Resumo
O presente trabalho apresenta uma síntese dos fatos que deram origem ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos, analisando os Direitos e Deveres assegurados, juntamente com a criação da Comissão e da Corte, explanando sobre o método de provocar, a legitimidade de petição e as competências. São apuradas também as formas de análises de casos e seus relatórios emanados.
Demonstraremos a importância desses órgãos e a necessidade de que seja mantida vigilância constante sobre os países integrantes e atualização constante para que se possa garantir os preceitos fundamentais inerentes ao ser humano no contexto moderno e globalizado em que vivemos.
Palavras-chave: Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Direitos Humanos. Corte interamericana de Direitos Humanos. Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
Abstract
The present work presents a synthesis of the facts that gave rise to the Inter-American Human Rights System, analyzing the Rights and Duties ensured, together with the creation of the Commission and the Court, explaining about the method of provoking, the legitimacy of the petition and the competences. The forms of analysis of cases and their reports are also investigated.
We will demonstrate the importance of these bodies and the need for constant vigilance over the member countries and constant updating in order to guarantee the fundamental precepts inherent to human beings in the modern and globalized context in which we live.
Keywords: Inter-American Human Rights System. Human rights. Inter-American Court of Human Rights. Inter-American Commission on Human Rights.
INTRODUÇÃO
Quando se começou a pensar em Direitos Humanos, o real objetivo era de limitar o poder do Estado, e não proteger de fato os cidadãos como nos propomos a fazer hoje em dia, conforme demonstrado na Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão, no entanto esse pensamento. Ao fim da Segunda Grande Guerra, governantes começaram a se conscientizar de que os Direitos Fundamentais deveriam ser garantidos e preservados para que as graves atrocidades como as que ocorreram não sejam cometidas novamente.
Essas mudanças colocaram o ser humano em posição de destaque, reconhecendo de forma contundente a necessidade de constante vigilância acerca dos direitos fundamentais inerentes a todo ser humano, sejam eles direito a personalidade, a dignidade e até o de se expressar. Como afirma a constituição americana, o homem tem direito à busca da felicidade, portanto, a liberdade de pensar, buscar seu caminho fazendo suas próprias escolhas, se torna o foco do bem tutelado nessas cartas e convenções acordadas entre os países.
No Brasil, a Constituição de 1988 trouxe vários avanços na proteção, como o princípio da dignidade da pessoa humana, a liberdade e a saúde, alguns desses já existiam em Constituições anteriores, porém eram modestos e precisavam de atualização ou adequação aos tempos atuais. Posteriormente foram adicionados o racismo como crime imprescritível e a orientação para preservação da cultura indígena, dentre outros.
Todas essas diretrizes foram discutidas na OEA, o que culminou, dentre outros, com o Pacto de San Jose da Costa Rica, que cria a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, conforme verificaremos a seguir.
CRIAÇÃO DO SISTEMA INTERAMERICANO
Após as várias guerras e atrocidades realizadas, que constantemente ceifavam a vida de inocentes em todas as partes do mundo, sentiu-se necessidade de uma regulamentação a nível internacional das garantias fundamentais da pessoa humana. Aos poucos foram sendo criados órgãos internacionais de proteção e garantias. Esses órgãos passaram por grandes mudanças e atualizações para que chegássemos ao conceito de Direitos e Deveres do Homem que temos atualmente, sempre buscando a dignidade e respeito à vida e a seus preceitos fundamentais. Os direitos humanos consistem em um conjunto de direitos considerado indispensável para uma vida humana pautada na liberdade, igualdade e dignidade. Os direitos humanos são os direitos essenciais e indispensáveis à vida digna. (de Carvalho Ramos, André, 2017, p. 13).
Existem vários sistemas que tratam as garantias fundamentais e dos direitos humanos, são divididos entre: O sistema Universal, chamado também de “Sistema Onusiano”, que é um sistema global, ou seja, compreende todo o território do globo, e os sistemas Regionais, que são divididos por regiões do globo. É válido ressaltas que os órgãos são autônomos entre si.
O sistema interamericano de proteção de direitos humanos foi criado em 1948, com a aprovação da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, e seu primeiro documento é a Carta da OEA, datada de 30/04/1948. Contudo, apenas em 1969 é criada a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, e após o Pacto de San José da Costa Rica é fundada a Corte Interamericana de Direitos Humanos, embora tenha entrado em vigor apenas no ano de 1978, pois era requerido que pelo menos 11 Estados Membros aderissem ao Pacto para que o mesmo entrasse em vigor, o que aconteceu neste ano.
A carta da OEA, criou várias estruturas e mecanismos para viabilizar a garantia do respeito e proteção dos direitos humanos, assim como a proteção ao direito à educação, à igualdade, ao direito econômico, entre outros, e/ou evitar que esses direitos sejam violados.
A Declaração trouxe, portanto, uma importante inovação no contexto dos direitos humanos. A conjugação dos direitos civis e políticos aos direitos econômicos, culturais e sociais fez com que a fruição de um estivesse atrelada à do outro, consolidando, portanto, a concepção contemporânea de direitos humanos que os define como uma unidade interdependente e indivisível. (AMOROSO GONÇALVES, TAMARA, 2013, p. 75).
O Sistemas de Direitos Humanos foram criados em diferentes sistemas jurídicos divididos territorialmente entre partes do globo, de forma que tratem os conflitos existentes em seu território, de acordo com a ótica e as características e peculiaridades de sua respectiva região global. Desse modo, os sistemas regionais e o sistema global se complementam de forma que o respeito aos direitos fundamentais sejam melhor compreendidos e aplicados.
Vem ocorrendo também, uma comunicação bastante ativa entre órgãos de sistemas regionais de diferentes territórios, de forma com que decisões ou sentenças prolatadas por um órgão possa ser utilizada para fundamentar a decisão de outro órgão, de forma que seja maximizada a capacidade de proteção aos indivíduos.
O Decreto n°678, de 6 de novembro de 1992, que promulga oficialmente no Brasil o ingresso no Pacto de San Jose da Costa Rica, possui 82 artigos, dos quais, os primeiros, cuidadosamente colocados, por sua importância, são os princípios e garantias fundamentais, tais como a liberdade de pensamento e expressão, a proteção da família, igualdade perante a Lei e direito à vida.
PACTO DE SAN JOSE DA COSTA RICA: COMISSÃO E CORTE
O Pacto de San Jose em sua segunda parte, que se situa à partir do artigo 33, elenca meios de proteção aos direitos já expressados na primeira parte. Estabelecendo a criação de dois órgãos internacionais: Comissão e da Corte Interamericanas de Direitos Humanos, das quais discorreremos a seguir:
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos:
- Sediada em Washington DC (EUA);
- É um órgão que representa os Estados membros;
- Possui 7(sete), que recebem mandatos de 4(quatro anos).
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, possui natureza executiva, ou seja, é encarregada de realizar visitas a países para observar ou investigar situações, estimular a consciência dos direitos humanos, fazer recomendações a Estados membros da OEA, receber e analisar petições que denunciam possíveis violações dos direitos humanos.
De acordo com o artigo 44, qualquer pessoa, grupo de pessoas, entidades não governamentais legalmente reconhecidas, grupo de Estados, entre outros, podem denunciar violações praticadas por um Estado-membro.
É importante frisar, que um dos requisitos de admissibilidade da Corte é que todas as medidas judicias domésticas no Estado que está cometendo a suposta infração sejam ineficazes. Deverão ser elencados os direitos violados (civis, políticos ou sociais).
Após aceita a admissibilidade da petição será dado um prazo de 90 a 180 dias para o Estado membro apresentar provas, fatos ou argumentos dos quais decida ser necessários para a compreensão do fato.
Após a análise das argumentações e das provas, a comissão deliberará na forma de recomendações ao estado envolvido, ou tentar encontrar uma solução amigável.
Em caso de infrutíferas as soluções na via da Comissão, a CIDH poderá remeter, por iniciativa própria ou à pedido de uma das partes, o caso à Corte Interamericana para dirimir o litígio.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos:
- Está sediada em San José (Costa Rica);
- Possui 7(sete) Juízes, com mandatos de 6(seis)anos.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos, possui fundamentalmente natureza judicial, ou seja, poderá julgar e proferir sentença, que será irrecorrível. Além disso possui algumas peculiaridades e restrições principalmente a quem pode peticionar a Corte.
Como já sabemos, a Corte só tem jurisdição perante os Estados que tenham ratificado a Convenção de Direitos Humanos e aceitado a jurisdição facultativa da corte, além de necessária a finalização do caso perante a Comissão. Perante a Corte, não se pode, um indivíduo, protocolar uma petição, tendo essa prerrogativa apenas um Estado-membro ou a Comissão de Direitos Humanos.
O procedimento possui os ritos semelhantes a um julgamento comum, possuindo memoriais, defesa oral, e diligencias para elucidação possíveis dúvidas que possam vir a surgir no decorrer do procedimento.
Visto isso, a corte poderá deliberar o pagamento de multas, o ajustamento da conduta, no entanto não poderá ordenar sanções punitivas, tais como a prisão.
BRASIL: CASOS EMBLEMÁTICOS
Até a data de envio deste artigo, o Brasil possui 9(nove) condenações na Corte Interamericana de Direitos Humanos das quais 5(cinco) a Justiça Global faz parte, por diversos motivos e situações, no entanto, a mais popularmente conhecida ainda é o caso Vladimir Herzog, na qual o jornalista foi torturado e morto. São os casos:
- Caso Ximenes Lopes v. Brasil – sentença de 4 de julho de 2006.
O referido caso trata dos maus tratos e assassinato do Senhor Damião Ximenes Lopes, senhor de idade que apresentava quadro de condição mental depressiva, que ao ser internado foi gravemente exposto a situações desumanas, degradantes e humilhantes na Casa de Repouso Guararapes no ceará.
- Caso Escher e outros V. Brasil – sentença de 6 de julho de 2009.
Esse caso se deu a partir do monitoramento ilegal(sem autorização) de linhas telefônicas de líderes de organizações sociais ligadas ao Movimento dos Sem Terra(MST) e posteriormente sua divulgação de determinados trechos de forma que tal divulgação denegrisse a imagem dos envolvidos.
- Caso Garibaldi Vs. Brasil – sentença de 23 de setembro de 2009.
Trata-se de um caso levado à Corte no qual o Senhor Sétimo Garibaldi foi morto em uma tentativa de despejo de famílias sem-terra que ocupavam uma fazenda no interior do estado do Paraná, mais precisamente na cidade de Querência do Norte. Tal fato ocorreu em 27 de novembro de 1998.
- Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) Vs. Brasil – sentença de 24 de novembro de 2010.
Teve sua base processual no desaparecimento e tortura de 62 membros da Guerrilha do Araguaia, movimento que se dedicava ao combate à Ditaduta. Guilherme Gomes Lund foi um estudante que organizou e mobilizou pessoas para participar do movimento da Guerrilha contra a Ditadura instaurada no Brasil em 1964.
- Caso Trabalhadores da Fazenda Verde Verde Vs. Brasil – sentença de 20 de outubro de 2016.
Para ser proferida a sentença neste caso, demorou-se 3 anos deste a postura da ação. Trata-se da primeira condenação sobre esse tema. Caso ocorreu após uma fiscalização do Ministério Público do trabalho que ao adentrar a Fazenda Verde Verde, no interior do Pará, constatou o trabalho escrevo de mais de 300 trabalhadores entre os anos de 1997 a 200, o que culminou com uma grande ação onde o Estado Brasileiro foi considerado cúmplice.
- Caso Favela Nova Brasília Vs. Brasil – sentença de 16 de fevereiro de 2017.
Processo originado a partir de duas chacinas ocorridas entre 1994 e 1995 na comunidade Nova Brasília, situada no complexo do alemão, onde houveram denúncias de tortura e estupros, além de 13 jovens mortos. Ao todo, o Brasil foi condenado a pagar indenização a 80 pessoas após ser acusado de violência policial.
- Caso Povo Indígena Xucuru e seus membros Vs. Brasil – sentença de 5 de fevereiro de 2018.
Deu-se com a violência sofrida pelos índios Xucuru, e pela perca de seru território, que havia sido demarcado pelo Governo Brasileiro, porém a demarcação não era cumprida, tendo até havido sentença excluindo a terra que já havia sido delimitada. Além de tudo, ainda houveram muitos problemas no processo de desintrusão dos não indígenas.
- Caso Herzog e outros Vs. Brasil – sentença de 15 de março de 2018.
Vladimir Herzog era um jornalista da TV Cultura, que foi intimado a comparecer à sede do DOI, em 1975, órgão utilizado para reprimir grupos contra a ditadura. O jornalista foi preso, torturado e morto em interrogatório, tendo ido espontaneamente à sede do órgão. Neste caso o Brasil foi condenado a reabrir a investigação para se apurar os fatos, visto que a Lei da anistia, de 1979 havia beneficiado os supostos assassinos. A sentença tratou da investigação sobre o caso, e não da condenação dos envolvidos, visto que uma Lei existente já os tinha livrado de sansões.
- Caso dos Empregados da Fábrica de Fogos de Santo Antônio de Jesus Vs. Brasil – sentença de 15 de fevereiro de 2020.
Condenação mais recente no momento, trata-se de uma explosão que houve em uma fazenda chamada Joeirana, zona rural da Bahia, matando 64 pessoas no dia 11 de dezembro de 1998, acontece que a situação degradante na qual viviam as vítimas, as obrigavam a trabalhar por valores ínfimos, e as submetia há situações completamente perigosas e insalubres. Os donos da fábrica foram condenados por diversos crimes, pois a investigação mostrou que eles tinham ciência do perigo aos quais os funcionários corriam e negligenciaram todas as exigências.
Bibliografia
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