ADVOCACIA, QUALIDADE DE VIDA E INTELIGÊNCIAS ARTIFICIAL
José Cláudio Rocha[1]
1.Introdução
A discussão sobre transformação digital está presente em todos os segmentos da sociedade, inclusive, no Direito. Mas nem tudo se limita a pensar processo digitais, ensino remoto ou audiências virtuais, existe muito mais a ser pensado e aproveitado para a melhoria da profissão e nossa condição humana. Em um momento em que todos estamos passando por grande stress, pensar em soluções que possam facilitar nosso dia a dia é muito importante. Afinal de contas, em termos de desenvolvimento e qualidade de softwares e inteligência artificial: “menos é mais”.
Quero dizer com isso que os bons softwares são aqueles que resolvem problemas simples de nossas vidas. Pequenas soluções geram grandes impactos, ao serem utilizadas por milhares, às vezes, milhões de pessoas. Tecnologias como Facebook, WhatsApp e Instagram foram pensadas assim.
Ante o exposto, escolhemos para falar neste artigo sobre os softwares ou aplicativos que têm a função de monitorar vários aspectos de nossa vida diária, contribuindo para o bem-estar, como atividade física, dieta, sono, entre outros.
Esses aplicativos ajudam na concretização de suas metas e objetivos de forma lúdica, divertida e interativa, podendo tratar seus indicadores individualmente, ou compartilhar com amigos, familiares, estimulando a todos a buscar concretizar suas metas.
Esse tipo de aplicativo, ajuda muito para aquelas pessoas que, como eu, têm um horário de trabalho bem dinâmico e não consegue frequentar academias ou marcar horários com personal trainers. Utilizo um destes aplicativos que tem me ajudado muito a melhorar a forma física e manter um acompanhamento melhor da minha saúde.
Tenho informações de que, no futuro próximo, estes aplicativos serão utilizados pelos Planos de Saúde para monitoras seus segurados. Os usuários que praticam atividades físicas regulares, controlam suas taxas com exames e vão ao médico com frequência, vão pagar menos, enquanto aqueles que não cuidam da saúde terão custos mais elevados. É esperar para ver.
Só para esclarecer, utilizo o aplicativo Samsung Health que veio embarcado em meu celular, mas existem outros aplicativos no mercado que cumprem a mesma função. Estou não só analisando meu desempenho, mas estudando o aplicativo, pois, pretendo no futuro desenvolver um aplicativo dessa natureza voltados para utilização nas comunidades ou em aparelhos mais simples. Criar programas de qualidade de vida nas comunidades é uma de nossas intenções.
2. Advocacia e novas tecnologias digitais
O século XXI trouxe em seu bojo uma série de transformações que nos autoriza a falar numa mudança de paradigma. De fato, os avanços das Tecnologias de informação e Comunicação (TIC), especialmente, da internet, tem movimentado a infraestrutura econômica mundial com repercussões na superestrutura política, social e cultural (CASTELLS, 2013).
Estamos, progressivamente, deixando a sociedade industrial para ingressar na sociedade da informação e do conhecimento, onde novas características, serviços e produtos estão sendo gerados. Por outro lado, essas novas características, produtos e serviços, tem relação com uma nova realidade de produção imaterial, onde ocorre um fenômeno chamado “desmaterialização” da economia, onde muitos bens têm deixado de ser físicos e são consumidos em sua forma imaterial (ROCHA, 2018).
Nos dias atuais os jornais, revistas e periódicos existem somente na forma virtual. Grandes produções cinematográficas de hollywood são lançadas, simultaneamente, no vídeo e no cinema. Já temos mais E-Books hoje do que livros físicos produzidos pelas editoras. Nosso comportamento mudou e nunca a humanidade esteve tão disposta a consumir bens imateriais.
Essas questões são sentidas também no mundo do trabalho, os autores Oliveira e Carelli nos falam dos impactos dessa nova economia do conhecimento para o direito do trabalho, na obra: As plataformas digitais e o direito do trabalho: como entender a tecnologia e proteger as relações de trabalho no século XXI (OLIVEIRA, 2021).
Por outro lado, a criatividade, por exemplo, em 2015 era considerada como 10ª habilidade mais importante para o mercado de trabalho. Já em 2018, no Fórum Econômico de Davos, galgou posições e passou a ser considerada a terceira habilidade mais requerida pelas empresas, atrás apenas da capacidade de raciocínio lógico e do pensamento crítico.
A criatividade é importante para uma sociedade ou organização por conta de ser um ingrediente imprescindível para o processo de inovação, seja ela tecnológica, pública ou social. E nessa nova sociedade do conhecimento, a inovação é a mola mestra do desenvolvimento econômico-social sustentável.
Sobre isso, vários autores como Stiglitz (STIGLITZ, 2004), tem defendido que a inovação tecnológica tem a capacidade de gerar “externalidades positivas” beneficiando toda a sociedade. Ou melhor, o crescimento econômico e a riqueza experimentados pela humanidade nos últimos 70 anos é, mais de 80%, fruto da inovação tecnológica, pública e social. O que seria de nós brasileiros sem a inovação do Sistema Único de Saúde (SUS).
É por teste motivo que as nações mais desenvolvidas têm investido significativamente em inovações tecnológicas que possam gerar ativos de propriedade intelectual.
Mas, inovar não é pensar só em lucro para as empresas, é preciso ter em vista o propósito do projeto, ou seja, quais os ganhos para a sociedade. Por outro lado, concordamos com o conceito defendido por Marc Giget, do Instituto Europeu de Criatividade, de que a inovação deve ter o ser humano com centro gravitacional do processo e seu objetivo último é melhorar a condição humana, ou seja, melhorar a vida dos indivíduos, harmonizar a convivência em sociedade, aprimorar a vida nas cidades e no campo, melhorar nossa relação com o meio ambiente (GIGET, 2010).
Vale dizer que nossa última Conferência Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação (CECTI), organizada pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (SECTI) e pelo Conselho Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação (CONCECTI), apresentou a ideia de BAHIA: Sociedade 5.0. A CECTI trouxe uma questão essencial para os nossos dias que diz respeito a: Como utilizar a Ciência, Tecnologia e Inovação para alcançar os melhores resultados, que nos auxiliem na superação de nossos desafios e, ao mesmo tempo, nos coloque em direção a sociedade 5.0 (SECTI, 2019, p. 08).
Como professor universitário e pesquisador na área de CTI, chamo à atenção para dois temas da CECTI fundamentais para as Instituições de Ensino Superior que são: Eixo 4 – Como formar pessoas para a sociedade 5.0 e o Eixo 8 – Difusão de conhecimento e popularização da ciência. Para que um ecossistema de inovação funcione é preciso que os diferentes atores: sociedade; empresas; academia; poder público; interajam e desempenhem papéis específicos para o giro do ecossistema, como hélices com múltiplas vértices (SECTI, 2019, p. 09).
O Direito, por sua vez, não fica alheio a essas mudanças, os impactos já podem ser sentidos nas diversas áreas de atuação dos profissionais e as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direitos, foram alteradas pela Resolução nº 02 de 19 de abril de 2021, tentando atender a essas mudanças.
Mas nem só de processo eletrônico e audiências virtuais vive o direito, existe muito mais a ser utilizado pelos profissionais em sua atividade cotidiana. As tecnologias prioritárias para o país não se limitam as tecnologias habilitadoras (Inteligência Artificial, Internet das Coisas, entre outros), elas vão muito além disso. Destaco, nesse sentido, as tecnologias para a qualidade de vida.
3. Tecnologias prioritárias
Está em formação no Brasil um marco legal para CTI visando melhorar a posição do Brasil no ranking global da inovação, se em termos de artigos científicos nos encontramos na 12ª ou 13ª posição, quando o assunto é inovação tecnológica, estamos em modesto 70º lugar (ABDI, 2020). A leitura desses indicadores demonstra que o Brasil vem gerando conhecimento, mas, não conseguem converter esse conhecimento em ativos de propriedade intelectual e divisas para o país. Essa é uma parte da equação que o país ainda não aprendeu.
É por este motivo que o Brasil está investindo no marco legal de CTI, visando a criar um ambiente institucional favorável a inovação em terras Brasilis. Destaco a Lei 13.243 de 2016 (BRASIL, 2016), o Decreto 9.283 de 2018 (BRASIL, 2018). A Estratégia Nacional de CTI – ENCTI 2016 a 2022 (BRASIL, 2016) e a Política Nacional de Inovação (BRASIL, 2020). Nesse panorama, temos as chamadas Tecnologias Prioritárias, definidas pelas Portarias do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) de nº 1.122/2020 e 1.390/2020 que destacam os 05 grupos de tecnologias prioritárias no Brasil.
- Tecnologias estratégicas (espacial, nuclear, cibernética, segurança pública, segurança de fronteiras, entre outras);
- Tecnologias habilitadoras (Inteligência Artificial, Internet das Coisas, Materiais Avançados, Biotecnologia e nanotecnologia, entre outras)
- Tecnologias de produção (modelos de inovação, economia solidária, entre outras);
- Tecnologias de desenvolvimento sustentável (cidades inteligentes, energias renováveis, bioeconomia, tratamento e reciclagem de resíduos sólidos, tratamento de poluição, monitoramento, prevenção e recuperação de desastres naturais, além da proteção ambiental);
- E Tecnologias para a qualidade de vida (saúde, bem-estar, saneamento básico, segurança alimentar, segurança hídrica, entre outras).
Como pode ser lido nem tudo se limita a gestão de projetos nas organizações, o Estado e a comunidade internacional preocupa-se também com o bem-estar da sociedade, e com a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.
4. Tecnologias de qualidade de vida
Poderíamos falar aqui sobre os diversos softwares e aplicativos utilizados no mundo do direito, mas a ideia de trazer tecnologias para a qualidade da vida, foi a de provocar mais o livre pensar de nossos estudantes e profissionais do direito. Que novos aplicativos e softwares poderemos desenvolver para melhorar a vida desses profissionais, trago como exemplo o aplicativo Samsung Health, que tem me ajudado a melhorar minha qualidade de vida, em todos os sentidos, ao me auxiliar nos exercícios físicos, monitorar uma série de funções em meu corpo e me dá relatórios do meu progresso, a qualquer momento.
Acredito que se eu tivesse a ajuda de um personal trainer ele usaria um aplicativo semelhante para monitorar meu rendimento, pois, duvido, que ainda utilize a velha prancheta com uma folha em branco. Nada contra os profissionais dessa área, muito pelo contrário, acho que eles são vitais para ajudar as pessoas a realizar o exercício da forma correta e ainda lhe dar motivação, mas, para indivíduos como eu, que têm horários incertos e precisa praticar seus treinos quando a situação permite, a inteligência artificial no aplicativo tem me auxiliado bastante na superação das minhas metas.
Se o indivíduo for disciplinado ele consegue controlar padrões e qualidade do sono, oxigenação sanguínea durante o sono, detecção de ronco, avaliações durante os exercícios físicos, postura durante a corrida, tempo de contato, tempo de voo e oscilação vertical, para analisar e desenvolver os hábitos de corrida e evitar lesões. Sem prejuízo de qualquer outra forma, acho que o aplicativo pode ser a solução para monitorar sua qualidade de vida.
No futuro próximo poderemos desenvolver aplicativos que possam ser utilizados por instituições comunitárias e, quem sabe, financiados pelo poder público, reduzindo o atendimento médico e economizando recursos do erário público.
5. Objetivos do Desenvolvimento Sustentável
Por fim, cabe dizer que tudo isso que falamos aqui contribui para o atendimento das metas dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, principalmente, em relação a qualidade de vida. Os aplicativos das empresas de celulares são cheios de funções que quase nunca são utilizadas, ou foram pensados para serem utilizados por grandes executivos. Mas se a partir dessas versões, tivéssemos aplicativos mais simples e com as atividades da comunidade.
São todas possibilidades que podemos pensar para um futuro próximo em que a inteligência artificial auxiliará nossa inteligência humana.
Referências
ABDI. Agenda Brasileira para a Indústria 4.0: O Brasil preparado para os Desafios do Futuro. Ministério da Indústria Comércio e Serviço - Governo Federal, 2020. Disponivel em: <http://www.industria40.gov.br/>. Acesso em: 02 Fevereiro 2021.
BRASIL. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação - ENCTI 2016 a 2022. Brasília : MCTI, 2016.
BRASIL. Lei 13.243 de dezembro de 2016 - Dispõe sobre estímulos ao desenvolvimento científico, à pesquisa, à capacitação científica e tecnológica e à inovação. Presidência da República | Secretaria Geral | Subsecretaria de Assuntos Jurídicos, Brasília, 2016. Disponivel em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13243.htm>. Acesso em: 30 novembro 2020.
BRASIL. DECRETO Nº 9.283, DE 7 DE FEVEREIRO DE 2018. Presidência da República | Secretaria Geral | Subsecretaria de Assuntos Jurídicos, 2018. Disponivel em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/d9283.htm>. Acesso em: 30 Novembro 2020.
BRASIL. Decreto 10.534 que institui a Política Nacional de Inovação - PNI. Presidência da República - Casa Civil, 2020. Disponivel em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/decreto/D10534.htm>. Acesso em: 06 Junho 2021.
CASTELLS, M. A sociedade em rede. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.
GIGET, M. Inovação Tecnológica gera qualidade de vida. Revista Interação, São Paulo, 17 Março 2010. 01-05.
OLIVEIRA, M. S. C. R. L. As plataformas digitais e o direito do trabalho. Belo Horizonte: Dialética, 2021.
ROCHA, J. C. Economia da Informação. Brasília: UFRJ/CAPES, 2018.
SECTI. Bahia: Sociedade 5.0. Salvador: Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação - SECTI/BA - Governo do Estado da Bahia, 2019.
STIGLITZ, J. E. E. G. B. Rumo a um Novo Paradigma em Economia Monetária. São Paulo: Francis, 2004.
[1] Advogado, economista e professor titular da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Currículo lattes http://lattes.cnpq.br/5068823120384244