O artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, em seu inciso III, disciplina ser direito básico do Consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços postos no mercado de consumo.
Em sentido convergente, o artigo 31[1] do CDC dispõe ser dever do fornecedor assegurar que o Consumidor disponha de informações corretas, claras precisas, ostensivas e em língua portuguesa dos produtos e serviços que adquire, ou que venha a usufruir.
Observa-se da leitura combinada destes dois artigos que de um lado, o consumidor possui o direito de ser informado de todas as peculiaridades que envolvam a aquisição de determinado bem ou serviço e, por outro lado, que o fornecedor é obrigado ao fornecimento destas informações.
Apesar das disposições legais serem de simples compreensão, a realidade é que a matéria representa uma grande problemática, especialmente no que diz respeito aos processos de fornecimento e análise de garantia a serem realizados por parte do fornecedor (neste artigo será tratado apenas questões relativas ao vício no produto – Art. 18 do CDC[2]).
Extrai-se do o último relatório[3] apresentado pelo Conselho Nacional de Justiça, que a matéria “Responsabilidade do Fornecedor/Indenização por Dano Moral” representa um dos cinco assuntos com mais quantitativos de processo em todas as instâncias da Justiça Estadual, fato que comprova a ocorrência de evidente falha nestas relações.
É preciso insistir no fato de que em grande parte destes casos (ou processos), a discussão tem como cerne principal questões dizentes à ausência de dever de informação no que compreende ao chamado “procedimento de garantia”, que em linhas gerais é um dever de conduta a ser adotada pelo Fornecedor e que relacionado ao atendimento e ao devido encaminhamento de peças “falhadas” para análise técnica.
Com o advento das redes sociais, especialmente o WhatsApp, não se pode mais admitir a possibilidade de o Fornecedor alegar dificuldades no que diz respeito à comunicação de todos os tramites do processo de garantia dos produtos que coloca no mercado, porquanto a legislação não veda o uso deste tipo de ferramenta como forma de comunicação, que se enquadra, inclusive, como transmissão de resposta inequívoca, vide artigo 26, § 2°, I do CDC[4].
De acordo com Fernando Paiva, editor do Mobile Time[5], “O WhatsApp segue instalado nos smartphones de 99% dos brasileiros, mas a novidade é a quantidade de entrevistados que afirmam abri-lo todos os dias: subiu de 93% para 95% em apenas seis meses, fruto do isolamento social causado pela pandemia. Se levarmos em conta quem garantiu abri-lo “quase todos os dias”, esse montante sobe para 99%; ou seja, quase todos os brasileiros abrem o WhatsApp com uma frequência praticamente diária”.
Anote-se que o dever de informação guarda ligação umbilical com o denominado princípio da boa-fé nas relações contratuais de consumo as quais inseridas no Código de Defesa do Consumidor.
Em sua obra, “Manual de Direito do Consumidor”[6], os doutrinadores Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpção Neves expressam que “Da atuação Concreta das partes na relação contratual é que surge o conceito de boa-fé objetiva”, merecendo destaque “o dever de cuidado, dever de respeito, o dever de lealdade, o dever de probidade, o dever de informar, o dever de transparência, o dever de agir honestamente e com razoabilidade”.
Logo, ao diligenciar de modo ativo nestes casos, ou seja, com o envio de informações que levam o Consumidor a ter conhecimento dos prazos, tramites e eventuais atrasos no procedimento, o Fornecedor pratica conduta pautada na boa-fé, dando-se, assim, cumprimento efetivo ao seu dever contratual para com o Consumidor (parte com vulnerabilidade informacional).
Neste sentido vale lembrar que “A garantia é um instrumento que, quando bem utilizado, consolida a imagem da empresa no mercado, visto que legalmente ela passa a garantir seus produtos[7].", e que o descaso no pós venda[8] é capaz de, por si só, gerar dever de responsabilidade objetiva do fornecedor (ensejando-se condenações para reparação de eventuais danos morais).
Por tudo isso, utilizar-se das ferramentas tecnológicas disponíveis é quase um dever de conduta de um Fornecedor que zela pela boa imagem de sua empresa, e que, igualmente, se preocupa com a redução de seu passivo em demandas judiciais relativas a falha no pós venda de seus produtos (aqui inserido o procedimento de garantia).
[1] Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
[2] Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
[3] https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/08/WEB-V3-Justi%C3%A7a-em-N%C3%BAmeros-2020-atualizado-em-25-08-2020.pdf
[4] Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;
[5] https://www.mobiletime.com.br/noticias/03/09/2020/95-dos-usuarios-do-whatsapp-acessam-o-aplicativo-todo-dia/
[6] Tartuce, Flávio. Manual de direito do consumidor: direito material e processual/ Flávio Tartuce, Daniel Amorim Assumpção Neves. – 6. Ed. rev. Atual e Ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017.
[7] http://www.vdo.com.br/media/746664/manual-garantia.pdf
[8] TJ-PR - RI: 00070454220178160033 PR 0007045-42.2017.8.16.0033 (Acórdão), Relator: Juíza Melissa de Azevedo Olivas, Data de Julgamento: 26/11/2018, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 27/11/2018, TJ-PR - RI: 00093128520168160044 PR 0009312-85.2016.8.16.0044 (Acórdão), Relator: Juiz Nestario da Silva Queiroz, Data de Julgamento: 25/04/2018, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 25/04/2018, TJ-PR - RI: 000421471201481600180 PR 0004214-71.2014.8.16.0018/0 (Acórdão), Relator: Renata Ribeiro Bau, Data de Julgamento: 09/04/2015, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 17/04/2015.