Breves comentários à Lei nº 14.155/2021

28/05/2021 às 20:25
Leia nesta página:

O presente artigo traz breves e importantes comentários sobre a Lei nº 14.155/2021 publicada em 28 de maio de 2021, que agrava as penas dos crimes de violação de dispositivo informático, furto e estelionato, além de alterar a competência do estelionato.

Preliminarmente, convém salientar que a Lei nº 14.155/2021 tem natureza penal e processual, uma vez que agrava sanções penais e também altera a competência para apuração de crimes de estelionato, modificando e inserindo novas redações em dispositivos do Código Penal e do Código de Processo Penal.

No plano processual, houve alteração de competência por superveniência da mencionada lei, pois a competência era determinada pelo local onde o autor do crime obtinha a vantagem ilícita, pois o núcleo do tipo penal é obter vantagem ilícita, então o entendimento era que a consumação se dava no momento em que os valores entravam efetivamente em sua conta bancária, nos casos de estelionato mediante depósito ou transferência.

Na prática, o aludido entendimento prejudicava as investigações criminais, haja vista a demora para realizar diligências em outras unidades da federação, visto que muitas vezes acontece que a vítima tem domicílio na região norte, enquanto o autor toma posse da vantagem ilícita na região sul onde é domiciliado, portanto, a doutrina e a jurisprudência divergiam bastante sobre essa questão.

Para evitar decisões contraditórias, a Terceira Seção do STJ reiterou, por unanimidade, a orientação de que a consumação ocorre no local em que o estelionatário alcança a vantagem, porém, em face da mudança do entendimento jurisprudencial da própria Terceira Seção, a matéria foi novamente apreciada pelo colegiado.

Chegou-se a estabelecer distinção entre a modalidade de estelionato mediante depósito de cheque clonado ou adulterado, cuja competência era do local onde a vítima possui conta bancária, e a modalidade cometida mediante depósito ou transferência bancária em favor do autor do crime, ficando a competência para o local da agência bancária beneficiária do depósito ou transferência.

Hoje, com a publicação da Lei nº 14.155/2021, foi dada nova redação ao §4º do art. 70 do CPP, definindo a competência para as duas modalidades de estelionato, a saber: “Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a COMPETÊNCIA será definida pelo LOCAL DO DOMICÍLIO DA VÍTIMA, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela PREVENÇÃO.” (grifo nosso)

Desse modo, a partir de hoje, 28 de maio de 2021, a competência para processar e julgar as modalidades de estelionato supramencionadas é do local do domicílio da vítima e, quando houver mais de uma vítima, a competência será por prevenção, ou seja, do juiz que primeiro tomar conhecimento do fato criminoso.

Assim, na prática, essa nova lei ajudará na investigação criminal porquanto a autoridade policial com atribuições para instaurar inquérito será aquela do local do domicílio da vítima, facilitando a colheita de elementos informativos e provas documentais.

Agora, saindo um pouco do plano processual e adentrando no âmbito material, vale destacar as penas agravados pela lei em comento, quais sejam:

VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVO INFORMÁTICO
“Art. 154-A. Invadir dispositivo informático de uso alheio, conectado ou não à rede de computadores, com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do usuário do dispositivo ou de instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita:
Pena – reclusão, DE 1 (UM) A 4 (QUATRO) ANOS, e multa.
§ 2º Aumenta-se a pena DE 1/3 (UM TERÇO) A 2/3 (DOIS TERÇOS) se da invasão resulta prejuízo econômico.
§ 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido:
Pena – reclusão, DE 2 (DOIS) A 5 (CINCO) ANOS, e multa.” (grifo nosso)

FURTO
“Art. 155 - (...)
§ 4º-B. A pena é de reclusão, DE 4 (QUATRO) A 8 (OITO) ANOS, e multa, se o furto mediante fraude é cometido POR MEIO DE DISPOSITIVO ELETRÔNICO OU INFORMÁTICO, CONECTADO OU NÃO À REDE DE COMPUTADORES, COM OU SEM A VIOLAÇÃO DE MECANISMO DE SEGURANÇA OU A UTILIZAÇÃO DE PROGRAMA MALICIOSO, OU POR QUALQUER OUTRO MEIO FRAUDULENTO ANÁLOGO.
§ 4º-C. A pena prevista no § 4º-B deste artigo, considerada a relevância do resultado gravoso:
I – aumenta-se DE 1/3 (UM TERÇO) A 2/3 (DOIS TERÇOS), se o crime é praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional;
II – aumenta-se de 1/3 (UM TERÇO) AO DOBRO, se o crime é praticado contra idoso ou vulnerável.”
(grifo nosso)

ESTELIONATO
“Art. 171 - (...)
Fraude eletrônica
§ 2º-A. A pena é de reclusão, DE 4 (QUATRO) A 8 (OITO) ANOS, e multa, se a fraude é cometida com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro POR MEIO DE REDES SOCIAIS, CONTATOS TELEFÔNICOS OU ENVIO DE CORREIO ELETRÔNICO FRAUDULENTO, OU POR QUALQUER OUTRO MEIO FRAUDULENTO ANÁLOGO.
§ 2º-B. A pena prevista no § 2º-A deste artigo, considerada a relevância do resultado gravoso, aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional.
(...)
Estelionato contra idoso ou vulnerável
§ 4º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é cometido contra idoso ou vulnerável, considerada a relevância do resultado gravoso.” (grifo nosso)

Por fim, conclui-se que a nova lei em apreço contribuirá no plano processual quando definiu a competência do local do domicílio da vítima para apuração das referidas modalidades de estelionato, que está em alta no país, mormente durante a pandemia, período em que está havendo milhares de fraudes eletrônicas, a maioria delas envolvendo o auxílio emergencial, bem como o agravamento das penas certamente inibirá a ação delituosa dos criminosos que praticam reiteradamente as espécies de crimes tratadas acima, entretanto, vale frisar que o crime de violação de dispositivo informático protege a inviolabilidade dos segredos, enquanto o furto e o estelionato tutela o patrimônio.

Sobre o autor
Paulo César da Silva Melo

alagoano de Arapiraca, casado, pai de 4 filhas, servidor público desde 2000, policial civil desde 2002, Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL), escritor de artigos jurídicos, aprovado no XIV exame nacional da OAB, apto à advocacia desde 2014, pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI), pós-graduando em Políticas Públicas e Direitos Humanos pela UNEAL, com capacitações na área de segurança pública pelo Ministério da Justiça, pesquisador das ciências criminais, professor de direito em cursos preparatórios e eterno aprendiz.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

lei nova. penal e processual penal.

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