LIP – o equívoco na dispensa de empregados que solicitaram auxilio emergencial afastados por LIP (licença para tratar de interesse particular)

07/05/2021 às 10:10
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Neste artigo, tomaremos como base, a título de estudo de caso, alguns processos ocorridos com empregados públicos da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, afastados por terem solicitado auxílio emergencial durante licença para tratar de interesse particular (LIP). Mostraremos como a defesa do Dr. Deoclécio Barreto Machado vem atuando para provar que a dispensa é abusiva e incabível.

Interpretação razoável de texto de lei sobre a definição de “emprego formal ativo”. Falta de notificação da CAIXA ao empregado para a devolução do valor – Necessidade. Improbidade administrativa não configurada com a devolução do valor antes da conclusão de processo administrativo. Justa Causa trabalhista não caracterizada.

É de causar aflição e revolta os rumos que tem tomado os julgamentos da CAIXA nos processos administrativos instaurados para apurar a solicitação de auxílio emergencial por empregados afastados para Licença para tratar de Interesse Particular – LIP.

Tomou-se um caminho jurídico desarrazoado, avesso a princípios de humanidade e apartado da legalidade. Com lastro em uma manifestação meramente sugestiva da Controladoria Geral da União, a CAIXA atropelou procedimentos prévios indispensáveis, sem oportunizar a correção interpretativa dos empregados, impingiu processo administrativo e bateu carimbo de dispensa por justa causa em quase todos os casos que houve requerimento espontâneo.

Olvidou que este grupo de empregados, que integram o patrimônio humano da CAIXA, jamais agiu com dolo e não possuem nem de longe o perfil de pessoas ímprobas.

A dispensa por justa causa, decidida pela CAIXA ao arrepio da legislação trabalhista, assemelha-se ao triste episódio de dispensa no ano de 1990 de milhares de empregados admitidos através concurso público. O então empossado presidente Fernando Collor de Melo, sob o manto do falso discurso da economia e austeridade, em associação com o presidente da CAIXA Lafaiete Coutinho, de triste lembrança, demitiu milhares de empregados recém empossados.

Na ocasião, judiciário e sindicatos travaram intensa batalha que culminou no restabelecimento dos empregos a todos os empregados.

A realidade mudou. Com o enfraquecimento imposto aos sindicatos, caberá irremediavelmente ao judiciário restabelecer o estado de direito e o emprego dos jovens empregados, ora dispensados injustamente e alcunhados de ímprobos pela instituição empregadora. O paradoxo nesta história é que a própria CAIXA tinha dúvidas interpretativas sobre o texto legal, tanto que solicitou parecer da Controladoria mesmo após a concessão do benefício aos licenciados.

O ponto central do debate se concentra assim, na dispensa por justa causa dos empregados da CAIXA, em LIP, que solicitaram auxílio emergencial e foram aprovados no filtro de análise e não tiveram recusa pelo sistema integrado estatal. E isto se deu devido à interpretação dada à expressão “contrato de trabalho ativo“ do agente público para fins de recebimento do auxílio emergencial instituído pela Lei 13.982/2020. Os contratos de trabalho deste grupo de empregados se encontrava suspenso, nos termos normativos da CAIXA.

A CAIXA taxou de dolosos os atos dos empregados, apesar de terem:

(a) Requerido o Auxílio em aplicativo digital disponibilizado para toda a população brasileira;

(b) Informado com absoluta fidelidade todos os seus dados;

(c) Aguardado a análise que se acreditava criteriosa dos órgãos dos sistemas integrados dos diversos órgãos federais:

(e) Recebido a informação de análise e deferimento do pedido, lhes dando certeza de que eram elegíveis.

Tem-se, ainda, que era de conhecimento público e constava do próprio aplicativo disponibilizado que os requerimentos seriam submetidos à análise; além do usual e esperado cruzamento de dados que atualmente é feito pelos órgãos públicos, o que serviu de convicção para os pretendentes de que não estariam cometendo nenhuma irregularidade ao “solicitar” o Auxílio.

É sabido que nenhuma lei está isenta de ambiguidades, dado que nem sempre as palavras estão aptas a expressar com clareza a intenção do legislador e assim, será necessário submeter as dispensas ao poder judiciário para aferir a legalidade da motivação da dispensa imposta.

Tanto foi razoável a interpretação dada pelos empregados  de que os contratos de trabalho não se encontravam  ativos, em vista da Licença não remunerada, que até o judiciário federal corroborou com o este entendimento, conforme se verifica do julgado abaixo, proferido no MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5003435-95.2020.4.03.6103 / 3ª Vara Federal de São José dos Campos, que resumidamente se transcreve abaixo:

“Narra a impetrante que, no dia 07/04/2020, por atender os requisitos previstos na Lei 13.982/2020, formulou via aplicativo próprio, o requerimento do auxílio emergencial. Afirma que seu pedido foi indeferido em 27/04/2020, sob o fundamento “Auxílio Emergencial não aprovado: você não atende todas as condições para receber o auxílio emergencial. MOTIVO: – cidadão com emprego formal – Vinculado ao RPPS; – Cidadão com emprego formal – vinculado ao RAIS”.

A decisão foi no seguinte sentido:

A concessão da licença sem remuneração é equivalente, em termos práticos, à inexistência de “emprego formal ativo”, termo fixado na lei instituidora do auxílio. De fato, a teleologia legal do auxílio emergencial é de amparar as pessoas que se encontrem em situação de desamparo, decorrente das vicissitudes inerentes à pandemia. No caso dos autos, estando bem demonstrada a ausência de qualquer remuneração, deve-se concluir que, a despeito da manutenção do vínculo estatutário, não se trata de vínculo “ativo”. Assim, a objeção manifestada pela autoridade administrativa não poderá prevalecer. Comprovado o ato ilegal praticado, o pedido é procedente.

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Em face do exposto, julgo procedente o pedido, para ratificar a liminar e conceder a segurança, determinando à autoridade impetrada que adote as providências necessárias à implantação do auxílio emergencial, mantendo-o em todas as parcelas previstas, afastando o óbice relativo à existência de vínculo com o regime próprio de previdência social. (destaques acrescidos).

Assim, a controvérsia instalada acerca da lei afasta por completo o dolo atribuído ao leigo, que deu interpretação razoável ao texto legal.

Útil debater ainda sobre as parcelas recebidas e devolvidas pelos empregados, afastando qualquer tipo de prejuízo à CAIXA e qualquer outra entidade.

A justa causa carimbada pela CAIXA na vida profissional dos empregados deverá e será revista pelo judiciário. A decisão, como se sabe, traz consequências materiais e psicológicas à vida do trabalhador, capaz de comprometer seu futuro profissional e a reinserção no mercado de trabalho.

Não houve na conduta da CAIXA nem proporcionalidade e tampouco razoabilidade.

Tem-se, assim, a partir de toda a reflexão escandida neste trabalho, que a decisão será revista pelos tribunais do trabalho, com a decisão de reintegração e inclusive com a condenação da CAIXA em danos morais.

Sobre o autor
Deoclécio Machado

Advogado e mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP, com experiência na atuação de processos administrativos de empregados e servidores públicos na esfera federal, estadual e municipal. Ex-advogado de empresa pública federal. Especialista em direito processual civil e direito bancário. Professor Universitário. Integrou a diretoria da OAB-Campinas e presidiu a comissão de ética da entidade.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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