Teoria Geral da Prova

23/04/2021 às 15:25
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O presente conteúdo jurídico trata-se sobre a prova no processo penal e sua teoria. Tema de supra importância para o estudo e muito exigido em provas.

Sumario: Introdução. 1. Princípios da prova. 1.1. princípio da autorresponsabilidade das partes. 1.2. princípio da audiência contraditória. 1.3. Princípio da aquisição e comunhão das provas. 1.4. Princípio verdade real e comunhão das provas. 1.5. Princípio do livre convencimento motivado. 1.6. Princípio da oralidade. 1.7. Princípio da publicidade. 1.8. Princípio da não autoincriminação. 2. Conceito de prova. 3. Objetivo e natureza jurídica da prova. 4. Destinatários. 5. Objetos. 6. Classificação das provas. 7. Meios de provas. 8. Provas ilícitas. 9. Ônus da prova. 9.1. Elementos de mitigação da pena. 10. Do magistrado. 11. Prova emprestada. 12. Sistemas de valoração de provas.

 

Introdução

Iremos tratar sobre a teoria geral das provas no processo penal, este previsto nos artigos 155 a 157 do CPP.

O processo penal é um instrumento de retrospecção, de reconstrução aproximativa de um determinado fato histórico. Como ritual, está destinado a instruir o julgador, a proporcionar o conhecimento do juiz por meio da reconstrução histórica de um fato. Dessa forma, as provas são os meios através dos quais se fará essa reconstrução do fato passado (crime). O tema probatório é sempre a afirmação de um fato (passado), não sendo as normas jurídicas, como regra, tema de prova.

Podemos imaginar da seguinte forma: um juiz julgando no presente (hoje) um homem e seu fato ocorrido num passado distante (anteontem), com base na prova colhida num passado próximo (ontem) e projetando efeitos (pena) para o futuro (amanhã). Assim como o fato jamais será real, pois histórico, o homem que praticou o fato não é o mesmo que está em julgamento e, com certeza, não será o mesmo que cumprirá essa pena, e seu presente, no futuro, será um constante reviver o passado.

O processo penal, inserido na complexidade do ritual judiciário, busca fazer uma reconstrução (aproximativa) de um fato passado. Através das provas, o processo pretende criar condições para que o juiz exerça sua atividade recognitiva, a partir da qual se produzirá o convencimento externado na sentença. É a prova que permite a atividade recognoscitiva do juiz em relação ao fato histórico (story of the case) narrado na peça acusatória. O processo penal e a prova nele admitida integram o que se poderia chamar de modos de construção do convencimento do julgador, que formará sua convicção e legitimará o poder contido na sentença.

 

Portanto, a atividade do juiz é sempre recognitiva, pois, como induz Jacinto Coutinho, “a um juiz com jurisdição que não sabe, mas que precisa saber, dá-se a missão de dizer o direito no caso concreto”. Daí por que o juiz é, por essência, um ignorante: ele desconhece o fato e terá de conhecê-lo através da prova.

  1. Princípios da prova

Todo o campo do direito tem os princípios basilares que regem determinados assuntos e no processo penal não seria diferente. Dessa forma, os princípios que regem a produção probatória, são:

  1. Princípio da autorresponsabilidade das partes

O indivíduo responde pelo exercício probatório que produzir, pode-se falar em ônus da prova que atribui a responsabilidade no litígio às partes com o intuito de demonstrar a veracidade dos fatos. Esse meio de provar um acontecimento, além de ser usado para convencer o julgador, é utilizado para o benefício de algum dos litigantes na relação processual. Desse modo, conforme o art.156 do Código de Processo Penal:

Art. 156 - A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:

I - Ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;

II - Determinar, no curso da instrução, ou antes, de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.

  1. Princípio da audiência contraditório

Toda prova produzida por uma das partes admite a produção de uma contraprova pela parte contrária.

Quando se fala no princípio da audiência contraditória em que as partes participam da produção probatória, deve-se mencionar o princípio do contraditório, o qual é assegurado na Carta Magna de 1988.

Contraditório, elencando na Constituição, é o direito que as partes do processo possuem de se defenderem às imposições opositivas. O art. 5º, inciso LV da Constituição Federal, menciona:

Art. 5º - Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral é assegurado o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes

Na audiência de instrução e julgamento é que se origina esse procedimento, no qual há, conforme o artigo 400 do Código do Processo Penal: a acusação da vítima; testemunhas das partes; contradição do acusado. Portanto, as partes têm o direito de conhecimento prévio da sua manifestação durante a audiência, ou seja, deve ocorrer anteriormente a decisão.

  1. Princípio da aquisição e comunhão das provas

Se no momento de composição das provas a responsabilidade pertence à parte que a produzir, uma vez entregue, o valor probatório será do processo. Por meio disso, o juiz aperfeiçoará sua convicção em relação à prova a fim de julgá-la.

Pode-se ressaltar ainda que o princípio da aquisição e comunhão das provas está previsto no art. 251 do Código de Processo Penal, prevendo:

Art. 251 - Ao juiz incumbirá prover à regularidade do processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos, podendo, para tal fim, requisitar a força pública.

O julgador por intermédio de ofício, desse modo, poderá ouvir as testemunhas.

  1.  Princípio verdade real e comunhão das provas

Utilizando o princípio da verdade real, o juiz deve buscar a realidade de um acontecimento e se desviar daqueles desprovidos da não controvérsia. Pertence ao processo penal, colocando o magistrado como investigador e julgador; com isso, na doutrina, há críticas em relação a este fato, no qual há um debate de violação do devido processo legal e do sistema acusatório imposto no Brasil.

A prova pertencendo ao processo deduz-se que trazer a verdade real absolutamente pode ser algo que não pode ser alcançado. Dessa forma, vê-se que um fato ocorrido em períodos anteriores é “materialização formal” de um momento que já se efetivou. Portanto, o Princípio da aquisição e comunhão traz a ideia de que no momento da entrega da prova, esta pertence ao órgão julgador e ao magistrado cabe o dever de auxiliar na procura da verdade real.

  1.  Princípio do livre convencimento motivado

O artigo 131 do CPC também consagra o Princípio do Livre Convencimento Motivado, como sistema da persuasão racional. Desta forma, o julgador é livre para analisar as provas produzidas e decidir a demanda apresentada conforme seus critérios de entendimento, por meio do seu raciocínio e na lógica, desde que tenha por base os elementos constantes dos autos, as provas, e que fundamente sua decisão, sempre baseado na legislação pátria e na Constituição Federal.

No processo penal as provas possuem valor relativo e não são valorizadas de acordo com a lei, sendo que o juiz possui liberdade de apreciá-las da maneira que melhor lhe convencer, de acordo com o seu entendimento, desde que sua decisão seja devidamente fundamentada sob pena de ser nula.

De acordo com o art. 155 do Código de Processo Penal:

Art. 155 - O Juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.

Ao apreciar as provas desta maneira, o juiz não se vale de qualquer orientação legal, mas simplesmente, de uma forma racional, de acordo com a sua convicção, considerando todos os elementos presentes nos autos em sua totalidade. Ao final, o magistrado apresenta os argumentos devidamente fundamentados que o levaram à determinada decisão.

Um fato importante de salientar é que em nosso sistema jurídico não existe hierarquia entre as provas apresentadas em um processo, sendo que todas possuem o mesmo valor para o entendimento do juiz/julgador

  1. Princípio da oralidade

Nada mais é do que priorizar as provas faladas do que as escritas. Geralmente é mais utilizado na colheita de provas em audiências, onde acontecem os depoimentos. Uma prova feita perante o juiz possibilita que o mesmo participe no momento, formando seu convencimento, no exato instante da produção da prova permitindo a avaliação precisa da sinceridade da pessoa que está a sua frente.

A oralidade no momento processual, deve ser realizada perante o juiz. E em um instante no processo, a linguagem falada é crucial, sem haver danos documentais, pois, ela é registrada nos autos. Com a relevância desse princípio, outros são relacionados a ele, devido à oralidade processual.

Pode-se, assim, destacar: o princípio da concentração, que atribui o menor número possível de audiências, a fim de trazer um processo célere; o princípio da imediação, que é aquele no qual o magistrado tem contato diretamente com as provas e sem intermediação; e o princípio da identidade física do juiz, no qual se entende que o juiz que efetivará a resolução final é aquele que esteve diretamente com as provas.

O princípio da oralidade em sentido estrito, é a utilização da palavra dita oralmente em juízo, estabelecendo que as deduções das partes, normalmente, devem fazer-se naquele momento em audiência, o qual é propício em que o juiz ouve as partes e emite um juízo.

O depoimento da testemunha em audiência será, em regra, prestado oralmente, conforme prevê no art. 204, CPP:

Art. 204 - O depoimento será prestado oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito”.

Percebe-se que se trata de forma que permite uma avaliação mais precisa da sinceridade da testemunha em juízo, que já possui compromisso de dizer a verdade, sob pena de responder por falso testemunho. Sendo mais fácil ao juiz notar quando há uma mentira ou quando a testemunha diz a verdade. De acordo com Nucci “impessoal, impossibilitando ao magistrado averiguar a sua fidelidade aos fatos, bem como inviabilizando as reperguntas das partes e, com isso, ferindo o princípio do contraditório” Uma das características do interrogatório é de ser um ato oral, onde somente o interrogado ou querelado pode ser interrogado. Mais um ato processual em que o juiz pode analisar se o acusado diz a verdade ou falta com a mesma, tentando manipular algum fato a seu favor.

No entanto, é preciso salientar que no interrogatório do acusado, tanto judicialmente quanto na fase inquisitória realizada na delegacia, é assegurado o direito ao silêncio, de acordo com o Art. 5º, LXIII da CF.

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A oitiva do ofendido realizada perante o juiz deve ser realizada sempre que possível, de acordo com o art. 201, caput, do CPP, e somente em casos que não possa ser realizada deve deixar de ser feita, como por exemplo, em caso de morte ou incapacidade absoluta.

  1. Princípio da publicidade

A regra no processo penal é a publicidade dos atos, em razão da importância das questões atinentes a esse processo. Os atos que compõem o procedimento, inclusive a realização de provas, não devem ser praticados de forma secreta.

Súmula vinculante nº 14 STF: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

  1. Princípio da não autoincriminação

O indivíduo acusado de alguma infração não pode ser obrigado a produzir provas contra si.

  1. Conceito de prova

Prova é tudo aquilo que contribui para a formação do convencimento do juiz, ou seja, é tudo aquilo que levamos ao conhecimento do magistrado na expectativa de convencê-lo da realidade dos fatos ou de um ato do processo. Ela é inerente ao desempenho do direito de defesa e de ação. Segundo ao que leciona Guilherme de Souza Nucci, "O termo prova origina-se do latim – probatio –, que significa ensaio, verificação, inspeção, exame, argumento, razão, aprovação ou confirmação. Dele deriva o verbo provar – probare –, significando ensaiar, verificar, examinar, reconhecer por experiência, aprovar, estar satisfeito com algo, persuadir alguém a alguma coisa ou demonstrar".

Ainda segundo ao professor, há três sentidos para o termo prova, quais sejam: o ato de provar, que é o processo em que se verifica a verdade do fato alegado, como exemplo, temos a instrução probatória onde as partes utilizam os elementos disponíveis para descortinar a "verdade" do que se alega; o meio para provar, que é o instrumento pelo qual se demonstra a verdade de algo, um exemplo disso é a prova testemunhal; o resultado da ação de provar, que trata do produto extraído da análise dos instrumentos de prova oferecidos.

  1. Objetivo e natureza jurídica da prova

Conforme visto acima, as provas possuem como objetivo obter o convencimento do julgador, que decide de acordo com o livre convencimento motivado ao apreciá-las, segundo o sistema adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Ademais, têm a natureza jurídica de direito subjetivo. As normas referentes às provas são normas processuais, ou seja, de aplicação imediata, no qual os crimes ocorridos antes da vigência de uma nova lei poderão ser demonstrados pelos novos meios de prova.

  1. Destinatários

Referendo aos destinatários das provas, há dois tipos, sendo eles o destinatário direto e indireto.

  1. O destinatário direto, também conhecido como destinatário imediato, trata-se da autoridade judiciária.
  2. Já os destinatários indiretos ou mediatos são as partes, sendo quanto maior for o conteúdo probatório, maior será a probabilidade delas se convencerem e, se elas se convencem, consequentemente aceitarão com mais tranquilidade a decisão, minimizando assim o risco da vingança privada.

 

  1. Objetos

Há dois tipos de objeto, sendo: o objeto da prova, que se refere aos acontecimentos relevantes ao desvendamento da causa e; o objeto de prova, que está relacionado ao que é pertinente provar, ou seja, aos elementos que a lei não desobriga de provar.

Decerto, podemos analisar que não é objeto de prova, ou seja, não depende de prova os itens abaixo:

  1. o direito federal, tendo em vista que o juiz o conhece a sua existência e vigência, mas de forma excepcional poderá ser exigida a demonstração probatória quanto a vigência e também quanto a existência do direito estadual, municipal, consuetudinário (costumes) e estrangeiro;

 

  1. os Fatos Notórios, também conhecidos como "Verdade Sabida", pois são de domínio de grande parte da população medianamente informada. Um exemplo de fato notório são os feriados nacionais, onde podemos observar que parcela significativa da população tem a informação de que o dia 25 de dezembro é Natal.

 

  1. Fatos Axiomáticos ou Intuitivos, que se auto demonstram pela sua obviedade. Têm força probatória própria (a prova está no próprio fato). Como exemplo temos o artigo 162 do CPP, que em seu parágrafo único dispensa o exame interno cadavérico quando as lesões externas presentes no cadáver permitirem precisar a causa da morte, como ocorre no caso da decapitação.

 

  1. Fatos Inúteis, que são fatos irrelevantes para a demonstração da verdade. Exemplo: é desnecessário, em certos casos, provar a cor do chão do local onde ocorreu determinado homicídio.

 

  1. Presunções legais, que são conclusões extraídas da própria lei. As presunções legais podem ser: presunções absolutas (juris et de jure), nas quais dispensam a produção de prova e não admitem prova em sentido contrário ou; presunções relativas (juris tantum), sendo que estas invertem o ônus da prova, ou seja, admitem prova em sentido contrário

 

  1. Vale observar que fatos incontroversos, que são aqueles fatos alegados por uma parte e reconhecidos pela outra parte, dependem de prova, onde é preciso obedecer ao princípio da investigação oficial e da verdade material.

 

Por fim, vale apenas citar Norberto Viana lecionando, "Consideram-se incontroversos os fatos incontestes, ou seja, que não foram refutados ou impugnados pelas partes. Estes, ao contrário do que ocorre no processo civil (art. 334III, do CPC), não dispensam a prova, podendo o juiz, inclusive, a teor do art. 156II, do CPP, determinar, no curso da instrução ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante. E não poderia ser diferente. Afinal, se a própria confissão do crime pelo acusado não é suficiente, por si, para um juízo condenatório, exigindo sempre confronto com os demais elementos de prova angariados ao processo (art. 197 do CPP), é evidente que a simples ausência de contestação quanto a atos, fatos e circunstâncias não tem força suficiente para elidir a produção probatória." 

  1. Classificação das provas

As provas podem ser classificadas de diversos critérios, vejamos quais:

  1. Quanto ao objeto (relação da prova com o fato a ser provado) – A prova direta refere-se diretamente ao fato demonstrando, como por exemplo, a testemunha visual; já a prova indireta refere-se a um outro acontecimento que leva ao fato, como por exemplo, o álibi, que, de acordo com Guilherme de Souza Nucci, é a alegação feita pelo acusado, como meio de provar a sua inocência, de que estava em local diverso de onde ocorreu o crime, razão pela qual não poderia tê-lo cometido.

 

  1. Quanto ao efeito ou valor (grau de certeza gerado pela apreciação da prova) - A prova plena é aquela necessária para condenação e que imprime no julgador certeza quanto ao fato; já a prova não plena ou indiciária é a limitada quanto à profundidade, permitindo, por exemplo, a decretação de medidas cautelares.

 

  1. Quanto ao sujeito ou causa - A prova real é aquela que resulta do fato, como por exemplo, as fotografias e pegadas do local do crime; já a prova pessoal decorre do conhecimento de alguém, como por exemplo, a confissão e testemunha.

 

  1. Quanto à forma ou aparência – A prova testemunhal está relacionada à afirmação de uma pessoa, independentemente dessa pessoa ser testemunha, com por exemplo, o interrogatório do réu; já a prova material se trata de qualquer elemento que corporifica a demonstração do fato, com por exemplo, o exame de corpo de delito e os instrumentos do crime. Também há a prova documental.

 

Por fim, novamente, Guilherme de Souza Nucci leciona que as provas plenas consistem nas provas que possuem valor probatório suficiente para fundamentar por si só a decisão judicial sobre o fato que se pretende provar. Já as provas não plenas são as aquelas não são idôneas nem suficientes para fundamentar por si só a decisão judicial sobre os fatos que se pretende provar, senão que funcionam conjuntamente com outros princípios probatórios, como um elemento a mais a permitir ao juiz inferir uma hipótese sobre esses fatos mediante um procedimento de prova indireta ou indutiva. Em razão do exposto, as provas não plenas somente podem coadjuvar a decisão em qualidade de indícios.

  1. Meios de provas

Podemos conceituar os meios de provas como instrumentos utilizados para produzir a prova e levá-la ao conhecimento do magistrado, ou seja, é tudo aquilo que pode ser usado, direta ou indiretamente, para demonstrar o que se alega no processo.

Quanto aos meios, as provas podem ser nominadas ou inominadas. As provas nominadas se referem aos meios de produção previstos em lei, mais especificamente, nos artigos 158 a 250 do CPP. Por outro lado, as provas inominadas tratam dos meios de produção não disciplinados em lei, como por exemplo, o clichê fônico (identificação da voz).

Ambas as espécies de provas citada acima são aceitas e podem ser usadas, pois o princípio da verdade real permite o uso de meios probatórios atípicos, desde que moralmente legítimos e legais (não afrontadores do próprio ordenamento).

Portanto, percebe-se que há um embasamento principiológico para a ampla utilização da prova sendo os princípios que autorizam essa ampla utilização da prova são:

  1. princípio da verdade real (ou material), que estabelece que o processo penal almeja reconstruir aquilo que realmente ocorreu quando o crime foi praticado, sendo que o juiz criminal não irá se conformar com meras ficções de verdade e, por isso, é possível utilizar vasto material probatório para demonstrar o que realmente aconteceu quando o crime foi praticado. A verdade real é importante porque no direito processual penal a sanção para o ilícito praticado é privação da liberdade do indivíduo;
  2. princípio da liberdade na produção da prova, no qual aduz que admitido às partes produzir provas nominadas e também provas inominadas, já que se está em busca da verdade real.

A liberdade probatória é regra no processo penal, porém ela não é absoluta, encontrando limites na demonstração do estado civil das pessoas, onde o artigo 155 do CPP, em seu parágrafo único, preleciona que: 

Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.

Portanto, devemos seguir as limitações do Código Civil, de forma que a demonstração do estado civil será feita por certidão, como por exemplo, no casamento será feita por certidão de casamento.

A respeito da menoridade do réu, o Enunciado 74 do STJ determina que ela deve ser provada por documento hábil.

A segunda exceção à liberdade na produção da prova é a vedação das provas ilícitas (artigos 5LVI, da CF e 157 do CPP), no qual veremos no item a seguir.

  1. Provas ilícitas

É de supra importância destacar que a doutrina diferencia os termos: provas proibidas, provas ilícitas e provas ilegítimas. Veremos abaixo cada uma delas:

  1. As provas proibidas (ou vedadas ou inadmissíveis) são gênero e têm como espécies as provas ilícitas e ilegítimas.

 

  1. As provas ilícitas violam princípios constitucionais penais ou normas de direito material, como o Código Penal e a Legislação Penal Especial. Um exemplo é a confissão obtida mediante tortura (Lei 9.455/1997)

 

  1. As provas ilegítimas violam princípios constitucionais processuais ou normas de direito processual, como o Código de Processo Penal, a Legislação Processual Especial. Um exemplo é a realização do exame de corpo de delito, na falta de perito oficial, por somente uma pessoa não portadora de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, infringindo assim o artigo159, § 1 do CPP.

 

O artigo 157, "caput", do CPP estabelece que: 

São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. 

Esse dispositivo não distingue provas ilícitas de provas ilegítimas, mas tão somente considera como ilícita a prova que viola a norma constitucional ou infraconstitucional, pouco importando tratar-se de norma de direito material ou processual, englobando-se os princípios.

Ademais, menciona a Magna Carta no art. 5.ºLVI, CF: 

São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.  

Dito isso, vejamos a utilização das provas ilícitas nas seguintes teorias:

  1. Teoria da proporcionalidade ou razoabilidade ou do sacrifício:

Conforme aduz essa teoria, na ponderação de bens jurídicos, o magistrado deve dar prevalência ao bem jurídico de maior importância. Logo, entre a formalidade na produção da prova e o "status libertatis do réu", este último deve prevalecer, sendo a prova ilícita utilizada para inocentá-lo.

Acerca disto, alguns doutrinadores admitem o uso da prova ilícita em favor do acusado, para demonstrar a sua inocência. Afirmam que entre o "jus puniendi estatal" e a legalidade na produção probatória, em conflito com o "status libertatis do réu", deve-se prevalecer o bem de maior importância, que é o "status libertatis" do acusado, sendo a prova, mesmo que ilícita, utilizada em seu benefício e para obtenção da sua inocência.

Dessa forma, observa-se que a prova ilícita não pode ser utilizada para demonstrar a culpa de outrem, pois seus efeitos são limitados à obtenção da inocência do réu.

Para Nestor Távora a teoria da proporcionalidade deve ser invocada para preservar os interesses do acusado, em favor da absolvição (concepção da prova ilícita utilizada "pro reo").

Por outro lado, há doutrinadores que admitem uso da prova ilícita para condenar o acusado, Fernando Capez condiz:

"(...) consiste na admissibilidade das provas ilícitas, quando demonstrada a prevalência do interesse público na persecução penal, a tendência atual da jurisprudência dos Tribunais Superiores é a da sua não adoção. De acordo com esse entendimento, a não admissão de mecanismos de flexibilização das garantias constitucionais tem o objetivo de preservar o núcleo irredutível de direitos individuais inerentes ao devido processo legal, mantendo a atuação do Poder Público dentro dos limites legais. As medidas excepcionais de constrição de direitos não podem, assim, ser transformadas em práticas comuns de investigação." 

Ainda segundo ao doutrinador, em caso de crime praticado por organizações criminosas:

"(...) consiste na admissibilidade das provas ilícitas, quando demonstrada a prevalência do interesse público na persecucáo penal, a tendência atual da jurisprudência dos Tribunais Superiores é a da sua não adoção. De acordo com esse entendimento, a não admissão de mecanismos de flexibilização das garantias constitucionais tem o objetivo de preservar o núcleo irredutível de direitos individuais inerentes ao devido processo legal, mantendo a atuação do Poder Público dentro dos limites legais. As medidas excepcionais de constrição de direitos não podem, assim, ser transformadas em práticas comuns de investigação." 

  1.  Teoria dos frutos árvore envenenada ou "fruits of the poisonous tree" ou teoria da prova ilícita por derivação

A teoria dos frutos árvore envenenada se originou no Brasil através da jurisprudência do STF e encontra previsão no artigo 157 do CPP. Essa teoria sugere que todas as provas que decorrem de uma prova ilícita também estarão contaminadas, já que a sua origem é ruim.

A prova ilícita criada é reproduzida na figura de uma árvore, sendo a fonte que tem o condão de contaminar todas as provas dela decorrentes, que seriam os frutos. Logo, a ilicitude da obtenção da prova ilícita transmite-se às provas dela derivada.

Segundo dispõe o artigo 157§ 3 do CPP, as provas ilícitas devem ser desentranhadas dos autos do processo e preclusa a decisão de desentranhamento, haverá a destruição da prova na presença facultativa das partes. Nestor Távora diz que:

"se a contaminação probatória for ampla, faltará verdadeira justa causa para a deflagração da ação penal, de sorte que a inicial acusatória deve ser rejeitada caso os elementos informadores sejam contaminados pela extensão da prova ilícita, com arrimo no art. 395 em nova redação dada pela Lei nº 11.719/08."

No artigo 157 do CPP, pode-se extrair outras quatro teorias, que são decorrentes da teoria da prova ilícita por derivação e constituem exceções à mesma, sendo:

  1. teoria da prova absolutamente independente ou limitação da fonte independente (artigo 157, § 1, 1ª parte do CPP, estabelecendo que:

"São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras (...)".

Com isso, não havendo nexo de causalidade (relação de dependência) entre a prova ilícita e as demais provas que decorreram da ilícita, não haverá contaminação. O processo será aproveitado se houver outras provas válidas absolutamente independentes da prova ilícita, cabendo ao juiz deferir os limites de interdependência da prova; a teoria da descoberta inevitável ou do curso hipotético de investigação ou "inevitable discovery"(art. 157§ 1, parte final e § 2, § 3 do CPP), que aduz que as provas que decorrem de uma prova ilícita não necessariamente estarão contaminadas e serão aproveitadas se ficar demonstrado que elas inevitavelmente seriam descobertas de outra maneira, por uma outra fonte autônoma e por meio válido. Por exemplo, não se deve reconhecer como ilícita as declarações de testemunha que foi descoberta mediante interceptação telefônica sem autorização judicial, se esta pessoa foi indicada por várias outras como testemunha do fato, também, não deve ser declarada a ilicitude de confissão obtida mediante tortura, quando inevitavelmente se chegaria ao autor do homicídio em razão de impressões digitais do mesmo no local do crime.

Nesse caso existe liame entre a prova ilícita e as demais, mas ele não é decisivo e cabe ao juiz definir se existia a inevitabilidade da descoberta, ou seja, se a prova derivada poderia ser descoberta de uma outra forma.

Ademais, há outras duas teorias:

  1. teoria da contaminação expurgada ou da conexão atenuada, que indica que quando o vínculo entre a prova ilícita e a derivada for irrelevante ou tênue, não haverá contaminação;

 

  1. teoria da boa-fé, onde busca-se evitar o reconhecimento da ilicitude da prova quando os agentes de polícia ou da persecução penal tiverem atuado destituídos do dolo de infringir a lei, pautados em situação de erro.

 

  1. Teoria da exclusão da ilicitude da prova

A prova, aparentemente ilícita, deve ser reputada como lícita quando a conduta do agente na sua captação está amparada pelo direito (excludentes de ilicitude).

Vejamos como exemplo, caso o réu tenha que violar o domicílio de outrem, sendo tal conduta tipificada como crime nos termos do artigo 150 do CP, para produzir prova fundamental em favor de sua inocência, esta prova será tida como válida, pois o mesmo agiu em estado de necessidade (artigo 24CP) ao suprimir bem jurídico alheio (tutela domiciliar) para salvaguardar outro bem jurídico (liberdade), em face de um perigo atual (existência de persecução penal), ao qual não deu causa, e cujo sacrifício não era razoável exigir.

  1. Ônus da prova

O ônus da prova se refere ao encargo atribuído as partes de demonstrar aquilo que alegou. Conforme preleciona o artigo 156, 1ª parte, CPP, aquele que alega é quem faz a prova da alegação.

Trata-se de uma faculdade, no qual a parte omissa assume as consequências de sua inatividade (aquele que não foi exitoso em provar, possivelmente não terá reconhecido o direito pretendido).

Contudo, há duas correntes acerca da distribuição do ônus da prova:

  1. a corrente minoritária aponta que, no processo penal, o ônus da prova é exclusivo da acusação;

 

  1. a corrente majoritária distribui o ônus da prova entre a acusação e a defesa no processo penal.

A respeito da primeira corrente, tem-se que o artigo 386IIV e VII, do CPP dispondo que a debilidade probatória da acusação em demonstrar os elementos que caracterizam o crime implica na absolvição do réu.

De acordo com Nestor Távora, em que pese a distribuição do ônus de provar estar reconhecida legalmente, a defesa não tem ônus probatório algum. Afinal, se a defesa for absolutamente inerte em provar e a acusação não for integralmente exitosa, no final do processo, havendo dúvida, está será em favor do réu e o juiz deverá absolvê-lo, em obediência ao princípio da presunção da inocência, pois, o ônus da prova deve ser analisado à luz do princípio da presunção de inocência e a favor do réu, sendo que se a defesa ficar inerte durante todo o processo, o juiz, na dúvida, deverá absolver o acusado.

De acordo a última corrente, cabe a acusação demonstrar a autoria ou participação, materialidade (existência da infração), elemento subjetivo do agente (dolo ou culpa), causas de exasperação de pena e cabe à defesa provar as causas excludentes de ilicitude, causas excludentes de culpabilidade, causas de extinção da punibilidade.

  1. Elementos de mitigação da pena

O ônus da prova possui dois aspectos, quais sejam o objetivo e o subjetivo. Segundo ao Renato Brasileiro lima, condiz que

"No aspecto objetivo, o ônus da prova funciona como uma regra de julgamento a ser aplicada pelo juiz quando permanecer em dúvida no momento do julgamento", além disso, "Em seu aspecto subjetivo, o ônus da prova deve ser compreendido como o encargo que recai sobre as partes de buscar as fontes de prova capazes de comprovar as afirmações por elas feitas ao longo do processo, introduzindo-as no processo através dos meios de prova legalmente admissíveis. Ao contrário do ônus da prova objetivo, cujo destinatário é o juiz, o ônus subjetivo é voltado para as partes, a fim de que se saiba qual delas deve suportar o risco da prova frustrada. Sob esse aspecto subjetivo, as disposições sobre o ônus da prova funcionam, portanto, como regras de conduta das partes" (...) " No âmbito processual penal, o ônus da prova subjetivo é atenuado por força da regra da comunhão da prova e dos poderes instrutórios do juiz".

  1. Do magistrado

O juiz, no processo penal, não possui ônus probatório, pois é inerente às partes a atribuição de provar.

Quanto à iniciativa probatória, o magistrado pode determinar de ofício a produção de prova nas hipóteses do art. 156, I e II, quais sejam:  

Caput: A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:

Inc. I - Ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida;

Inc. II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante. 

É importante ressaltar que a atividade do magistrado na determinação da prova é complementar, não podendo o mesmo construir todas as provas que são levadas aos autos, sob pena de incorrer em impedimento (art. 254CPP) ou suspeição (art. 252CPP).

A determinação de prova "ex officio pelo juiz" é permitida pelo princípio da busca da verdade real, que busca revelar o que realmente aconteceu quando da ocorrência do delito. Mas a constitucionalidade do artigo 156 do Código de Processo Penal é, segundo Nestor Távora, questionada por parcela da doutrina, que afirma que o mesmo infringe o sistema acusatório adotado no ordenamento jurídico brasileiro e é incompatível com o princípio da imparcialidade.

  1. Prova emprestada

Segundo ao que leciona Norberto Avena, prova emprestada é "aquela que, produzida originariamente em um determinado processo, vem a ser apresentada, documentalmente, em outro. Para que seja admissível, é preciso que ambos os feitos envolvam as mesmas partes e que, na respectiva produção, tenha sido observado o contraditório. Satisfeitas estas duas condições, terá a prova emprestada o mesmo valor das demais provas realizadas dentro do processo. Ausentes, contudo, perderá muito de seu valor probatório, devendo ser considerada como simples indício".

Conforme vimos acima, podemos compreender que os requisitos para a admissibilidade da prova emprestada no processo penal são:

  1. a existência das mesmas partes em ambos os processos;
  2. o mesmo fato probando;
  3. o respeito a disciplina normativa que rege a produção probatória;
  4. e o respeito ao contraditório no processo emprestante.

Por fim, com base no último requisito, podemos concluir que não há empréstimo de prova de um inquérito a um processo, em razão do procedimento investigativo preliminar ser regido pela inquisitoriedade.

  1. Sistemas de valoração de provas

O processo penal contemporâneo contempla três modelos de avaliação ou valoração da prova, sendo: o sistema legal; o da íntima convicção; e o da persuasão racional.

Sobre tais sistemas probatórios, veremos seus conceitos:

  1. O sistema legal - Também conhecido como tarifado, é típico do procedimento acusatório, em que a intensa participação das partes na produção da prova pressupõe o prévio estabelecimento de valores definidos a cada um dos elementos probatórios considerados válidos.

 

  1. O sistema da íntima convicção - É inaplicável no direito processual-penal brasileiro, em razão do que dispõe o artigo 93, IX, Constituição Federal ("todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade...").

 

  1. O sistema da persuasão racional ou do livre convencimento - Esta encontra respaldo no método inquisitório, em que o magistrado tem ampla liberdade para avaliar as questões de fato, devendo apenas motivar as questões de direito.

 

Por fim, o que distingue o sistema da persuasão racional é a liberdade do magistrado na valoração dos elementos probatórios, que, embora exista, é contida pela obrigatoriedade de justificação das escolhas adotadas, diante da prova legitimamente obtida, com a explicitação do caminho percorrido até a decisão. Portanto, o Brasil adota o sistema do livre convencimento motivado (155 do CPP), bem como o sistema da íntima convicção (apenas para o júri). Contudo, é inegável o fato de que o sistema da prova tarifada ainda possui resquícios no processo penal, tendo em vista os fortes ranços inquisitórios que ainda assolam alguns dos dispositivos do nosso código e a mentalidade de alguns dos nossos julgadores.

REFERÊNCIA:

Lenza, Pedro – Direito Processual penal, Ed. 15ª Saraiva - https://amzn.to/3s78uYh

 

 

Avena, Norberto – Direito Processo Penal, Ed. 10º, Método - https://amzn.to/3nBe2Hn

 

 

Lopes Jr., Aury – Direito Processo Penal, Ed. 17ª, Saraiva Jur - https://amzn.to/2PJ2wi6

Sobre o autor
Jonathan Ferreira

Acadêmico de Direito pela universidade Estácio de Sá com foco em Dir. Penal, Dir. Proc. Penal, Dir. Constitucional Brasileiro. Administrador e fundador da página Âmbito Criminalista, no qual ajudo pessoas a entenderem o Direito Penal de forma simples e descomplicada. Amante da Sabedoria e estudante da psicanálise lacaniana em conjunto com a seara penal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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