A (im)possibilidade da adoção de idosos em situação de abandono

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Estudar a viabilidade jurídica da adoção de pessoas idosas em situação de abandono, inserindo-as em uma família substituta disposta a oferecer o direito de convivência familiar e comunitária, com qualidade e dignidade

RESUMO

O presente artigo tem por finalidade estudar a viabilidade jurídica da adoção de pessoas idosas em situação de abandono, inserindo-as em uma família substituta disposta a oferecer o direito de convivência familiar e comunitária, prover cuidados, como carinho, afeto, proteção e amor com qualidade e dignidade. Para tanto, utilizou-se metodologia descritiva e levantamento bibliográfico, assim como busca de dados em sites governamentais a partir das normas existentes e de estudos pelos projetos de lei em trâmite na Câmara dos Deputados, PL nº 956/2019, PL nº 5.475/2019, PL nº 5.532/2019, PL nº 105/2020 que tratam sobre a adoção de idosos. Assim, visa demonstrar bem como reafirmar a necessidade da regulamentação de direitos em legislações específicas e de políticas públicas para proteger idosos, proporcionando-lhes um envelhecer digno. Segundo dados demográficos e conforme projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o cenário é de envelhecimento da população brasileira, considerada atualmente a maior do mundo, cujo número tende a dobrar daqui a 20 anos. De igual forma, o abandono de idosos é crescente, sendo institucionalizados em lugares monótonos conhecidos “asilos” e “abrigos”, com um futuro incerto, onde a família não volta para tirá-los, e acabam morrendo ali mesmo, na sua última fase de vida, período em que mais precisam da convivência familiar essencial para a longevidade do idoso. São inúmeros desafios ao longo do caminho, mas, a afetividade e o princípio do melhor interesse do idoso devem sobressair sobre os requisitos impeditivos.

Palavras-chave: Adoção de idosos. Convivência Familiar e Comunitária. Abandono. Família substituta. Idosos.

ABSTRACT

This article aims to study the legal feasibility of adopting elderly people in a situation of abandonment, inserting them in a substitute family, which is willing to offer the right to family and community coexistence, providing care, such as affection, protection and love with quality and dignity. For this, descriptive methodology and bibliographic survey were used, as well as data search on government websites based on existing norms and studies by the bills in process in the Chamber of Deputies, PL nº 956/2019, PL nº 5.475 / 2019 , PL nº 5.532/2019, PL nº 105/2020 that deal with the adoption of the elderly. Thus, it aims to demonstrate as well to reaffirm the need to regulate rights in specific laws and public policies to protect the elderly, providing them a dignified aging. According to demographic data and according to projections from the Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE), the Brazilian population aging scenario is currently considered the largest in the world, whose number tends to double 20 years from now. Likewise, the abandonment of the elderly is increasing, being institutionalized in monotonous places known as "nursing homes" and "shelters", with an uncertain future, where the family does not return to take them out, and they end up dying right there, in their last period of life, a moment in which they most need family life essential for the elderly's longevity. There are countless challenges along the way, but affection and the principle of the best interest of the elderly must stand out over the impeding requirements.

Keywords: Adoption of the elderly. Family and Community Living. Abandonment. Substitute family. Seniors.

  1. - Introdução

De acordo com os dados demográficos e projeções notórias abordados neste artigo acerca do envelhecimento populacional, o Brasil está com maior índice de longevidade. Surge um novo perfil populacional, tendo como uma das principais características a vulnerabilidade, período pelo qual necessita de apoio e proteção familiar e sua dignidade preservada, conquanto pertinente uma atenção e discussão especial visando construir políticas públicas que tragam uma proteção especial à pessoa idosa bem como à efetivação de seus direitos fundamentais, normalmente negligenciados pela Constituição Federal de 1988 e pelo Estatuto do Idoso.

Utilizando-se da metodologia descritiva e levantamento bibliográfico este estudo busca discutir o seguinte questionamento: seria possível a inserção de idosos abandonados em família substituta por meio da adoção?

Inicialmente, será destacado o conceito de família, célula básica de toda e qualquer sociedade pautando-se no afeto, princípio do Direito das Famílias o qual sobressai mesmo diante de vínculos sanguíneos. A família tradicional vem passando ao longo dos anos por diversas transformações, ficando inquestionável que as alterações ocorridas na sociedade, refletiram no campo do Direito das Famílias, extinguindo o modelo único e admitindo-se atualmente diversos modelos familiares.

Em sequência será enfatizado que, a família substituta por meio da adoção seria a melhor opção e completa como meio para se garantir o direito fundamental da pessoa idosa, previsto no art. 230 da Constituição Federal de 1988 e no art. 3° do Estatuto do Idoso3. A convivência familiar e comunitária é fundamental para um envelhecimento saudável. Atualmente no Brasil não há nenhuma legislação específica ou qualquer instrumento jurídico que trate a possibilidade de colocação de idoso em família substituta. No entanto, há 04 projetos de leis abordando o assunto sob o estudo do governo e em trâmite na Câmara dos Deputados, tratados minuciosamente ao longo do artigo.

Portanto, será válida a inserção deste idoso em uma família substituta, que está disposta a oferecer o direito de convivência familiar e comunitária, prover cuidados, como carinho, afeto, proteção e amor com qualidade e dignidade.

  1. - Contextualização da família pautada no afeto e a formação desta por outra origem

A família base da sociedade brasileira vem sofrendo inúmeras mudanças sociais, devido às diversas culturas, crenças e costumes distintos, moldando novos contornos e modelos, sofrendo significativas alterações e deixando para trás o padrão matrimonial, patriarcal e hierárquico. Ao longo dos anos têm-se invertido valores centenários, e expandido espaço no Direito das Famílias, para um conceito moderno de família, como expõe Rolf Madaleno:

“A família matrimonializada, patriarcal, a, heteroparental, biológica vista como unidade de produção cedeu lugar para uma família pluralizada, democrática, igualitária, hetero ou homoparental, biológica ou socioafetiva, construída com base na afetividade e de caráter instrumental. (Rolf Madaleno, 2020, p.20)”.

Diante das constantes mudanças na estrutura familiar, a Constituição Federal de 1988, em seu art. 226, ampliou e pugnou pela igualdade nas diversas formas de entidades familiares todas merecedoras de proteção especial do Estado, destacando:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. 1º O casamento é civil e gratuita a celebração.

2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

É inquestionável que as alterações ocorridas na sociedade, refletiram no campo do Direito das Famílias, extinguindo o modelo padrão único, ou seja, matrimonial que era seguido quando se tratava de família.

A Carta Magna ampliou as entidades familiares, trazendo um rol exemplificativo no art. 226, sendo que, tal concepção tem prevalecido no entendimento, tanto doutrinário como jurisprudencial. Assim, são admitidas diversas células familiares, seja, família anaparental, sem a presença dos pais; família homoafetiva, constituída por pessoas do mesmo sexo; família mosaico ou pluriparental, aquela de vários casamentos, relacionamentos afetivos e uniões estáveis; família monoparental, formada por apenas um dos genitores responsáveis pelo filho; família matrimonial, formada com base no casamento civil aquele composto por atos solenes e formais; família informal, a qual se dá pela convivência, sem a união do casal tenha sido oficializada; família paralela, quando uma mesma pessoa possui duas uniões ao mesmo tempo, mas uma teve início antes da outra, enfim diversos modelos, ora as presentes, ora as que ainda podem surgir.

O poeta Fabrício Carpinajar4 em uma estrofe do seu poema “parente e família”, escrito em 2015 e publicado pelo Gaúchazh que é um portal de notícias brasileiro mantido pelo Grupo RBS de Porto Alegre resume de forma clara e concisa o significado que tem a família:

Família é chegada, não origem.

Família se descobre na velhice, não no berço. Família é afinidade, não determinação Biológica.

Família é quem ficou ao lado das dificuldades enquanto a maioria desapareceu.

Família é uma turma de sobreviventes, de eleitos, que enfrentam o mundo em nossa trincheira e jamais mudam de lados. (GZH Geral)

Devido à amplitude de modelos de família, é impossível impor um conceito único, Rodrigo da Cunha (2020), Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, enfatiza que “a família é a célula básica de toda e qualquer sociedade desde os mais primitivos até os mais contemporâneos”. Diante tentativa conceitual, o mencionado doutrinador Rodrigo da Cunha, afirma:

Família, ou entidade familiar, é um gênero que comporta duas espécies, em suma constituição: a família conjugal e a família parental. A conjugal é aquela que se estabelece com base em uma relação afetiva, envolvendosexualidade e pode advir daí filhos, ou não. Pode ser heteroafetiva ou homoafetiva, pelo casamento ou união estável, simultânea à outra, quebrando o princípio da monogamia, ou não; a família parental é aquela que decorre da formação de laços consanguíneos ou socioafetivos. Pode ser inseminação natural ou artificial, gerados em útero próprio ou de substituição (barriga de aluguel). Seja como for, parental ou conjugal, interessa ao Direito a inclusão de todas essas novas configurações para que se possa atribuir direitos e receber a proteção do Estado.(Rodrigo da Cunha, 2020, p.18)

Nesse contexto de alterações, o afeto adquire marca relevante para uma construção conceitual de família, sendo apontado como o principal fundamento das relações familiares.

O ordenamento jurídico brasileiro reconhece que o afeto sobressai mesmo diante de vínculos sanguíneos. Segundo Flávio Tartuce (2020, p.27), “mesmo não constando a expressão afeto no Texto Maior como sendo um direito fundamental, pode se afirmar que ele decorre da valorização constante da dignidade humana e da solidariedade”.

A afetividade como um princípio do direito de família, tem valor jurídico podendo ser visto no lustroso artigo do jurista mineiro Baptista Villela (1979, p.1), a “Desbiologização da paternidade”, dita que “a paternidade, em si mesma, não é um fato da natureza, mas um fato cultural”, ou seja, o vínculo familiar constitui mais um vínculo de afeto do que um vínculo biológico. Cabe ressaltar como complemento o que diz o professor paranaense, Ricardo Calderón:

A afetividade passou a prevalecer sobre os critérios econômicos, políticos, religiosos, sociais, de interesse do grupo familiar, enfim, preponderou sobre os demais fatores que influenciavam os vínculos familiares até então. O critério afetivo que figurava como coadjuvante no período da família clássica foi alçado à protagonista na família contemporânea, tanto para as suas relações de conjugalidade, como para as suas relações de parentalidade. (Ricardo Calderón, 2017, p.157)

O Código Civil de 2002, no seu art. 1.593, reconhece que “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem” (Brasil, 2002), de modo a expressar ainda que implicitamente, a possibilidade de parentesco afetivo, quando admite “ou outra origem”, na redação dada pelo legislador, há referência por doutrinadores e decisões judiciais, afirmando que o vocábulo envolve o parentesco por socioafetividade.

O Enunciado n° 103 da I Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, dita que:

O Código Civil reconhece, no art. 1.593, outras espécies de parentesco civil além daquele decorrente da adoção, acolhendo, assim, a noção de que há também parentesco civil no vínculo parental proveniente quer das técnicas de reprodução assistida heteróloga relativamente ao pai (ou mãe) que não contribuiu com seu material fecundante, quer da paternidade socioafetiva, fundada na posse do estado de filho.

Tomando por base tais circunstâncias, indaga-se: a adoção de idosos diante do cenário de envelhecimento populacional e o abandono crescente e observando sempre ao princípio do melhor interesse, poderia ser instituída na legislação por meio do termo “ou outra origem” ?

Antes de qualquer resposta a esta pergunta, é preciso analisar de forma minuciosa a atual situação da pessoa idosa no Brasil.

    1. - Família substituta como meio para se garantir o direito à convivência familiar e comunitária

O ordenamento jurídico brasileiro reconhece pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, (Lei nº 8.069/1990), a existência de três espécies de família: a natural, a extensa e a substituta.

A família natural é aquela formada apenas pelos pais e seus descendentes (art. 25, caput, ECA), sendo proveniente da origem biológica, constituída pelos laços sanguíneos, referindo-se a conhecida família tradicional, com pai, mãe e filhos.

No tocante à família extensa ou ampliada ela inclui, além dos pais e filhos, os parentes próximos com os quais convivem e mantém vínculos de afinidade e afetividade (art. 25, parágrafo único, ECA), desde que haja convivência contínua e afinidade, sendo exemplo, a neta que mora com a avó.

Já a família substituta é caracterizada pela, guarda, tutela e adoção (art. 28, ECA). Ou seja, como o próprio nome já diz, substitui pais ou responsáveis. Todavia na guarda a família substituta torna-se provisória; a família torna-se temporária nos casos de tutela; e pela adoção a família torna-se definitiva. Pela adoção, são gerados parentalidade afim, não por laços sanguíneos, mas sim por afinidade carinho e amor, portanto, manifestação de vontade por ambas as partes.

Adoção é a espera do amor (DIAS, 2019), instituto pelo qual se aceita, acolhe um estranho, independentemente de laços consanguíneos, criando relação entre duas pessoas por meio do afeto. A adoção é a modalidade de colocação em família substituta prevista na legislação, mais completa, a qual diz sobre a inserção a criança ou adolescente, ou até mesmo uma pessoa adulta em um novo núcleo familiar, concernindo uma medida protetiva. Refere-se ao um ato irrevogável, ou seja, adoção é para sempre, gerando direitos e deveres como se fosse filho biológico, sem distinção, tornando-se um membro da família, estabelecendo um vínculo de filiação. Adoção passa por todo um processo, desde quem pode adotar, à quem vai ser adotado, um caminho longo, complexo e burocrático até a decisão judicial. Não é fácil, mas é possível, principalmente quando está disposto a amar, cuidar e se dedicar ao outro, sem preconceitos.

Para o doutrinador Caio Mário Pereira (2020, p.467), “a adoção é, pois, um ato jurídico pelo qual uma pessoa recebe outra como filho, independente de existir entre elas qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim”.

Possuindo características e legislação própria, a adoção está prevista atualmente no Código Civil de 2002 apenas em dois artigos, que são o art. 1.618 o qual define que a adoção de crianças e adolescentes será regulada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e o art. 1.619, que, por sua vez, ressalta que a adoção de maiores de 18 anos dependerá da assistência efetiva do poder público e de sentença constitutiva, aplicando-se também as regras constantes no Estatuto. Vale ressaltar que o art. 1.596 não trata de forma específica sobre a adoção, mas define os mesmos direitos e deveres como para os filhos biológicos como para dos adotivos.

No Estatuto da Criança e do Adolescente de início têm-se os arts. 19 e 22 que tratam sobre os direitos e deveres das crianças e dos pais, em específicos para a adoção destacam-se os arts. 39 ao 52-D, os quais definem direitos e deveres do adotante e do adotado.

A Lei nº 1.3509/2017 - Lei Nacional da Adoção -, dispõe sobre a adoção e trouxe alteração e revogação de alguns artigos do Código Civil de 2002, bem como o Estatuto da Criança e do Adolescente, buscando ter autonomia para legislar sobre a adoção.

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Ao contrário do que ocorre com a criança e o adolescente, inexiste lei específica que trate sobre o assunto nem tão pouco no Estatuto do Idoso cogita a possibilidade de adoção de idosos. Por essa questão e considerando se tratar de uma realidade a falta de cuidado a essa parcela crescente e hipervulnerável da população, atualmente existem projetos de lei, que abordam tal instituto, visando alterar o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03), ganhando voz e destaque no Poder Legislativo, a ideia de colocar o idoso em uma família substituta através de um instituto semelhante a uma adoção.

O Estatuto do Idoso reconhece a família substituta por meio do art. 37 ao dizer que “o idoso tem direito a moradia digna, no seio da família natural ou substituta, ou desacompanhada de seus familiares, quando assim o desejar,

ou ainda, em instituição pública ou privada” (BRASIL, 2003).

A regra seria que a família natural, ou seja, família biológica ou consanguínea, desse apoio, amparo familiar a estes idosos quando eles se tornam mais vulneráveis e dependentes de cuidado, em virtude da velhice ou enfermidade. Não acontecendo assim, o art. 37 do Estatuto do Idoso como supracitado, aduz que este pode ser inserido em uma família substituta, questão em tela discutida no Projeto de Lei nº 5.532/2019, pelo meio do instituto jurídico da adoção, o qual vai ser tratado de forma minuciosa mais a frente.

O Estatuto do Idoso estabeleceu em seu artigo 3º, dentre outras obrigações impostas à Família, à Sociedade e ao Estado, a importância da família e do convívio familiar que influencia de forma direta a qualidade de vida das pessoas idosas:

“É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e a convivência familiar e comunitária“. (BRASIL, 2003)

Faz-se mister dizer que a convivência familiar está ligada umbilicalmente à moradia digna descrita no art. 37 do Estatuto supracitado com “uma teoria dos direitos fundamentais edificada sobre a dignidade da pessoa humana” (Min. Luís Barroso, 2015). E ainda o art. 230, caput, da Constituição Federal de 1988, densificou essa ordem obrigacional.

Logo neste contexto, a fim de assegurar não só o direito à vida, à saúde, e à alimentação, mas também o direito à convivência familiar e a convivência comunitária5, é extremamente urgente que a pessoa idosa seja amparada. Para tal a

adoção como modalidade de família substituta pode ser mais uma possibilidade, além das previstas no artigo supracitado.

3- Envelhecimento populacional

A constante presença de pessoas idosas na população é uma realidade que vem crescendo e superando marcas no país e no mundo nas últimas décadas.

De acordo o Estatuto do Idoso (Lei n° 10.741/03) em seu art. 1º e a Organização Mundial de Saúde (OMS), idoso é o indivíduo com 60 (sessenta) anos de idade ou mais. E ainda, segundo este organismo internacional, o Brasil desde 2016 tem a maior população idosa do mundo, sendo 30,2 milhões de pessoas idosas, a qual representa 13,5% da população, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)6 divulgada em 2018. Ainda de acordo com projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esse número tende a dobrar até o ano de 2043, pois, um quarto da população deverá ter mais de 60 anos, alcançando o total de 57 milhões.

Antes do século XXI, pouco se falava sobre uma política específica para os idosos, tento em vista que a população era composta majoritariamente por crianças e jovens, mas segundo estudo feito pela Organização das Nações Unidas (ONU), pela primeira vez na história há mais idosos do que crianças no mundo, percentual que, até 2050 pode ser multiplicado, tendo em vista o crescente desequilíbrio entre idosos e jovens.

Por conta desse fator do avançar da idade, o Estatuto do Idoso (Lei n° 10.741/03), precisa ser analisado minuciosamente; talvez seja hora de atualizar seu contexto, pois quando criado não previa essa atual situação dos idosos. A realidade está inversa, por muito tempo se preocupou apenas com as crianças e adolescentes, só que tal preocupação ficou no passado, e, consequentemente, é hora de se exigir que sejam criadas novas políticas públicas, bem como o cumprimento de programas sociais previstos no ordenamento jurídico e dos prrogramas de atuação governamental já existentes no Brasil.

Em importante pesquisa e dados coletados com base nos próprios residentes pelo SBA Residencial – Residencial para idosos em São Paulo –, conhecido como uma “instituição de Hospitalidade Sênior, um local destinado à moradia para idosos que procuram conveniência, comodidade, cuidados com a saúde e profissionais altamente preparados para lidar com as especificidades da terceira idade”, após análise, em 2019 publicou-se um artigo na sua plataforma de suporte que fala sobre “Autonomia e independência do idoso”, o qual ressalta que há inúmeros idosos em situação de vulnerabilidade, vivendo sozinhos e acometidos por sérias limitações, com perda de autonomia e independência. Consequentemente, desde já percebe-se que o tema em questão abordado nesse artigo nunca foi tão pertinente. A situação do idoso no Brasil é no mínimo preocupante, sendo preciso enfrentar os temas de envelhecimento e seus reflexos, apesar das dificuldades ao longo do caminho, devendo prevalecer a afetividade sobre os requisitos impeditivos, tendo em vista que a possibilidade de colocação de idosos em família substituta por meio de adoção passou a ser um assunto bastante discutido atualmente.

3.1- Idosos em situação de abandono

O art. 229 da Constituição Federal de 1988 prevê que “os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. Contudo, essa não é a realidade e privilégio para todas as pessoas idosas, direito este constantemente violado e desprezado, seja por abandono da família ou por omissão do Estado, ao não inserir programas de amparo aos idosos.

Ao atingirem certa idade e precisar de cuidados que as famílias nem sempre conseguem dar, muitos idosos são inseridos em Instituições de Longa Permanênica (ILPIs)7, os conhecidos abrigos e asilos onde passam o restante das suas vidas. Com esse processo de mudança de lares sofrem a dor de não pertencerem mais fisicamente a uma família, e é exatamente nesse contexto que surge a ideia de adoção de idosos, que vem ganhando voz e destaque das autoridades brasileiras.

O abandono de quem cuida ou deveria cuidar dos pais na velhice, denomina- se abandono afetivo inverso e ganha atualmente grande repercussão no ordenamento jurídico brasileiro, o seu descumprimento de dever de prestação de apoio, faz minúcia um ato ilícito, caracterizando fato gerador de reparação civil e até mesmo penal, com base no art. 4° do Estatuto do Idoso.

No entanto, a realidade remonta a dados assustadores, segundo o relatório anual do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, publicado pela plataforma do site oficial do Governo Federal (BRASIL, 2020), em análise estatística ao Disque 100, que recebe, analisa e encaminha denúncias de violações de direitos humanos, elenca que nos últimos anos houve uma escala ascendente em relação ao abandono8 e a negligência9. Em 2011, havia 12.192 mil denúncias, em 2018, constava um aumento de quase sete vezes mais, chegando em 82.010 mil, e, já no primeiro semestre de 2019, até onde consta dados já chegava a 48.446 mil denúncias, sendo que diante das estatísticas, 65% dos agressores são os filhos e entre os tipos de violência estão: a violência física, violência sexual, violência psicológica e a negligência. Vale ratificar que, ainda têm os casos da cifra negra10 que não são denunciados.

Idosos institucionalizados e consequentemente abandonados em lugares monótonos por familiares, no lugar de cuidado encontram violência, sem nenhum tipo de convívio ou apoio familiar, são velhos desamparados e de futuros incertos, sem família, sem lar, sem um mínimo de dignidade. Nesses locais, tidos como monótonos, eles acabam morrendo ali mesmo no decorrer da sua última fase de vida, onde mais carecem de carinho, afeto, amor, convivência familiar e social. Tais situações acarretam um desequilíbrio emocional e psicológico, como resultados bastante negativos.

Diante da falta de convivência familiar, essencial e eficaz para a longevidade do idoso, verifica-se o tratamento desumano com alguém que já foi muito na vida. Portanto, será válida a inserção deste idoso em uma família substituta, que estará disposta a oferecer este direito de convivência familiar e comunitária, com qualidade e dignidade.

  1. A pessoa idosa dentro da legislação

Como já dito anteriormente não há atualmente legislação ou qualquer outro instrumento jurídico para regulamentar o cuidado com o idoso, através de políticas públicas voltadas para este objetivo. É preciso que sejam apresentadas soluções rápidas, pois os idosos que não detêm nenhuma estrutura econômica, tiveram suas vidas sofridas para constituírem as suas família, e agora se vêem abandonados, vivendo apenas da aposentadoria, benefício muitas vezes retido por algum familiar que faz o que acha pertinente, negligenciando os seus cuidados e deixando de prover suas necessidades básicas, como alimentação e saúde.

Com a atual conjuntura burocrática e social do Brasil, é preciso buscar uma flexibilização tendo em vista situações e questões simples, tal como um processo adotivo de uma criança que poderia ser resolvida de forma mais célere, vez que se arrasta por anos dentro do sistema de justiça.

A Constituição Federal de 1988 assegura seu no art. 5°, caput, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, bem como o art. 3° inciso IV, constituí como objetivo fundamental a promoção do bem de todos. Já o art. 229 dispõe sobre a obrigação dos filhos em ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, ao passo que o art. 230 ressalta que além da obrigação da família, o dever da sociedade e do Estado de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida, direitos dos idosos que pouco se faz efetivamente por eles.

O Estatuto do Idoso instituído em 1º de outubro de 2003 pela Lei Federal nº 10.741, regula os direitos das pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, e é composto de 118 artigos, que em sentido amplo estabelece a obrigação da família, comunidade, sociedade e do Poder Público em assegurar ao idoso, com integral prioridade, o cumprimento do direito à vida, saúde, alimentação, educação, cultura, ao esporte, lazer, trabalho, cidadania, liberdade, dignidade, respeito e à convivência familiar e comunitária.

Ressalta-se que a obrigação da família difere da obrigação do Estado, mesmo uma complementando a outra. A família é voltada em prover cuidados, como carinho, afeto, proteção e amor, enquanto o Estado tem o dever de oferecer um suporte necessário à família para que possa valer os seus direitos fundamentais e sociais, implementando serviços e programas para atender os idosos, garantindo-lhes em primeiro lugar o cumprimento de um dos mais importantes princípios constitucionais que é o da Dignidade da Pessoa Humana, que forma base para todos os direitos inerentes a ser humano.

    1. Projetos de lei acerca a adoção

Embora a possibilidade de colocação de idoso em família substituta por meio da adoção não seja regulamentada no Brasil, há atualmente projetos de leis abordando o assunto sob o estudo do governo e em trâmite na Câmara dos Deputados.

O primeiro, Projeto de Lei Federal nº 956/19 prevê a inserção do art. 119 ao Estatuto do Idoso, estabelecendo que a adoção deveria ser estimulada pelo Poder Público e obedeceria as regras referentes à adoção de maiores de 18 anos. Por isso, haveria a incidência do art. 1.619 do Código Civil, que prevê que “a adoção de maiores de 18 (dezoito) anos dependerá da assistência efetiva do poder público e de sentença constitutiva, aplicando-se no que couber, as regras gerais da Lei n° 8.069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente”.

O segundo Projeto de Lei é o de nº 5.532/2019, que pretende alterar o Estatuto do Idoso e inserir, entre as hipóteses de medida de proteção especial, a adoção de idosos nos casos de ausência ou abandono da família natural. Em seu texto, também há previsão no sentido de seguir o rito do Estatuto da Criança e do Adolescente, no que couber (art. 2°). Traz ainda no bojo de justificação do projeto a colocação de idosos em família substituta, seja em parentes próximos ou ainda pessoa sem qualquer vinculo familiar, mas que possa amar e cuidar do idoso adotado.

Ressalta também que a proteção do idoso tem assento constitucional, no entanto de forma escassa com baixa efetividade e que com o avançar da idade da população Brasileira e com o número cada vez mais crescente do abandono familiar, faz-se necessário ser criada uma medida de proteção para estes idosos. Oportuno dizer que tal projeto sendo aprovado para lei posteriormente, será nominado como Lei Dona Cotinha, caso emblemático de tentativa de adoção de idosos ocorrido no Brasil, publicado pelo site da BBC NEWS Brasil, que atua mundialmente como provedor de notícias em língua portuguesa e agências de notícias.

A Dona Cotinha atualmente com 68 anos de idade, quase não fala e se comunica na maioria das vezes por gestos. Foi abandonada e ganhou este apelido pelas freiras que a acolheram na década de 1960, no Hospital da Beneficência Portuguesa de Araraquara, no interior do Estado de São Paulo, quando foi vítima de um atropelamento ainda criança.

O Hospital da Beneficência Portuguesa que acolheu Dona Cotinha, que acumulava uma dívida de R$ 70.000.000,00 (setenta milhões) foi fechada, e a Dona Cotinha teve que ser encaminhada para um abrigo. A ex-funcionária do abrigo Gláucia ao visitá-la, se deparou com a idosa em um canto, chorando sem parar e repetindo que queria ir embora. Foi quando tomou a decisão de levá-la pra casa. Segundo a funcionária críticas não faltaram. Mas sabia apenas que estava cumprindo uma missão que Deus havia lhe confiado, ser a mãe da Dona Cotinha.

Os pais de Gláucia receberam Dona Cotinha de braços abertos. O marido também não fez objeção. Na casa alugada, Gláucia acomodou Cotinha no quarto da sua única filha Emily, que passou a dormir com a mãe. Seus passatempos favoritos são assistir à TV e brincar de boneca com a caçula.

Gláucia ganhou uma advogada como aliada em sua batalha para oficializar a adoção de Dona Cotinha. Aos poucos as duas começaram a regularizar a situação de Cotinha. Primeiro deram a ela uma nova certidão de nascimento, onde consta nome e sobrenome. Quanto à data de nascimento, a escolhida foi 12 de outubro, dia em que os funcionários do hospital comemoravam o aniversário de Dona Cotinha, tiraram sua carteira de identidade e conseguiram o Benefício de Prestação Continuada (BPC) de um salário mínimo mensal, concedido a pessoas com deficiência ou maiores de 65 anos e de baixa renda.

Gláucia embora tenha a curatela de Dona Cotinha, não se deu por satisfeita. Quer oficializar a adoção da Dona Cotinha. A advogada entrou com um pedido especial na Justiça e aguarda andamento do processo, pois, pelo artigo 1.619 do Código Civil de 2002 o adotante tem que a diferença mínima de 16 anos de idade a mais que o adotado.

Trata-se, portanto, de medida de extrema relevância e grande alcance social, como um dos direitos a ser assegurado como prioridade aos idosos, conforme justificação do Projeto de Lei n° 5.532/2019 de autoria do Deputado Federal Ossesio Silva.

O terceiro Projeto de Lei é o de nº 5.475/2019. Nele busca-se conceituar o termo família substituta, e igualmente trazer alguns requisitos procedimentais específicos para a adoção, como o estágio de convivência familiar, tópico a qual já foi abordado em tópico anterior de forma precisa.

A justificativa do projeto é pautada no envelhecimento populacional conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), bem como o dever legal dos filhos amparar os seus pais na velhice, defendendo e garantindo seus direitos de cunho fundamental a vida digna.

O quarto Projeto de Lei é o de nº 105/2020, foi proposto na Câmara dos Deputados por Pedro Lucas Fernandes Deputado Federal, prevendo a criação do instituto da “senexão”, de acordo com a justificação inserida no referido projeto de lei é palavra formada da raiz latina “senex”, que corresponde a idoso e do sufixo “ão” que designa pertencimento, como em aldeia/aldeão, cidade/cidadão.

A senexão por sua vez pretende ser agregada junto ao Estatuto do Idoso como sendo um novo instituto do direito das famílias. Conforme disposições do Projeto Lei n° 105/2020, o possível almejado instituto, é apensado à terminologia que já é conhecida tradicionalmente como adoção dos idosos, mas que no momento inexiste lei específica que regularize. Pensando nessa nomenclatura e nos projetos que já estão em pauta sobre a possível colocação de idosos em família substituta, foi criado esse novo projeto de lei de autoria do Deputado Federal Pedro Lucas Fernandes, Projeto de Lei n° 105/2020, que consistiria, em um ato irrevogável com direitos e obrigações de ambos partes, com registro no cartório de pessoas naturais em livro próprio. No caso dos abrangidos a pessoa receptora seria senectora, enquanto o idoso seria o denominado de senectado.

A presidente da Comissão da Adoção e do Idoso do Instituto Brasileiro de Direito de Família seção Espírito Santo – IBDFAM/ES e autora do artigo, “Senexão: um novo instituto de direito das famílias?”, Patricia Novais Calmon afirma em redação que a senexão:

Consistiria, pois, em mais uma medida protetiva específica do Estatuto do Idoso (art. 45). Consequentemente, seria cabível em casos onde se verificasse ameaça ou violação aos direitos do idoso, estando este em situação de risco social, por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, por falta, omissão ou abuso da família, curador ou entidade de atendimento, ou, por fim, em razão de sua condição pessoal (art. 43, I, II e III, EI), tendo por finalidade a tutela de direitos de idosos em situação de vulnerabilidade ou abandono, que estivessem inseridos em instituições de longa permanência (ILPI) ou desamparados, através de sua colocação em uma família substituta, visando lhes proporcionar amparo e estabilidade em suas relações socioafetivas. (CALMON, 2020)

O projeto exige que a decisão seja concedida judicialmente, de forma preferencial sendo um processo mais célere possível. Reforçando sempre que tanto o senectado como para o senector, será lhes atribuído direitos e obrigações, entenda quais são:

Art.55 D. São obrigações do senector:

  1. – a mantença do senectado como pessoa da família, provendo todas as suas necessidades materiais e afetivas;

  2. – fornecer ao senectado ambiente familiar de acolhimento e segurança, tratando-o como parente;

  3. – cuidar de todas as necessidades de saúde do senectado;

  4. – fornecer ao senectado um ambiente propício a sua idade, estimulando atividades compatíveis com sua capacidade, a fim de integrá-lo socialmente, estimular sua autonomia e desenvolvimento de aprendizado, se assim desejar, e fornecerlhe ambiente de tranquilidade e segurança.

Art. 55 E. São direitos do senector:

I – inscrever o senectado como dependente para fins tributários;

II– inscrever o senectado em planos de saúde, assistência, seguros ou previdência pública ou privada;

III – ser declarado herdeiro do senectado apenas no caso de herança vacante, tendo preferência na ordem sucessória sobre o estado.

Art. 55 F. São direitos do senectado:

  1. - ser recebido voluntariamente como membro da família do senector, na qualidade de parente sócio afetivo, recebendo todo amparo devido a pessoa da família;

  2. - viver em ambiente propiciado pelo senector em que possa realizar as atividades de que seja capaz e tenha desejo, a fim de manter sua realização plena como pessoa humana;

  3. - receber do senector e sua família todo amparo material e afetivo necessário, inclusive sendo estimulado à autonomia, enquanto possível, e recebendo cuidados adequados quando não. (PL nº 105/2020)

Por sua vez, se o senector vier a falecer antes do senectado, todos os direitos e obrigações passam aos herdeiros do senector, caso haja multiplicidade de herdeiros, é necessário que um assuma a posição de senector, mas caso venha acontecer ao inverso os diretos sucessórios do senectado, não serão transmitidos para o senector, onde sobrevirá a formação de laços socioafetivos entre os envolvidos, o que difere da inclusão de pessoa idosa em família substituta por meio da adoção, a qual existirá formação de vínculos de filiação.

Não há como saber se tais projetos de adoção serão convertidos em lei e tão pouco se aprovados serão aceitos pela sociedade, pois existem desafios a serem enfrentados, mas de maneira louvável já é um grande passo possível para a implementação no ordenameto jurídico brasileiro.

o PL n° 5.532/2019 está em um caminho mais célere, tendo em vista o existente art. 37 do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03), que traz no texto dispositivos legais sobre a possibilidade de o idoso ser colocado em família substituta. Certo é que o acolhimento do idoso em família substituta irá salvaguardar seus direitos e necessidades, recebendo em sua última fase de vida, um lar, respeito, carinho, afeto e o amor, como principal base estrutural de todo e qualquer relacionamento.

5 - Considerações finais

Ao longo de todo o artigo demonstrou-se que a colocação de idoso em família substituta seria uma medida protetiva para estes, uma vez que se encontram em extremo grau de vulnerabilidade por abandono familiar, e institucional, em um momento importante da sua vida.

O crescente cenário de envelhecimento da sociedade, a inexistência da previsão legal de adoção de idosos, bem como o alto índice de abandono familiar e a crescente ocupação em asilos, exige do Estado cada vez mais a implementação de políticas públicas e meios adequados para efetivação e fruição de direitos como prevê o Estatuto do Idoso e a Constituição Federal para com a pessoa idosa, garantindo-lhes o direito fundamental a que faz jus como convivência familiar e comunitária.

Atualmente, não há previsão legal que possa incluir a pessoa idosa em uma família substituta para oferecer e demonstrar a importância de um lar e de uma família pautada no amor e no afeto. Idosos são abandonados pelos familiares, restando apenas a opção de ser institucionalizado e conviver com pessoas que não conhecem e nem possui nenhum laço de afinidade. Foram destacados os projetos de lei em trâmite que visam regulamentar a adoção de idosos, onde o afeto está cada dia mais inalteradamente ligado com a formação de laços familiares.

Assim, família substituta para acolhimento dos idosos nos termos aqui propostos, seria aquela resultante da inclusão da pessoa em outro núcleo, que não a formada por seus familiares consanguíneos, outra “origem”, sendo por institutos já existentes, como apadrinhamento, curatela, adoção como proposto, ou mesmo por outra nomenclatura para tal instituto. O importante é proteger os idosos, com a criação de políticas governamentais públicas, para garantir a eles um envelhecimento saudável, ativo, tranquilo e com dignidade.

Este estudo teve por objetivo refletir sobre a possibilidade de colocação desses idosos em outra família, que não a formada por seus familiares consanguíneos, inserindo em uma família substituta, que estaria disposta a oferecer o direito de convivência familiar e comunitária, prover cuidados como carinho, afeto, proteção e amor com qualidade e dignidade. Obviamente não será fácil, mas é preciso sonhar, buscar quebrar paradigmas, para encontrar soluções, observando sempre o princípio do melhor interesse do idoso, garantindo-lhe direitos constitucionais e a convivência familiar.

Referências

Autoria individual

BRAGA, Pérola Melissa Viana. Curso de Direito do Idoso. 1.ed. Atlas, 2011.

CALDERÓN, Ricardo. Princípio da Afetividade no Direito de Família. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

DIAS, Maria Berenice. Manual de direitos das famílias. 12. Ed. rev., atual. E ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil 3. 5.ed. Saraiva, jan./2018. LÔBO, Paulo. Direito Civil 5: Famílias. 9.ed. Saraiva, 2019.

MADALENO, Rolf. Manual de Direito de Família. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Direito de Família – vol.V/ - 28.ed. Rio de Janeiro, Forense, 2020.

_________. Rodrigo da Cunha. Direito das Famílias. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 10.ed: Rio de Janeiro, 2019.

RAMOS, Paulo Roberto Barbosa. Curso de Direito do Idoso. 1.ed. Saraiva, 2014.

TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito de Família - vol.5. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

Artigo científico de periódico

CALMON, Patricia Novais. A colocação de Idosos em família substituta por meio da adoção: uma possibilidade? Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões. v.37(jan/fev) – Belo Horizonte: IBDFAM, 2020.

CALMON, Patricia Novais. Senexão: um novo instituto de direito das famílias? Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões.: IBDFAM, 2020

BRONZATTII, Carla Cargnelutti; LOUZADA, Marcelle Cardoso. O direito à convivência familiar e comunitária do Idoso: como fica o Idoso abandonado?: Fadisma Entrementes, 12. Ed, 2015.

SOUSA, Jennifer Karolynne Costa de; SOARES, Jardel de Freitas. O crime de maus-tratos aos idosos sob a ótica das relações familiares. Revista Brasileira de Gestão Ambiental, Pombal, PB, abr./jun. 2019.

Material on line (eletrônico)

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Lei

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm. Acesso em: 14 nov. 2020.

_________. (Constituição 1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 14 nov. 2020.

_________. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 14 nov. 2020.

_________. Lei n° 10.741, de 01 de outubro 2003. Estatuto do Idoso. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm. Acesso em: 14 nov. 2020.

__________. Projeto de Lei n° 105, de 2020. Estabelece a senexão como o ato de colocar pessoa idosa em família substituta. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=223655 Acesso em: 14 nov. 2020.

__________. Projeto de Lei n° 956, de 2019. Altera o Estatuto do Idoso, aprovado pela Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003, para inserir os incisos I,II,III, IV e V ao Art. 52A no capitulo II, do Título IV e o Art. 119, ao Título VIII. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=219256 Acesso em: 14 nov. 2020.

_________. Projeto de Lei n° 547, de 2019. Altera a Lei nº 10.741, de 1º outubro de 2003 (Estatuto do idoso), e a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e adolescente), para prever a possibilidade de adoção de idosos, e dá outras providencias. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2224737. Acesso em: 14 nov. 2020.

__________. Projeto de Lei n° 5532, de 2019. Altera a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, que "Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências", para inserir no ordenamento jurídico brasileiro a adoção de idosos. (Lei Dona Cotinha). Disponível em:https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2225387. Acesso em: 14 nov. 2020.

3 No Brasil, o Estatuto do Idoso (Lei Federal nº 10.741 de 1 de Outubro de 2003) é um estatuto no qual são estabelecidos os direitos dos idosos e são previstas punições a quem os violarem, dando aos idosos uma maior qualidade de vida. Por essa lei em vigor os filhos maiores de 18 anos são responsáveis pelo bem estar e saúde dos pais idosos. Por essa lei, em vigor no Brasil, é considerado idoso as pessoas a partir dos 60 anos de idade e impõe as penalidades a quem infringir a lei.

4 Fabrício Carpinejar é um poeta, cronista, jornalista, professor universitário e apresentador brasileiro. É considerado um dos principais nomes da poesia contemporânea. Carpinejar, como ele próprio assina, nasceu em Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, no dia 23 de outubro de 1972. Filho dos poetas Carlos Nejar e Maria Carpi, mudou-se para Porto Alegre onde cursou Jornalismo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, se graduando em 1995. No primeiro ano da faculdade publicou seu primeiro poema na revista da Faculdade de Comunicação. Carpinejar ganhou destaque por suas obras literárias e também por seus vários blogs onde publica muitos de seus textos e escreve sobre outros assuntos pertinentes, como futebol. É também muito requisitado para participar de eventos e dar palestras. Atualmente com mais de 20 livros publicados, ele faz parte do programa Encontro com Fátima Bernardes, da Rede Globo. www.ebiografia.com/fabricio_carpinejar: Acesso em:26 nov. 2020.

5 “A convivência comunitária promove o bem estar, a alegria e a qualidade de vida na terceira idade. Incentivar os idosos a participar ativamente da sociedade, seja em grupos de convivência, voluntários em trabalhos de cunho social, cursos e demais encontros sociais é o caminho para garantir uma velhice realmente saudável.” Disponível em: https://silo.tips/download/percepao-sobre-convivencia-familiar-e-comunitaria-da-populaao-idosa#. Acesso em: 27 nov. 2020.
 

6Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD, de periodicidade anual, foi encerrada em 2016, com a divulgação das informações referentes a 2015. Planejada para produzir resultados para Brasil, Grandes Regiões, Unidades da Federação e nove Regiões Metropolitanas (Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre), ela pesquisava, de forma permanente, características gerais da população, educação, trabalho, rendimento e habitação, e, com periodicidade variável, outros temas, de acordo com as necessidades de informação para o País, tendo como unidade de investigação o domicílio. A PNAD foi substituída, com m tdologia atualizada, pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - PNAD Contínua,  que propicia uma cobertura territorial mais abrangente e disponibiliza informações conjunturais trimestrais sobre a força de trabalho em âmbito nacional.  

A PNAD foi iniciada no segundo trimestre de 1967, sendo os seus resultados apresentados com periodicidade trimestral até o primeiro trimestre de 1970. A partir de 1971, os levantamentos passaram a ser anuais, com realização no último trimestre, sendo interrompidos nos anos de realização dos Censos Demográficos. Em 1974-1975, foi levada a efeito uma pesquisa especial, denominada Estudo Nacional da Despesa Familiar - ENDEF e, durante a sua realização, o levantamento básico da PNAD foi interrompido. Em 1994, por razões excepcionais, a pesquisa não foi realizada. Ao longo do tempo, a PNAD passou por atualizações metodológicas, algumas restritas ao plano amostral, e outras relacionadas à abrangência e às conceituações dos aspectos pesquisados, em consonância com as recomendações internacionais. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/educacao/9127-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios.html?=&t=o-que-e. Acesso em 27 nov. 2020.

7 “As Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) são um local destinado à moradia, permanente ou temporária, para pessoas com 60 anos ou mais. Segundo definição da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Anvisa, são instituições governamentais ou não-governamentais, de caráter residencial, destinadas a domicílio coletivo de idosos com ou sem suporte familiar, em condição de liberdade, dignidade e cidadania. Criadas em 2003 por sugestão da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia para substituir o papel dos asilos na rede de assistência social ao idoso.” https://institutomongeralaegon.org/longevidade-e-saude/voce-sabe-diferenca-de-um-asilo-para-uma-ilpi-tire-aqui-suas-duvidas. Acesso em:26 nov. 2020.

8 A Convenção Interamericana dos Direitos Humanos dos Idosos, de 9 de junho de 2015, assim conceitua o termo: “Abandono: A falta de ação, deliberada ou não, para atender de maneira integral as necessidades de um idoso, que ponha em risco sua vida ou sua integridade física, psíquica ou moral”.

9 A Convenção Interamericana dos Direitos Humanos dos Idosos, de 9 de junho de 2015, assim conceitua o termo: “Negligência: Erro involuntário ou ação não deliberada, incluindo, entre outros, o descuido, omissão, desamparo e desproteção, que causa dano ou sofrimento a um idoso, tanto no âmbito público como privado, quando não foram tomadas as precauções normais necessárias em conformidade com as circunstâncias.”

10 “A partir disso surgem outras problemáticas, tais como as subnotificações dos casos de violência –

sendo a porcentagem não denunciada chamada de cifra negra, assim refletindo distorções nas estatísticas, dificultando a detecção e a compreensão da casuística, além de prejudicar a devida reprimenda.”(SOUSA, Jennifer Karolynne Costa de; SOARES, Jardel de Freitas. O crime de maus-tratos aos idosos sob a ótica das relações familiares. Revista Brasileira de Gestão Ambiental, Pombal, PB, abr./jun. 2019)”

Sobre as autoras
Maira Ramos Pereira

Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Doctum de Teófilo Otoni-MG, 2020.2.

Paula Barreiros

Professora do Centro Universitário Doctum de Teófilo Otoni-MG, Advogada, Pós-Graduada em Direito Civil, Processo Civil, Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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