Na data de 10 de Agosto de 2021, o senhor Prefeito Ricardo Nunes encaminhou proposta (projeto de lei) a Câmara de Vereadores do Município de São Paulo visando instituir os Programas de Residência Jurídica e Residência em Gestão Pública no Município de São Paulo.
Além de objetivo de atrair talentos para o setor público com a resolução de problemas e da busca de inovação, tal projeto almeja posicionar o Município de São Paulo entre as organizações públicas mais modernas e eficientes.
Tais programas contribuem fortemente para o desenvolvimento de habilidades dos bacharéis e licenciados, aliando prática e teoria.
O objetivo do aperfeiçoamento profissional da residência jurídica assemelha-se a relação de estágio de estudantes, regulado pela Lei Federal nº 11.788/08, proporcionando aperfeiçoamento técnico, científico e social mas com ela não se confunde!
Ademais, a supracitada lei do estágio não traz nenhum impeditivo a essa modalidade de admissão.
No julgamento das ADIs 5752 e 5803, que tratavam dos programas de residência jurídica no MP-SC e MP-RO, respectivamente, Supremo Tribunal Federal não estipulou a necessidade de que os estagiários de pós-graduação sejam selecionados por concurso público, destacando tão somente a necessidade de que sua escolha se desse por critérios objetivos.
A esse respeito é salutar destacar o seguinte trecho do voto proferido pelo Min. Ayres Britto no julgamento da ADI 3795:
“se o número de pretendentes a estágio profissionalizante é sempre maior que a disponibilidade de vagas no setor público – ninguém põe em dúvida essa afirmativa –, nada mais racional e justo que a própria Administração opte por estabelecer critérios que signifiquem tratamento isonômico aos interessados. Sem favorecimentos e preterições, portanto. Critérios que, além do mais, primem por uma objetividade tal que ponha em estado de concreção o princípio da impessoalidade, impeditivo da quase sempre patrimonialista indistinção entre o espaço público da Administração e o espaço privado do administrador”
(ADI 3795, Relator Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 24/2/2011, republicação DJe 16/6/2011)
Portanto, verificamos que os requisitos elencados pelo STF para admissão de estagiários de pós-graduação foram:
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a regular matricula do aluno em instituição de ensino;
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a celebração de termo de compromisso; e
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a limitação de jornada de estágio de maneira a compatibilizar seu exercício com os estudos.
Embora se possa lançar, apressadamente, o argumento que há prestação de serviço pessoal, subordinado e não eventual em favor de terceiro, mediante contraprestação, relação trabalhista não se aperfeiçoa, visto que o Programa de Residência objetiva primordialmente a formação educacional do aluno residente, sendo este elemento que impedem vinculo empregatício nos termos da Consolidação das Leis Trabalhistas.
Noutro diapasão, também não prevalece o argumento que haveria afronta a competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho nos termos do artigo 22, I, da Constituição da República Federativa do Brasil, visto que o Supremo Tribunal Federal julgou recentemente improcedente uma ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Procuradoria-Geral da República contra a lei do Amazonas que criou um programa de residência jurídica no âmbito da Procuradoria Geral do Estado.
Segundo o então ministro Marco Aurélio, no julgamento da ADI 5.387, a lei dispõe sobre simples estágio visando o aperfeiçoamento de bacharéis em Direito, cite-se “(…) Previu-se a existência de aulas teóricas e atividades práticas, afastada a possibilidade de exercício de atividade privativa de procurador do Estado e outros titulares de cargos públicos da área jurídica, sendo vedada, ao estagiário, praticar atos que possam vincular a administração”.
E continuou ao se manifestar: “(…) Os parâmetros não revelam arregimentação de servidor público quando se poderia versar a necessidade de concurso. Para ter-se estagiário, suficiente é a abertura pública de certame para tal fim, valendo notar que o diploma, no artigo 4º, tratou, inclusive, da participação da OAB-AM”.
Também não há como equiparar a residência jurídica ou de gestão, a contratação temporária de servidor público. Conforme já apontado, não há formação de vinculo empregatício e inexiste contribuição previdência ao regime próprio ou geral, e nem mesmo contagem de tempo de serviço público.
Inclusive qualquer tentativa nesse sentido acabaria por frustrar a proposta do programa de residência, que é a educacional.
Por fim, resta evidente a constitucionalidade e legalidade do programa de residência, que busca promover diversidade dos modos de aprendizagem, aliando, como já dito, prática e teoria para uma melhor formação de futuros profissionais, indo inclusive, ao encontro da Lei de diretrizes e base da educação nacional (Lei nº 9.394/96) nesse desiderato.
Portanto, iniciativa salutar e muito bem-vinda, desejando-se que outros entes adotem posturas semelhantes!