Artigo - Lei nº14.188 de 28 de julho de 2021
“O Brasil quando aprova a criminalização da violência psicológica se coloca à frente de várias nações desenvolvidas. Com ações como essas, vamos debelar esse mal endêmico no nosso país”, avalia da presidente da Associação de Magistrados do Brasil (AMB), Renata Gil. A entidade foi autora da sugestão ao Congresso que deu origem à Lei nº14.188. A proposta foi entregue em março deste ano aos parlamentares.
O presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei 14.188 de 28 de julho de 2021, que criou o programa Sinal Vermelho contra a Violência Domestica e familiar. A lei altera o Decreto-Lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940, modificando a modalidade da pena da lesão corporal simples cometida contra a mulher por razões da condição do sexo feminino e criou um novo tipo penal: a violência psicologica contra a mulher. A sanção foi publicada no Diario oficial da união nessa quinta-feira (29)
O texto legal autoriza que o Executivo, Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e órgãos de segurança pública estabeleçam parcerias com estabelecimentos comerciais privados.
X – Vermelho.
No parágrafo único do art. 2º O programa Sinal Vermelho prevê, entre outras medidas, que a letra X escrita na mão da mulher, preferencialmente na cor vermelha, funcione como um sinal de alerta para situação de violência em curso.
Ainda assim, a identificação do símbolo, poderá ser feita pela própria vítima, pessoalmente, ou em repartições públicas e entidades privadas de todo o País.
A implementação do projeto prevê a realização de campanhas informativas e capacitação permanente dos profissionais atuantes no programa, além de ampla divulgação, para que todos da sociedade possam reconhecer uma vítima com facilidade.
Alterações na lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal)
A nova lei tambem alterou o artigo 129, §13 que, agora conta com o seguinte texto legal:
Se a lesão for praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do §2 – A do art. 121 deste código
Pena – reclusão de 1(um) a 4(quatro anos)
O tipo que exsurge da nova lei se assenta em certa qualidade especial da vítima, atrelada a uma motivação específica concernente ao autor. Assim, o primeiro requisito para a incidência da norma é que a vítima seja mulher. Não há o incremento das margens penais se a vítima é homem. A esse requisito, adita-se outro: o crime tem que ser praticado por razões da condição do sexo feminino, consoante definição do § 2º-A do art. 121 do CP.
A interpretação do sexo feminino no referido dispositivo legal se refere ao genero e não ao sexo biologico, respeitando a axiologia constitucional.
o art. 121, § 2º-A e, consequentemente, o art. 129, § 13, ao remeterem à Lei Maria da Penha, importam do diploma especial o tratamento de gênero, não de sexo. Sendo certo que mulheres transgênero são igualmente vulneráveis nas relações sociais. Ainda assim, a Constituição Federal, ao estabelecer o repúdio ao preconceito e à discriminação como objetivo fundamental, exige essa conclusão.
Violência psicológica.
Em todo texto legal da lei nº 14.188 de julho de 2021, o novo dispositivo legal que fala sobre a violência psicologica foi o que causou mais polêmica entre juristas, advogados e profissionais do direito.
A Lei 14.188, de 2021 inclui no Código Penal o crime de violência psicológica contra a mulher, a ser atribuído a quem causar dano emocional “que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões”. O crime pode ocorrer por meio de ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro método. A pena é de reclusão de seis meses a dois anos e multa.
De acordo com o referido diploma legal:
Art. 147-B. Causar dano emocional à mulher que a prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde psicológica e autodeterminação:
No texto, a vitima é sempre a mulher, aqui novamente estende-se o gênero feminino, ou seja, existindo o crime se a pessoa for mulher transgênero, o dispositivo legal acerta novamente na ampliação do sexo feminino.
O homem jamais poderá ser o passivo desse novo delito, não havendo nenhuma violação à igualdade entre generos, pois o tratamento e proteção diferenciado possui uma justificativa social muito forte, sendo que a categoria do gênero feminino possui uma vulnerabilidade muito maior quando falamos em violência contra gênero oposto e violência domestica.
Na nova lei, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, não existindo a necessidade de ser proximo a vitima, mudando consideravelmente o que a Lei Maria da Penha contextualiza.
O crime pode ocorrer, portanto, em estabelecimentos de ensino, serviços de saúde (violência obstétrica), templos religiosos, locais públicos, ambientes de trabalho, serviços de atendimento à mulher. E, além das tradicionais condutas de controle, isolamento, humilhação por parte de parceiros, a descrição ampla do tipo penal permite, por exemplo, que se considerem violência psicológica condutas como a de autoridade policial que ridiculariza e humilha a mulher durante atendimento ou a pressiona a não registrar ocorrência. A principal conduta do novo delito, consiste em causar dano psicologico a mulher, e é nesse aspecto a grande divergencia de opniões e um grande equivoco por conta do legislador que continua tentando combater a violência doméstica por meio do direito Penal.
A prova do delito pode ser feito pelo depoimento da ofendida, por depoimentos de testemunhas, relatórios de atendimento médico, relatórios psicológicos
O crime se consuma com a provocação do dano emocional à vítima. Cuida-se de delito material. Como dito, esse resultado, contudo, pode ser perseguido ou não pelo agente.
O texto do artigo 147 – B é muito abrangente, uma vez que não especifica os danos de maneira taxativa, abrindo margem às mais diversas interpretações, vejamos: o texto prevê que causar danos psicológicos à mulher que a prejudique ou pertube seu pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio. O problema da configuração do texto em sí, como já mencionado, é seu formato exemplificativo, por exemplo, como será provado que a vitima foi manipulada, ou qual o grau de constrangimento que será necessario para a adequação do delito? Além disso, o o seguinte trecho: “ em qualquer outro meio em que cause prejuizo a saúde psicológica e auto determinação da mulher” ratifica o rol, meramente taxativo e pode acabar por dificultar a indiviualização dos delitos.
O legislador, fere o principio da taxatividade, ao dispor de expressões genéricas e meramente exemplificativas, não oferecendo a mínima possibilidade de compor um rol taxativo das condutas elencadas no texto legal, podendo, portanto, o artido ser considerado inconstitucional a luz do art. 5º, XXXIX, da constituição federal, a depender da interpretação adotada.
Considerações finais
A nova legislação sinaliza quanto à maior gravidade da lesão corporal em contexto de violência de gênero e dá maior visibilidade à violência psicológica, sendo uma lei inovadora nesse aspecto.
Todavia, é essencial que as novas normas penais sejam aplicadas dentro das diretrizes da Lei Maria da Penha, que prevê a necessidade de concretização de políticas públicas de prevenção e proteção à mulher. Não se deve cair na ilusão do populismo punitivo.
Por fim, o legislador faz com que o Brasil se iguale a países como a Irlanda, criando um tipo penal que visa punir quem agride psicologicamente de diversas formas todas que se enquadram no gênero feminino, mas ao mesmo tempo falha, criando tipos penais abrangentes e de dificil aplicação prática.