Bioética e Direito: Experiências Controversas com Seres Humanos

01/06/2021 às 22:51
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O presente trabalho faz uma análise acerca de experiências com seres humanos e como os princípios da Bioética e Biodireito podem regular tais atividades. bem como faz uma análise acerca dos princípios da bioética e suas limitações jurídicas.

Bioética e Direito: Experiências Controversas com Seres Humanos

 

 

 

 

Os 400 Cobaias Negros - “Estudo Tuskegee de Sífilis Não-Tratada no Homem Negro”

Essa pesquisa se deu na cidade de Tuskegee, Alabama nos Estados Unidos. Os pesquisadores sabiam que todos os 400 homens, negros, eram portadores de sífilis e se recusaram a dar tratamento a eles. O objetivo dessa pesquisa era registrar e documentar a piora nas condições dos homens com a evolução da sífilis até irem a óbito.
 Essa pesquisa teve fim em 1972 quando denunciada pela própria comunidade científica local. Em 1997 o até então presidente Bill Clinton se desculpou com a comunidade.
 Essa pesquisa vai contra todos os princípios da Bioética pois não trouxe beneficência, era extremamente maleficente, os homens não tinham autonomia e foram injustiçados.  
 Aqui no Brasil essa pesquisa seria totalmente inviável, impensável. A tentativa de tal ato já seria um atentado contra a vida.

 

O Caso David/Brenda

Quando bebê, o canadense David Reimer perdeu o pênis após uma circuncisão malfeita. O psicólogo John Money recomendou submetê-lo a uma cirurgia de troca de sexo e a um tratamento com hormônios femininos. Ele queria provar que a identidade de gênero pode ser imposta, e não nata. David foi criado como Brenda, só soube da verdade aos 14 anos e cometeu suicídio aos 38.

 

As experiências da “Visita Íntima”


O Serviço de Saúde Pública dos EUA pagou prostitutas com sífilis para transar com detentos da Penitenciária Central da Guatemala (e o governo do país ainda copatrocinou a “pesquisa”!). O objetivo era infectá-los e, depois, acompanhar o tratamento com penicilina. Não há registros de que os presos tenham concordado com o teste.

 

O Cereal Radioativo


Preocupado com um possível ataque nuclear da União Soviética durante a Guerra Fria, os EUA conduziram quase 4 mil experimentos secretos com radiação em sua própria população.
 Além dos experimentos com cereal radioativo, houve maiores atrocidades com radiação, sendo elas:

 - 49 doentes mentais comeram cereal matinal com ferro e cálcio radioativos

 - 800 grávidas e sete recém-nascidos receberam iodo radioativo

 - 18 pessoas foram injetadas com plutônio

 - 200 doentes de câncer foram expostos a níveis altíssimos de césio

 

As Crianças Cobaias


- Zabdiel Boylston, para estudar a forma de proteção contra o sarampo, utilizou como cobaias seus dois filhos e seus dois servos.

- Benjamim Waterhouse, o médico que introduziu a vaccinia nos EUA, testou-a inicialmente em seus filhos

- Albert Sabin comprovou a eficácia da vacina oral contra poliomielite, usando como cobaias, nesse experimento, suas próprias filhas e mais três crianças

 

A Ingestão de Venenos e Gasolina Intravenosa


Karl Brand obrigava seus “pacientes” a ingerir venenos e injetava gasolina intravenosa nos mesmos, a fim de verificar as reações do organismo humano.

 

As Experiências do “Anjo da Morte” – Josefe Mengele


Ocorrido em Auschwitz, o Anjo da Morte encontrou o perfeito laboratório humano para experiências que eram basicamente o melhoramento genético da raça ariana.
- Para criar uma raça de indivíduos de cabelos loiros e olhos azuis, Mengele fez experiências com vários pigmentos que injetou nos olhos não-anestesiados de crianças, preferencialmente gêmeas. O procedimento excruciante frequentemente causava ferimento e às vezes cegueira total, momento em que as crianças eram exterminadas.
- Em alguns experimentos, suturou as crianças para uni-las, para simular gêmeos siameses.
- Em outros experimentos, injetava febre tifóide ou tuberculose para ver como os indivíduos de diferentes raças reagiam à doença, ou matava um grupo de indivíduos sadios simultaneamente, pois queria fazer autópsias em gêmeos que tinham morrido precisamente no mesmo momento.
- nos experimentos gastro-intestinais e respiratórios, Mengele introduzia tubos na narina dos indivíduos que alcançavam os pulmões e, então, bombeava um gás que desencadeasse uma tosse violenta e facilitasse a coleta de fluidos. Se os pulmões não rasgassem ou entrassem em colapso, a vítima teria poucos dias para se recuperar, sendo, então, amarrada a uma maca, oportunidade em que tinha seu reto distendido para um intenso e doloroso exame gástrico inferior. Após a colheita das amostras de tecido dos rins, próstata e testículos, a vítima era levada a uma sala de dissecção, morta com uma única injeção de fenol ou clorofórmio no coração e dissecada para estudo de seus órgãos internos.

 

A Unidade 731


Para registrar os limites do corpo humano quando submetido a situações extremas que poderiam acontecer no front de batalha, os japoneses contaminavam propositalmente seus prisioneiros chineses com diversas doenças.  - Durante o funcionamento, a tática foi responsável pela morte de milhares de pessoas. As vítimas de diversas formas de pesquisas: alguns eram infectados com disenteria ou injetados com tétano; outros usando máscaras, outros não, eram levados a um lugar aberto e bombardeados com cianureto;
 - Outros ainda eram enterrados em câmaras frias, a 50 graus negativos, e congelados até a morte.
 - Outros experimentos eram ainda mais aterradores: para controlar os limites da duração humana, prisioneiros eram obrigados a carregar pesadas mochilas do Exército e marchar em círculo no clima frio da Manchúria, com quantidades mínimas de alimento e água, até morrerem de exaustão

 

A Experiência dos Sentimentos e suas representações por expressões faciais


Carney Landis, aluno do curso de psicologia da Universidade de Minnesota, desenvolveu um experimento em 1924 cuja proposta era perceber se os sentimentos eram representados por expressões faciais específicas. Em outras palavras, o rapaz queria saber se havia uma expressão universal para demonstrar felicidade, nojo, choque, tristeza e outros tipos de emoções. O estudante universitário recrutou voluntários para o seu experimento, que em sua maioria eram outros alunos da Universidade de Minnesota, levou-os até um laboratório e fez riscos em suas faces visando uma observação precisa dos movimentos dos músculos faciais, posteriormente submetendo-os a estímulos que envolviam colocar a mão em um balde cheio de animais pegajosos, assistir pornografia ou mesmo cheirar amônia, e registrando suas reações por meio de fotos.
- O experimento passou a ficar obscuro a partir do momento em que Landis ordenou que os voluntários decapitassem um rato que era entregue vivo, em uma bandeja. A maior parte dos voluntários apresentou resistência diante da ordem, mas alguns acabaram aceitando decapitar o roedor. Em resposta aos que negavam, o próprio Landis fazia o serviço, certificando-se de registrar a expressão facial do colega em questão enquanto decapitava o rato diante dele.

Criação de Assassinos: o Experimento da Obediência por Stanley Milgram

A ideia de matar uma pessoa, por motivos óbvios, gera resistência. No entanto, a Universidade de Yale decidiu estudar, durante a década de 1960, se era tarefa fácil fazer com que o ser humano se torne um assassino. A parte mais bizarra de tudo é que a faculdade provou que, sim, é muito fácil fazer com que alguém vire um assassino, a depender de uma questão de autoridade e obediência.
 Milgram foi responsável pela seleção de alguns voluntários para fazer parte de seu experimento. Ele disse aos voluntários, no entanto, que aquilo se tratava de um experimento para verificar o efeito da punição no aprendizado de uma pessoa. O aprendiz, em questão, era um ator. A proposta era que ele deveria memorizar uma série de palavras, que seria acompanhada pelos voluntários por meio da leitura de um gabarito. Se o ator (que, para os voluntários, tratava-se de outro voluntário, já que eles não sabiam que tudo era armado) errasse uma palavra, a ordem era que dessem uma descarga elétrica nele. A cada erro, os choques (que eram secretamente de mentira) aumentariam a voltagem.
 Durante o experimento, o ator errava de propósito, e os voluntários eram obrigados a aumentar a potência do choque. Em resposta, o aprendiz começava a gritar e chorar, e até implorar que o libertassem. Se os voluntários perguntassem para os pesquisadores o que deveria ser feito, eles apenas encorajavam a continuar o experimento, uma vez que a proposta de Milgram era, justamente, saber quanto tempo aquelas pessoas levariam para recusar a dar o choque no aprendiz, e se a obediência os levaria a matar alguém.
 Mesmo deparados com os gritos do aprendiz, os voluntários não recuavam, e a maior parte deles continuava a dar choques até atingir a potência máxima, levando o ator a cair e ficar em silêncio, como se ele estivesse morto. Dentre as reações dos voluntários que foram registradas por Milgram, houve tremedeira, suor e até risos histéricos, mesmo que continuassem a pressionar o botão, dando a descarga no ator. O pesquisador também fez testes com pessoas que não podiam ver e nem ouvir os gritos do ator, e todos desse tipo de experimento cooperaram sem hesitação.

 

A Experiência da Justiça e da Ciência

John W. Deering foi morto em 1938, durante um experimento científico. Mas calma: não aconteceu uma explosão por acidente. O caso é que Deering já havia sido condenado à morte por ter assassinado um homem durante um assalto e, sendo assim, concordou com a ideia de que médicos monitorassem seus batimentos cardíacos enquanto ele seria executado a tiros. Sendo assim, em 30 de outubro de 1938, o condenado fez a sua última refeição e, na manhã seguinte (31), seguiu para cumprir a sua pena. Depois de ter os sensores de eletrocardiograma posicionados em seu pulso, Deering foi alvejado pelos tiros de cinco atiradores pagos pelo município de Salt Lake City. O exame registrou um espasmo de 4 segundos no coração do preso. Um tempo depois, o coração teve outro espasmo. E o ritmo foi diminuindo gradualmente, até parar completamente em 15,6 segundos depois de a vítima ter sido baleada. De acordo com os médicos que conduziram o experimento, os resultados poderiam ser úteis para especialistas em doenças do coração, já que mostrava claramente o efeito do medo sobre o ser humano. Apenas por curiosidade, os batimentos cardíacos de Deering foram de 72 bpm para 180 bpm quando ele foi amarrado à cadeira de execução. Apesar da calma aparente do condenado, a média de batidas por minuto continuou alta até o fim do experimento.

 

Experimento Pela Ingestão de Vômito

Durante o início do século XIX, o Dr. Stubbins Ffirth resolveu ir um pouco longe demais para provar a sua teoria. Ao notar que a febre amarela era muito comum no verão e desaparecia no inverno, Ffirth concluiu que a doença não era contagiosa e que, em vez disso, ela era causada por uma série de fatores estimulantes. Para provar que estava certo, o médico da Pensilvânia precisava se expor o máximo possível à febre amarela e mostrar que não havia sido infectado. Por isso, Ffirth fez pequenos cortes em seu braço e derramou, sobre eles, o vômito com sangue dos enfermos. Resultado: ele não ficou doente. Posteriormente, Ffirth também pingou gotas do característico vômito da doença em seus próprios olhos, além de ter inalado o vapor gerado ao ferver um pouco da mesma substância. Como se não bastasse, o cientista kamikaze também bebeu copos de vômito e, mesmo assim, não contraiu a doença.

O Experimento da Excitação

O médico e sexologista Kurt Freund  é famoso por ter inventado um aparelho de nome complicado e função peculiar: o pletismógrafo peniano, um dispositivo capaz de medir alterações na circunferência e no fluxo de sangue do pênis. Ou, em outras palavras, uma máquina que monitora ereções.
 Ao tomar conhecimento da invenção, o exército tcheco contratou Freund com uma missão de suma importância: confirmar a suposta homossexualidade de recrutas que tentavam escapar das obrigações militares, já que as forças armadas não permitiam a inserção de gays em seu contingente.
 O experimento era simples. Depois de conectar o dispositivo ao órgão genital do suspeito, Freund exibia imagens que podiam ser excitantes para o paciente e analisava como ele reagia a elas, podendo traçar, assim, um padrão de preferência sexual. Mais tarde, o pletismógrafo também foi usado para incriminar estupradores e pedófilos.
 Como isso revolucionou o sexo? Bem, pelo menos na antiga Tchecoslováquia, o pletismógrafo fez com que Freund percebesse que a homossexualidade não era uma questão de opção ou de “ânimo” que surgia depois do quinto ou sexto drink.
 Mesmo os pacientes que haviam passado por um programa de “reversão” de orientação sexual continuavam se excitando com imagens de outros homens, embora tivessem abandonado esse tipo de relação sexual. Com base nisso, Freund lutou pelo fim desse “tratamento” e, também, pela descriminalização da homossexualidade no país, que aconteceu em 1961.

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O Experimento do Bebê Albert


O bebê Albert, de 9 meses, foi induzido a desenvolver uma fobia durante uma pesquisa científica. Foi isso que aconteceu com Douglas Merrite, criança que foi utilizada como cobaia em um teste do professor John Watson e da aluna de graduação Rosalie Rayner, da Universidade de Johns Hopkins, em Baltimore, nos EUA, em 1920.
 Para o teste, o bebê foi colocado em contato com diversos animais peludos – indo desde ratos até cachorros. No começo, ele pareceu gostar da situação. Porém, com o passar do tempo, o pesquisador Watson começou a produzir barulhos e sons assustadores toda vez que o Albert ficava próximo dos animais.
 Não demorou para que o bebê associasse o estímulo inicialmente neutro (animais peludos) a um estímulo aversivo (som alto) e ficasse com medo. Para Watson, o teste provou que os medos são aprendidos, e não herdados biologicamente.

 

O Experimento “Monstro”


Em 1930, o fonoaudiólogo Wendell Johnson, da Universidade de Iowa (EUA), convenceu-se de que a gagueira infantil era uma deficiência mais psicológica do que biológica. Ele se baseou na sua própria experiência: quando criança, Johnson conviva com o problema e cresceu acreditando que isso só tinha acontecido porque um professor seu havia dito que ele era gago.
Johnson recrutou 22 crianças órfãs, entre as quais haviam gagos e indivíduos com dicção de fala normal.

O grupo de indivíduos gagos (10 crianças) foi dividido em outros dois grupos: um que era sempre informado de que sua fala era boa e outro que era reforçado sobre sua gagueira. As crianças com dicção normal também foram divididas de forma semelhante.
 Incrivelmente, as crianças não-gagas que ouviram com frequência que eram gagas passaram a ser relutantes ao falar. Muitas não conseguiram emitir sons e a autoestima delas despencou.
 Os efeitos psicológicos prejudiciais persistiram nessas pessoas por muito tempo e várias delas se tornaram reclusas. No entanto, apesar de ter sido observado um comportamento de gagueira, nenhuma delas desenvolveu a condição.

 

 

 Todos os experimentos polêmicos, atrozes e desumanos descritos acima aconteceram ao longo da história e, em todos, houve sérias violações contra A Dignidade da Pessoa Humana, ferindo diretamente qualquer direito humano existente.
 A Bioética traz em seu bojo princípios que devem ser observados e respeitados, o que não foi o caso.
 O princípio da Justiça não foi observado e respeitado, causando óbito em quase todos os experimentos, sendo injusto para com as “cobaias”.
 O Princípio da Autonomia não fora respeitado pois todos os experimentos não foram consentidos, visto que esse requer a autonomia daqueles que farão parte do experimento;
 O Princípio da Não-Maleficência ocorreu em todos, visto que só trouxe maleficência e não houve um modo de minimizar os riscos e danos aos pacientes, ou melhor, cobaias.
 E o princípio da Beneficência simplesmente foi ignorado visto que esse busca maximizar o benefício e minimizar os riscos e danos aos pacientes porém a ambição dos cientistas foi mais intensa do que sua conduta ética moral.
 É claro que a ciência deve se desenvolver buscando melhorias e aperfeiçoamento, portanto, não sendo interrompida, entretanto deve ter um limite, deve haver uma intervenção pelo Direito visando a preservação do ser humano.
 Moralmente a Bioética tem importante papel na busca pelos avanços da ciência, através dos questionamentos e experiências sendo fato inquestionável. Porém do ponto de vista jurídico faz-se necessário fixar parâmetros para o exercício de tais experimentos.
 O uso de humanos em experiências científicas é uma prática antiga, no entanto, devido à relação ética-jurídica que impõe limitações para certos tipos de atividades é fato recente devido aos diplomas legais acerca da proteção da dignidade da pessoa humana.
 Acima dos interesses científicos, deve-se reconhecer o ser humano como o centro de todas as relações; sejam elas científicas, jurídicas, morais ou éticas.

 

Sobre o autor
Silvio Moreira Alves Júnior

Advogado; Especialista em Direito Digital pela FASG - Faculdade Serra Geral; Especialista em Direito Penal e Processo Penal pela FASG - Faculdade Serra Geral; Especialista em Direito Penal pela Faculminas; Especialista em Compliance pela Faculminas; Especialista em Direito Civil pela Faculminas; Especialista em Direito Público pela Faculminas. Doutorando em Direito pela Universidad de Ciencias Empresariales y Sociales – UCES

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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