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Intolerância religiosa e liberdade de expressão: os limites do discurso proselitista

01/06/2021 às 18:16
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A pluralidade de ideias é um aspecto intrínseco às sociedades diversificadas e o presente artigo possui como propósito demonstrar de que maneira restrições a tais liberdades quando se demonstram como ofensivas a outras crenças.

RESUMO: O proselitismo é constitucionalmente protegido como vertente das liberdades de expressão e de crença. Expor o pensamento religioso é uma característica do Estado Democrático de Direito amparado pela igualdade e liberdade. No entanto, o fato de se tratar de uma garantia fundamental não significa ser dotado de caráter absoluto. Algumas limitações surgem quando os limites dos direitos são extrapolados e invadem o campo da moral, da ética, do respeito. Discriminar crenças diferentes das próprias é uma forma de professar o ódio e o preconceito e o Estado deve intervir como garantidos de convivência interconfessional pacífica. A pluralidade de ideias é um aspecto intrínseco às sociedades diversificadas e o presente artigo possui como propósito demonstrar de que maneira restrições a tais liberdades quando se demonstram como ofensivas a outras crenças são essenciais para consecução de um único fim: a tolerância religiosa. Serviram como base, doutrinas mais modernas e preceitos de direitos humanos, bem como, julgamentos recentes essenciais para clarificação do tema da liberdade de expressão religiosa.

Palavras Chave: Liberdade de Expressão. Liberdade Religiosa. Proselitismo. Intolerância.


INTRODUÇÃO

Através da liberdade de expressão, diversas vertentes do “ser livre” surgem com o propósito de proporcionar ao indivíduo maior amplitude do conceito de liberdade e na sua aplicação no dia a dia. Cada ser humano tem o direito de defender suas próprias convicções, exatamente por isso, debater acerca da tolerância é fundamental. O pluralismo de ideias a pensamentos atrelado a ética necessária para a convivência em meio as diferenças se traduz em muitas culturas que merecem respeito e não podem suportar intolerâncias.

A singularidade do direito à liberdade define um posicionamento do Estado configurado pela neutralidade e independência diante da variedade de religiões e concepções filosóficas, concedendo ao cidadão vasta autonomia na adoção de valores religiosos diversos (MASSON, 2020, p.325). A liberdade religiosa, por exemplo, se configura por meio de dois aspectos: convivência de crenças diferentes e a marginalização daquelas crenças dotadas de particularidades, ou seja, religiões que não eram “comuns” diante de um Estado com raízes predominantemente católicas. Isso se dá devido ao fato de, num dado período histórico, alguns pensamentos serem frutos de consensos pelos detentores de poder como verdades evidentes em si mesmas (BOBBIO, 1992, p.20).

O que realmente se mostra como problema diante da variedade de crenças, é a ideia de que cada uma carrega verdades irrefutáveis. No momento em que pensamentos colidem, surgem disputas por meio do discurso e, não raras vezes, por intermédio de lutas que se desdobram em verdadeiras batalhas em torno da fé (não em seu sentido subjetivo). A ruptura do ordenamento jurídico pátrio com o cristianismo (BOBBIO, 1992, p.21), apesar de necessária, deu ensejo a muitos discursos amparados na revolta e na discordância a respeito: fica rejeitado o pensamento de um Estado confessional.

A convicção de “possuir a verdade” é a raiz de muitas situações concretas onde a intolerância precisa ser reparada através da justiça. Então, preconceito e discriminação se colocam diante da liberdade religiosa e de expressão e nos limites que tais liberdades devem possuir dentro da reserva do possível. O Estado deve atuar como garantidor de condições de igualdade na liberdade de expressão e de religião. Essas liberdades se aproximam na medida em que a primeira pressupõe a segunda (MASSON, 2020, p.333). A liberdade de crença presume a “liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças, individual ou coletivamente, tanto em público como em privado”[1].

O desconhecimento sobre outras religiões e o preconceito que surge exatamente sobre aquilo que se desconhece, a convicção de superioridade que desencadeia a inferiorização do outro por aquilo que ele acredita é o pano de fundo desse artigo para elucidação do tema. De que modo o Estado dever intervir positivamente no aspecto da convivência entre as diferentes formas de pensamento? A ignorância e a crença exclusiva devem ser, gradativamente, abolidas pelo Poder Público por meio de políticas públicas que ensinem, informem, orientem sobre o quão nocivo é o desrespeito à liberdade.

LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DISCURSO RELIGIOSO

Limitar a liberdade de expressão ainda é um assunto bastante controverso e dotado de especificidades que dificultam o papel dos doutrinadores na interpretação constitucional a luz dos problemas atuais relativos a tolerância entre os indivíduos. Se a liberdade de expressão, como direito fundamental e parte da ordem democrática e do pluralismo, é assegurada a todos, quais os limites quando tal liberdade invade a esfera do respeito e da tolerância? Identificar em quais ocorrências o exercício da liberdade de expressão se traduz em violação a liberdade alheia, essencialmente, nos casos onde o discurso religioso se afigura como violador principal. É necessário modificar a aplicação do direito estabelecendo limites aos direitos fundamentais de acordo com o fato de que não há direito absoluto, ou seja, imune a qualquer meio de restrição (SARLET, 2008, p. 30).

Essas restrições estão dispostas na legislação infraconstitucional e o exemplo mais evidente é o do Código Penal que possui um capítulo expresso sobre “Os crimes contra o sentimento religioso” e tipifica a conduta no art.208: “Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”. [2] Como instrui Mirabete (2005, p. 404) o que se protege é “ o sentimento religioso, interesse ético-social em si mesmo, bem como a liberdade de culto. Embora sejam admissíveis os debates, críticas ou polêmicas a respeito das religiões em seus aspectos teológicos, científicos, jurídicos, sociais ou filosóficos, não se permitem os extremos de zombarias, ultrajes ou vilipêndios aos crentes ou coisas religiosas”. Não são raras as vezes que os Tribunais Superiores se deparam com casos em que o discurso religioso afeta diretamente a moral e o pensamento de determinada pessoa (ou classe de pessoas) e precisam decidir de acordo com a razoabilidade e a proporcionalidade entre preceitos constitucionais basilares e adequação ao Código Penal.

No Recurso Ordinário em Habeas Corpus de n° 146.303 a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal considerou a publicação de vídeos em redes sociais feitas por um pastor como discurso religioso discriminatório, pois, o mesmo tentou desmerecer ou aniquilar outras religiões e ofendeu os seguidores das mesmas (MASSON, 2020, p.334). O Supremo compreendeu a distinção entre discurso religioso e discurso que atente contra a crença alheia, rebaixando-a. O exercício da liberdade de crença foi exercido atacando a mesma liberdade. Há uma contradição quando, na esfera social, pessoas exercem direitos atacando os direitos alheios. Trata-se de uma espécie de via de “mão única” ao invés da “mão dupla” necessária para a harmonia entre direitos iguais de pessoas diferentes.

O pluralismo do Estado Democrático Brasileiro promove a não propagação de discursos generalizantes, universalizantes. Existe, dentro da liberdade de expressão, o direito à crítica, inclusive nos espaços relacionados a religião. Ou seja, o indivíduo pode se expressar no seio da sua crença, mas deve se atentar aos excessos (desrespeito ou ódio). A disseminação de pensamentos que discriminam (segregam), não pode ser uma realidade na ordem jurídica pátria. “Pode-se muito, mas não se pode tudo”. É complicado fazer a distinção entre discursos legítimos e passíveis de aceitação e aqueles que estão abarcados pelo ódio e pelo desrespeito. O papel do julgador, neste ponto, é essencial. Ele será mediador daquilo que pode, ou não, se fazer no âmbito da liberdade de expressão e da liberdade de religião.

Existindo a dignidade e outros preceitos como limitantes da liberdade de religião e de expressão, é importante destacar que tais limites não podem atingir o núcleo essencial desses direitos objetos de restrições (SARLET, 2008, p.107). Ofender um direito fundamental em sua totalidade, inclusive o núcleo, significa ofender a Constituição e isso, claro, estaria dotado de ilegalidade; a dignidade da pessoa humana assume o papel de balança no Direito Brasileiro, pesando e equilibrando os direitos fundamentais. Por tal razão, em casos concretos, deve-se haver uma ponderação entre o direito fundamental propriamente dito e as restrições impostas de acordo com a dignidade.

LIBERDADE DE CRENÇA

O sentido de igualdade nas democracias liberais é algo institucionalizado como atribuição de direitos e deveres de maneira igual a todos. A autonomia individual desencadeia certa abstenção de imposições moralmente parciais sobre as decisões fundamentais da existência humana (DWORKIN, 2011, p. 30). O pensamento religioso é algo tão subjetivo de cada ser humano, até mesmo para a total descrença, que desrespeitar tal particularidade se traduz em um desrespeito a própria liberdade e a dignidade (SILVA, 2013, p.116). A liberdade de crença é o ideal de cada ser humano poderá crer no que lhe convém. Além da liberdade de se expressar, existe a liberdade para acreditar (ou não) em alguma religião.

A dimensão da liberdade de crença é dotada de certa margem de alcance, isso porque, o indivíduo possui total liberdade para crer em tudo, ou em nada. Para professar a sua crença ou o seu agnosticismo, no entanto, não pode ferir essa mesma liberdade quando a enxerga no próximo. Ou seja, deve-se respeitar a liberdade de crença alheia, mesmo pregando a própria liberdade sobre algo diametralmente oposto. Não há como definir o que é sagrado ou digno de devoção para todos. O cidadão é apto a decidir sobre aquilo a que atribuirá sacralidade (DWORKIN, 2006, p. 56). A racionalidade deve ser algo adstrito a convivência humana e ao operador do direito no momento de regulamentar tal convivência. A individualidade de cada um está intimamente ligada ao conceito de ser “livre e igual”. A Constituição de 1988 adotou expressa neutralização estatal nas questões atinentes à liberdade religiosa e materializou o Estado como laico ao garantir a inviolabilidade de crença e assegurar o livre exercício de cultos e a proteção aos locais onde eles são realizados (MASSON, 2020, p.326).

A autonomia quando a consciência proporciona certa proteção ao indivíduo contra interferências de ordem moral, religiosa, filosófica e política. A pessoa pode crer em revelações propostas por alguma religião (teísmo), ou acreditar na existência de um Deus e rejeitar revelações (deísmo) ou não crer em Deus algum (ateísmo) e isso deve ser extremamente respeitado por todos (NOVELINO, 2014, p. 507). Tal liberdade, diga-se de passagem, não compreende a liberdade, como instrui José Afonso da Silva[3] de “embaraçar o livre exercício de qualquer religião, de qualquer crença, pois também a liberdade de alguém vai até onde não prejudique a liberdade dos outros”. Afastando-se de ações desarrazoadas, aproxima-se de um sistema justo de integração dos cidadãos marcado pela justiça social.

Existem princípios que regem as convicções religiosas que, na mentalidade de muitos, se sobressaem em relação aos princípios do direito que norteiam o meio social. Há uma razão moral e teleológica a que os doutrinadores ou julgadores devem se atentar na resolução de situações concretas delicadas relativas a liberdade de crença. Preceitos constitucionais devem ser inclusivos assegurando direitos iguais a todos e separando crenças religiosas de legislações e decisões. A autonomia do indivíduo vai da sua crença até a exteriorização daquilo que acredita, ou seja, não se esgota na mera escolha. Há um arcabouço de detalhes que se entrelaçam com tal modalidade de liberdade. A laicidade não significa inimizade com a forma de expressar a fé, o interesse público deve se preocupar e zelar pelas confissões religiosas (MENDES, 2009, p. 462).

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PROSELITISMO RELIGIOSO E INCITAÇÃO À INTOLERÂNCIA NA INTERNET

É de conhecimento geral que a forma mais singular de edificar o discurso religioso é pelo convertimento de uma pessoa aos dogmas da sua religião, em poucas palavras, o proselitismo[4]. A forma de persuasão empregada pelas religiões foi tida como legitima pelo Supremo Tribunal Federal, pois, segundo a Corte, inclusive, está compreendida na liberdade religiosa, dentre outras coisas, a permissão para fazer uso de meios de comunicação para propagar a própria religião.[5] É de extrema importância que não haja confusão entre a realização de tal direito e atos discriminatórios que transmitam ódio e intolerância. O discurso de cunho religioso (que seja sinônimo de incitação odiosa e intolerante) que extrapole a mera discordância publica ideológica em razão das demais religiões viola absurdamente o próprio direito à liberdade de crença e pode configurar-se como crime (MASSON, 2020, p.333). Importante trecho da obra de Rodrigo Francisco de Paula (DE PAULA, 2009, p. 12) mostra-se adequado para compreensão sobre o discurso de ódio em ligação com a liberdade de expressão:

É nesse sentido que assume relevo a análise do discurso de ódio, que, como visto, traduz-se na incitação e no induzimento à discriminação ou ao preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, à base de uma ação violenta. Ora, a imprescindibilidade da liberdade de expressão, na perspectiva do uso público da razão, é manifesta. Mas, no momento em que seu conteúdo traz o discurso de ódio, introduz-se na esfera pública a violência, radicada na disseminação do ódio contra as minorias (raciais, étnicas, religiosas etc.) e do medo infligido a quem é vítima de tal manifestação do pensamento de sofrer uma agressão gratuita, corrompendo-se o aspecto comunicativo do poder. Não se deve confundir, por evidente, o discurso de ódio com o discurso de crítica. Odiar, no discurso, significa coagir mediante o emprego da violência radicada na disseminação do ódio e do medo da agressão gratuita, ao passo que discordar exprime a pretensão de se fazer valer o próprio argumento no debate público, o que é inerente à própria teoria do discurso.

Expressões de conteúdo imoral que atingem diretamente aquilo que alguém acredita não podem ser protegidas por uma liberdade fundamental. O que se pode entender disso é que declarações concretas que incitem ao ódio religioso não serão, em hipótese nenhuma, abarcadas pelo binômio liberdade de expressão e liberdade de crença. Quando declarações são feitas por líderes políticos ou religiosos, a temática ganha maiores proporções e desencadeia certa comoção social. De um lado, os Cristãos que se amparam na crença “majoritária” e do outro, pessoas que cultuam religiões discriminadas há séculos e marginalizadas na esfera social.

Os delitos e as formas de discriminação já reconhecidos pelo ordenamento ganharam novo delineado, em razão de um novo modo operandi: a internet. A discussão se concentra neste ponto, nunca a intolerância foi tão discutida, as redes sociais são meios para divulgação de informações e, até mesmo, denúncias. Ao passo que a internet possibilita a identificação de infratores de maneira mais rápida, também incita o ódio em determinados discursos na mesma velocidade. O diálogo é importante para proporcionar união, mas, muitas vezes, difunde ainda mais os discursos de ódio e segregação.

Gilmar Mendes (2014, p. 293) instrui que:

O reconhecimento da liberdade religiosa decerto que contribui para prevenir tensões sociais, na medida em que, por ela, o pluralismo se instala e se neutralizam rancores e desavenças decorrentes do veto oficial a crenças quaisquer.

Apesar de brilhantemente discorrer sobre o tema, sabe-se que, na realidade, não é em acordo que as religiões convivem. Há uma eterna disputa pautada na fé e na crença que foi levada, inclusive, para as mesas das Casas Legislativas. Hoje, nota-se a presença de verdadeiras bancadas Cristãs que demonstram que o “Estado Laico e não confessional” não é bem algo concreto no cotidiano do cidadão brasileiro. As pretensões políticas, morais e religiosas devem se dar de acordo com o reconhecimento de “cidadãos livres e iguais”. Mesmo com discordâncias previstas e conflitos, deve-se, na medida do possível, o Estado, realizar ações que fomentem a paz social e o respeito entre os devotos das mais diversas religiões existentes.

O multiculturalismo brasileiro se traduz em infinitas possibilidades de manifestações de pensamento, não se pode desprezar o tamanho do território brasileiro e o modo como aqui se deu a colonização. Harmonizar diferentes pensamentos por intermédio dos princípios constitucionais, é sempre uma boa maneira de levar a tolerância as situações diversas do dia a dia jurídico. Vale dizer que tal harmonização não significa submeter as pessoas a pensamentos que elas não compactuam, mas sim, fazê-las compreender que a convivência traçada pelo respeito se torna muito mais fácil e prática.

Quando políticas públicas são empregadas pensando no proselitismo como algo natural, na igualdade como preceito máximo, na liberdade como essencial e na tolerância propagada por meio de uma educação efetiva, torna-se mais fácil aplicar certas medidas no espaço virtual de comunicações. Aquele que tolera, não determina imposições na liberdade do outro em falar ou agir da maneira que escolher, por mais que não concorde, haverá o respeito (PIRES, 2013, p. 3). O discurso de ódio precisa ser quebrado por meio de ações que transformem, gradativamente, o pensamento dos cidadãos. Como mostra João Cavalcante Filho (2017, p.36):

O discurso do ódio (hate speech) pode ser definido, de forma ampla, como a expressão cujo conteúdo ofende a honra ou a imagem de grupos sociais, especialmente minorias, ou prega a discriminação contra os integrantes desses grupos.

Ou seja, qualquer manifestação, por qualquer meio de comunicação considerada como discriminatória e brutal que pode desencadear atitudes violentas ou falas de ódio constitui hate speech. Com a velocidade nas comunicações, percebe-se uma crescente difusão desses discursos. O Estado não pode fechar os olhos diante das situações de intolerância presentes nas redes sociais, assim como, os operadores de tais redes devem se atentar a exclusão de páginas que demonstrem qualquer tipo de ato discriminatório. A divulgação de crenças de acordo com o proselitismo não pode, em nenhuma hipótese, representar o ódio por religiões e crenças diferentes das próprias.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Além do que está disposto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional, o direito à liberdade de crença também se dá no foro íntimo do indivíduo. A ampla liberdade de expressão caracteriza-se pela possibilidade de discorrer sobre qualquer assunto e acreditar em qualquer crença de modo confessional, ou até mesmo, não crer em absolutamente nada. A crença ou a descrença merecem a proteção do Estado, desde que não haja invasão na esfera da liberdade alheia.

Condutas inaceitáveis como o discurso de ódio e a incitação a intolerância devem ser analisadas a luz da dignidade humana e da proteção a liberdade do sujeito de direito. Isso deve se dar, também, no âmbito virtual por meio de legislação especifica nesse sentido, não apenas por entendimento jurisprudencial. Quando políticas públicas são dispostas por meio de lei, há uma certa tendência ao respeito, ao receio de sanções determinadas relativas a difusão de hate speech nas redes sociais.

O que se nota é que a internet se transformou em um espaço onde, além da informação, são praticadas condutas ilícitas de maneira incontrolável que afetam a intimidade e a vida digna das pessoas. Ofensas distribuídas de forma indiscriminada demonstram a necessidade de controle por parte do Estado. Não são raras as vezes em que atitudes desumanas e atentatórias a liberdade de crença ocorrem no mundo virtual. Os Tribunais caminham para entendimento pacífico a respeito das restrições as ofensas e ao discurso carregado de ódio disseminado na internet e isso é, verdadeiramente, um grande avanço, mas não diminui a necessidade de lei especial que trate de questões atinentes a liberdade de expressão nos meios de comunicação, que não se confunda, como meio de censura, mas como forma de quebrar o mito de que “internet é terra sem lei”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

DE PAULA, Rodrigo Francisco. Liberdade de expressão e discurso de ódio. Notas para a proscriação da violência no discurso de ódio no espaço público, a partir de Hanna Arendt e Jurgen Habermas. In. Constituição e Processo. A resposta do constitucionalismo à banalização do Terror. Belo Horizonte: Del Rey, 2009.

DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Editora Wmf Martins Fontes, 2011

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 462

MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. v. 3, 23 ed. São Paulo: Editora Atlas, 2005, p. 404

RHC 146.303/RJ, rel. Min. Edson Fachin, red.p/ o ac. Min. Dias Toffoli, julgado em 6/3/2018 e noticiado no Informativo 893.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2008, os. 30-107.

SILVA NETO, Manoel Jorge e. Proteção constitucional à liberdade religiosa. São Paulo: Saraiva, 2013, ps. 116-158.

PIRES, Carlos. O que é tolerância? in: Dúvida metódica. abr. 2013 Disponível em: https://duvidametodica.blogspot.com.br/2013/04/o-que-e-tolerancia.html


[1] Artigo 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos “Liberdade de consciência e de religião 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de consciência e de religião. Esse direito implica a liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças, bem como a liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças, individual ou coletivamente, tanto em público como em privado”.

[2] Código Penal: Decreto lei nº 2.848 de 07 de dezembro de 1940.

[3] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 33ª ed. Malheiros, 2009, p. 249

[4] “No que toca especificamente à liberdade de expressão religiosa, cumpre reconhecer, nas hipóteses de religiões que se alçam a universais, que o discurso proselitista é da essência de seu integral exercício...” (RHC 134682, Rel. Min. Edson Fachin, Primeira Turma, julgado em 29/11/2016 e noticiada no informativo 849)

[5] ADI 2566, rel. p/ o ac. Min. Edson Fachin, julgada em 16/5/2018 e noticiada no Informativo 902.


RELIGIOUS INTOLERANCE AND FREEDOM OF EXPRESSION: THE LIMITS OF PROSELITIST DISCOURSE

ABSTRACT: Proselytism is constitutionally protected as part of the freedoms of expression and belief. Exposing religious thought is a characteristic of the Democratic Rule of Law supported by equality and freedom. However, the fact that this is a fundamental guarantee does not mean that it has absolute character. Some limitations arise when the limits of rights are extrapolated and invade the field of morals, ethics, respect. Discriminating beliefs different from one's own is a way of professing hatred and prejudice and the State must intervene as guarantors of peaceful interfaith coexistence. The plurality of ideas is an intrinsic aspect of diversified societies and the purpose of this article is to demonstrate how restrictions on such freedoms when they are shown to be offensive to other beliefs are essential to achieve a single end: religious tolerance. They served as a basis, more modern doctrines and human rights precepts, as well as recent judgments essential to clarify the theme of freedom of religious expression.

Keywords: Freedom of Expression. Religious freedom. Proselytism. Intolerance.

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Sobre a autora
Ana Carolina Bastos da Silva

Acadêmica de Direito na Faculdade Luciano Feijão

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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