Histórico do Contrato Individual do Trabalho

10/08/2021 às 12:27
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O estudo histórico do contrato individual do trabalho auxilia na compreensão dos alicerces protecionistas do Direto Trabalhista, fundamentando etimologicamente o acordo do vínculo do Empregado e Empregador ajustando os direitos e obrigações.

O histórico do Contrato Individual do Trabalho está diretamente ligado à história do Direito do Trabalho por motivo morfológico, portanto será desenvolvido no presente trabalho um processo que obedece a uma forma dialética imprescindível para a dedução do histórico e delimitar da abrangência ao estudo sistematizado.

O direito não é um fenômeno estático. É dinâmico. Desenvolve-se no momento de um processo que obedece a uma forma especial de dialética na qual se implicam, sem que se fundam, os polos de que se compõe. Esses polos mantêm-se irredutíveis. Conservam-se em suas normas dimensões, mas correlacionam-se. De um lado os fatos que ocorrem na vida social, portanto a dimensão fática do direito. De outro, os valores que presidem a evolução das ideias, portanto a dimensão axiológica do direito. Fatos e valores exigem-se mutuamente, envolvendo-se num procedimento de intensa atividade que dá origem a formação das estruturas normativas, portanto a terceira dimensão do direito1.

A primeira forma de trabalho registrada na história é a escravidão, onde o escravo era considerado coisa, não tendo qualquer tipo de direito, o escravo era propriedade do dominus não era considerado sujeito de direito, muito menos trabalhista2.

No regime de escravidão, não sendo o escravo sujeito, e sim objeto de direito, o trabalho por ele executado não traduzia o cumprimento de uma obrigação assumida por força de um vínculo jurídico, livremente estabelecido com aquele em favor de quem era o trabalho realizado: não constituía uma prestação. Não havia lugar para o Direito do Trabalho, regulador de uma relação jurídica obrigacional então existente.3

Como segunda forma pode-se citar a servidão. Na época do feudalismo os senhores feudais atribuíam uso da terra e proteção militar e política aos servos que em troca tinham que prestar serviço na terra do senhor feudal e entregar parte da produção rural4.

Na terceira forma encontra-se as corporações de oficio nos quais são partes integrantes três personagens: os mestres, os companheiros e os aprendizes5.

Os mestres eram os proprietários das oficinas, que já tinham passado pela prova da obra mestra. Os companheiros eram trabalhadores que percebiam salários dos mestres. Os aprendizes eram os menores que recebiam dos mestres o ensino metódico do oficio ou profissão. Havia nessa fase da história um pouco mais de liberdade ao trabalhador; o objetivo, porém, eram os interesses das corporações mais do que conferir qualquer proteção aos trabalhadores. As corporações de oficio tinham por objetivo: (a) estabelecer uma estrutura hierárquica; (b) regular a capacidade produtiva; (c) regulamentar a técnica de produção. Os aprendizes trabalhavam a partir de 12 ou 14 anos, e em alguns países já se observava prestação de serviços com idade inferior. Ficavam os aprendizes sob a responsabilidade do mestre que, inclusive, poderia impor-lhes castigos corporais. Os pais dos aprendizes pagavam taxas, muitas vezes elevadas, para o mestre ensinas seus filhos. Se o aprendiz superasse as dificuldades dos ensinamentos, passava ao grau de companheiro. O companheiro só passava a mestre se fosse aprovado em exame de obra mestra, prova que era muito difícil, além de os companheiros terem de pagar taxas para fazer o exame. [...]6.

Porém as corporações de ofício foram suprimidas pela Revolução Francesa, pois eram incompatíveis com o ideal de liberdade do homem, outras causas da extinção também foram à liberdade de comércio e o encarecimento dos produtos das corporações7.

Efetivamente, o Direito do Trabalho passa a engatinhar com o surgimento da Revolução Industrial. Nessa época, a principal causa econômica do surgimento da Revolução Industrial foi o aparecimento da máquina a vapor como fonte energética, substituindo a força humana. Houve, portanto, a substituição do trabalho manual pelo trabalho com o uso de maquinas. Havia necessidade de que as pessoas viessem também a operar as maquinas não só a vapor, mas também maquinas têxteis, o que fez surgir o trabalho assalariado. Daí nasce uma causa jurídica, pois os trabalhadores começaram a reuniu-se, associar-se, para reivindicar melhores condições de trabalho e salários, diminuição das jornadas excessivas (os trabalhadores prestavam serviços por 12, 14, 16 horas diárias) e contra a exploração de menores e mulheres. Estes se sujeitavam a receber salários ínfimos e a trabalhar em jornadas exaustivas para poder entrar no mercado de trabalho. A partir desse momento, passa a surgir liberdade na contratação das condições de trabalho. O Estado, por sua vez, deixa de ser abstencionista, para se tornar intervencionista, intervindo nas relações de trabalho8.

Em 1891, o Papa Leão XIII com a Encíclica RerumNovarum (coisas novas), inicia uma fase de transição para a justiça social concebendo regras para a intervenção estatal na relação entre trabalhador e patrão9.

A primeira Conferência Internacional do Trabalho foi convocada em Berlim, 1890, presentes representantes da França, Alemanha, Áustria, Holanda, Bélgica, Inglaterra, Itália, Dinamarca, Portugal, Suécia, Noruega, Suíça, Espanha e Luxemburgo. Houve sugestões para a criação de uma Repartição Internacional para estudos e estatísticas de trabalho. Na época, Guilherme II solicitou apoio ao papa Leão XIII, e este, no ano seguinte, promulgaria a encíclica RerumNovaum10.

No México em 1917, houve a primeira Constituição que tratou do tema do Direito do Trabalho11.

Os constituintes mexicanos, diferentemente do que ocorria anteriormente, decidem incluir em sua Lei Maior, um conjunto de direitos sociais. O art. 123, desta constituição, trata Do Trabalho e da Previdência social, com 30 incisos garantindo direitos aos trabalhadores, entre outros: duração do trabalho, salários em geral, proteção ao trabalho, em especial ao das mulheres e menores, participação dos lucros, regras de despedida e demissão, tribunais do trabalho e etc12.

Com o Tratado de Versalhes de 1919 surge a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que tem como objetivo proteger as relações entre Empregados e Empregadores13.

Na Itália, aparece a Carta Del Lavoro, de 1927, instituindo um sistema corporativista-fascista, que inspirou outros sistemas políticos como os de Portugal, Espanha e, especialmente, o Brasil. O corporativismo visava organizar a economia em torno do Estado promovendo o interesse nacional, além de impor regras a todas as pessoas. Surge o corporativismo na metade do século XIX com o fim de organizar os interesses divergentes da Revolução Industrial. O Estado interferia nas relações entre as pessoas com o objetivo de poder moderador e organizador da sociedade. Nada escapava a vigilância do Estado, nem a seu poder. O estado regulava, praticamente, tudo, determinando o que seria melhor para cada um, organizando a produção nacional O interesse nacional colocava-se acima dos interesses dos particulares. Mussolini dizia, na época: Tudo no Estado, nada contra o Estado, nada fora do Estado (TuttonelloStato, nientecontroloStato, nulla al difuoridelloStato). As diretrizes básicas de corporativismo eram: (a) nacionalismo; (b) necessidade de organização; (c) pacificação social (d) harmonia entre o capital e o trabalho14.

Verifica-se com a Constituição Brasileira de 1988 que surge uma nova teoria pregando a necessidade de separação entre econômico e o social15.

A carta de 1988 trouxe o mais relevante impulso já experimentado na evolução jurídica brasileira, a um eventual modelo mais democrático de administração dos conflitos sociais no país. Impulso relevante, se cotejado com a história anterior do Direito Laboral pátrio16.

Pode-se concluir que o surgimento do Direito do Trabalho ocorreu lentamente durante a história, sendo conduzido por inúmeros fatos que em sua essência conquistaram os direitos ao trabalhador.


Histórico do Contrato Individual do Trabalho no Brasil

Em 1824, a Constituição apenas tratou de abolir as corporações de ofício, pois no exercício de ofícios e profissões deveria haver liberdade17.

Com a assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel em 13 de maio de 1888 fora abolida a escravatura18.

Embora a Lei Áurea não tenha, obviamente, qualquer caráter justrabalhista, ela pode ser tomada, em certo sentido, como o marco inicial de referência da História do Direito do Trabalho brasileiro. E que ela cumpriu papel relevante na reunião dos pressupostos a configuração desse ramo jurídico especializado. De fato, constitui diploma que tanto eliminou da ordem sociojurídica relação de produção incompatível com o ramo justrabalhista (a escravidão), como, em consequência, estimulou a incorporação pela pratica social da formula então revolucionaria de utilização da força de trabalho: a relação de emprego. Nesse sentido, o mencionado diploma sintetiza um marco referencial mais significativo para a primeira fase do Direito do Trabalho no país do que qualquer outro diploma jurídico que se possa apontar nas quatro décadas que se seguiram a 188819.

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A liberdade de associação foi constada na Constituição de 1891.

Reconheceu a Constituição de 1891 a liberdade de associação (§8º do art. 72), que tinha na época caráter genérico, determinando que a todos era lícita a associação e reunião, livremente e sem armas, não podendo a polícia intervir, salvo para manter a ordem pública20.

Surge em 1919 a Organização Internacional do Trabalho (OIT), que traz grande influência na política trabalhista brasileira de 1930.

As transformações que vinham ocorrendo na Europa em decorrência da primeira guerra mundial e o aparecimento da OIT, em 1919, incentivaram a criação de normas trabalhistas em nosso país. Existiam muitos imigrantes no Brasil que deram origem a movimentos operários reivindicando melhores condições de trabalho e salários. Começa a surgir uma política trabalhista idealizada por Getúlio Vargas em 193021.

A primeira constituição brasileira a tratar especificamente do Direito do Trabalho surgiu em 193422.

Haviam várias normas trabalhistas esparsas sobre os mais variados assuntos trabalhistas, então, em 1/5/1943 com o Decreto lei n 5.452 fora aprovado a Consolidação das Leis do Trabalho com o objetivo de reunir as leis já existentes na época, consolidando-as23.

Em 5/10/1988 é aprovada a atual Constituição Federal que trata de direito trabalhista nos art. 7º a 11. O art. 7º trata da Constituição de direitos individuais e tutelares do trabalho. O art. 8º aborda sobre o sindicato e suas relações. O art. 9º refere-se a regras sobre greve. O art. 10 pondera disposições sobre a participação dos trabalhadores em colegiados. E o art. 11 refere-se que nas empresas com mais de 200 Empregados é assegurada a eleição de um representante dos trabalhadores para entendimentos com o Empregador24.

Portanto, pode-se concluir que o Contrato Individual do Trabalho singulariza as relações trabalhistas desde os primórdios da necessidade de haver uma estrutura no acordo do vínculo do Empregado ao Empregador ajustando os direitos e obrigações recíprocas.


 Referencial Bibliográfico

1NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho: história e teoria geral do Direito do Trabalho, relações individuais e coletivas do trabalho. 26 ed. São Paulo: Saraiva. 2011. p. 31.

2MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho.26.ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 33.

3MARANHÃO, Délio. CARVALHO, Luiz Inácio B. Direito do Trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1993. p.45.

4MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 33.

5MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 33.

6MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 33-34.

7MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 34.

8MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 34.

9MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 35.

10NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. p. 90.

11MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 35.

12GIRARDI, Leopoldo Justino. O Trabalho no direito. Brasil: Coli, 2005. p. 43.

13MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 35.

14MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 35-36. 15MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 36.

16DELGADO, Mauricio Godinho. Curso De Direito do Trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr. 2012. p. 123.

17MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p.36.

18MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 36.

19DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. p. 105-106.

20MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 36.

21MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 36.

22MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 37.

23DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. p.111.

24MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. p. 38.

Sobre a autora
Ediléia Mafra

Tutora | Advogada | Pós-graduada em Direito Imobiliário | Pós-graduanda em Direito Digital e Proteção de Dados e em Docência do Ensino Superior e Metodologias Ativas.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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