Posso mesmo perder minha propriedade para o Caseiro por Usucapião?

16/07/2021 às 22:31
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O fenômeno da INTERVERSÃO DA POSSE muda o caráter da posse e faz com que ela passe a possibilitar a aquisição do bem pela usucapião. Cuidado!

A posse exercida pelo CASEIRO não tem o condão para permitir o reconhecimento da Usucapião em nenhuma das suas modalidades - e isso certamente todos os colegas aprenderam ainda nos bancos da faculdade. Ensina a doutrina clássica e sempre por mim recomendada do ilustre Advogado e Desembargador Aposentado, Dr. BENEDITO SILVÉRIO RIBEIRO que:

"O exercício de fato sobre a coisa está em CONTRAPOSIÇÃO ao exercício de direito, não bastando o elemento material (corpus), sendo mister a sua detenção física, somada a um terceiro elemento, PSÍQUICO ou moral (animus), que é a INTENÇÃO DE TER A COISA DE SUA PROPRIEDADE (animus rem sibi habendi). Esse ânimo não se confunde com aquele do proprietário (dominus). (...) Aqueles que têm a posse, por OBRIGAÇÃO ou direito, durante um tempo, mas em RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA, não são possuidores; mantêm a coisa e a posse EM NOME ALHEIO. São detentores, motivo pelo qual lhes é VEDADO clamar pela proteção possessória (...) Falta ao detentor a VONTADE DE DETER A COISA COMO SE FOSSE DONO (affectio tenendi), ânimo ínsito no espírito do possuidor e sem a interferência de outrem para o exercício da posse".

atual Código Civil é categórico:

"Art. 1.198. Considera-se DETENTOR aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas".

Nesse diapasão, não se desconhece a impossibilidade do CASEIRO obter para si a propriedade cuidada escudando-se na prescrição aquisitiva (usucapião) já que é detentor (cf. art. 1.198 do CCB/2002) - PORÉM - e é aqui que mora o ponto nevrálgico da questão e muitos colegas infelizmente não atentam - pode ocorrer também no caso ora analisado o fenômeno da INTERVERSÃO DA POSSE, como previsto no art. 1.203 do mesmo Códex. Nesse sentido inclusive o Enunciado 301 do Conselho da Justiça Federal, que assevera:

"É possível a conversão da detenção em posse, desde que rompida a subordinação, na hipótese de exercício em nome próprio dos atos possessórios".

Comprovada, pois, a interversão da posse, torna-se PLENAMENTE POSSÍVEL o reconhecimento da USUCAPIÃO em favor do ocupante, como muito bem ilustra a jurisprudência do TJSP:

"TJSP. 0000759-50.2004.8.26.0219. J. em: 12/05/2015. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. IMÓVEL. POSSE PRECÁRIA CONVERTIDA EM POSSE AD USUCAPIONEM. INTERVERSÃO DA POSSE. Ainda que a vizinha dos autores tenha alegado que haveria detenção, pois seriam os autores CASEIROS dos proprietários do imóvel, não se pode desconsiderar a ausência de pagamentos dos supostos serviços e, ainda, o longo período de posse dos autores, fatos que, com segurança, confirmaram a posse ad usucapionem. O prazo de vinte anos, previsto no art. 550, do Código Civil de 1916, completou-se no ano de 2008. Não se desconhece que a ação foi ajuizada em 22 de março de 2004. Contudo, a usucapião extraordinária do imóvel pode ser declarada, considerando-se o tempo de trâmite da demanda. RECURSO PROVIDO para declarar a usucapião extraordinária dos imóveis descritos na petição inicial".
Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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