Tributação dos lucros distribuídos aos sócios. Pertinente, desde que na dose e no momento certo

12/08/2021 às 16:04
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A proposta de tributação do lucro distribuído aos sócios chega em momento inoportuno, em razão dos efeitos deletérios da pandemia, e a dosagem pode desestimular investimentos.

Luiz Fernando Maia

O artigo 3º do Projeto de Lei (PL) nº 2.337/21, proposto pelo Governo Federal, prevê a tributação dos lucros distribuídos, incluindo os artigos 10-A-B-C, na lei nº 9.249/95. Impossível não pontuar inconstitucionalidades, como a isenção de R$ 20 mil/mês somente a sócios de Micro ou EPP, em ofensa à isonomia tributária, pois a legislação prevê tratamento beneficiado às Micro/EPP e não a seus sócios; a ofensa a Acordos Internacionais, quando tributa o lucro no momento em que incorrido e não disponibilizado (ofensa ao controlled foreign Corporation-CFC), a retroatividade inconstitucional, quando estabelece que o lucro que vier a ser integralizado será tributado, caso a sociedade houver reduzido seu capital social nos últimos 5 anos anteriores a nova lei, dentre outros aspectos.

Mas na verdade, pretendemos aqui, tratar da tributação do lucro distribuído aos sócios, desde as razões do legislador isentá-lo em 1995, o que levou a esta isenção, o inoportuno momento de reintroduzir a tributação, diante dos efeitos deletérios da pandemia de Covid-19 e, principalmente, a absurda tributação que resultará da somatória do lucro da empresa e dos sócios na previsão do aludido PL. Da desoneração da tributação dos lucros e dividendos distribuídos aos sócios em 1995, a Lei 9.249/95 isentou a distribuição de lucros e dividendos de forma ampla, desde o calendário de 1996, desonerando os lucros e dividendos distribuídos a sócios ou acionistas, pessoas físicas ou jurídicas, domiciliados ou não no Brasil, tributadas pelo lucro real, presumido ou arbitrado ou do Simples Nacional.

Na exposição de motivo da isenção trazida no artigo10 da Lei 9.249/95, o legislativo alegou: “Com relação à tributação dos lucros e dividendos, estabelece-se a completa integração entre a pessoa física e a pessoa jurídica, tributando-se esses rendimentos exclusivamente na empresa e isentando-se quando do recebimento pelos beneficiários. Além de simplificar os controles e inibir a evasão, esse procedimento estimula, em razão da equiparação de tratamento e das alíquotas aplicáveis, o investimento nas atividades produtivas”. Desde então, a tributação do lucro das empresas (IRPJ/CSLL), passou a ser 34% no caso do lucro real (2ª maior do mundo).

Na outra ponta, países como Noruega, Suécia, Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Inglaterra, França e EUA sempre optaram em dividir a tributação do lucro nas empresas e aos sócios, tributando menos as empresas e mais o lucro distribuído, tendo como regra a somatória da tributação do lucro da empresa e dos sócios em patamar máximo de 35%. Aliás, desde 2008, face à crise econômica global, desencadeada da quebra do banco Lehman Brothers, este patamar da tributação do lucro, somado o da empresa com o do sócio, sofreu significativa redução. Neste movimento, podemos citar a Bélgica, que reduziu de 34% para 25%  em 2020, Espanha de 30% para 25%, EUA de 39% para 21%, Holanda, até 2022 reduzirá de 20% para 16%, Reino Unido reduziu de 27% para 16%, e assim outros países, seguindo a lógica mundial, sistematizada como opção a manter investimentos nacionais e internacionais. 

Inoportunidade e dosagem errada da tributação do lucro e dividendos proposta. A premissa primeira é que entendemos pertinente a tributação do lucro distribuído, porém não neste momento em que as empresas buscam sobreviver ao momento pandêmico. Qual o interesse do empresário investir em plena crise, quando e se aprovado o PL, a tributação do lucro (empresa e sócio) será muito maior do que a tributação do ganho de capital?

Parece-nos um incentivo ao capital ocioso em aplicações do que ir para fontes produtivas. Nenhum segmento estará recuperado da crise atual antes do fim de 2022. O recrudescimento econômico ocorrerá pouco a pouco. Portanto, parece-nos que o “time” ideal para a mudança pretendida pelo PL nº 2.337/21 seja 2024. Quanto à dosagem certa, seria a redução da tributação das empresas a 25% e a tributação do lucro distribuído em 10% (conforme outro PL existente em trâmite no legislativo de nº 2.015/19), seguindo lógica mundial. A somatória da tributação do lucro corporativo e dos sócios ficaria em 35%, pouco maior que a tributação de hoje, que não tributa o lucro distribuído.

A tributação dos lucros distribuídos aos sócios é pertinente, desde que em momento menos crítico. Quanto a dose da tributação deste lucro, considerando que, embora sejam dois impostos distintos (lucro da pessoa jurídica e lucro distribuído aos sócios), trata-se à evidência da mesma realidade econômica, com pequena diferença no valor da base de cálculo, onde na empresa é o lucro líquido e quanto ao sócio é o valor deste lucro líquido distribuído. Assim, inadmissível deixarmos de ser a segunda maior incidência de tributo sobre o lucro do mundo (34% no somatório do IRPJ e CSSL) para passar a ser, disparadamente, a primeira, quando, somada a tributação do lucro na empresa e o recebido pelos sócios, passa do patamar de 54%.

Luiz Fernando Maia é advogado e sócio-fundador do escritório LF Maia Sociedade de Advogados.

Sobre o autor
Luiz Fernando Maia

Advogado, mestre em Direito Constitucional, e sócio-fundador do escritório LF Maia Sociedade de Advogados.

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