INTRODUÇÃO
A estabilidade prevista no art. 19 do ADCT é um tema que até os dias atuais gera insegurança jurídica e interpretações controvertidas acerca da norma extraída do seu texto. Não raro, até o interprete maior – o Supremo Tribunal Federal –, com as devidas vênias, extrai uma norma despida da profundidade a qual o tema merece, limitando-se a literalidade do texto.
Diante de tal cenário, os tribunais em todo o Brasil têm dado um tratamento totalmente diverso aos servidores alcançados pelo dispositivo, em descompasso com os princípios da dignidade da pessoa humana, da dignidade do trabalhador e desprezando toda uma evolução histórica do tema aqui discutido.
No presente trabalho a discursão abordará toda a evolução histórica do tema e o modo como os tribunais solucionam as controvérsias, de modo a esclarecer a razão da previsão e o real tratamento que os servidores abarcados pelo texto merecem.
A previsão constitucional da estabilidade excepcional do art. 19 do ADCT não foi uma inovação legislativa trazida pelo Constituinte de 1988. Longe disso. Na norma transitória da Carta de 1988 houve uma reprodução das normas anteriormente prevista nas constituições anteriores e não uma inovação. Com efeito, a previsão constitucional, diferente do que muitos defendem, não cria uma nova categoria de servidores públicos – os estáveis e não efetivos – ao revés, ela apenas assegura a estabilidade à certa categoria de servidores em uma determinada situação que à época não preenchiam os requisitos estabelecidos para estabilidade, pois para investidura em seus cargos não era necessária a passagem por concurso devido à sua natureza.
Há distinção entre a estabilidade e a efetividade, sendo estes institutos distintos e destinados a diferentes finalidades, de modo que a estabilidade está para o servidor; e a efetividade está para o cargo, ou seja, a efetividade é pressuposto para a estabilidade e não o inverso.
Portanto, sob o prisma da interpretação sistemática combinada com a histórica e teleológica, a estabilidade excepcional apenas consagrou e unificou as diversas categorias de servidores anteriormente existentes nas ordens constitucionais anteriores e não criou outra categoria ou forma de permanecer no serviço público.
BREVE HISTÓRICO DA PREVISÃO CONSTITUCIONAL DA ESTABILIDADE EXCEPCIONAL
Inicialmente, é de bom alvitre ressaltar que as Constituições de 25 de março de 1824 e a de 24 de fevereiro de 1891 não trataram sobre a efetividade ou estabilidade dos servidores públicos, tampouco sobre o concurso como forma de provimento de cargo público.
A CF/1824, em seu art. 179, XIV, previa como forma de provimento em cargo público: “XIV. Todo o cidadão pode ser admittido aos Cargos Publicos Civis, Politicos, ou Militares, sem outra differença, que não seja dos seus talentos, e virtudes.”; já Carta de 1891, estabeleceu em seu artigo 73: “Art 73 - Os cargos públicos civis ou militares são acessíveis a todos os brasileiros, observadas as condições de capacidade especial que a lei estatuir, sendo, porém, vedadas as acumulações remuneradas.”
Contudo, a Constituição Federal de 1934 foi o marco inicial no que tange a previsão da estabilidade aos servidores, porquanto, inaugurou um novo instituto que até então não havia previsão semelhante, o do concurso público como forma de provimento de cargo. No entanto, não houve qualquer menção a efetividade. Em seu artigo 169 disciplinou:
Art 169 - Os funcionários públicos, depois de dois anos, quando nomeados em virtude de concurso de provas, e, em geral, depois de dez anos de efetivo exercício, só poderão ser destituídos em virtude de sentença judiciária ou mediante processo administrativo, regulado por lei, e, no qual lhes será assegurada plena defesa.
Parágrafo único - Os funcionários que contarem menos de dez anos de serviço efetivo não poderão ser destituídos dos seus cargos, senão por justa causa ou motivo de interesse público.
Deste modo, os funcionários públicos, uma vez preenchidos os requisitos acima citados, só poderiam ser destituídos por meio de sentença judicial ou processo administrativo devidamente regulado em lei.
Em seguida, com o advento da CF de 1937, houve uma pequena alteração legislativa, conquanto tenha sido silente, semelhantemente a CF/34, quanto à efetividade, no que se refere à previsão da estabilidade que em seus artigos 156 e 157, in verbis:
Art 156 - O Poder Legislativo organizará o Estatuto dos Funcionários Públicos, obedecendo aos seguintes preceitos desde já em vigor:
a) o quadro dos funcionários públicos compreenderá todos os que exerçam cargos públicos criados em lei, seja qual for a forma de pagamento;
b) a primeira investidura nos cargos de carreira far-se-á mediante concurso de provas ou de títulos;
c) os funcionários públicos, depois de dois anos, quando nomeados em virtude de concurso de provas, e, em todos os casos, depois de dez anos de exercício, só poderão ser exonerados em virtude de sentença judiciária ou mediante processo administrativo, em que sejam ouvidos e possam defender-se;
Art 157 - Poderá ser posto em disponibilidade, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, desde que não caiba no caso a pena de exoneração, o funcionário civil que estiver no gozo das garantias de estabilidade, se, a juízo de uma comissão disciplinar nomeada pelo Ministro ou chefe de serviço, o seu afastamento do exercício for considerado de conveniência ou de interesse público.
As duas previsões constitucionais iniciais são semelhantes com praticamente os mesmos requisitos.
Diferentemente das constituições anteriores, a CF de 1946, inovou em seu texto ao prevê que os servidores que foram nomeados sem concurso serão estáveis após 5 (cinco) anos de exercício (art. 188, II), senão vejamos:
Art 188 - São estáveis:
I - depois de dois anos de exercício, os funcionários efetivos nomeados por concurso;
II - depois de cinco anos de exercício, os funcionários efetivos nomeados sem concurso.
Parágrafo único - O disposto neste artigo não se aplica aos cargos de confiança nem aos que a lei declare de livre nomeação e demissão.
Portanto, conclui-se que, à época, já haveria a possibilidade da estabilidade sem a necessidade de concurso público e que foi, como no de decorrer demonstrado, reproduzido na atual CF, com as devidas adaptações.
Por conseguinte, com o advento da CF de 1967, que em seu artigo 99, §1º disciplina:
Art 99 - São estáveis, após dois anos, os funcionários, quando nomeados por concurso.
§ 1º - Ninguém pode ser efetivado ou adquirir estabilidade, como funcionário, se não prestar concurso público.
Contudo, no Título V – Das Disposições Gerais Transitórias, no art. 177, o qual estabeleceu:
Art 177 - Fica assegurada a vitaliciedade aos Professores catedráticos e titulares de Oficio de Justiça nomeados até a vigência desta Constituição, assim como a estabilidade de funcionários já amparados pela legislação anterior.
[...]
§ 2º - São estáveis os atuais servidores da União, dos Estados e dos Municípios, da Administração centralizada ou autárquica, que, à data da promulgação desta Constituição, contem, pelo menos, cinco anos de serviço público.
Destarte, o §2º retrocitado repete o disposto no inciso II do art. 188 da CF/46, com o adendo da condição da data da promulgação da constituição.
A Emenda Constitucional nº 01 de 17 de outubro de 1969, conquanto tenha vindo intitulada como emenda a Constituição de 1967, é tida pela doutrina como inauguradora de uma nova ordem constitucional, conforme preleciona a doutrina de José Afonso da Silva, in verbis:
Teórica e tecnicamente, não se tratou de emenda, mas de nova constituição. A emenda só serviu como mecanismo de outorga, uma vez que verdadeiramente se promulgou texto integralmente reformulado, a começar pela denominação que se chamava apenas de Constituição do Barsil. (AFONSO, 2007, p. 89)
Portanto, no presente artigo será considerada como uma carta política autônoma e não uma emenda como nome faz presumir.
A EC nº 01/69, em seu art. 100 e 194,
Art. 100. Serão estáveis, após dois anos de exercício, os funcionários nomeados por concurso.
Art. 194. Fica assegurada a vitaliciedade aos professôres catedráticos e titulares de ofício de justiça nomeados até 15 de março de 1967, assim como a estabilidade de funcionários amparados pela legislação anterior àquela data.
Por fim, a estabilidade excepcional veio disciplinada pelo art. 19 do Ato de Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT, da Constituição Federal de 1988 o qual disciplina:
Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição, são considerados estáveis no serviço público.
§ 1º O tempo de serviço dos servidores referidos neste artigo será contado como título quando se submeterem a concurso para fins de efetivação, na forma da lei.
§ 2º O disposto neste artigo não se aplica aos ocupantes de cargos, funções e empregos de confiança ou em comissão, nem aos que a lei declare de livre exoneração, cujo tempo de serviço não será computado para os fins do "caput" deste artigo, exceto se se tratar de servidor.
§ 3º O disposto neste artigo não se aplica aos professores de nível superior, nos termos da lei.
Como demonstrado acima, o instituto da estabilidade excepcional teve sua primeira previsão na CF/67, a qual foi repetida nas demais, exceto na EC 01/69, porém atualmente reproduzida no artigo 19 do ADCT.
Em uma análise sumária da historicidade da evolução normativa do tema em estudo, extrai-se que o legislador constituinte vem garantindo aos servidores que não prestaram concurso a estabilidade no serviço e diferentemente das constituições anteriores, a de CF/88, inaugurou um novo instituto, o da efetividade, que não se confunde com a estabilidade como será no tópico seguinte demonstrado, de modo que, por ser uma inovação, não necessariamente deve-se concluir que ela não está presente na estabilidade prevista no art. 19 do ADCT, pois, anteriormente os institutos confundiam se.
DISTINÇÃO ENTRE ESTABILIDADE E EFETIVIDADE
A estabilidade e a efetividade são institutos que não se confundem, essa é um atributo do cargo e aquela está ligada ao servidor, ou seja, o cargo é efetivo e o servidor é estável. Logo, a grosso modo, uma vez ocupado o cargo efetivo e preenchido os requisitos do art. 37 da CF/88, o servidor será estável.
Segundo apontamentos doutrinários pode-se concluir consoante preleciona Jose dos Santos Carvalho Filho:
Estabilidade, como vimos acima, é a garantia constitucional do servidor público estatutário de permanecer no serviço público, após o período de três anos de efetivo exercício. Efetividade nada mais é do que a situação jurídica que qualifica a titularização de cargos efetivos, para distinguir-se da que é relativa aos ocupantes de cargos em comissão. Se um servidor ocupa um cargo efetivo, tem efetividade; se ocupa cargo em comissão, não a tem. (FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Adminstrativo. 30ªed., São Paulo: Atlas, 2016, p. 841)
Por conseguinte, é de bom alvitre trazer à baila, embora antigo, porém, sempre atual, pela didática a conceituação, a doutrina de Hely Lopes Meireles, segundo ele:
A nomeação em caráter efetivo é a condição primeira para a aquisição da estabilidade. A efetividade, embora se refira ao servidor, é apenas um atributo do cargo, concernente à sua forma de provimento, e, como tal, deve ser declarada no decreto de nomeação e no título respectivo, porque um servidor pode ocupar transitoriamente um cargo de provimento efetivo (casos de substituição, por exemplo), sem que essa qualidade se transmita ao seu ocupante eventual. (...)
Não há confundir efetividade com estabilidade, porque aquela é uma característica da nomeação, e esta é um atributo pessoal do ocupante do cargo, adquirido após a satisfação de certas condições de seu exercício. A efetividade é um pressuposto necessário da estabilidade. Sem efetividade não pode ser adquirida a estabilidade. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2008)
Portanto, feita a distinção entre os dois institutos de direito administrativo, diferenciação essa inaugurada pela CF/88, uma vez declarado estável no serviço público a efetividade do servidor estava implícita, nas palavras da doutrina de Hely Lopes Meirelles.
A EFETIVIDADE COMO PRESSUPOSTO DA ESTABILIDADE E O DIREITO À PROGRESSÃO NA CARREIRA.
Âmbito de Aplicabilidade do art. 19 do ADCT
Antes da promulgação da Carta de 1988, como já exposto acima, estava em vigor a CF/67 e a EC 01/69. O § 1º do art. 97 da EC, disciplinava: § 1º A primeira investidura em cargo público dependerá de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, salvo os casos indicados em lei. (sem negrito no original). A expressão destacada, à época, fora alvo de impasses doutrinários, notadamente quanto à competência para instituir a norma excludente da regra.
A aludida celeuma findou-se com o Acórdão do STF no RE nº 80.336, Rel. Mim. Moreira Alves, no qual a Corte decidira no sentido de que os entre políticos eram competentes para regulamentar o disposto no art. 97 da EC 01/69.
Com efeito, dada à imprecisão legislativa da norma constitucional, muitas leis dos entes políticos sugiram como forma de burlar a sistemática dos concursos. Nascia a necessidade da delimitação dos casos em que seria possível a exceção ao concurso, pois o que era regra passava a ser exceção.
De forma magistral o atual Mim. Gilmar Mendes, à época, Procurador da República, em artigo publicado, cujo tema é o Princípio do Concurso Público na Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal definiu que a exceção ocorria nos casos e cargos cujas atribuições tornassem impossível ou não recomendável a disputa. Somente esses casos poderiam ser encarados como de natureza especial.
O posicionamento é adotado pelo STF, consoante voto do, à época, Mim. Joaquim Barbosa, no RE 199.649 AgR, o qual disciplinou:
Não é possível extrair do §1º do art. 97 da Emenda Constitucional nº 1/1969 a interpretação de que bastaria lei municipal para tornar inaplicável o concurso público. O entendimento a que chegou a jurisprudência dessa Corte é que a
exigência de concurso para a primeira investidura em cargo público deveria ser vista como regra geral, podendo ser excepcionada, por lei do ente federado, apenas quando se tratasse de cargos cujas atribuições tornassem impossível ou não recomendável a disputa. Apenas nesses casos excepcionais, os chamados cargos de natureza especial, é que o concurso poderia ser dispensado (cf. do mim. Gilmar Mendes, “Princípio do Concurso Público na Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal” Revista de Informação Legislativa a. 25 n. 100 out-dez 1988, p.163-174). [RE 199.649 AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 14-9-2010, 2ª T, DJE de 8-10-2010.]
Outrossim, o art. 106 da EC 01/69, preconizou: O regime jurídico dos servidores admitidos em serviços de caráter temporário ou contratados para funções de natureza técnica especializada será estabelecido em lei especial. A aludida lei especial de que trata o dispositivo constitucional foi a Lei nº 6.185/74, que, em seus artigos 2º, 3º, 4º e 6º disciplinam:
Art. 2º Para as atividades inerentes ao Estado como Poder Público sem correspondência no setor privado, compreendidas nas áreas de Segurança Pública, Diplomacia, Tributação, Arrecadação e Fiscalização de Tributos Federais e Contribuições Providenciárias, Procurador da Fazenda Nacional, Controle Interno, e no Ministério Público, só se nomearão servidores cujos deveres, direitos e obrigações sejam os definidos em Estatuto próprio, na forma do art. 109 da Constituição Federal. (Redação dada pela Lei nº 6.856, de 1980) (Vide Lei nº 7.391, de 1985)
Art 3º Para as atividades não compreendidas no artigo precedente só se admitirão servidores regidos pela legislação trabalhista, sem os direitos de greve e sindicalização, aplicando-se-lhes as normas que disciplinam o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.
Parágrafo único. Os servidores a que se refere este artigo serão admitidos para cargos integrantes do Plano de Classificação, com a correspondente remuneração.
Art 4º A juízo do Poder Executivo, nos casos e condições que especificar, inclusive quanto à fonte de custeio, os funcionários públicos estatutários poderão optar pelo regime do artigo 3º. (Regulamento)[...]
Art 6º Os atuais funcionários que não fizerem a opção prevista no artigo 4º serão mantidos no regime estatutário.
O regulamento de que trata o art. 4º, é o Decreto nº 77.464, de 20 de abril de 1976, o qual regulamentava a forma como o servidor faria a opção, ou não pelo regime de legislação trabalhista.
Dito isso, o art. 19 do ADCT é destinado aos ocupantes de cargos de natureza especial, que, à época, não necessitava de concurso para serem providos e que optaram pela legislação trabalhista como norma de regência, deste modo, à aplicabilidade do citado dispositivo seria para esses servidores específicos, uma vez que os demais já seriam contratados por meio de concurso, na forma do §1º, do art. 97, EC 01/69.
Incongruência do §1º do art. 19 do ADCT e o seu caput
A falta de técnica e a distinção realizada pelo legislador no §1º, do art. 19 do ADCT são cristalinas, visto que, tal dispositivo uma vez interpretado sistematicamente com a nova ordem jurídica, ao condicionar os servidores já em exercício em seus cargos à submissão ao concurso para fins de efetivação, incorreu em contradição, tendo em vista que os servidores que preenchiam os requisitos ali dispostos tornaram-se estáveis de forma automática, de pleno direito, dada a eficácia plena do artigo citado.
A estabilidade excepcional prevista no art. 19 do ADCT, contemplou os servidores que preenchera os requisitos, garantindo um direito excepcional já previsto nas constituições anteriores, consagrando e valorizando seus serviços prestados até então. Quando da análise histórica do tema, conclui-se que, anteriormente a CF/88, já existia servidores contratados sem concurso público, conquanto a previsão do instituto já tivesse sido consagrada desde a CF/34, ou seja, mesmo diante do comando constitucional, havia contratações de pessoal na forma e nos casos especificados acima.
Diante de tal fato o constituinte estendeu o direito a estabilidade aos servidores contratados sem concurso para os cargos que não previam tal condição para o provimento, visando assegurar e prestigiar seus serviços à Administração. Concluir de outra forma seria um verdadeiro ato ilegítimo e carente de equidade e legitimidade para com aquele trabalhadores, com nítida afronta ao direito da pessoa humana, pois a criação de uma nova categoria de servidor (estável, mas não efetivo), estabelece uma nova relação jurídica incompatível com a nova sistemática constitucional.
De efeito, a nova ordem constitucional inaugurada pela CF/88, notadamente prevista no art. 39, preconiza o fim da pluralidade de regimes, de modo que todos os servidores deverão ser submetidos a um único regime jurídico, e, salvo os cargos em comissão e as exceções legais, submetidos ao concurso público, não havendo mais a ressalva de cargos especiais, senão vejamos as palavras de Paulo Emílio Ribeiro de Viena:
Com a regência do art. 39, da Constituição Federal de 1988, a duplicidade de regime perdeu, prática e teoricamente o sentido, pois o que visou a nova Carta foi exatamente eliminar qualquer forma ou espécie de exploração de trabalho humano pela administração pública. A igualização não foi o objetivo imediato e principal do preceito, o objetivo foi, isso sim, assegurar a tutela jurídica a todos os trabalhadores estatais, que qualificamos, acima, como servidores públicos. O meio encontrado tomou a feição de uniformidade, ou seja, igualdade de regimes. (VIENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Constituição de 1988 – Servidor Público “Celetista” Concursado e Estabilidade. Revista de informação legislativa, v. 29, n. 115, p. 263-274, jul./set. 1992 | Revista de Direito do Trabalho, n. 79 p. 54 a 62, set. 1992. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/176071> Acesso em: 27/03/2017.
Como acertadamente concluído por Clovis Renato Costa Farias, em seu artigo publicado na rede mundial de computadores, cujo título é: Estabilidade Extraordinária de Servidores Públicos e a Busca Pela Justiça (Uma análise do art. 19 do ADCT/CF88 com base na teoria dos direitos fundamentais), no que importa citado:
Observe-se, contudo, que a literalidade do artigo em tela incorre em uma incoerência lógica entre os fatos sociais e a mens normativa, uma vez que veio com efeitos ampliativos que visam proteger os trabalhadores e respeitar os serviços por eles desenvolvidos até a ocasião. Algo constatado pelo fato de que a CF/67 já previa o concurso público para a efetividade e estabilidade dos servidores públicos, mas faticamente houve a contratação, em todos os entes e poderes da Federação por décadas, de um grande número de servidores pelo regime celetista, convivendo nas mesmas condições e prestando serviços equiparados aos estatutários. Comprova-se assim o caráter fático-jurídico de que o art. 19 do ADCT veio para criar uma situação excepcional para os obreiros por ele abarcados e pensar de forma contrária significa até mesmo mitigar a cidadania dos obreiros que trabalharam para a administração pública, outro dos fundamentos da República brasileira, como assevera Torres², uma constelação de direitos e deveres do homem em comunidade. (FARIAS, Clovis Renato Costa. Estabilidade Extraordinária de Servidores Públicos e a Busca Pela Justiça (Uma análise do art. 19 do ADCT/CF88 com base na teoria dos direitos fundamentais). Revista Opinião Jurídica (Fortaleza), v. 9, n. 13, p. 2, 2011).
Deste modo, a previsão estabelecida pelo art. 19 do ADCT pode ser entendida como um direito oponível ao estado e aos particulares, uma norma ampliativa/contemplativa e restrita à parte do funcionalismo que à época integrava o corpo de servidores.
Logo, aplicando uma interpretação sistemática ao ordenamento constitucional, concluir que o art. 19 do ADCT criou uma nova categoria de servidores públicos – estáveis e não efetivos – seria um contrassenso aos princípios fundamentais em que se funda a CF/88. Destarte, foge ao razoável submeter os servidores nessa condição à penalização de não pertencer a qualquer carreira, sendo tratados apenas como servidores e fadá-los a permanecer estagnados, sem perspectivas quanto à majoração da base remuneratória tendo direito apenas à recomposição financeira com parâmetro na inflação.
Leis como a do Estado de Alagoas (Lei nº 7.697 de 09 de julho de 2015), a qual estabelece uma tabela de correspondência remuneratória entre os servidores que foram submetidos a concurso público com aqueles estáveis na forma do art. 19 do ADCT, excluindo, deste modo, o direito de fazer parte do plano de cargos e salários, sendo eles tratados de modo sui generis, não se coaduna com os princípios constitucionais da dignidade do trabalhador e da dignidade da pessoa humana. A previsão legal corre à margem da proporcionalidade e pode ser entendida como violadora do direito da dignidade da pessoa humana por discriminar os servidores em tal situação.
Na lição de FARIAS, 2011,p. 4:
O reconhecimento da igualdade plena entre os servidores públicos concursados e os abrangidos pela estabilidade extraordinária atende também aos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 3º da CF/88), por pacificarem a questão quanto à qualidade do trabalhador e do trabalho prestado pelos detentores de estabilidade extraordinária, de forma que, se entendida de forma restritiva acaba por gerar interpretações equivocadas na sociedade e entre os servidores que são trabalhadores nessas condições, são inferiores ou prestam trabalho de menor qualidade do que os detentores da estabilidade ordinária, malferindo o princípio irradiante da CF/88, a dignidade da pessoa humana.
Constrói-se, com esses pequenos ajustes hermenêuticos, uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, CF/88) e se promove o bem de todos, sem preconceitos ou quaisquer formas de discriminação (art. 3º, IV, CF/88). Efetiva-se direito social, atende-se aos ditames valorativos da Constituição. Como declara Sarmento, o Estado não mais se contenta com a proclamação retórica da igualdade de todos perante a lei, assumindo como tarefa impostergável a promoção efetiva dessa igualdade no plano dos fatos.
Noutro giro, em parecer exarado pelo Advocacia Geral da União – AGU, como forma a aclarar o posicionamento aqui defendido no PARECER Nº - GM – 030 PROCESSO Nº - 00001.005869/2001-20, que obteve o “de acordo” do Presidente da República, concluiu:
Em primeiro lugar, parece não haver dúvida de que a interpretação da norma de estabilidade especial, vale dizer, excepcional, constante do Ato das Disposições Transitórias teve por objetivo, tal como passou a ser tradição nas Constituições brasileiras a partir de 1946, conceder a quantos servidores contassem com o tempo de serviço igual ou superior a cinco anos, na data da promulgação da Constituição – excepcionalmente – os mesmos direitos dos servidores efetivados no cargo pela regra geral de ingresso no serviço público mediante concurso e aquisição de estabilidade após um estágio chamado probatório.
De fato, a norma constitucional transitória estabeleceu a necessidade de concurso público para efetivação dos servidores não concursados, os quais tornou estáveis aos cinco anos de serviço. Contudo, entender que o legislador pretendeu criar uma espécie de servidor atípico, ou seja, com todos os direitos do servidor estável, exceto o direito a previdência por regime próprio dos servidores, é interpretação que não parece razoável.
A interpretação mais lógica e mais segura, é entender-se exatamente o oposto, ou seja, que, embora tenha concedido aos servidores não estáveis os mesmos direitos do servidor estável, inclusive, e naturalmente, a aposentadoria, quis o legislador, com a exigência do concurso, nada mais do que aperfeiçoar o processo de integração dos mesmos no serviço público, mediante a correção do meio de ingresso no serviço público, via concurso, ressalte-se, de modo a retirar dos mesmos a condição de servidores com ingresso especial, ao viabilizar a integração completa dos mesmos no status de servidores efetivos comuns, inclusive pela forma de ingresso no serviço.
Ademais, o Professor Paulo Diniz, em artigo publicado com o título: “Estabilidade/Efetividade Atributos do Cargo Público”, assim asseverou:
4.2Servidores públicos civis ocupantes de cargos efetivos ou celetistas ocupantes de empregos permanentes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, ou seja, 06.10.1998, há pelo menos cinco anos contínuos, e que não tenham sido admitidos por concurso público.
4.3A Constituição não criou dois tipos de estabilidades. Estabeleceu sim, duas formas de aquisição de estabilidade por servidores detentores de cargos efetivos
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas. Não pode, por conseguinte, a Administração Pública, adstrita a que está ao princípio da legalidade, criar arbitrariamente dois tipos de estabilidades: conceder direitos a uns para desenvolvimento na carreira e negar a outros. Por conseqüência teríamos por absurdo e duas categorias de servidores. Como resultado tem-se: servidor efetivo com estabilidade, e,servidores não estáveis , mas com o atributo da efetividade .
4.4Os cargos efetivos e os empregos permanentes foram transformados em cargos efetivos. O cargo efetivo assegura ao seu titular o efetivo exercício das atribuições a ele inerentes. Em outras palavras a efetividade como atributo do cargo efetivo assegura ao seu titular o exercício das atribuições inerentes a cada cargo. Onde a lei não distinguiu, não cabe ao interprete fazê-lo.
[...]
7- A estabilidade é um atributo do cargo público que assegura a continuidade da prestação do serviço público que é de caráter permanente. Não há que se confundir estabilidade com efetividade. É a própria Constituição que faz esta distinção. O servidor estável há de ser efetivo, mas nem todo servidor efetivo é estável. Negrito e grifo nosso
[...]
Não existem duas forma dos tipos de estabilidades, existem sim, duas formas de aquisição de estabilidade: uma após aprovação em concurso público e em estágio probatório, e, a outra concedida pelo maior poder que uma nação democrática possui: o Poder Constituinte cuja vontade e decisão está expressa no Art. 19, dos ADCT: Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição, são considerados estáveis no serviço público.
Entrementes, como acima tratado, os servidores estáveis na forma do art. 19 do ADCT, têm o direito a fazer parte do plano de cargos e carreiras em igualdade de condições, uma vez que ocupam cargos efetivos e desempenham atividades iguais daqueles que prestaram concurso público. Entender de outra forma seria se contrapor ao princípio da legalidade e confiança, visto que os atos praticados pelos servidores estariam eivados de ilegalidade pela sua incompetência, uma vez que eles não ocupariam cargos e, por conseguinte, não teriam legitimidade para praticá-los.
Logo, é de clareza solar a vontade do constituinte originário em não instituir duas categorias de servidores públicos distintas, uma legitimada a gozar das benesses da carreira; ao revés, a outra apenas ocupar um “espaço” até que possa se aposentar, não parece das mais escorreitas interpretações a ser dada a nossa Carta Maior.
VISÃO DOS TRIBUNAIS SOBRE O TEMA:
Inicialmente vejamos o posicionamento o STF, o tema foi extraído do sítio eletrônico do STF, no parte de legislação anotada – A Constituição e o Supremo, que, no que se refere ao art. 19 do ADCT, em um de seus enunciados preleciona:
A norma do art. 19 do ADCT da Constituição brasileira possibilita o surgimento das seguintes situações: a) o servidor é estável por força do art. 19 do ADCT e não ocupa cargo de provimento efetivo; b) o servidor que se tornou estável nos termos do art. 19 do ADCT ocupa cargo de provimento efetivo após ter sido aprovado em concurso público para o provimento deste cargo; c) o servidor ocupa cargo de provimento efetivo em razão de aprovação em concurso público e é estável nos termos do art. 41 da CR. O STF já se manifestou sobre essas hipóteses e, quanto às listadas nos itens a e b, firmou o entendimento de que, independentemente da estabilidade, a efetividade no cargo será obtida pela imprescindível observância do art. 37, II, da CR.
[ADI 114, voto da rel. min. Cármen Lúcia, j. 26-11-2009, P, DJE de 3-10-2011.]
Vide ADI 100, rel. min. Ellen Gracie, j. 9-9-2004, P, DJ de 1º-10-2004
Em seguida, vejamos o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça - STJ acerca do tema:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ. REGIME CELETISTA. EQUIPARAÇÃO AOS EFETIVOS PELA LEI PARANAENSE 10.219/02. APLICAÇÃO DO REGIME JURÍDICO ÚNICO. LEI PARANAENSE 6.174/70. LICENÇA ESPECIAL. BENEFÍCIO CONDICIONADO À ESTABILIDADE. INTERPRETAÇÃO CONFORME DADA PELO PRETÓRIO EXCELSO.
ADIN. 1.695/PR. RECURSO DESPROVIDO.
[...] 2. O Pretório Excelso, porém, no julgamento da ADIN 1.695/PA, da relatoria do eminente Ministro MAURÍCIO CORRÊA (DJU 28.05.2004), deu interpretação conforme a Constituição ao § 2o. do art. 70 da Lei Paranaense 10.219/92, sem redução de texto, fixando a exegese de que os Servidores oriundos do regime celetista, mesmo que considerados estáveis no serviço público, por força do art. 19 do ADCT, não se equiparam aos efetivos, no que concerne aos efeitos legais que dependam do requisito da efetividade.
3. O art. 247 da Lei do Estado do Paraná 6.174/70, ao prever o benefício da licença especial, apesar de não condicioná-lo à efetividade, limitou-o aos funcionários estáveis que, durante o período de dez anos consecutivos, não tenham se afastado do exercício de suas funções.
4. Salvo na hipótese excepcional prevista no art. 19 do ADCT, a efetividade é pressuposto necessário da estabilidade, o que afasta a sua aquisição por parte do servidor empregado público regido pela CLT, mesmo após a transposição para o regime estatutário, no que concerne ao direito à percepção de vantagens.
[...]
(RMS 25.996/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 04/12/2009, DJe 01/02/2010)
A seguir, passemos a análise da jurisprudência dos Tribunais:
ADMINISTRATIVO - APELAÇÃO CÍVIL - PENSÃO POR MORTE - ARSENAL DE MARINHA DO RIO DE JANEIRO - COTRATO DE TRABALHO - CLT - ART. 19 DO ADCT - AQUISIÇÃO DE ESTABILIDADE - NÃO EFETIVIDADE - NÃO APLICAÇÃO DA LEI 8.112/90 - ART. 243,§ 1º DA LEI 8.112.
[...] 3 - Esta estabilidade especial instituída pelo art. 19 do ADCT conferiu ao servidor civil apenas a prerrogativa de garantia de permanência no cargo em que ocupava, sendo necessário para dispensá-lo a comprovação de falta funcional grave apurada em processo administrativo ou judicial assegurado o contraditório e a ampla defesa. É tão somente este o intuito da disposição transitória. Tal artigo não tem o condão de dar ao servidor civil efetividade. Esta é adquirida com a realização de concurso público e com a estabilidade especial não se confunde. Assim sendo, não goza também dos benefícios próprios de servidores públicos concursados. 4 - Esta questão já foi sedimentada no Superior Tribunal Federal no RE 167635 / PA, Relator Min. MAURÍCIO CORRÊA, Julgamento em 17/09/1996, Segunda Turma, publicação DJ 07-02-1997: RECURSO
EXTRAORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. FUNCIONÁRIO PÚBLICO ESTADUAL ADMITIDO SEM CONCURSO PÚBLICO E REDISTRIBUÍDO PARA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO. EFETIVAÇÃO POR RESOLUÇÃO DA MESA. FORMA DERIVADA DE INVESTIDURA EM CARGO PÚBLICO. DESFAZIMENTO DO ATO ADMINISTRATIVO PELA MESA DIRETORA DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. ILEGALIDADE DO ATO QUE DECLAROU A NULIDADE DA INVESTIDURA DO SERVIDOR. IMPROCEDÊNCIA. EFETIVIDADE E ESTABILIDADE. (...) 2.Efetividade e estabilidade. Não há que confundir efetividade com estabilidade. Aquela é atributo do cargo, designando o funcionário desde o instante da nomeação; a estabilidade é aderência, é integração no serviço público, depois de preenchidas determinadas condições fixadas em lei, e adquirida pelo decurso de tempo. 3. Estabilidade: artigos 41 da Constituição Federal e 19 do ADCT. A vigente Constituição estipulou duas modalidades de estabilidade no serviço público: a primeira, prevista no art. 41, é pressuposto inarredável à efetividade. A nomeação em caráter efetivo constitui se em condição primordial para a aquisição da estabilidade, que é conferida ao funcionário público investido em cargo, para o qual foi nomeado em virtude de concurso público. A segunda, prevista no art. 19 do ADCT, é um favor constitucional conferido àquele servidor admitido sem concurso público há pelo menos cinco anos antes da promulgação da Constituição. Preenchidas as condições insertas no preceito transitório, o servidor é estável, mas não é efetivo, e possui somente o direito de permanência no serviço público no cargo em que fora admitido, todavia sem incorporação na carreira, não tendo direito a progressão funcional nela, ou a desfrutar de benefícios que sejam privativos de seus integrantes. 3.1. O servidor que preenchera as condições exigidas pelo art. 19 do ADCT-CF/88 é estável no cargo para o qual fora contratado pela Administração Pública, mas não é efetivo. Não é titular do cargo que ocupa, não integra a carreira e goza apenas de uma estabilidade especial no serviço público, que não se confunde com aquela estabilidade regular disciplinada pelo art. 41 da Constituição Federal. Não tem direito a efetivação, a não ser que se submeta a concurso público, quando, aprovado e nomeado, fará jus à contagem do tempo de serviço prestado no período de estabilidade excepcional, como título. (...) (grifo nosso [...]. (TRF-2 - AC - APELAÇÃO CIVEL : AC 201051010217761. Orgão Julgador: OITAVA TURMA ESPECIALIZADA. Publicação: 07/02/2014. Julgamento: 29 de Janeiro de 2014. Relator: Desembargadora Federal SIMONE SCHREIBER) sem negrito no original
APELAÇÃO CÍVEL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE MIRACEMA. ART. 19 DO ADCT. PRETENSÃO DE REENQUADRAMENTO NA CARREIRA. MAGISTÉRIO MUNICIPAL. [...]
3- ESTABILIDADE EXCEPCIONAL PARA SERVIDORES NÃO CONCURSADOS DA UNIÃO, DOS ESTADOS, DO DISTRITO FEDERAL E DOS MUNICÍPIOS QUE, QUANDO DA PROMULGAÇÃO DA CF, CONTASSEM COM, NO MÍNIMO, CINCO ANOS ININTERRUPTOS DE SERVIÇO PÚBLICO, QUE NÃO SE CONFUNDE COM ESTABILIDADE.
4- ADOÇÃO DO ENTENDIMENTO SUFRAGADO PELA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, NO SENTIDO DE QUE O "SERVIDOR QUE PREENCHER AS CONDIÇÕES EXIGIDAS PELO ART. 19 DO ADCT SERÁ ESTÁVEL NO CARGO PARA O QUAL FORA CONTRATADO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, MAS NÃO EFETIVO. NÃO É TITULAR DO CARGO QUE OCUPA, NÃO INTEGRA A CARREIRA E GOZA APENAS DE UMA ESTABILIDADE ESPECIAL NO SERVIÇO PÚBLICO, QUE NÃO SE CONFUNDE COM AQUELA ESTABILIDADE REGULAR DISCIPLINADA PELO ART. 41 DA CF. NÃO TEM DIREITO A EFETIVAÇÃO, A NÃO SER QUE SE SUBMETA A CONCURSO PÚBLICO"(RE Nº 167.635, MIN. MAURÍCIO CORREA; ADI Nº 114, MIN. CARMEM LÚCIA). 5REFORMA DA SENTENÇA, EM REEXAME NECESSÁRIO (SÚMULA Nº 253 DO STJ). (TJ-RJ - REEXAME NECESSÁRIO : REEX 00052242620118190034 RIO DE JANEIRO MIRACEMA 2 VARA. Órgão Julgador: QUARTA CÂMARA CÍVEL. Partes: AUTOR: Maria Lucia Rangel Alvim, REU: Municipio de Miracema. Publicação: 19/03/2013. Julgamento:15 de Março de 2013. Relator: MYRIAM MEDEIROS DA FONSECA COSTA)
Pelo acima demonstrado, e não poderiam ser diferentes, os tribunais ordinário e o STJ seguem o posicionamento do STF no sentido de que há mais de uma classe de servidores [(a) o servidor é estável por força do art. 19 do ADCT e não ocupa cargo de provimento efetivo; b) o servidor que se tornou estável nos termos do art. 19 do ADCT ocupa cargo de provimento efetivo após ter sido aprovado em concurso público para o provimento deste cargo; c) o servidor ocupa cargo de provimento efetivo em razão de aprovação em concurso público e é estável nos termos do art. 41 da CR]. O que, conforme analisado, destoa da real prestação do texto constitucional uma vez superada a sua literalidade e aplicando a ele uma interpretação aprofundada e coerente com o ordenamento jurídico, sob pena de se cometer injustiças, como nos casos tratados acima.
CONCLUSÃO
A real finalidade do art. 19 do ADCT, uma vez aplicada às técnicas de interpretação da norma jurídica, como a histórica, sistemática e a teleológica, nos conduz a exegese de que não fora criada uma nova categoria de servidor público quando da promulgação da Carta de 1988, e sim uma estabilização e unificação dos regimes que regulariam as carreiras dos servidores públicos que à época da entrada em vigor da nova ordem constitucional se enquadravam ou tinham sido contratados por outra forma que não o concurso público, mas que ao tempo era constitucional devido à natureza do cargo
e expressa previsão nesse sentido.
Conjugando a análise histórica com o princípio da dignidade da pessoal humana extrai-se do texto ora em análise que a norma contemplou uma determinada categoria de servidores com a estabilidade nos cargos ou carreiras das quais faziam parte, e não os segregou em uma carreira sui generis, anômala as regras atualmente vigentes, se assim o quisesse teria expressamente os excluídos de seus cargos e disposto especificamente quanto a suas novas atribuições.
Quando da análise da jurisprudência é vista uma patente injustiça para com os servidores, ao ponto de trata-los como servidores sem carreira, sem direito a progressão quanto aos padrões remuneratórios o que se afigura totalmente em descompasso com o princípio da dignidade do trabalhador e da pessoa humana, pois são como se estivessem ali por uma benesse, um favor do Estado e não por seus serviços prestados. Os contemplados pela norma não se submeteram a concurso, não por opção, mas pela
natureza do cargo que ocupavam o qual não necessitavam de submissão ao instituto por expressa disposição constitucional (§ 1º do art. 97 da EC 01/69).
A atual constituição garantiu àqueles a estabilidade, essa entendida como consequência da efetividade e não ao contrário, além disso, uma vez ocupando um cargo público efetivo o servidor adquire a estabilidade após o preenchimento de outros requisitos e não há como conceber uma estabilidade afastada de um cargo, torna-se vazia a previsão constitucional, pois a investidura do servidor em um cargo “efetivo sem efetividade” torna-se inócua, sem qualquer sentido, desprovida de suporte constitucional.
Destarte, não há confundir os servidores que burlaram os sistema por meio de leis dos entes políticos inconstitucionais concebidas de forma sorrateira com o intuito de desvencilhar-se do instituto republicano do concurso público, muitas delas declaradas inconstitucionais pelo STF (RE 199.649, citado na pág. 7 deste trabalho), com aqueles que ocuparam os cargos de natureza especial previsto na EC 01/69, em seu § 1º do art. 97, esses sim, reais destinatários da norma.
Portanto, a previsão transitória da constituição é uma forma de contemplar e enquadrar os servidores a nova ordem instituída, os quais deveriam ter seus direitos assegurados assim como aqueles que passaram por um concurso, pois esta, sem dúvida, é a interpretação que garante a máxima efetividade do texto constitucional como um todo não apenas atendo-se a literalidade disposta no art. 19 do ADCT.
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