Jus Postulandi e a Paridade de Armas nos Juizados Especiais

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A fim de melhorar os Juizados Especiais esse artigo discutiu a eficácia da Lei 9.099/95. O instituto do Jus Postulandi impossibilita que as partes conflitantes tenham a devida prestação jurisdicional em paridade de armas, dificultando o acesso à justiça.

RESUMO

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, surge um movimento intenso na busca de efetivação de direitos atrelado a necessidade de novas formas de acesso à justiça. Justamente dessa necessidade e sendo este acesso básico e fundamental à luz dos direitos humanos, a fim de uma justiça mais rápida, eficaz e econômica surgem os Juizados Especiais. O presente artigo tem como objetivo a discussão a respeito da eficácia da Lei 9.099/95, em específico sobre o artigo 9º, que versa sobre a capacidade do Jus Postulandi e sua relação com o instituto da paridade de armas. Nesse sentido, tratou-se desses princípios norteadores, bem como o decorrer da implantação, estrutura e funcionamento dos Juizados Especiais no Brasil. Essa pesquisa buscou descrever os fenômenos e a experiência dos juizados no âmbito de alguns princípios, neste viés, para tanto foi utilizado o tipo de abordagem qualitativa com procedimento de revisão bibliográfica.     

 

Palavras-Chave. Jus Postulandi. Paridade de Armas. Juizados Especiais. Acesso à Justiça. 

 

ABSTRACT

With the promulgation of the 1988 Federal Constitution, there was an intense movement in the search for the realization of rights linked to the need for new forms of access to justice. It is precisely from this need and since this access is basic and fundamental in the light of human rights, in order to achieve faster, more effective and economic justice, the Special Courts arise. This article aims to discuss the effectiveness of Law 9.099 / 95, specifically on Article 9, which deals with Jus Postulandi's capacity and its relationship with the weapons parity institute. In this sense, these guiding principles were dealt with, as well as the implementation, structure and functioning of the Special Courts in Brazil. This research sought to describe the phenomena and the experience of the courts within the scope of some principles, in this bias, for this purpose the type of qualitative approach was used with a literature review procedure.

 

Key words. Jus Postulandi. Arms Parity. Special Courts. Access to justice.

 

1. INTRODUÇÃO

A partir da segunda metade do século XX, com o advento do estado intervencionista, que emerge a preocupação em se resguardar de modo profícuo e no plano prático a garantia dos meios para que se preserve a almejada igualdade dos direitos entre os cidadãos, esse fenômeno advém, sobretudo, da judicialização dos conflitos que faz com que a diretriz da garantia da igualdade de direitos no âmbito político-social deva, também, alcançar a esfera judicial. Sendo assim, a concretude da igualdade dos direitos entre os cidadãos somente será alcançada de forma plena se a esses forem conferidos os meios necessários à salvaguarda de tais direitos quando invocada a tutela jurídica perante o Estado detentor do monopólio da jurisdição, dessa forma entende-se que o acesso à justiça é uma das formas mais básicas de igualdade e direitos humanos, MENEGATTI (2009).

Mediante tal situação, no Brasil, a necessidade de incrementar o acesso à justiça se intensificou após a promulgação da Constituição Federal de 1988, que positivou direitos antes não reconhecidos. Gerando assim, uma crescente necessidade de procurar a Justiça estatal para a efetivação desses direitos, por meio da resolução de controvérsias, FARIAS (2013).

Portanto dentro dessa perspectiva, buscando uma maior facilidade de acesso à justiça nas causas de menor complexidade, é permitindo que qualquer um do povo devidamente legitimado para postular, no Juizado Especial ingresse com ações sem a necessidade de acompanhamento de um advogado, desde que o valor da causa não ultrapasse 20 (vinte) salários-mínimos, conforme permissão explicitada no artigo 9º da Lei 9099/95. Tal facilidade permite que a parte, sem qualquer conhecimento jurídico ou um advogado, ingresse com ação no Juizado Especial para solucionar possíveis ações que poderão surgir na convivência em sociedade. Olhando por uma ótica, é uma ótima forma de facilitar o acesso à justiça de toda a população, permitindo que ela compareça ao Juizado Especial, porém, ocorre que, observando os Juizados Especiais, o comparecimento sem advogado, revela vários problemas no decorrer do processo em razão da parte estar desacompanhada e não ter o conhecimento necessário para resolver, quando for necessário, BORGES (2010).

Menegatti (2009) ressalta a expressão jus postulandi indicando a faculdade dos cidadãos postularem em juízo pessoalmente, sem a necessidade de se fazerem acompanhar de um defensor, praticando todos os atos processuais inerentes à defesa dos seus interesses incluindo-se a postulação ou a apresentação de defesa, requerimento de provas, interposição dos recursos, entre outros atos típicos do iter procedimental previsto em lei é aplicável aos diversos ramos do Judiciário. 

Essa falta de acompanhamento segundo Borges (2010) causa entraves que começam desde o momento da postulação da ação, visto que, por não comparecer acompanhado de advogado, o analista deve fazer este trabalho tão importante no processo, que é a petição inicial, onde os fatos devem ser narrados, os pedidos cuidadosamente feitos, toda a fundamentação deve ser inserida naquele momento.

Ainda sobre essa questão, nas audiências de conciliação, percebe-se que essa deficiência fica mais notória, visto que, estando à outra parte, principalmente sendo esta pessoa jurídica, acompanhada de advogado bem preparado, às vezes a parte que postula em juízo sem o auxílio de um advogado, por não ter conhecimento técnico jurídico, se perde em meio aos termos e propostas feitas nas salas de audiências, por vezes fazendo acordos que estão muito aquém do seu direito ou não apresentando a defesa adequada, mesmo de forma oral, para a contestação apresentada pela parte ré, sendo levada, às vezes, a prejudicar sua própria defesa, quando apresenta informações, de boa-fé, que vão de encontro ao seu direito, BORGES (2010). 

Nesse contexto observa-se ainda segundo Barouche (2010) que analisando a grandeza territorial do nosso país, e detentos as especialidades e dificuldades de cada estado brasileiro, encontrou se também alguns estados periclitando em relação à atuação dos juizados por falta de apoio dos tribunais de justiça, que não dispensam os recursos necessários ao desenvolvimento de suas atividades, ou pela carência de operadores do sistema comprometida com essa diferente filosofia de trabalho, ou ainda, pela grande quantidade de ações ajuizadas diariamente e que se multiplicam numa progressão geométrica. Juntamente com isso ainda encontramos a problemática das causas serem julgadas após aproximadamente um ano de sua propositura, o que de monta já atenta contra um dos princípios basilares da lei dos juizados especiais que é o princípio da celeridade processual, no qual, de acordo com a doutrina, as causas devem ser processadas e julgadas em igual ou pouco mais de um trimestre. 

Não obstante o que se busca com essa pesquisa é analisar até que ponto a lei dos juizados especiais no âmbito do jus postulandi e da paridade de armas, tem cumprido ou não com seu papel de facilitador do acesso à justiça aos cidadãos, buscando ainda o cumprimento eficaz dos objetivos da lei, que ao longo dos anos e mudanças na lei experimentaram um progressivo desvirtuamento dos ideais de sua criação como um tipo de justiça não estatal, mais informal e próximo dos princípios comunitaristas de justiça, e transformando-se ao invés disso, em um braço, estendido do poder judiciário, MELLO; MEIRELLES (2010).   

 

2. JUIZADOS ESPECIAIS COMO FORMA DE ACESSO À JUSTIÇA

O fenômeno dos juizados especiais tem ocupado um lugar de destaque no cenário público brasileiro ao ser assolado não só como uma forma de acesso à justiça para a população, mas também pelos problemas atuais enfrentados diariamente pela instituição. A criação dos juizados especiais surge principalmente da ideia de informatizar os meios e os métodos de resolução de conflitos. 

Com isso, segundo Barouche (2010), temos que os Juizados Especiais Cíveis trouxeram para o ordenamento jurídico brasileiro, não só a busca efetiva da tutela jurisdicional de forma célere, orientado pela Carta Magna, como também procurou dar efetividade aos direitos constitucionais de acordo com sua lei processual menos burocrática, mais acessível e econômica.  

Sendo assim o legislador com o intuito de possibilitar que todas as pessoas tenham acesso à justiça partindo da premissa de que este acesso é básico e fundamental à luz dos direitos humanos e, ainda, da necessidade de garantir a plena fruição desse direito, concluem no sentido de que no Estado liberal democrático o acesso à justiça é apenas formal na medida em que somente aqueles que podem arcar com os custos decorrentes de uma demanda, incluindo custas, emolumentos e honorários advocatícios, tenham garantido o acesso ao judiciário, CAPPELLETTI E GARTH (1988). 

Ainda neste viés a base para a criação da ideia de juizados especiais no Brasil surge com o denominado Small Claims Courts dos Estados Unidos, os quais foram criados com o escopo de solucionar os conflitos de menor complexidade decorrentes do dia a dia, como por exemplo brigas entre vizinhos e desentendimentos diversos das relações cotidianas, possibilitou-se assim que a resolução dos litígios pudessem ser resolvidos com a seguridade do judiciário sem que para isso o cidadão adentra-se em um sistema complexo e oneroso, BAROUCHE (2010).  

Os juizados surgem desse contexto, com o advento da Lei n. 9099/99, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis, introduziu-se no mundo jurídico um novo sistema, com uma das finalidades de combater a problemática da morosidade processual, nesse sentido, a criação de tal lei proporciona às causas de menor complexidade e às próprias partes, uma justiça mais barata, rápida e eficiente, auxiliando na tutela jurídica dos direitos sociais, ajudando a desafogar a justiça comum com um rito mais simplificado, BAROUCHE (2010)      

Nesse sentido os Juizados Especiais são orientados por princípios basilares na sua constituição como, oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, por meio desses princípios, os Juizados vêm se aproximando cada vez mais da realidade social e, consequentemente, recepcionando muitas demandas. Percebe-se, ainda, que esse acesso vem se ampliando, mas surge por parte de estudiosos o questionamento sobre sua efetividade, considerando a existência de obstáculos para a promoção de um acesso igualitário para todos, FARIAS (2013).  

 

2.1 Da criação dos Juizados Especiais no Brasil

     Contextualizando o cenário em que foram criados os juizados especiais, segundo Paletta (2011), no período que consistiu a ditadura militar brasileira (1964-1985) período lembrado como uma época de repressão, tortura e, especialmente supressão de direitos constitucionais, curiosamente, justamente nesta época de desmandos e autoritarismo, onde o poder executivo se sobrepunha aos demais poderes do estado, que surgiu a ideia revolucionária de democratizar o acesso à justiça a partir da criação de uma justiça rápida, barata e capaz de atender à parcela mais pobre da população. No ano de 1979, logo após assumir o governo, o presidente e general João Batista Figueiredo criou o Ministério da Desburocratização, nomeando para o cargo de ministro, economista e administrador Hélio Beltrão que lançou o Programa nacional de Desburocratização, destinado a dinamizar e simplificar o funcionamento da administração pública federal, sendo que este programa criou um canal de comunicações com a sociedade civil, passando dela a receber, diariamente, críticas e sugestões de melhorias a serem realizadas. 

Neste viés, Chasin (2007), comenta que entre os objetivos deste programa se encontra a possibilidade de melhoria do atendimento aos usuários do serviço público, a redução da interferência do governo na atividade do cidadão e do empresário.  

E que nesta situação segundo Ferraz (2010), ao ser constatado que uma gama enorme de reclamações era dirigida diretamente ao Poder Judiciário, sendo suas maiorias referentes a causas de pouco valor e complexidade jurídica, o então Secretário Executivo de Coordenação do Programa Nacional de Desburocratização, segundo Paletta (2011), Piquet Carneiro, buscando inspiração em experiências estrangeiras realizou, em setembro de 1980, uma visita às Small Claims Courts de Nova York. 

Que derivaram de um longo desenvolvimento histórico acerca da maneira de lidar com demandas de baixa complexidade, que teve início em 1913, em Cleveland, nos Estados Unidos, surgindo assim o primeiro órgão jurisdicional com atribuição especial para cuidar das “pequenas causas” (FERRAZ, 2010).

Dessa forma, as características dessas cortes americanas eram o de ser populares, atendendo as camadas baixa e média da população, e de ter baixo custo para seus usuários, tendendo ainda a ser bastante informais, dispensando os advogados e às formalidades processuais que costumam transformar o processo em um ritual moroso e altamente misterioso aos olhos dos leigos (PALETTA, 2011). 

Ainda sobre a Small Claims Courts¹, Chasin (2007) também atribui a importância que essas influências trouxeram na ideia de criação dos juizados especiais no Brasil, além disso Harrington (1985) afirma que como parte das cortes municipais as Small Claims funcionavam como um braço descentralizado do sistema de justiça, sob a supervisão do juiz municipal. Sua existência, fundada em procedimentos informais, iria assim completar o sistema convencional de justiça. As críticas, que começaram a ser formuladas algumas décadas mais tarde, e que dariam ensejo às reformas ocorridas na década de 1970, apontavam que as Small Claims Courts nada mais eram do que versões simplificadas e modernas da adjudicação formal, sem as proteções do processo legal. Foi dessa forma demonstrado como seu objetivo inicial, de fórum de defesa dos direitos do homem comum, foi sendo aos poucos transformados no oposto, tornando-se fórum de defesa dos empresários e locadores no qual o homem comum parece na condição de explorado. 

Diante dessas situações, a discussão envolvendo as Small Claims Courts como citado acima, em 1970 foram propostas reformas para que redefinissem seus objetivos. Considerava-se que embora o objetivo de criação de uma justiça eficiente, rápida e barata já houvesse sido alcançado, esse sistema não era igualitário e acessível a todos. Os pobres participavam apenas na condição de réus, e normalmente perdiam. Era esse o ponto que as reformas afirmavam querer atacar. (CHASIN, 2007).   

Ainda nesse sentido, Chasin (2007) afirma que esse contexto internacional contribui para incentivar a ideia de Juizado Especial. Inspirado nas ideias internacionais e no sucesso dos Conselhos de Conciliação e Arbitramento do Rio Grande do Sul, o Ministério da Desburocratização investiu na criação do juizado, envolvendo nesse processo importantes setores do campo do direito, e construindo, assim, uma ampla aliança capaz de sustentar o projeto que daria forma a essa nova instituição. Nesse mesmo sentido, segundo Paletta (2011) inspirada nesse arquétipo norte-americano adveio a Lei Federal n° 7.244, de 07 de novembro de 1984, que instituiu no Brasil os Juizados de Pequenas Causas, com as seguintes características gerais: competência restrita à esfera cível, destinado ao julgamento de demandas de menor complexidade, com o valor da causa limitado em até 20 (vinte) salários-mínimos, isenção de custas em primeira instância e contratação facultativa de advogado.   

Ocorreram várias críticas com a criação deste novo sistema, uma delas adveio de Tucci (1985) que acreditava que não seria necessária a criação desse sistema, bastaria que fosse realizada uma reforma no procedimento sumaríssimo. 

A promulgação da constituição de 1988 tratou dos juizados especiais em seus artigos 24 inciso X e 98 inciso I, trazendo dessa forma inovações inserindo a instituição de um juiz leigo, ao lado do juiz togado, a inserção da execução das causas cíveis, que constava no projeto original, mas fora excluída, a criação, ao lado dos Juizados Especiais Cíveis, dos Juizados Especiais Criminais, a alteração do objeto, de causas de reduzidos valor econômico, para causas cíveis de menor complexidade e autorização de transação. (FERRAZ, 2010). 

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Dessa forma, segundo entendimento de Paletta (2011) em setembro de 1995, o então presidente da república Fernando Henrique Cardoso, sancionou a Lei 9.099, instituindo aqueles Juizados vigorados na lei anterior. A partir desse momento, introduziu-se no mundo jurídico um microssistema de natureza instrumental destinado à rápida e efetiva atuação do direito. Como os Juizados foram estruturados para solucionar uma categoria específica de interesses cotidianos, este novo modelo de prestar jurisdição teve sua competência limitada a causas de menor complexidade elencadas no art. 3° da Lei 9.099/95. 

No entanto, por uma questão estratégica, para que o sistema fosse de fato simplificado e voltado para uma categoria bastante específica de interesses cotidianos, excluíram-se de sua competência as causas de natureza alimentar, falimentar e fiscal, de interesse da fazenda pública e referentes a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e à capacidade das pessoas. Juntamente com a criação desse novo modelo de acesso à justiça o art 9° da lei 9.099/95 possibilita o jus postulandi, que traz debates sobre sua eficiência em um tratamento igualitário nesse sistema.

  

3 PRINCÍPIO DO JUS POSTULANDI

Em termos conceituais o que seria o jus postulandi? Menegatti (2009) conceitua que sua expressão resulta no “direito de postular”. Entretanto, a mera tradução literal não basta à compreensão de sua significância, ou seja, da acepção que a expressão assume no âmbito da ciência jurídica.

Segundo Portela (2018), o instituto do jus postulandi surgiu junto com o advento do Habeas Corpus por meio de um decreto de Dom João VI, em 23 de maio de 1821, quando parte da família real retornou a Portugal. Remédio constitucional este, que surge com o objetivo de proteger o direito de liberdade e de locomoção, para que seja cessado a violência ou ameaça de constrangimento ilegal do direito de ir e vir, podendo ser impetrado pela própria vítima sem a necessidade de um advogado.     

Ademais, embora tivesse sido criado esse decreto apenas em 1832, com a criação do Código de Processo Criminal, em seu artigo 340, que o instituto jurídico do Habeas Corpus ganhou notoriedade. Porém cumpre destacar que em primeiro momento havia apenas o Habeas Corpus liberatório, para  os casos em que o  constrangimento ou a prisão já ocorreram, sendo criado então em 1871 o Habeas Corpus preventivo. Ou seja, após ser previsto pela primeira vez conforme demonstrado, esse instituto passou a ser expresso na atual constituição brasileira de 1988 em seu artigo 5º, LXVII. Dessa maneira é possível considerar o Habeas Corpus como primeira expressão do jus postulandi no Brasil. (PORTELA, 2018). 

O instituto do jus postulandi surgiu na legislação brasileira no Direito Trabalhista, nesse sentido, Silva (2017) complementa o conceito trazendo o momento histórico em que se começou a ser abordado esse termo, o jus postulandi que se originou no direito brasileiro quando da entrada em vigor da CLT, no ano de 1943, na ocorrência do governo de Getúlio Vargas. O direito do trabalhador de ingressar com pleitos na justiça do trabalho, sem advogado e com auxílio do órgão, está previsto na CLT arts. 791 e 839. Dessa maneira, como bem preceitua Moraes (2019, p.34), “Assim, a processualística da Justiça do trabalho tenta, dessa forma, viabilizar o acesso ao apreço jurisdicional das lides, principalmente daqueles que não têm condições de arcar com as custas de advogado.

Entretanto, desde a promulgação da CF/88, a constitucionalidade e a legalidade do jus postulandi foram fortemente confrontadas pela doutrina, por conta do mandamento constitucional da indispensabilidade do advogado para a administração da justiça. Todavia, em contrapartida foi reforçado pela entrada em vigor do Estatuto da Advocacia, que determinou que a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário ou Juizado Especial é atividade privativa de advogado, segundo o art. 1°, deste mesmo estatuto. Vale ressaltar que no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 1.127 pelo Supremo Tribunal Federal, que tinha como causa de pedir a supressão da expressão “qualquer” do inciso I do artigo 1° do Estatuto da Advocacia, trata por solucionar a questão, julgando procedente o referido pedido e reconhecendo a existência do jus postulandi no ordenamento jurídico brasileiro. 

Sendo assim, conclui-se que o jus postulandi está de acordo com a Constituição e pode ser utilizado tanto nos juizados especiais, como na justiça do trabalho, conforme entendimento exarado pelo Supremo Tribunal Federal, nesta ADIN.

Segundo Menegatti (2009), o jus postulandi como prerrogativa do jurisdicionado é meio processual para resguardo dos direitos assegurados pela legislação no plano material, nos quais se incluem o direito à liberdade, o direito à vida, o direito à sentença, entre outros direitos e garantias fundamentais assegurados aos jurisdicionados pela CRFB/88, ou seja, a possibilidade de postulação sem a presença de um advogado é baseado na ideia de uma justiça que atinja a população desfavorecida financeiramente, sendo uma medida tomada acima de tudo para promover maior acesso à justiça.

 Em virtude desse movimento de possibilitar maior acesso à justiça, ao analisar de forma geral esse contexto, para Gilla (2020), no sentido da Constituição Federal de 1988, não parece descabido que as exceções definidas que admitem o instituto do jus postulandi assim foram determinadas pelo legislador para apenas garantir o acesso à justiça mas também para que de certa forma, fosse simplificado o procedimento jurídico, tendo como fundamento máximo o critério de que caso seja demonstrado categoricamente o direito material, o juiz deve apreciar a demanda, sem a necessidade de burocratização do ato. Dessa maneira, com essas reduções atinge-se a pauta de alcançar os princípios da celeridade, informalidade e economia processual, no qual o jus postulandi é parte intrínseca.    

Como visto acima, diante da abordagem da história que norteia os juizados especiais tanto no Brasil como de um aspecto internacional como o citado Small Claims Courts, até a atual lei de 1995 que regula atualmente esses órgãos, o também citado jus postulandi tem papel importantíssimo e fundamental no que norteiam os juizados especiais. Isto porque o direito de postular é intrínseco ao Estado Democrático de Direito na medida em que a todos é possível a busca de uma tutela jurisdicional perante o Estado, que possui monopólio da jurisdição (MENEGATTI, 2009). 

 

3.1 Relação com os Juizados Especiais

Como bem demonstrado nos capítulos anteriores, o jus postulandi é a capacidade dada ao indivíduo de postular em juízo sem a necessidade de representação por um advogado, dessa forma, têm-se uma facilidade de ingresso ao poder judiciário àqueles que não possuem condições financeiras de contratar um profissional para auxiliá-los. Sendo assim, no Brasil, esse instituto é adotado pelos Juizados Especiais, estaduais e federais, e como já demonstrado anteriormente na justiça do trabalho, conforme dispõe (PORTELA 2018).  

Todavia, esse direito de postular possui alguns limites estabelecidos pela Lei 9.099/95, conforme demonstrado a seguir,  

 

Art. 9º Nas causas de valor até vinte salários-mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória. 

§ 1º Sendo facultativa a assistência, se uma das partes comparecer assistida por advogado, ou se o réu for pessoa jurídica ou firma individual, terá a outra parte, se quiser, assistência judiciária prestada por órgão instituído junto ao Juizado Especial, na forma da Lei nº local. 

§ 2º O Juiz alertará as partes da conveniência do patrocínio por advogado, quando a causa o recomendar. 

§ 3º O mandato ao advogado poderá ser verbal, salvo quanto aos poderes especiais. 

§ 4o O réu, sendo pessoa jurídica ou titular de firma individual, poderá ser representado por preposto credenciado, munido de carta de preposição com poderes para transigir, sem haver necessidade de vínculo empregatício. (Redação dada pela Lei nº 12.137, de 2009) (grifo nosso) (www.planalto.gov.br).

 

Nesse sentido, o legislador deixa nítida a capacidade postulatória da população em relação aos Juizados Especiais, desde que obedecido os critérios da lei, onde as causas não ultrapassem 20 salários-mínimos.

Vale ressaltar segundo Portela (2018) que no que se refere aos Juizados da esfera federal, não há limite de valor da causa para a propositura da ação para a população que opte pelo instituto do jus postulandi, ficando o pleito limitado ao teto do próprio juizado que é de 60 salários-mínimos, conforme demonstrado pela Lei 10.259/01 arts 3º e 10º a seguir:

 

Art. 3o Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários-mínimos, bem como executar as suas sentenças. 

Art. 10. As partes poderão designar, por escrito, representantes para a causa, advogado ou não.

 

Mais uma vez fica nítida a vontade expressa do legislador em conferir capacidade postulatória aos litigantes, correspondendo assim ao instituto do jus postulandi.  

Ademais, para um dos autores já citados Menegatti (2009), paradoxalmente, tomando-se como exemplo os Juizados Especiais e a Justiça do Trabalho, o jus postulandi permite aos principais destinatários dessas cortes, consumidores e trabalhadores, respectivamente, em princípios reconhecidos pelo prisma social e legal como hipossuficientes litigar em nome próprio, ou seja, de forma leiga. Os preceitos constitucionais devem guardar uma coerência lógica. Desta forma, não se pode criar facilidades ao acesso à justiça sem identificar, no plano prático, se estas medidas asseguram a fruição plena dos princípios garantidores do processo, sobretudo quando se verifica que cabe ao estado prover a assistência jurídica aos necessitados. Menegatti (2009), ainda afirma que as partes devidamente acompanhadas por advogados ainda passam por situações tormentosas durante a lide, levando a crer que muito mais gravosa seria a situação se desacompanhado de advogado estivessem. 

A constatação que emerge da realidade é que os poucos que comparecem ao Judiciário, desacompanhados dos advogados não o fazem por desejo próprio, mas pela simples impossibilidade de remunerar este profissional ou obter a assistência estatal para tanto. Diante dessa constatação, pode-se cogitar que os meios e institutos criados com o escopo de facilitar o acesso do cidadão ao judiciário acabam por entregá-lo à própria sorte, dificultando ou mesmo impossibilitando o exercício das garantias do processo, sobretudo o contraditório pleno e a ampla defesa. Aos preceitos constitucionais devem guardar uma coerência lógica. 

Desta forma, não se pode criar facilidade ao acesso à justiça sem identificar, no plano prático, se estas medidas asseguram a fruição plena dos princípios garantidores do processo, sobretudo quando se verifica que cabe ao Estado promover a assistência jurídica aos necessitados. Evidencia-se que o jus postulandi não investe a parte de capacidade postulatória nos moldes descritos pela lei sendo certo que esta somente pode ser exercida por profissional devidamente habilitado, limitando-se a afastar, excepcionalmente a necessidade de representação por meio de um advogado quando a lei assim dispuser. 

Nesse sentido, ainda podem ocorrer casos em que a postulação leiga encontra sua maior extensão quando se verifica que, até as partes não alfabetizadas poderão postular utilizando-se do jus postulandi. Dessa forma, entende-se que o acesso à justiça não se perfaz de forma simples, exige-se do cidadão um amplo conhecimento do direito material e processual e envolvendo uma sucessão de atos a serem praticados com vias ao exercício pleno de tal direito (MENEGATTI 2009).

No entendimento de Gilla (2020) não é suficiente apenas que as pretensões dos indivíduos sejam recebidas pelo poder judiciário, por meio do jus postulandi, o acesso à justiça significa a participação das partes em igualdade e em conformidade com princípios constitucionais que garantem o devido processo legal, a fim de uma prestação jurisdicional o mais justa possível alcançando assim os ideais constitucionais.

É relevante o fato de que a ineficiência dos critérios utilizados para se ter a capacidade postulatória conforme art. 9º da Lei 9.099/95, que deveriam servir como uma maneira de acesso à justiça, acarretam circunstâncias prejudiciais à parte desassistida, o que torna o acesso à justiça restrito. Ou seja, tem grandes possibilidades de o instituto não atingir sua finalidade acarretando prejuízo considerável, comprometendo a lide em termos de igualdade, contribuindo assim para sua ineficácia. Dessa forma, temos que o jus postulandi, impõe um custo alto para a parte postulante, em razão de comprometer a equidade processual. (GILLA, 2020).   

Cabe destacar ainda o entendimento de Portela (2018), que destaca a dificuldade de a grande maioria dos indivíduos perceber a existência dos próprios direitos, sendo ainda mais complexo compreenderem os procedimentos e particularidades dos atos processuais e do processo ao todo, ao ponto de conseguirem dar perfeito andamento em uma ação mesmo que de certa forma vários atos dos Juizados Especiais já sejam simplificados. Ou seja, o autor deixa nítida a possibilidade de que a parte perca o prazo, deixe de juntar um documento comprobatório ou até mesmo de realizar um requerimento necessário ao processo. Assim conclui-se que essa falta de compreensão da sistemática do ordenamento jurídico pode conduzir para que os pedidos sejam julgados improcedentes.    

Não obstante, cumpre destacar que Gilla (2020), também adverte sobre a indispensabilidade do advogado, que é considerado peça fundamental para o equilíbrio entre as partes. Segundo a autora, a Constituição Federal de 1988, em seu art.133, reconhece a indispensabilidade à administração da justiça, bem como a inviolabilidade do exercício da advocacia, equiparando, segundo ela, o advogado aos demais agentes de prestação jurisdicional. Temos que o advogado possui o conhecimento e a capacidade para a interpretação das normas jurídicas bem como a experiência necessária para conduzir de forma adequada o processo. 

Neste viés, Portela (2018,p.32) afirma, “O jus postulandi concedido para demandar em causa própria no juizado, ao mesmo tempo que serve como uma grande porta para o Judiciário, acaba mitigando determinados aspectos fundamentais do direito de acesso à justiça, tendo em vista a condição de extrema desigualdade em que a parte pode se colocar”. Ou seja, percebe-se que para que haja um processo célere e eficiente, é necessário ceder outras garantias constitucionais.  

Outro importante aspecto a se analisar em relação ao instituto do jus postulandi, se configura no momento em que a parte desassistida ingressa com a ação nos juizados especiais, conforme bem descreve, Santos apud Gilla (2020), no momento em que as partes recorrem aos Juizados Especiais para realizar  atermação, que é um termo de queixa, o cidadão irá elucidar os fatos e apresentar as provas pertinentes a um funcionário, ou servidor público ou até mesmo um estagiário, após terminado o termo será assinado, não podendo ser modificado apenas ajustado. 

Conforme demonstra a autora, pode ocorrer de possivelmente, o funcionário que elaborou o termo não possuir todo o conhecimento jurídico necessário para redigir e desenvolver um documento que possua requisitos que possam tornar possível o êxito da ação, como uma petição padrão feita por um advogado qualificado. Não obstante, um termo que não atinge o patamar necessário para servir como uma espécie de petição inicial, dá a possibilidade da pretensão não atingir seu objetivo que é a procedência dos pedidos e a resolução efetiva da lide. Por isso, segundo os autores, as partes desacompanhadas de advogado possuem muitas das vezes seus pedidos indeferidos por falta de provas relevantes que não foram juntadas pela falta de conhecimento da parte. Assim entendesse o quão prejudicial pode ser a postulação em juízo sem estar devidamente representado.   

Relevante também destacar as consequências da ausência de um advogado nas audiências de conciliação, instrução e julgamento, onde a parte desacompanhada muitas vezes não possui conhecimentos técnicos a respeito dos atos que irão se suceder. É evidente que o conhecimento segundo os autores adquirido pelos advogados ao longo dos anos na graduação não pode ser equiparado a uma parte leiga sobre a demanda e os atos processuais. Essa falta de conhecimento técnico impede que seja requerido, pedido ou que seja decidido algo favorável ou que possa reverter a situação, ou seja, é indispensável a prática jurídica. Torna-se assim dever dos operadores do sistema jurisdicional a condução pelo processo de forma que se tenha paridade entre as partes litigantes, a fim de que seja alcançado um processo justo, e baseado em princípios garantidores constitucionais (POSSIDONIO apud GILLA, 2020). 

Ocorre ainda segundo Gilla (2020), as situações em que a parte desacompanhada recebe a sentença prolatada pelo juiz, por meio de carta de aviso de recebimento ou de consulta no processo pela internet, e os mesmos não conseguem compreender o teor da decisão por possuir uma linguagem técnica e de difícil compreensão, para pessoas que não possuem o conhecimento específico do ramo do direito. Este fato pode gerar consequências negativas para a parte desassistida pois a mesma pode não saber do seu direito de recurso nem mesmo como fazê-lo. 

Assim sendo, com base nesses fatos, temos ainda segundo Gilla (2020), que o instituto do jus postulandi é um princípio que possui grande relevância social, no entanto, não soluciona e nem atinge sua finalidade, pois ao passo que conduz o acesso à justiça, o mesmo coloca em situação de vulnerabilidade as partes litigantes desacompanhadas de profissional apto. Essas mesmas partes se encontram em meio às complexidades das minúcias que permeiam o judiciário e que sem a presença de um advogado diminuem suas possibilidades de êxito em suas demandas judiciais, ou seja, não adiante a garantia de acesso à justiça se não há justiça e equidade ao demandante.           

 

4 PRINCÍPIO DA PARIDADE DE ARMAS

O princípio da paridade de armas segundo o art. 7º do CPC/2015, trata da busca de igualdade entre as partes na lide, no que tange, os aspectos dos meios de defesa. Ou seja, esse princípio é positivado no intuito, segundo Franco (2020), como uma busca por condições semelhantes entre as partes envolvidas para que uma não tenha vantagem em relação à outra, dessa forma, teremos a garantia de que o conflito em questão seja resolvido de forma justa e igualitária entre as partes. 

Ainda nesse sentido, Didier Jr. (2013), ressalta a importância da paridade de armas entre os litigantes, para que ambos recebam tratamento igualitário. Deve ser ofertado às partes as mesmas armas para a luta, ou seja, as mesmas oportunidades de defesa e os mesmos meios processuais para tanto, dessa forma, é garantido o tão almejado princípio constitucional da igualdade. No entanto, o autor ainda salienta que, nessa vontade de igualdade, não significa que haverá simetria entre os direitos e as obrigações, mas que não haverá um desequilíbrio, em prejuízo a outra parte, visto que, de acordo com o rito processual em uma lide, haverá partes vencedoras e perdedoras. 

Segundo Portela (2018), embora tenha sido positivada a garantia do princípio da paridade de armas, em termos práticos e fáticos, e ausência de tal instituto surge como barreira ao acesso à justiça, se consolidam nas dificuldades das partes precisam enfrentar para conseguir postular em juízo em par de direito com a parte contrária. Dessa forma, a justiça eficaz e garantista do cumprimento de direitos está intimamente interligada com a paridade de armas entre os litigantes.  

Por fim é necessário ressaltar mais uma vez que as partes devem ser tratadas com igualdade processual, ou seja, é necessário que nas ações que tramitam nos juizados especiais deve ser observado a imparcialidade do juiz, a igualdade ao acesso à justiça, sem que haja qualquer tipo de discriminação, a redução das desigualdades que impossibilitam o acesso à justiça e ao acesso a informações necessárias para que seja exercido o contraditório. (JUNIOR 2013).    

 

4.1 Relação com os Juizados Especiais

Conforme demonstrado anteriormente nesta pesquisa, entende-se que o acesso à justiça evoluiu muito, tornando mais viável esse acesso pela população tentando alcançar, assim, o patamar de igualdade. O jus postulandi nos juizados especiais foi fundamental para possibilitar maior acesso à justiça pelas partes mais vulneráveis. No entanto, essa facilidade de ingresso ao Judiciário sem o devido acompanhamento de um advogado criou barreiras e impedimentos aos desacompanhados que movem uma ação. (PORTELA 2018)  

Sendo assim, é difícil existir essa garantia processual da paridade de armas com o instituto do jus postulandi, segundo Franco (2020), pois durante o rito processual é improvável que a parte sem advogado consiga juntar provas relevantes, contraditar testemunhas na audiência de instrução e julgamento, acompanhar prazos dentre outros atos. Na deficiência de conhecimentos específicos sobre o rito processual é bem incerto que as partes consigam exercer de forma eficaz a ampla defesa e o contraditório de seus interesses.    

Nesse aspecto, Portela (2018), ressalta os efeitos práticos do que ocorre com a possibilidade do jus postulandi, pois o mesmo afirma que se já é difícil para a maioria dos indivíduos perceberem a existência dos próprios direitos, mais difícil se torna compreender os procedimentos e particularidades do processo a ponto de conseguirem, sem auxílio, dar o andamento correto e eficaz em uma ação, mesmo sabendo que o rito dos Juizados especiais é mais simplificado. Tais dificuldades tornam extremamente provável que a parte perca o prazo, deixe de juntar provas úteis, deixe de fazer um requerimento importante e consiga compreender as etapas de um processo como um todo.    

Assim fica nítido que é muito difícil se falar em paridade de armas e efetivação de todas as garantias processuais numa situação em que uma das partes demanda utilizando-se do jus postulandi direto com seu adversário na lide, que está amparado por um advogado devidamente preparado e que conhece bem das normas, procedimentos, ritos processuais e estando munido de provas e argumentos contundentes. Ou seja, ao passo que o jus postulandi concede maior acesso à justiça, acaba mitigando determinados aspectos fundamentais do direito de acesso à justiça, levando-se em consideração a condição de extrema desigualdade em que a parte pode se colocar criando de certa forma, um nível muito grande de desigualdade entre as partes envolvidas, tornando desproporcional o processo judicial que tem como escopo ser justo, igual, proporcional e alcançar o ideal de paridade de armas. (PORTELA 2018) 

Cumpre ainda destacar posicionamento semelhante em que Cavazzani (2017), remete ao fato da não obrigatoriedade de acompanhamento por advogado nas causas de valor até 20 salários-mínimos, pois dessa forma, segundo o autor, essa falta de obrigatoriedade nos juizados especiais já não promove acesso à justiça. Tal argumento se perfaz em alguns dos fatos já citados acima por outros autores como, que a paridade de armas só pode ser alcançada quando ambas as partes estão devidamente representadas, pois segundo o mencionado autor, se o advogado é indispensável à administração da justiça conforme art. 133 da Constituição federal de 1988, a previsão do artigo 9º da Lei nº 9.099/95 é inconstitucional, por mais que o Supremo Tribunal Federal assim declare. 

Desse modo, ainda para o autor deveria ser considerado inconstitucional todo ato normativo que afastasse a necessidade da assistência de um advogado em um processo, tanto para processos administrativos quanto para processos judiciais, incluindo também os juizados especiais, por ser inconcebível o desenvolvimento de um processo sem a presença de um advogado habilitado, pois é ele quem vai garantir fazer valer o direito da parte, buscando a justiça processual de forma adequada como demanda as normas e ritos processuais. Logo, tal situação se agrava quando de um lado do polo ativo temos uma parte desacompanhada e por outro lado temos um órgão do poder público no polo passivo, o qual está devidamente representado por um procurador, que detém conhecimentos específicos e está habituado a lidar com demais demandas processuais e esses fatos, afastam dos juizados especiais, o princípio da paridade de armas, tornando injusto o que deveria ser uma forma de acesso e garantia a justiça.         

 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Resta claro que os juizados especiais foram criados no intuito de cumprir com princípios e direitos fundamentais positivados na Constituição brasileira ao buscar maior acesso à justiça bem como à celeridade processual. É louvável, no entanto, que tal busca apresenta ao longo dos anos reflexos negativos, no que tange a dispensabilidade da figura do advogado no momento da postulação da ação em causas que não ultrapassam 20 salários-mínimos. 

O jus postulandi é um instituto fortemente confrontado pela doutrina pelo fato de que para a postulação em juízo é indispensável a presença do advogado, mesmo tal instituto estando de acordo com a constituição que buscou com este princípio que a população menos favorecida economicamente também tivesse acesso à justiça.

Essa capacidade postulatória atribuída a população que necessita da tutela jurisdicional, apresenta alguns obstáculos para se alcançar alguns princípios fundamentais de forma plena, pois na prática resta demonstrado que essa falta de capacidade técnica coloca em desvantagem a parte desacompanhada, impossibilitando assim, a paridade de armas na lide.

De certa forma, essa desvantagem resulta com que a parte sem assistência fique impossibilitada de exercer o contraditório e a ampla defesa, ou seja, fica nítido que é necessário ter ao menos alguns conhecimentos técnicos e jurídicos a respeito do ordenamento jurídico, sobre os atos e os ritos processuais. É necessário muito mais do que apenas a distribuição das ações nos setores de atermação dos juizados, é necessário conhecimentos específicos a fim de garantir o verdadeiro acesso à justiça, de forma, que ambos os polos processuais estejam em par de igualdade, pois só assim teremos cumprido os objetivos constitucionais da devida prestação jurisdicional à sociedade.   

Não obstante, os conhecimentos que um advogado adquire ao longo de sua formação acadêmica e sua experiência advogando não pode ser comparada ao nível de conhecimento de uma parte inexperiente sobre os atos processuais. Essa falta de conhecimento técnico pode impossibilitar, ou dificultar a solução dos problemas, além da linguagem complexa utilizada no meio processual, que por vezes também dificulta o entendimento do que se passa naquele momento da ação.  

Por fim, como foi percebido com essa pesquisa, a condução pelo processo deve ser tomada de forma que haja paridade entre as partes litigantes, para que seja alcançado um processo justo, e baseado em princípios garantidores constitucionais.

Ressalta-se ainda que, pelo princípio da paridade de armas não significa que haverá similitude entre os deveres e obrigações das partes e sim um equilíbrio das forças processuais, ou seja, ambas as partes terão as mesmas condições de apontarem seus direitos. No entanto, o instituto do jus postulandi vai em desencontro com o objetivo de igualdade processual, pois nada adianta ter acesso à justiça sem a devida prestação jurisdicional.

Em suma, é necessário que os operadores dos juizados especiais estabeleçam formas de uma prestação jurisdicional mais sensível à população que não possui condições de estar devidamente acompanhada por um advogado. É necessário que tanto servidores como juízes e estagiários proporcionem informações claras a respeito das consequências do ajuizamento de ações sem representação. Além de do fato de que é necessário também que o Estado proporcione a essa parcela da sociedade mais vulnerável, maior suporte técnico em relação às ações ajuizadas para que não seja apenas um mero acesso à justiça e sim uma justiça eficaz e efetiva a todas as pessoas. 

 

 REFERÊNCIAS 

 

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Paulo: Saraiva, 2001. v.1

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CAVAZZANI, Ricardo Duarte. Artigo Online. Acesso à justiça e competência absoluta dos juizados especiais federais cíveis: inconstitucionalidades a partir do §3º do artigo 3º da Lei N. 10.259/01. Elaborado em: 2017. http://abdconst.com.br/anais-civil/Ricardo%20Duarte%20Cavazzani.pdf . Acessado em: 25/04/2021 

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TUCCI, Rogério Lauria. Manual do Juizado Especial de Pequenas Causas: anotações à Lei7.244, de 7-11-1984. São Paulo: Editora Saraiva, 1985.

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