É devida indenização por lucros cessantes pelo período em que o imóvel objeto de contrato de locação permanecer indisponível para uso, após sua devolução pelo locatário em condições precárias?
Inicialmente, cumpre esclarecer que as perdas e danos abrangem o que efetivamente foi perdido, bem como o que era possível lucrar. Nesse sentido, “dano emergente” é tudo aquilo que pode ser comprovado como redução patrimonial (o que foi perdido), enquanto “lucros cessantes” é o acréscimo patrimonial que poderia ter sido alcançado caso não houvesse o impedimento causado pelo dano (o que era possível lucrar).
É o que determina o art. 402 do Código Civil:
Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.
Vale dizer que o enunciado prescritivo do regramento civil se aplica aos casos em que os danos (prejuízos) fiquem comprovados, exceto quando outra norma jurídica afastar sua incidência.
No caso das relações locatícias, regidas pela lei n° 8.245/91, é perfeitamente aplicável a regra do art. 402 do Código Civil.
É razoável a incidência de danos emergentes e lucros cessantes na hipótese de uso inadequado pelo locatário, que cause deterioração capaz de acarretar perda patrimonial e impeça a utilização do bem imóvel.
Vejamos o teor do informativo n° 693 do STJ:
Informativo n° 693: É devida indenização por lucros cessantes pelo período em que o imóvel objeto de contrato de locação permaneceu indisponível para uso, após sua devolução pelo locatário em condições precárias.
Esse foi o entendimento unanime da Terceira Turma do STJ no Resp. 1.919.208/MA, Rel. Min. Nancy Anrighi, 20/04/2021.
DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL URBANO. RESILIÇÃO. RESTITUIÇÃO DO BEM EM CONDIÇÕES PRECÁRIAS. LOCADOR QUE FOI INJUSTAMENTE PRIVADO DE SEU USO E GOZO. LUCROS CESSANTES. INDENIZAÇÃO DEVIDA. 1. Ação ajuizada em 29/04/2014. Recurso especial interposto em 09/04/2018 e concluso ao gabinete em 03/12/2020. 2. O propósito recursal consiste em dizer se é devida indenização por lucros cessantes pelo período em que o imóvel objeto de contrato de locação permaneceu indisponível para uso, após sua devolução pelo locatário em condições precárias. 3. Nos termos dos arts. 569 do CC/02 e 23 da Lei 8.245/91, incumbe ao locatário usar e gozar do bem locado de forma regular, tratando-o com o mesmo cuidado como se fosse seu e, finda a locação, restituí-lo ao locador no estado em que o recebeu, ressalvadas as deteriorações decorrentes do seu uso normal. 4. Recai sobre o locatário a responsabilidade pela deterioração anômala do bem, circunstância que autoriza o locador a exigir, para além da rescisão do ajuste, indenização por perdas e danos. 5. A determinação das perdas e danos está submetida ao princípio da reparação integral, de maneira que devem abranger tanto o desfalque efetivo e imediato no patrimônio do credor, como a perda patrimonial futura, a teor do disposto no art. 402 do CC/02. 6. Para além dos danos emergentes, a restituição do imóvel locado em situação de deterioração enseja o pagamento de indenização por lucros cessantes, pelo período em que o bem permaneceu indisponível para o locador. 7. A ausência de prova categórica de que o imóvel seria imediatamente locado a outrem se fosse devolvido pelo locatário em boas condições de uso não impede a caracterização dos lucros cessantes. A simples disponibilidade do bem para uso e gozo próprio, ou para qualquer outra destinação que pretendesse o locador, tem expressão econômica e integra a sua esfera patrimonial, que restou reduzida pelo ilícito contratual. 8. Recurso especial conhecido e provido. (STJ - REsp: 1919208 MA 2018/0336534-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/04/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/04/2021).
Destaca-se, por fim, que mesmo que o locador não prove a existência de potencial interessado em nova locação é possível a incidência de lucros cessantes pela ausência de disponibilidade do bem para o uso e gozo próprio ou qualquer outra pretensão do locador.
Na prática, para alcançar a perfeita incidência da norma jurídica do art.402 do Código Civil e ser indenizado pelos danos emergentes e lucros cessantes, é fundamental que se faça a análise do caso concreto considerando a integralidade do contrato de locação e todos os meios de prova que possam embasar a demanda reparatória.
Ubirajara Guimarães (@ugprofessor)