Programa de residência jurídica e em gestão no município de São Paulo.

Mais uma iniciativa louvável no âmbito da administração pública

10/08/2021 às 21:34
Leia nesta página:

Comentários sobre o projeto de lei encaminhado a Câmara de Vereadores do Município de São Paulo instituindo o programa de residência jurídica e apontamentos sobre a constitucionalidade do mesmo.

Na data de 10 de Agosto de 2021, o senhor Prefeito Ricardo Nunes encaminhou proposta (projeto de lei) a Câmara de Vereadores do Município de São Paulo visando instituir os Programas de Residência Jurídica e Residência em Gestão Pública no Município de São Paulo.

Além de objetivo de atrair talentos para o setor público com a resolução de problemas e da busca de inovação, tal projeto almeja posicionar o Município de São Paulo entre as organizações públicas mais modernas e eficientes.

Tais programas contribuem fortemente para o desenvolvimento de habilidades dos bacharéis e licenciados, aliando prática e teoria.

O objetivo do aperfeiçoamento profissional da residência jurídica assemelha-se a relação de estágio de estudantes, regulado pela Lei Federal nº 11.788/08, proporcionando aperfeiçoamento técnico, científico e social mas com ela não se confunde!

Ademais, a supracitada lei do estágio não traz nenhum impeditivo a essa modalidade de admissão.

No julgamento das ADIs 5752 e 5803, que tratavam dos programas de residência jurídica no MP-SC e MP-RO, respectivamente, Supremo Tribunal Federal não estipulou a necessidade de que os estagiários de pós-graduação sejam selecionados por concurso público, destacando tão somente a necessidade de que sua escolha se desse por critérios objetivos.

A esse respeito é salutar destacar o seguinte trecho do voto proferido pelo Min. Ayres Britto no julgamento da ADI 3795:

“se o número de pretendentes a estágio profissionalizante é sempre maior que a disponibilidade de vagas no setor público – ninguém põe em dúvida essa afirmativa –, nada mais racional e justo que a própria Administração opte por estabelecer critérios que signifiquem tratamento isonômico aos interessados. Sem favorecimentos e preterições, portanto. Critérios que, além do mais, primem por uma objetividade tal que ponha em estado de concreção o princípio da impessoalidade, impeditivo da quase sempre patrimonialista indistinção entre o espaço público da Administração e o espaço privado do administrador”

(ADI 3795, Relator Min. Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgado em 24/2/2011, republicação DJe 16/6/2011)

Portanto, verificamos que os requisitos elencados pelo STF para admissão de estagiários de pós-graduação foram:

  1. a regular matricula do aluno em instituição de ensino;

  2. a celebração de termo de compromisso; e

  3. a limitação de jornada de estágio de maneira a compatibilizar seu exercício com os estudos.

Embora se possa lançar, apressadamente, o argumento que há prestação de serviço pessoal, subordinado e não eventual em favor de terceiro, mediante contraprestação, relação trabalhista não se aperfeiçoa, visto que o Programa de Residência objetiva primordialmente a formação educacional do aluno residente, sendo este elemento que impedem vinculo empregatício nos termos da Consolidação das Leis Trabalhistas.

Noutro diapasão, também não prevalece o argumento que haveria afronta a competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho nos termos do artigo 22, I, da Constituição da República Federativa do Brasil, visto que o Supremo Tribunal Federal julgou recentemente improcedente uma ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Procuradoria-Geral da República contra a lei do Amazonas que criou um programa de residência jurídica no âmbito da Procuradoria Geral do Estado.

Segundo o então ministro Marco Aurélio, no julgamento da ADI 5.387, a lei dispõe sobre simples estágio visando o aperfeiçoamento de bacharéis em Direito, cite-se “(…) Previu-se a existência de aulas teóricas e atividades práticas, afastada a possibilidade de exercício de atividade privativa de procurador do Estado e outros titulares de cargos públicos da área jurídica, sendo vedada, ao estagiário, praticar atos que possam vincular a administração”.

E continuou ao se manifestar: “(…) Os parâmetros não revelam arregimentação de servidor público quando se poderia versar a necessidade de concurso. Para ter-se estagiário, suficiente é a abertura pública de certame para tal fim, valendo notar que o diploma, no artigo 4º, tratou, inclusive, da participação da OAB-AM”.

Também não há como equiparar a residência jurídica ou de gestão, a contratação temporária de servidor público. Conforme já apontado, não há formação de vinculo empregatício e inexiste contribuição previdência ao regime próprio ou geral, e nem mesmo contagem de tempo de serviço público.

Inclusive qualquer tentativa nesse sentido acabaria por frustrar a proposta do programa de residência, que é a educacional.

Por fim, resta evidente a constitucionalidade e legalidade do programa de residência, que busca promover diversidade dos modos de aprendizagem, aliando, como já dito, prática e teoria para uma melhor formação de futuros profissionais, indo inclusive, ao encontro da Lei de diretrizes e base da educação nacional (Lei nº 9.394/96) nesse desiderato.

Portanto, iniciativa salutar e muito bem-vinda, desejando-se que outros entes adotem posturas semelhantes!

Sobre o autor
Ricardo Bucker Silva

Procurador do Município de São Paulo. Advogado. Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Opinativo sobre esse novo projeto de Lei, que na opinião do autor, será benéfico a Administração Pública e aos estagiários residentes!

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