A EPIDEMIA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA AS MULHERES NO BRASIL

27/06/2021 às 15:00
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Texto sobre os autos índices de violência doméstica e familiar contra mulheres no Brasil

A violência intrafamiliar sempre se beneficiou da imunidade que fora dispensada por todos os países ao grupo familiar, onde este, por ser a célula mater da sociedade, deveria ser protegido de indevidas ingerências dos órgãos governamentais, garantindo assim a proteção da família.

Dessa forma, a violência que sempre existiu na família, e que sempre ocorreu com uma certa frequência, encontrou um terreno fértil para existir, se desenvolver e até crescer em número de casos e na gravidade dos eventos criminosos que ocorriam, sempre baseados em valores  patriarcais de domínio do homem sobre a mulher.

É bom que, desde já, definamos o que seria violência intrafamiliar, sendo esta a violência praticada entre indivíduos que fazem parte do mesmo grupo familiar, existindo diversas espécies dessa violência, entre elas: a violência contra a mulher, os maus-tratos infantis ou violência contra crianças e adolescentes, a violência contra idosos, e a violência filio parental que é aquela onde os filhos praticam violência contra seus pais ou responsáveis.

No Brasil, dentre tais violências, a que mais se destaca é a violência doméstica e familiar contra as mulheres onde a ONG de direitos humanos Human Rights Watch afirmou categoricamente: o Brasil vive uma epidemia de violência doméstica.

Segundo os números trazidos pela citada organização fica destacada a situação de violência generalizada contra as mulheres no país, e que várias agressões por estas sofridas não são devidamente investigadas pelos órgãos policiais, gerando impunidade e fomentando a continuidade desse tipo de comportamento, que, por vezes, segue uma escalada no nível de violência culminando no homicídio de mulheres.

 Só para se ter uma ideia, em 2017 haviam 1,2 milhão de processos de violência doméstica pendentes de julgamento no judiciário brasileiro, e enquanto tais processos se acumulam nas mesas de juízes e promotores públicos, as mulheres vivem uma rotina marcada pela violência e medo.

Em 2017 houveram 4.539 homicídios cujas vítimas foram mulheres, sendo que desse total 1.133 foram apontados como feminicídio, que segundo a legislação brasileira ocorre quando a mulher é vítima de homicídio e este é motivado pelo gênero da vítima (no caso mulher) ou o crime ocorreu em circunstância de violência doméstica ou familiar.

Nesse sentido afirma o código penal brasileiro.

Homicídio simples

Art. 121. Matar alguém:

Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

Homicídio qualificado

§ 2º Se o homicídio é cometido:

Feminicídio      

VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino:  

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

§ 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:   

I - violência doméstica e familiar;    

II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher. 

Apesar do citado número de feminicídios a já mencionada ONG afirmou que existem indícios de subnotificação desse tipo de crime contra as mulheres, com base na diferença gritante entre homicídios com vítimas mulheres e os que foram indicados como feminicídio, o que torna perigosa a situação de repressão a esse tipo de delito no Brasil, posto que a subnotificação poderá ter um efeito negativo na prevenção e repressão da citada conduta criminosa.

O que deixa mais delicada a situação desses casos de violência é que no Brasil, em 2017, apenas 12 mil dos 64 mil homicídios que ocorreram naquele ano foram processados pelo Ministério Público, deixando evidente que a grande maioria dos crimes contra a vida no Brasil não são solucionados nem muito menos processados, e no caso da violência letal contra mulheres isso não é uma exceção.

No que concerne à agressão física contra mulheres, os dados oficiais apontam que aproximadamente 1,3 milhão de mulheres são vítimas de agressões físicas no Brasil por ano, muito embora tais números não levem em conta casos que não são denunciados (a chamada cifra negra do crime).

O Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) realizou uma pesquisa para avaliar o impacto da violência familiar na atividade econômica, essa pesquisa permitiu que chegássemos a uma ideia de algumas características da violência doméstica no Brasil, se constatando que é três vezes mais provável que uma mulher seja agredida que um homem em nosso país, sendo que em 43,1% dos casos em que a mulher é vítima de violência o delito ocorre na casa da mesma, contra 36,7% onde a violência contra a mulher ocorre em vias públicas.

Se analisarmos a relação da vítima com o agressor (conforme a pesquisa do IPEA) em 32,2% dos casos a vítima conhecia o seu agressor, contra 29,1% de casos em que a vítima não conhecia o agressor, mas o que chama a atenção é que em 25,9% dos casos em que a mulher sofre violência o agressor é um cônjuge ou ex-cônjuge da mesma.

Esses números deixam muito evidente que, em primeiro lugar, a mulher brasileira não tem em seu lar um lugar de estabilidade e segurança, e que a mesma não está segura entre os membros de sua própria família, notadamente seu cônjuge, uma pessoa que deveria lhe destinar afeto e proteção, quando na verdade o mesmo é um potencial e comum agressor da mesma. Esses dados contrariam toda a crença popular de que a família (como instituição social) e a casa (como espaço físico para viver e se desenvolver) são locais seguros para as mulheres, pois, na verdade, estes se mostram extremamente perigosos para as mulheres brasileiras.

Segundo ainda o estudo do IPEA, a maioria das mulheres que sofrem violência doméstica estão integradas ao mercado de trabalho, se constatando que 52,2% das mulheres que estão ativas no mercado de trabalho, segundo a citada pesquisa, sofrem violência doméstica, contra 24,9% que sofrem violência doméstica e não são ativas no mercado de trabalho, a pesquisa evidencia que existe uma relação complexa entre a participação da mulher no mercado de trabalho e o fato da mesma coabitar ou não com seu cônjuge na gênese da violência doméstica.

Embora a pesquisa indique que mulheres que são ativas no mercado de trabalho e que coabitam com o seu cônjuge possuem certa independência financeira do marido e acabam ganhando um poder de barganha junto ao parceiro pela contribuição da mesma na renda familiar, diminuindo a violência conjugal em alguns casos, a pesquisa deixa claro que em vários casos a permanência da mulher no mercado de trabalho acaba estimulando a violência, posto que a mulher exerce uma função que vai de encontro aos valores patriarcais ainda imperantes no Brasil, o que acaba levando à prática de violência contra a mesma.

Dessa forma, essa pesquisa deixa clara a complexidade do problema ora tratado, posto que apenas a independência econômica da mulher não é o bastante para superar a violência doméstica que as mulheres sofrem, sendo necessário outras políticas públicas para vencer esse problema, que tem uma raiz eminentemente cultural.

Nesse sentido afirma o Instituto de Pesquisa Econômica aplicada (2019):

A pesquisa analisa os dados à luz de teorias feministas de patriarcado e gênero e da racionalidade econômica. Uma das conclusões é que o empoderamento econômico da mulher, a partir do trabalho fora de casa e da diminuição das discrepâncias salariais, não se mostra suficiente para superar a desigualdade de gênero geradora de violência no Brasil. Outras políticas públicas se fazem necessárias, como o investimento em produção e consolidação de bases de dados qualificados sobre a questão, o aperfeiçoamento da Lei Maria da Penha e intervenções no campo educacional para maior conscientização e respeito às diferenças de gênero.

Outra pesquisa realizada pelo Instituto Data Folha por solicitação da ONG Fórum Brasileiro de Segurança Pública informa que no ano de 2018 cerca de 1,6 milhão de mulheres foram vítimas de algum tipo de agressão física, e que aproximadamente 20 milhões de mulheres brasileiras (37,1% do total de mulheres do Brasil) sofreram algum tipo de assédio. Das mulheres vítimas de violência 42% afirmaram que a violência ocorreu no ambiente doméstico, e 52% das mulheres não denunciaram a violência sofrida.

Nesse sentido a jornalista Franco (2019) comentando a citada pesquisa do Data Folha indicou que a maioria das vítimas de violência doméstica é uma mulher negra ou parda, comumente jovem e o agressor conhecia a vítima, nos seguintes termos:

Os novos dados corroboram o que outras pesquisas já mostravam. Grande parte das mulheres que sofreram violência dizem que o agressor era alguém conhecido (76,4%). Mulheres pretas e pardas são mais vitimadas do que as brancas; as jovens, mais do que as mais velhas.

Esses números gritantes de violência contra a mulher também fizeram que esse problema se tornasse um caso de saúde pública, superando a mera repercussão na seara da segurança pública e do direito penal, tendo em vista que esse tipo de violência tem trazido diversos problemas à saúde das vítimas, não apenas problemas físicos decorrentes das lesões corporais sofridas pelas mesmas, mas também problemas de cunho psicológico, existindo estudos qualitativos que indicam que existe uma grande relação entre a violência doméstica e práticas de suicídio cometidos por mulheres, bem como quadros de depressão, fobias, pesadelos, crises de angustia, psicoses, medos de relações sexuais, dentre outras (Cupertino et al, 2007).

Vale salientar que os filhos do casal que mantém essa dinâmica de violência doméstica também sofrem danos desse tipo de violência, sendo, de fato, vítimas indiretas da violência doméstica e familiar contra as mulheres, onde essas crianças podem apresentar sintomas de ansiedade, depressão, baixa autoestima, comportamento agressivo, problemas nas relações sociais e baixo desempenho escolar.

Essa realidade de violência sistêmica contra as mulheres brasileiras sempre foi uma realidade no Brasil, razão pela qual em 2006 fora promulgada a Lei 11.340, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, que visa enfrentar o problema da violência doméstica e familiar contra as mulheres.

A lei é conhecida como Lei Maria da Penha em alusão a Maria da Penha Maia Fernandes que sofreu duas tentativas de homicídio praticadas pelo seu marido, vindo a mesma a ficar paraplégica após sofrer um disparo de arma de fogo em umas das tentativas que sofreu. Maria da Penha levou mais de 19 anos para ver o agressor preso e hoje a mesma dedica sua vida a defender os direitos das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar.

Passemos agora a analisar alguns aspectos da citada lei, começando pelo seu artigo 5º que deixa claro o sentido de proteção integral à mulher afirmando que tal legislação se aplica a violência praticada por qualquer pessoa que tenha algum vínculo familiar com a vítima (mulher), seja esse vínculo consanguíneo ou afetivo, como irmãos, tios, pais, filhos, enteados, sogros, dentre outros, se aplica, igualmente, à violência praticada na residência da vítima, bem como à violência praticada por qualquer pessoa que mantenha ou tenha mantido relacionamentos amorosos com a mulher, independentemente de ter ou não coabitado com a mesma, punindo igualmente cônjuges, ex-cônjuges, namorados e noivos.

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Uma importante inovação dessa legislação, e bastante pertinente ao enfrentamento da violência doméstica contra a mulher, é previsto no paragrafo único do artigo 5º, que estabelece que essa lei é aplicada independentemente da orientação sexual da mulher, contemplando mulheres que possuem orientação homossexual, bem como transexuais, garantindo a todas as mulheres as prerrogativas de proteção previstas na citada lei caso a mesma seja vítima de violência praticada pela sua companheira.

Outra inovação importante dessa legislação, sob o ponto de vista penal, fora criar uma tipologia legal dos tipos de violência doméstica, sendo estas classificadas como: violência física que consiste em toda ação que ofenda a integridade física ou saúde da mulher; violência psicológica que seria qualquer conduta que venha a causar à mulher um dano emocional, diminuição de autoestima, prejuízo ou perturbação do desenvolvimento da mesma, degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças ou decisões por meio de ameaças, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à saúde psicológica ou a autodeterminação; violência sexual que consiste em obrigar a vítima a presenciar, manter ou participar de uma prática sexual não desejada, fazendo uso de violência ou intimidação; a violência patrimonial definida como qualquer ação de retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; e a violência moral que consiste na prática de calunias, difamações e injúrias contra a mulher.

A citada lei também inovou na legislação brasileira ao trazer medidas protetivas que visam resguardar a segurança pessoal da vítima, dentre elas a proibição do agressor de se aproximar da vítima até uma distância mínima, a possibilidade do juiz determinar o afastamento do agressor da residência do casal, a proibição do agressor de manter contato com a vítima por qualquer meio possível, dentre outras medidas.

Contudo, a citada legislação vai muito além da mera busca de punição penal para os perpetradores da violência doméstica e familiar, sendo um verdadeiro instrumento de políticas públicas com vistas a enfrentar de maneira qualificada a violência contra as mulheres.

Assim a citada legislação traça diversas diretrizes a serem seguidas tanto pelos órgãos de controle social formal (Polícia, Ministério Público e Judiciário) como para os órgãos de assistência social, conclamando todos os entes federados da república brasileira a colaborar com o enfrentamento desse tipo de violência. Ela prevê uma série de medidas assistenciais à mulher, como abrigamento da mesma e seus filhos, e tratamento/ acompanhamento psicológico com vistas a tratar os danos de cunho psicológico advindos da violência sofrida pela vítima.

Embora a citada legislação seja uma clara evolução no tratamento jurídico e repressão criminal da violência doméstica e familiar que as mulheres sofrem, e talvez uma das legislações protetivas dos direitos das mulheres mais avançadas do mundo, o que explica que hoje, após 14 anos da entrada em vigor da citada lei, existam números tão expressivos de violência contra a mulher?

A resposta é simples, a lei efetivamente é muito boa, mas é mal aplicada, é um escudo eficaz, mas que deixamos de lado quando vamos batalhar pela segurança de nossas mulheres.

Falamos isso com a propriedade de quem exerce as funções de polícia judiciária do Estado de Pernambuco. Não foram poucas as vezes em que flagramos agentes de segurança pública, tanto policiais militares como civis, simplesmente distratando as vítimas de violência doméstica. Chega a ser espantoso que uma vítima que sofreu violência em sua residência, ao tentar se socorrer em um órgão do estado acabe sofrendo novamente uma violência oriunda de agentes que deveriam protege-la, o que demonstra desconhecimento da já mencionada legislação protetiva e um completo despreparo para lidar com a violência doméstica e familiar contra as mulheres.

Em uma ocasião nós testemunhamos uma mulher vítima de violência psicológica, onde a mesma vinha constantemente sendo ameaçada pelo marido, e ao conseguir superar o medo e ir a uma delegacia de polícia denunciar o esposo, esta foi atendida por um delegado de polícia que disse à mesma: “a senhora tem que ter testemunhas da ameaça, porque se não tiver a senhora é que vai ser processada”. Ora grande parte da violência doméstica contra as mulheres, e isso nós vemos na pesquisa do IPEA, ocorre dentro da casa da vítima, muitas vezes o fato se dá em uma ocasião onde só estão na residência a vítima e o agressor. O que devemos fazer? Ser omissos e aguardar que o quadro de violência se agrave, para um feminicídio, por exemplo, pois assim teremos a prova indiscutível da materialidade? Isso é absurdo, para dizer o mínimo, é dever de todos os agentes públicos responsáveis pelo enfrentamento desse tipo de violência auxiliar as mulheres que buscam socorro em tais órgãos, e não sobrevitimizar a mesma. No Brasil, em casos de estupros sempre foi comum se dar maior valor probatório ao depoimento da vítima, posto que, comumente, apenas ela e o agressor testemunharam o delito ocorrido, sendo plenamente possível que no caso de violência doméstica seja dado, igualmente, maior valor probatório ao depoimento da vítima, o que já tem sido muito bem aceito pelos órgãos judiciais brasileiros.

Mas o mau uso da lei Maria da Penha se alarga pelo judiciário também, pois este não julga os casos de violência doméstica em tempo hábil, negando o direito de toda mulher vítima de violência doméstica a um razoável tempo de ter sua lide solucionada. Em muitos casos até o simples deferimento por parte dos juízes das medidas protetivas que, segundo o citado diploma legal, deveriam ser apreciadas em 48 horas, acaba demorando semanas para uma manifestação judicial, o que faz com que a violência doméstica persista e até se agrave, enquanto se aguarda o provimento dessa demanda.

Na verdade tais ações tanto dos agressores como de membros de órgãos estatais que deveriam proteger as mulheres se deve a uma cultura machista e misógina que se encontra arraigada na população brasileira, que acha completamente normal a desigualdade na relação entre homens e mulheres, onde é dado aos homens um direito quase que sagrado de dominar e controlar suas parceiras, devendo as mesmas simplesmente obedecer, sob pena de serem violentadas em sua integridade física e psíquica.

Parece que ainda vivemos sob a égide do antigo ditado popular: “em briga de marido e mulher, não se mete a colher”. Na verdade passou da hora de metermos a colher, as algemas e o rigor da lei nesse tipo de violência, mas enquanto não promovermos debates públicos na tentativa de mudar nossa cultura que acha normal esse tipo de violência de nada adiantará possuirmos uma boa legislação.

Nesse sentido afirma Araújo (2019) em um artigo acerca do fracasso da lei Maria da Penha:

Há algo muito grave e fora de controle quando uma nação assiste impotente ao extermínio sistemático de suas mulheres sem que os machos assassinos se abalem em sua selvageria, covardia e sensação de impunidade.

Que a mão da Justiça seja cada vez mais pesada e implacável. Mas que nossa consciência jamais ignore que só leis não bastam. A Lei Maria da Penha não basta. Novas leis, mais duras, não bastam.

Leis não funcionam contra uma cultura machista, misógina, falocrata, violenta e arraigada de forma perversa e extremamente visível. Levaremos anos até que cada homem brasileiro se sintam apedrejado, violentado, agredido e eliminado fisicamente cada vez que ousar pensar em agredir uma pessoa apenas porque ela é mulher.

Dessa forma, acreditamos que sem a promoção de debates públicos sobre a violência contra a mulher, principalmente em escolas primárias, fundamentais e de ensino médio, com vistas a conscientizar as pessoas desde jovens acerca do que seria a violência doméstica, como preveni-la e onde buscar ajuda, não será possível solucionar o problema ora tratado. Essas são medidas de suma importância para tentar mudar nossa “cultura” de violência contra a mulher, visando prevenir os casos, bem como mostrar o caminho de repressão desse tipo de violência.

É preciso que deixemos claro para a nossa sociedade que a violência doméstica não é um caminho aceitável, que não é normal que a mulher aceite os maus tratos, bem como que o homem faça uso da violência para garantir sua dominação sobre a mulher, afinal estamos falando de seres humanos e não de propriedades dos homens, homens e mulheres devem ser tratados de forma igualitária.

A independência financeira das mulheres é importante sim, mas não é tudo, se não trouxermos uma mudança efetiva na forma como vemos nossas mulheres, onde estas devem ser vistas como seres que merecem todo o respeito e dignidade.

O melhor preparo dos policiais para um melhor atendimento aos casos de violência doméstica e familiar, com vistas a evitar uma vitimização secundária, é de fundamental importância para uma proteção imediata da vítima de violência, seguida por uma melhor estrutura judicial e do Ministério Público com a criação de Varas e grupos especializados para denunciar e julgar os casos de violência doméstica, o que trará maior agilidade para um deslinde das causas de violência contra as mulheres.

Outra medida que deve ser contemplada é o acompanhamento psicológico do agressor, para que este trabalhe com um especialista os fatores que o levaram a praticar esse tipo de violência, e como o mesmo pode modificar o seu comportamento, fazendo este entender todos os efeitos nocivos que seu comportamento traz para a vítima da violência, os filhos do casal e o próprio agressor, e assim reabilitar o mesmo para o convívio afetivo e evitar que futuramente este use da violência como modo de convívio em sua família.

Dessa forma, as estatísticas deixam claro que apenas o tratamento penal mais rigoroso não é suficiente para enfrentar essa verdadeira epidemia de violência doméstica contra a mulher no Brasil, sendo mais efetivo essa busca por uma mudança cultural na forma como vemos e tratamos nossas mulheres, com vistas a vencer o citado tipo de violência. Enfrentar a cultura de desigualdade de gênero e de dominação do homem sobre a mulher, que coisifica a mesma como mero patrimônio masculino é de fundamental importância para uma diminuição considerável dos casos de violência doméstica no Brasil.

BIBLIOGRAFIA:

1- Aun, H. (2017). Maria da Penha, uma mulher que sobreviveu na luta. 2017 Mar 8 [acesso em 2020 Mar. 23]. Disponível em: https://catracalivre.com.br/cidadania/maria-da-penha-uma-mulher-que-sobreviveu-na-luta/.

2- Araújo, M. A. (2019). Lei Maria da Penha fracassou: ela não protege a mulher. 2019 Mar 14 [acesso em 2020 Mar 22]. Disponível em: https://noticias.r7.com/prisma/r7-planalto/lei-maria-da-penha-fracassou-ela-nao-protege-a-mulher-14052019.

3- Balan, M. (2019). Violência contra a mulher: por que a lei, sozinha, não dá conta. 2019 Mar 8 [acesso em 2020 Mar 24]. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/justica/violencia-contra-a-mulher-por-que-a-lei-sozinha-nao-da-conta-6s031lw2ji1z7rt89dryhsh0l/.

4- Brasil vive “epidemia de violência doméstica”, aponta Humans Rights Watch (2019). 2019 Jan 18 [acesso em 2020 Mar. 22]. Disponível em: https://claudia.abril.com.br/sua-vida/brasil-vive-epidemia-de-violencia-domestica-aponta-human-rights-watch/.

5- Cupertino, F., Dourado E. M. R., Huçulak M., Mansano, R. H., Raggio A., Silva, J. F., et al (2007). Violência: uma epidemia silenciosa. [acesso em 2020 Mar 24]. Disponível em: https://www.conass.org.br/conassdocumenta/cd_15.pdf.

6- Ferrari, D. C. A. e Vecina T. C. C. (2002). O fim do silêncio na violência familiar: teoria e prática. São Paulo: Ágora. 

7- Franco, L. (2019). Violência contra a mulher: novos dados mostram que “não há lugar seguro no Brasil. 2019 Fev 26 [acesso em 2020 Mar 24]. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-47365503.

8- Human Rights Watch (2019). World report. [acesso em 2020 Mar 23]. Disponível em: https://www.hrw.org/sites/default/files/world_report_download/hrw_world_report_2019.pdf.

9- Instituto de pesquisa econômica aplicada (2019). Índice de violência doméstica é maior para mulheres economicamente ativas. 2019 Ago 19 [acesso em 2020 Mar. 21]. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=34977&catid=8&Itemid=6.

10- Muszkat, M. (2016). Violência familiar. São Paulo: Blucher.

Sobre o autor
Jonathan Dantas Pessoa

Policial civil do Estado de Pernambuco, formado em direito pela Universidade Osman da Costa Lins - UNIFACOL/ Vitória de Santo Antão. Pós - graduado em direito civil e processo civil pela Escola Superior de Advocacia Professor Ruy Antunes - ESA/OAB/PE - Recife/PE. Mestre em Psicologia Criminal com Especialização em Psicologia Forense pela Universidad Europea del Atlántico - Santander/ES. Pós graduado em Criminologia pela Faculdade Unyleya. Pós graduado em Psicologia Criminal Forense pelo Instituto Facuminas. Membro do Centre for Criminology Research - University of South Walles. Membro do Laboratório de estudos de Cognição e Justiça - Cogjus.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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