A discutida liberdade de expressão

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10/08/2021 às 20:41

Resumo:


  • O episódio da invasão do Capitólio nos EUA gerou debates sobre liberdade de expressão e responsabilidade civil das redes sociais.

  • A suspensão das contas de Trump por redes sociais como Twitter e Facebook levantou questionamentos sobre limites da liberdade de expressão.

  • O Marco Civil da Internet no Brasil e a Seção 230 do US Code abordam a responsabilidade dos provedores de internet e redes sociais por conteúdos gerados por terceiros.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

[1] Dentre os principais invasores estavam militantes da supremacia branca. Um dos invasores que mais chamou a atenção foi o membro do QAnon, Jake Angeli (autodenominado QAnon Shaman e cujo nome real é Jacob Anthony Chansley), que invadiu o Capitólio com o rosto pintado, uma bandeira dos Estados Unidos e chapéu de pele com chifres. Os Proud Boys, grupo masculino de extrema-direita, também figurou entre os assaltantes e um deles, Nick Ochs, tirou fotos e postou vídeo dentro do Capitólio. Também influenciadores digitais da extrema-direita, como Tim Gionet (que se autodenomina "Baked Alaska") fez transmissão da invasão.

[2] No Brasil, instâncias superiores já se manifestaram equiparando as redes sociais a “provedores de conteúdos”, sendo perfeitamente aplicável a legislação consumerista no relacionamento entre rede social e usuário. In: SCHMIDLIN FILHO, Carlos. Redes Sociais e o Tratamento Jurídico Brasileiro. Disponível em: http://betoschimidlin.jusbrasil.com.br/atigos/180346661/redes-sociais-e-o-tratament-juridico-brasileiro  Acesso em 14.1.2021.

[3] O recurso discute a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), que exige prévia e específica ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil de provedor de internet, websites e gestores de aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos.

São três os pilares sobre os quais se fundamenta a Lei do Marco Civil da Internet, a saber: 1) a neutralidade da rede; 2) a liberdade de expressão; e 3) a privacidade dos usuários. Tal opção legislativa encontra-se em consonância com o que preconizado pela doutrina especializada. Ao dispor sobre a responsabilidade dos provedores de conexão e de aplicação de internet por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros, os artigos 18 e 19 do Marco Civil da Internet assim estabeleceram.

[4] Algumas leis que visam impor limites e garantir direitos aos usuários da Internet, como por exemplo a Lei 12.737/12, conhecida como Lei Carolina Dieckmann, que dispõe sobre tipificação criminal para delitos informáticos.

[5] O legislador brasileiro, inspirou-se no artigo 334 do Código Civil de Portugal, qual assevera que: “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou econômico desse direito”.

Registra-se que na I Jornada de Direito Civil da Justiça Federal foi formulado o Enunciado 37 acerca do art. 187 do Código Civil, nos seguintes termos: “a responsabilidade civil decorrente do abuso do direito independe de culpa, e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico”. Portanto, percebe-se que a jurisprudência segue a linha objetivista.

[6] A seção 230 é uma parte da legislação da Internet nos Estados Unidos, aprovada como parte da Communications Decency Act (CDA) de 1996 (um nome comum para o Título V da Lei de Telecomunicações de 1996), formalmente codificada como Seção 230 da Communications Act de 1934 em 47 USC § 230. 

A seção 230 geralmente fornece imunidade para editores de sites de conteúdo de terceiros. Em seu núcleo, a Seção 230 (c) (1) fornece imunidade de responsabilidade para fornecedores e usuários de um "serviço de computador interativo" que publicam informações fornecidas por terceiros: Nenhum provedor ou usuário de um serviço de computador interativo deve ser tratado como editor ou locutor de qualquer informação fornecida por outro provedor de conteúdo de informação.

[7] "Notice and takedown" significa que o provedor de serviços não será responsabilizado pela publicação do conteúdo protegido pelos direitos autorais se, uma vez notificado pelo legítimo autor, removê-lo imediatamente.

A responsabilidade civil dos provedores de serviços de internet por conteúdo gerado por terceiros é matéria contenciosa que, apesar de ter sido abordada em lei no Brasil a partir do Marco Civil da Internet, Lei n. 12.965/14, ainda é alvo de intensos debates doutrinários.

Isso se dá devido à profunda alteração que ele veio a causar no que se percebia como a tradicional trajetória da responsabilidade civil e em especial da responsabilidade pelos fatos dos serviços, conforme a proteção do diploma consumerista por causa da adoção do desrespeito à notificação judicial acerca do conteúdo ilícito como condição para que se promova a responsabilização dos provedores de aplicações. As críticas, ademais, se estendem ainda ao momento anterior à criação do Marco Civil, quando o Superior Tribunal de Justiça, ao tratar da matéria, importou ao Brasil o mecanismo de notice and takedown (ou de notificação extrajudicial), oriundo dos Estados Unidos da América e da União Europeia, como uma barreira inicial à responsabilização.

[8] O modelo do judicial notice and take down, estabelecido no Marco Civil da Internet, para além de ser um instrumento eficaz na concretização da garantia constitucional da liberdade de expressão, de modo algum fere as garantias constitucionais de intimidade, vida privada, honra e imagem (artigo 5º, X, da Constituição) nem a garantia constitucional de proteção ao consumidor (artigo 5º, XXXII, da Constituição brasileira vigente).

[9] O termo IP (Internet Protocol) é um número identificador dado ao seu computador, ou roteador, ao conectar-se à rede. É através desse número que seu computador pode enviar e receber dados na internet. O IP é definido pelo seu provedor de Internet.

[10] O usuário que prefere navegar de forma “anônima” na internet pode usar um software para esconder seu IP (Internet Protocol) – identificação do seu computador na rede. Como esconder seu IP; Mask My IP; IP Privacy; Real Hide IP; Tor Browser e Super Hide IP.

[11] O direito de liberdade de expressão é um direito fundamental, que se mostra como corolário da dignidade da pessoa humana, representando, de outra parte, fundamento necessário à sobrevivência do Estado.

[12] Discurso de ódio (tradução do inglês: hate speech) ou incitamento ao ódio é, de forma genérica, qualquer ato de comunicação que inferiorize ou incite ódio contra uma pessoa ou grupo, tendo por base características como raça, gênero, etnia, nacionalidade, religião, orientação sexual ou outro aspecto passível de discriminação.

No direito, discurso de ódio é qualquer discurso, gesto ou conduta, escrita ou representada que seja proibida porque pode incitar violência ou ação discriminatória contra um grupo de pessoas ou porque ela ofende ou intimida um grupo de cidadãos. A lei pode tipificar as características que são passíveis de levar a discriminação, como raça, gênero, origem, nacionalidade, orientação sexual ou outra característica. Há consenso internacional acerca do fato de que discursos de ódio devem ser proibidos pela lei, e que essas proibições não ferem o princípio de liberdade de expressão.

[13] O STF aprovou a equiparação de homofobia ao crime de racismo. O caso é discutido na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26 e no Mandado de Injunção 4.733, ações protocoladas pelo PPS e pela Associação Brasileiras de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) e das quais são relatores os ministros Celso de Mello e Edson Fachin. O julgamento começou em fevereiro de 2019, quando os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, além do relator, o Min. Celso de Mello votou para igualar os crimes de homofobia ao de racismo. E, o assuntou voltou ao plenário em 23.5.2019, quando Rosa Weber e Luiz Fux igualmente votaram favoravelmente à medida.

[14] Segundo doutrina tradicional, o conceito de ato ilícito utilizado pelo Código Civil brasileiro, como fundamento da responsabilidade contratual e extracontratual, corresponde à debatida faute do artigo 1.382 do Código Civil francês, devendo ser compreendida essa expressão em sua acepção de erro, ou, em uma tradução literal, de “falta”, e não no sentido de culpa, que é o estado moral de quem pratica o ato ilícito.

[15] Verifica-se que o Marco Civil da Internet previu que os provedores de conexão são inteiramente isentos de responsabilidade no que tange ao conteúdo gerado por terceiros (artigo 18). Já os provedores de aplicações de internet só poderão ser responsabilizados civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros nos casos em que, após ordem judicial específica, não tomarem as providências para tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente (artigo 19). A única exceção a esta regra está posta no artigo 21.

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[16] Atualmente está em discussão a constitucionalidade do art. 19 da lei 12.965/14 (Marco Civil da Internet), que trata da responsabilidade do provedor de aplicações por danos causados por terceiros.

[17] A responsabilidade civil dos provedores de aplicação de internet, pelo conteúdo gerado e compartilhado por seus usuários é objeto de dois temas reconhecidos como de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal.

O primeiro é o Tema 533, que tratou da responsabilidade, antes da entrada em vigor do Marco Civil da Internet, em 2014. Veja-se: “Tema 533 - Dever de empresa hospedeira de sítio na internet fiscalizar o conteúdo publicado e de retirá-lo do ar quando considerado ofensivo, sem intervenção do Judiciário (relator ministro Luiz Fux, RE 1.057.258)". O segundo caso é o Tema 987, citado acima, que ainda está pendente de decisão. Veja-se: “Tema 987 - Discussão sobre a constitucionalidade do artigo 19 da Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) que determina a necessidade de prévia e específica ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil de provedor de internet, websites e gestores de aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros (relator ministro Dias Toffoli, RE 1.037.396).

[18] A Comissão Europeia anunciou que pediu aos seus membros para migrar do WhatsApp para o aplicativo de troca de mensagens Signal com o objetivo de aumentar a segurança das suas comunicações.

[19] Browser ou Navegador é um programa criado para permitir a navegação pela internet. É o que torna possível o acesso a sites, como um caminho que leva até o que você procura na rede. Ele pode processar diversas linguagens, como HTML, ASP, PHP. Essas linguagens, hospedadas nos servidores de internet, ficam disponíveis para serem acessadas e transformadas em linguagem comum e imagens. Por exemplo, quando você digita o endereço de um site ou acessa um link, o navegador faz uma requisição daquela página. Este pedido é enviado para o servidor onde o site está hospedado e cabe a este responder com os arquivos que compõe a página.

[20] A Lei brasileira também equipara ao documento particular, no caso de falsificação ou alteração, o cartão de crédito ou débito, conforme o disposto no parágrafo único do artigo 298 do Código Penal.

[21] Muitos especialistas e juristas afirmam que a Lei das Fake News é fundamental para o país. A liberdade de expressão não constitui um valor absoluto já que não deve ser usado para justificar práticas criminosas cometidas online. Na Alemanha, existe lei em vigor que tem se mostrado muito eficiente por vários motivos, entre estes, as pesadas multas aplicadas às plataformas de redes sociais em caso de descumprimento das normas de transparência. E, as multas podem chegar a um milhão de euros.

[22] A interpretação conforme a Constituição é um método hermenêutico e de controle de constitucionalidade, que tem como fim garantir a compatibilidade da norma ao ordenamento constitucional, devendo ser utilizada, sempre para dar a lei o sentido adequado da Constituição Federal. A interpretação conforme a Constituição é aquela em que o intérprete adota a interpretação mais favorável à Constituição Federal, considerando-se seus princípios e jurisprudência, sem, contudo, se afastar da finalidade da lei.

[23] Tais grupos de extrema-direita que marcharam em Charlottesville (EUA)acreditam que a raça branca está em perigo e, estão certos de que os EUA foram construídos por e para as pessoas brancas e devem doravante abraçar o fascismo. Consideram ainda que as minorias estão dominando o poder no país. Havendo mesmo conspiração internacional de judeus por detrás dessa perigosa ameaça.

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Sobre a autora
Gisele Leite

Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora - Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores POA -RS.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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