Código de Processo Penal, define-se o que viria a ser essa competência do juiz:

[…]

Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:

I - o lugar da infração:

II - o domicílio ou residência do réu;

III - a natureza da infração;

IV - a distribuição;

V - a conexão ou continência;

VI - a prevenção;

VII - a prerrogativa de função.

Então, percebe-se que essa afirmação: juiz competente, não é apenas uma conjectura filosófica, mas uma determinação legal. A competência se amolda a uma normativa legal e a ela não pode fugir.

Isso é próprio da Ciência Jurídica, que deve seguir critérios rigorosos em suas afirmações e determinações, não fruto de uma subjetividade de um ocupante temporário de uma função administrativa pública.

A LEI COMPLEMENTAR Nº 35, DE 14 DE MARÇO DE 1979, que institui a Lei Orgânica da Magistratura Nacional, traz as garantias legais para o exercício pleno, independente e livre, da magistratura, imbuindo o poder judiciário de autonomia funcional e institucional:

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[...]

Art. 25 - Salvo as restrições expressas na Constituição, os magistrados gozam das garantias de vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos.

[...]

Essas garantias impedem que existam escolhas subjetivas de juízes para casos particulares, promovendo a injustiça a bem de um culpado ou a desfavor de um inocente. Também impõe a garantia de um julgamento imparcial, livre de coações ao poder judiciário, por qualquer singular ou grupo detentor de um poder econômico influente.

O juiz não está sujeito a nenhuma chefia, a nenhum compromisso escuso, doutrinário ou ideológico. Ele está sob a égide da Lei vigente e da Carta Magna, a qual deve total obediência nos seus julgados.

Só é admitido o tribunal estabelecido por competência, em lei. Tribunal criado para julgar exclusivamente uma situação fática não coaduna com a distribuição de competências, já elencadas na lei.

Caso ocorra uma situação que seja atípica, o legislador toma a atitude correta de atualizar a norma legal para abraçar a nova situação. Exemplo atualmente é o caso de Pandemia da doença COVID-19 devido ao vírus coronavírus recentemente descoberto. O legislador atualizou a normativa vigente, criando a Lei 13.979 de 6 de fevereiro de 2020. Esta lei trata de um assunto absolutamente novo na sociedade e como tal, o ordenamento jurídico se adapta a realidade vigente.

1.4 O Princípio do Juiz Natural na Doutrina

Todos os doutrinadores atuais, como Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, Vladimir Passos de Freitas ou Humberto Teodoro Júnior, são unânimes na existência e necessidade do Princípio do Juiz Natural em nosso ordenamento jurídico e sua função pilar de uma sociedade civilizada e evoluída em Direitos Fundamentais.

Não há Estado Democrático de Direito onde a justiça é coagida por forças alheias a ela, onde o julgamento é repleto de subjetividade e parcialidade, onde apenas quem detém o poder econômico vigente tem vez e voz.

Portanto, o Princípio do Juiz Natural só é possível se:

  1. O órgão jurisdicional foi criado por uma lei;

  2. A lei que investiu o órgão de jurisdição;

  3. A lei a.tribuiu competência ao órgão;

  4. Que tudo isso ocorreu antes do fato que ensejará o surgimento da causa judicial;

  5. A exigência de determinabilidade do juiz natural (prévia individualização através de leis gerais);

  6. garantia de uma justiça material (neutralidade e independência de um juiz);

  7. Princípio de fixação de competência do juiz natural (aplicação das regras decisivas para determinação do juiz da causa);

  8. a observância das determinações do procedimento referentes à divisão funcional interna (distribuição de processos).

1.5 Visão do STF sobre o Princípio do Juiz Natural

O Princípio do Juiz Natural atualmente é tema pacificado no Supremo Tribunal Federal, através da súmula 704:

Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados.

Portanto, nada mais há que se questionar sobre a existência ou validade do Princípio do Juiz Natural no ordenamento jurídico brasileiro. É recepcionado implicitamente pelo texto constitucional, pactos internacionais onde o Brasil ratifica e pela legislação infraconstitucional.

2.O Princípio do Promotor Natural

O princípio do promotor natural, também conhecido como o princípio do promotor legal é o entendimento que a autoridade com prerrogativa legal de acusação processual penal é o Ministério Público, com competência e liberdade funcional prescritas por lei.

O Ministério Público é órgão independente do poder judiciário, não devendo a este, portanto, obediência hierárquica. Também não está sujeito a qualquer interferência do Poder Legislativo ou Executivo, nem mesmo a interferência institucional interna, ou seja, o membro do Ministério Público possui direitos e garantias funcionais igualmente as do magistrado.

O Princípio do Promotor Natural é uma garantia da lisura do processo penal, afastando a possibilidade de acusações eivadas por motivações financeiras, ideológicas ou políticas. Toda pessoa tem o direito de ser acusado por um órgão predeterminado em lei, dentro das prerrogativas legais e garantias da livre defesa. Toda pessoa tem o direito de conhecer quem o acusa e o motivo. Tal acusação tem que estar embasada em critérios técnicos e científicos da Ciência Jurídica, não permitindo a subjetividade do acusador ou órgão.

O Ministério Público é o órgão competente e titular, definido em lei, a ser a voz do Estado na observância e cobrança da normativa legal. É o Vigilante da lei.

Assim como existe o juiz natural, o Promotor natural é uma consequência racional daquele. Se há o juiz competente, com as garantias legais de independência funcional, também tem que existir o acusador competente, com as garantias similares prefixas em lei.

O Princípio do Promotor Natural é uma evolução da sociedade rumo à civilidade, onde o Poder estatal em punir é limitado dentro dos liames da lei criada pelo próprio Estado. É um princípio basilar do Estado Democrático de Direito, onde toda pessoa tem a garantia de um processo honesto, dentro dos limites legais, por fatos após a criação da lei. É um princípio que harmoniza com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, onde os direitos e garantias fundamentais devem ser observados, mesmo para os transgressores das leis estatais.

​2.1.Evolução Histórica do Princípio do Promotor Natural

O Princípio do Promotor Natural evoluiu junto ao Princípio do Juiz Natural. Na realidade, a figura do acusador, desde épocas remotas sempre esteve tímida frente a figura do julgador. Não à toa que mesmo nos dias atuas têm-se a crença popular que o Promotor de Justiça é um auxiliar subalterno ao Juiz. Ou melhor, que Promotor de Justiça é uma etapa da carreira jurídica, antes de se atingir o magistrado. Verdadeiro é, que mesmo no meio acadêmico, pouquíssimas pessoas entendem como funciona o Ministério Público e qual seu posicionamento no ordenamento jurídico brasileiro.

Não podemos deixar de salientar que nunca na história do judiciário mundial, a figura do acusador não esteve presente, igualmente do julgador. Porém, o Ministério Público teve que percorrer uma longa via-sacra para ter seus direitos reconhecidos e normatizados. O Próprio Supremo Tribunal Federal, em passado recente, não reconhecia o Princípio do Promotor Natural em nosso ordenamento jurídico.

A sociedade evolui, essa é uma certeza, pode demorar, mas evolui. Hoje, tal princípio é basilar para uma sociedade dita civilizada.

​2.2.O Princípio do Promotor Natural nas Constituições Federais Brasileiras

A figura do Ministério Público como a voz do Estado no Processo Penal, nem sempre esteve presente no Brasil. O que também nem sempre esteve presente foram as garantias do Ministério Público em sua titularidade acusatória, bem como sua independência funcional e hierárquica. Por exemplo, no DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941, que institui o Código de Processo Penal, temos no seu artigo 26, temos:

[…]

Art.26. A ação penal, nas contravenções, será iniciada com o auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria expedida pela autoridade judiciária ou policial.

[...]

Observamos acima, que o legislador, para as contravenções penais, não atribuiu a exclusividade da ação penal ao Ministério Público. Tal atitude é um desvio de função, de sua origem para um órgão transverso, no caso, o judiciário ou a polícia judiciária. Isso exposto mostra que o Princípio do Promotor Natural, embora venha se desenvolvendo juntamente ao Princípio do Juiz Natural, não encontrou unanimidade de entendimento legal.

2.2.1.CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 18 DE SETEMBRO DE 1946)

É que efetivamente podemos dizer que o Princípio do Promotor Natural surge no ordenamento jurídico brasileiro:

[…]

Art. 127. Os membros do Ministério Público da União, do Distrito Federal e dos Territórios ingressarão nos cargos iniciais da carreira mediante concurso. Após dois anos de exercício, não poderão ser demitidos senão por sentença judiciária ou mediante processo administrativo em que se lhes faculte ampla defesa; nem removidos a não ser mediante representação motivada do Chefe do Ministério Público, com fundamento em conveniência do serviço.

[…]

Art. 141. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos têrmos seguintes:

§ 26 Não haverá fôro privilegiado nem juízes e tribunais de exceção.

§ 27 Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente e na forma de lei anterior.

[…]

Desde então, em todas as Constituições posteriores, a previsão legal do Ministério Público como órgão vitalício, independente e necessário ao ordenamento jurídico brasileiro vigorou.

​2.2.2.CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1967

[…]

Art. 138. O Ministério Público Federal tem por Chefe o Procurador-Geral da República. O Procurador será nomeado pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos indicados no art. 113, § 1º.

[...]

§ 1º Os membros do Ministério Público da União, do Distrito Federal e dos Territórios ingressarão nos cargos iniciais de carreira, mediante concurso público de provas e títulos. Após dois anos de exercício, não poderão ser demitidos senão por sentença judiciária, ou em virtude de processo administrativo em que se lhes faculte ampla defesa; nem removidos, a não ser mediante representação do Procurador-Geral, com fundamento em conveniência do serviço.

[...]

Art. 150. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pais a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos têrmos seguintes:

[…]

§ 15. A lei assegurará aos acusados ampla defesa, com os recursos a ela inerentes. Não haverá fôro privilegiado nem tribunais de exceção.

[…]

2.2.3.EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 1, DE 1969

[...]

Art. 95. O Ministério Público federal tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República, dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada.

§ 1º Os membros do Ministério Público da União, do Distrito Federal e dos Territórios ingressarão nos cargos iniciais de carreira, mediante concurso público de provas e títulos; após dois anos de exercício, não poderão ser demitidos senão por sentença judiciária ou em virtude de processo administrativo em que se lhes faculte ampla defesa, nem removidos a não ser mediante representação do Procurador-Geral, com fundamento em conveniência do serviço.

[…]

Art. 153. A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos têrmos seguintes:

[…]

§ 15. A lei assegurará aos acusados ampla defesa, com os recursos a ela inerentes. Não haverá fôro privilegiado nem tribunais de exceção.

[…]

​2.2.4.CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

[...]

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;

[…]

Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

§ 1º - São princípios institucionais do Ministério Público a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.

[…]

Art. 128. O Ministério Público abrange:

[…]

I - as seguintes garantias:

a) vitaliciedade, após dois anos de exercício, não podendo perder o cargo senão por sentença judicial transitada em julgado;

b) inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, mediante decisão do órgão colegiado competente do Ministério Público, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada ampla defesa; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

c) irredutibilidade de subsídio, fixado na forma do art. 39, § 4º, e ressalvado o disposto nos arts. 37, X e XI, 150, II, 153, III, 153, § 2º, I; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Vemos que nossa Carta Magna repudia explicitamente os tribunais de exceção e a acusação por encomenda. Também observamos a garantia constitucional da independência funcional e hierárquica do Ministério Público, tornando-o parte legítima da afirmação do Estado Democrático de Direito de nosso país. Sem essa garantia, não seria possível um Ministério Público independente e não coagido por forças externas.

​2.3.O Princípio do Promotor Natural na Legislação Vigente

Atualmente o Princípio do Promotor Natural está implícito na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, LIII, onde trata dos Direitos e Garantias Fundamentais, e nos artigos 127, § 1º e 128, I, alíneas a, b e c, onde tratam dos direitos e garantias do membro do Ministério Público.

Apenas com a existência de um Ministério Publico garantido independente funcional, hierárquico e orçamentário, pela lei, é que podemos aludir a um Promotor Natural.

Em combinação à legislação constitucional, temos a LEI Nº 8.625, DE 12 DE FEVEREIRO DE 1993, que institui a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, onde é garantida a exclusividade do Ministério Público como parte acusatória da ação penal pública e a independência de atuação do membro do Ministério Público, requisito basilar da existência do Promotor Natural:

[…]

Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

[…]

III - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

[…]

Art. 38. Os membros do Ministério Público sujeitam-se a regime jurídico especial e têm as seguintes garantias:

I - vitaliciedade, após dois anos de exercício, não podendo perder o cargo senão por sentença judicial transitada em julgado;

II - inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público;

III - irredutibilidade de vencimentos, observado, quanto à remuneração, o disposto na Constituição Federal.

[...]

Portanto, assim como não há tribunais e nem juízes arranjados para um julgamento em particular, sem previsão em lei anterior ao fato, também não pode existir um corpo acusatório excepcionalmente constituído para um caso concreto. Tal corpo acusatório tem que está previsto em legislação, previamente ao fato e deve possuir todas as garantias de liberdade funcional, senão, assim como no magistrado, pode ocorrer de um singular ou grupo economicamente poderoso interferir em processo penal que se fazem parte. O Promotor não pode ser conveniente com a injustiça, pois o mesmo é o vigilante de tal. O Ministério Público tem as mesmas garantias do poder judiciário, não sendo parte deste, nem abrangendo o mesmo. É independente absolutamente e suas garantias funcionais estão de acordo com os Princípios humanitários norteadores de nossa legislação, onde nos garante um julgamento justo, sem vícios e sem intervenção de forças alheias ao processo.

​2.4.O Princípio do Promotor Natural na Doutrina

Atualmente todos os doutrinadores reconhecem o Princípio do Promotor Natural no ordenamento jurídico brasileiro e sua necessidade de existência.

Não há Estado Democrático de Direito onde o Ministério Público é fragilizado e dependente de subjetividade de gestores públicos ou que seja coagido por forças alheias a ele.

Portanto, o Princípio do Promotor Natural só é possível se:

  1. O órgão acusatório foi criado por uma lei;

  2. A lei atribuiu independência ao órgão;

  3. A lei atribuiu as funções do órgão;

  4. Que tudo isso ocorreu antes do fato que ensejará o surgimento da causa judicial;

  5. A exigência de determinabilidade do promotor natural (prévia individualização através de leis gerais);

  6. garantia de uma justiça material (neutralidade e independência de um promotor);

  7. Princípio de fixação de competência do promotor natural (aplicação das regras decisivas para determinação do acusador da causa);

  8. a observância das determinações do procedimento referentes à divisão funcional interna (distribuição de processos).

​2.5.Visão do STF sobre o Princípio do Promotor Natural

O Supremo Tribunal Federal reconhece o Princípio do Promotor Natural em nosso ordenamento jurídico. Caso emblemático é o julgamento do Habeas Corpus 67759/RJ, julgado em 06 de agosto de 1992:

HABEAS CORPUS - MINISTÉRIO PÚBLICO - SUA DESTINAÇÃO CONSTITUCIONAL - PRINCÍPIOS INSTITUCIONAIS - A QUESTÃO DO PROMOTOR NATURAL EM FACE DA CONSTITUIÇÃO DE 1988 - ALEGADO EXCESSO NO EXERCÍCIO DO PODER DE DENUNCIAR - INOCORRÊNCIA - CONSTRANGIMENTO INJUSTO NÃO CARACTERIZADO - PEDIDO INDEFERIDO. O postulado do Promotor Natural, que se revela imanente ao sistema constitucional brasileiro, repele, a partir da vedação de designações casuísticas efetuadas pela Chefia da Instituição, a figura do acusador de exceção. Esse princípio consagra uma garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro do Ministério Público, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente do seu ofício, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o Promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e pré-determinados, estabelecidos em lei. A matriz constitucional desse princípio assenta-se nas cláusulas da independência funcional e da inamovibilidade dos membros da Instituição. O postulado do Promotor Natural limita, por isso mesmo, o poder do Procurador-Geral que, embora expressão visível da unidade institucional, não deve exercer a Chefia do Ministério Público de modo hegemônico e incontrastável. Posição dos Ministros CELSO DE MELLO (Relator), SEPÚLVEDA PERTENCE, MARÇO AURÉLIO e CARLOS VELLOSO. Divergência, apenas, quanto a aplicabilidade imediata do princípio do Promotor Natural: necessidade da "interpositio legislatoris" para efeito de atuação do princípio (Ministro CELSO DE MELLO); incidência do postulado, independentemente de intermediação legislativa (Ministros SEPÚLVEDA PERTENCE, MARÇO AURÉLIO e CARLOS VELLOSO) . - Reconhecimento da possibilidade de instituição do princípio do Promotor Natural mediante lei (Ministro SYDNEY SANCHES). - Posição de expressa rejeição a existência desse princípio consignada nos votos dos Ministros PAULO BROSSARD, OCTAVIO GALLOTTI, NÉRI DA SILVEIRA e MOREIRA ALVES.

(STF - HC: 67759 RJ, Relator: CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 06/08/1992, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 01-07-1993 PP-13142 EMENT VOL-01710-01 PP-00121)

2.6.Importância do Princípio do Juiz Natural e do Promotor Natural para a Efetividade do Devido Processo Legal

O Princípio do Juiz Natural implica a inexistência de tribunais de exceção e de julgamentos por incompetência. Esses tribunais de exceção são julgamentos que não estão previstas no ordenamento jurídico, em total afronta aos princípios básicos da Dignidade da Pessoa Humana. Essa competência é uma definição técnica, prevista em lei.

Não há como a sociedade evoluir sob a batuta da injustiça e do arbítrio estatal. Nossa sociedade hoje é um Estado Democrático de Direito, implicando tal posição de efeito, uma evolução de mentes individuais e grupos. Certo é que nem sempre vemos essa realidade, até mesmo no cenário político público vigente. O direito a um julgamento justo, imparcial, lícito, livre de vícios ou influências nefastas, bem como a garantia da voz dos menos favorecidos economicamente, soar em defesa própria, em busca de uma vida feliz, é o que qualquer sociedade dita civilizada deve buscar.

O processo penal somente será legal, ou seja, dentro das conformidades previamente estabelecidas por lei, se certas garantias forem estabelecidas e seguidas. Sempre há um singular ou grupo, que usando de poder econômico, tenta afastar o objetivo basilar do processo judicial: aplicação da justiça e restabelecimento da ordem pública. Em toda a história brasileira esse fenômeno ocorreu, ou porque os meios e métodos de fiscalização eram e são insuficientes e ineficientes, ou porque não havia previsão legal que garantia a independência do magistrado em seu trabalho. Exemplo, no tempo do Império, o magistrado vivia sob a sola do sapato do Imperador e seus caprichos. Não havia como atingir a justiça, objetivo último da prática jurídica.

O magistrado hoje é dotado de garantias constitucionais e infraconstitucionais para o exercício da função nobre de julgar. É através de um estabelecimento técnico e científico que o poder judiciário pode aferir o “jus puniendi” do Estado. Não de forma caprichosa e subjetiva, seguindo uma determinação de um superior, mas seguindo uma lógica legislativa pré fixada. As garantias constitucionais aos magistrados na realidade são uma garantia ao povo, de um julgamento justo e sem vícios.

O Povo é o destinatário fim de toda ação estatal. Nada deve ser feito se não for para mérito e usufruto da sociedade. Abominável é o individualismo nas práticas públicas, onde indivíduos revestidos de poder temporário, usam a confiança do povo para se locupletar, esquecendo milhares e até milhões ao sofrimento da miséria e abandono à violência mundana.

Nesse feito, temos também o poder estatal como acusador. Sim, o Estado tem a titularidade em julgar e acusar seus cidadãos. É muito poder para não ser limitado, de forma objetiva ou subjetiva. A Constituição vem como o grito do povo contra qualquer arbítrio, contra forças insurgentes à liberdade e garantia de vida feliz de nossa gente. Não à toa que todo governo autoritário busca, sem medida, desqualificar o texto constitucional. Lá está realmente o grito do povo e isso é demais para ouvidos trabalhados na insensatez, violência, ganância, egoísmo e desumanidade.

O Princípio do Promotor Natural, similarmente ao do juiz natural, implica uma limitação ao poder estatal em acusar e aplicar o seu “jus puniendi”. Não pode haver promotores por conveniência, influenciáveis por motivos econômicos, ideológicos ou políticos. Esses promotores, que compõe um poder próprio, diferente dos outros três, mas sem dependência hierárquica e orçamentária, têm garantias constitucionais e infraconstitucionais similares aos magistrados, para a prática funcional livre de qualquer coação. A ação penal pública é privativa do Ministério Público, ou seja, o Estado que detém a titularidade em julgar e acusar, o faz através do poder judiciário e do Ministério Público. Para que isso se torne realidade, deve haver transparência, legitimidade legal, independência total e absoluta liberdade investigativa. Toda pessoa tem o direito de saber por que é acusada e por quem. Quais os critérios científicos que qualificam sua ação como transviada do esperado normativo. É portanto, um princípio fundamental de garantia de direitos do povo, da pessoa humana.

O Processo Penal somente será efetivamente legal se as garantias constitucionais e infraconstitucionais dos magistrados e membros do Ministério Público, bem como as garantias e direitos fundamentais da pessoa humana, elencadas, não exaustiva, no texto constitucional e legislação paralela, forem observadas à risca. O Estado acusa e também julga, mas deve fazê-lo dentro de uma lógica legislativa preestabelecida antes do fato. Também sua titularidade punitiva deve ser comedida, relativizada, limitada. Isso posto senão voltamos para a era da palavra final do Rei, que tudo podia, tudo tinha, tudo queria e seu povo igualmente a um cão faminto, se servia de sobras.

O estabelecimento do Estado Democrático de Direito é traduzido na ação correta e garantida legalmente, do poder judiciário e do Ministério Público. Essa é a importância do Princípio do Juiz Natural e do Princípio do Promotor Natural na efetividade do Processo Legal: O Povo está em segurança, tanto do arbítrio estatal, como de forças funestas alheias a ordem social.

REFERÊNCIAS

[1] GOMES, Gustavo Henrique Comparim. Princípio do Juiz Natural à luz da doutrina e jurisprudência dos Tribunais Superiores. Conteúdo Jurídico, Brasília / DF: 30 maio 2020. Disponível em: <https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/35064/principio-do-juiz-natural-a-luz-da-doutrina-e-jurisprudencia-dos-tribunais-superiores>. Acesso em: 30 maio 2020.

[2] PAULINO, Priscilla Ribeiro. Análise do princípio do promotor natural. Conteúdo Jurídico, Brasília / DF: 30 maio 2020. Disponível em: <https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54042/anlise-do-princpio-do-promotor-natural>. Acesso em: 30 maio 2020.

[3] AGUIAR, João Marcelo Brasileiro de. O princípio do promotor natural no Direito brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 43, 1 jul. 2000. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/1056>. Acesso em: 30 maio 2020.

[4] SANTOS, Valdec Francisco dos, et al. Princípio do promotor natural. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 156, 1 set. 2015. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/42927>. Acesso em: 30 maio 2020.

[5] FRANCO JÚNIOR, Raul de Mello. Princípio do promotor natural. Página de Direito Constitucional, Brasil, 10 out. 1997. Disponível em: <http://www.raul.pro.br/artigos/pjnatur.pdf> . Acesso em : 30 maio 2020.

[6] VIEIRA, Rodrigo. O princípio do juiz natural. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 156, 1 set. 2015. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/43034>. Acesso em: 30 maio 2020.

[7] PINHEIRO, M. C. S. A.. Reflexões acerca do princípio do juiz natural. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, v. 18, p. 199-213, 2000.

[8] COUTINHO, J. N. M.. O principio do juiz natural na CF/88: ordem e desordem. Revista de Informação Legislativa, v. 45, p. 165-178, 2008.

[8] Coutinho, Jacinto Nelson de Miranda. “O princípio do juiz natural na CF/88 : ordem e desordem”. Artigo, julho de 2008. https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/176542.

[9] FERNANDES, Cristina Wanderley. O princípio do juiz natural e os tribunais de exceção. Revista Âmbito Jurídico, Direito Constitucional, Revista 17, Maio, 2004. Disponível em <https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-constitucional/o-principio-do-juiz-natural-e-os-tribunais-de-excecao/>. Acesso em 30 maio 2020.

[10] FREITAS, Vladimir Passos de, O princípio do juiz natural em um mundo em transformação, Consultor Jurídico, set, 2018. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2018-set-23/segunda-leitura-principio-juiz-natural-mundo-transformacao>. Acesso em 30 maio 2020.

[11] DUARTE, A. F.; Princípio do promotor natural, jusbrasil.com.br, 2015. Disponível em: <https://anandafroisduarte.jusbrasil.com.br/artigos/232661433/principio-do-promotor-natural>. Acesso em 03 junho 2020.

[12] CONSTITUIÇÃO POLITICA DO IMPERIO DO BRAZIL (DE 25 DE MARÇO DE 1824), Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[13] CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL ( DE 24 DE FEVEREIRO DE 1891), Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[14] CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 16 DE JULHO DE 1934), Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[15] CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1937, Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao37.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[16] Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946, decretada pela Assembléia Constituinte, Câmara dos Deputados, 2020. Disponível em <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1940-1949/constituicao-1946-18-julho-1946-365199-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[17] Constituição do Brasil de 1967, decretada e promulgada pelo Congresso Nacional, Câmara dos Deputados, 2020. Disponível em <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1960-1969/constituicao-1967-24-janeiro-1967-365194-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[18] EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 1, DE 1969, Câmara dos Deputados, 2020. Disponível em <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1960-1969/constituicao-1967-24-janeiro-1967-365194-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[19] EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 1, DE 1969, Câmara dos Deputados, 2020. Disponível em <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/consti/1960-1969/constituicao-1967-24-janeiro-1967-365194-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[20] CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988, Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[21] DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941, Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[22] DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941, Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[23] DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, Nações Unidas, 2020. Disponível em <https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2018/10/DUDH.pdf>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[24] DECRETO No 678, DE 6 DE NOVEMBRO DE 1992, Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[25] LEI Nº 8.625, DE 12 DE FEVEREIRO DE 1993, Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8625.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[26] LEI COMPLEMENTAR Nº 35, DE 14 DE MARÇO DE 1979, Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp35.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

[27] LEI COMPLEMENTAR Nº 35, DE 14 DE MARÇO DE 1979, Presidência da República – Casa Civil, 2020. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp35.htm>. Acesso em 07 de junho de 2020.

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Trabalho apresentado ao Curso de Bacharelado em Direito do Centro de Ensino Superior do Ceará, Faculdade Cearense, a ser utilizado como segunda nota parcial da disciplina Direito Constitucional I.

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