Pressuposto histórico-filosófico hermenêutico dos direitos humanos e sua principiologia ao Direito do Trabalho

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3. HERMENÊUTICA E PRINCIPIOLOGIA

Se o Direito do Trabalho, esta inserido na ordem como direito social, fundamental, e, sobretudo humano, para ser concedido em sua integralidade, demandam uma lógica e principiologia própria a orientar a interpretação desses direitos, no âmbito constitucional e internacional.

Especialmente em direito do Trabalho, quatro princípios merecem destaque por sua relevância quanto a hermenêutica, que são o princípio da interpretação teleológica, princípio da interpretação efetiva, o princípio da interpretação dinâmica e evolutiva dos dispositivos pertinentes aos direitos sociais, e o princípio da proporcionalidade.

O Princípio da Interpretação Teleológica traduz a busca de realizar os objetivos e propósitos consagrados nos comandos constitucionais e internacionais afetos à proteção desses direitos, a partir de uma lógica material, afastando leituras interpretativas que restrinjam seu alcance das obrigações assumidas pelos Estados no tocante a realização desses direitos sociais. Deve estar pautado na Dignidade da Pessoa Humana na medida em que os direitos humanos inspiram-se na afirmação da dignidade e na prevenção do sofrimento humano.

O princípio da interpretação efetiva endossa a importância de conferir às previsões concernentes aos direitos sociais a maior efetividade possível, cabendo ao intérprete maximizar e potencializar o alcance das normas veiculadoras de direitos humanos, evitando interpretações restritivas e reduzidas afetas a este direito.

O princípio da interpretação dinâmica e evolutiva dos dispositivos pertinentes aos direitos sociais é tarefa do intérprete para considerar as mudanças ocorridas nos planos sociais e político para a adequada interpretação dos direitos previstos nos planos constitucional e internacional. O alcance e o significado dos direitos não podem restar confinados e estagnados às concepções do momento em que foram elaborados, devendo ser concebidos como living instrument, a ser interpretado à luz do contexto e dos valores contemporâneos. O Intérprete deve vitalizar e não engessar os instrumentos protetivos, razão pela qual essa legiferança demasiada fragiliza o sistema através do retrocesso, e da flexibilização de normas mal cerzidas no ordenamento econômico, social e cultural.

E por fim o Princípio da Proporcionalizada pressupõe três dimensões: a necessidade a adequação e a proporcionalidade em sentido estrito, evitando qualquer excesso na restrição de direitos. É a busca por um justo equilíbrio entre as demandas de proteção geral da comunidade e as demandas de proteção dos direitos fundamentais individuais.

Esses quatro princípios orientadores da hermenêutica próprios dos direitos humanos aplicam-se ao direito do trabalho, e transita-se à reflexão dessa nova normalidade global econômica no tocante a efetivação dos direitos sociais, com tendência a flexibilização e desconstitucionalização desses direitos da esfera trabalhista.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

À vista do exposto, ciente de que apenas tivemos condições de esgrimir alguns argumentos em torno de alguns pressupostos históricos-filosófico hermenêuticos dos direitos humanos e sua principiologia ao direito do trabalho, não podemos olvidas que todas as saídas nos levarão ao crivo da jurisprudência (vinculante!?) do Supremo Tribunal Federal.

Aqui cabe a lição de Lênio Luiz Streck12, no sentido de que ao intérprete não é conferida a possibilidade de “dizer qualquer coisa sobre qualquer coisa”, já que sempre sujeito aos limites textuais mínimos (explícitos e implícitos) estabelecidos pelo sistema constitucional.

Penso que se os Direitos Humanos são os que civilizam a democracia, o Estado de bem-estar social é o que civiliza os mercados, e nesta linha de entendimento, resulta pelo menos discutível a tese de que as normas eivadas de inconstitucionalidade que tivesse em conflito com uma determinada interpretação a respeito do regime de direitos fundamentais, ainda mais quando tal interpretação do transbordo normativo é objeto de dissídio na doutrina e jurisprudência interdisciplinar.

Assim, dadas as opções discutidas (que não voltarão aqui ser retomadas e avaliadas, até mesmo por não ser nosso intuito enunciar qualquer conclusão fechada em relação às mesmas), mas pelas considerações levantadas na presente análise, pretendemos destacar a relevância da importância dos direitos humanos e sua principiologia ao direito do trabalho, cuja concepção foi revigorada e reestruturada pela ampla proteção constitucional dado ao tema.

Essa proteção constitucional e internacional se traduz como defesa da humanização do trabalho, e exige que os novos impositivos normativos, e a nova realidade laboral se readéque a mudança de postura ética, na consideração de que o trabalhador esta a frente dos meios de produção, resgatando-se o “habitat laboral” como espaço de construção de bem estar e dignidade daquele que labora.

Destaque-se que a dignidade humana é princípio de caráter absoluto norteador de toda a atividade econômica, haja vista todos os pressupostos histórico-filosóficos, que consubstanciaram em um dos fundamentos da República, uma vez que não há Direitos Humanos (Trabalhistas) sem democracia e tampouco democracia sem Direitos Humanos (Trabalhistas).


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico Universitário. 3ªed. SP: Saraiva, 2017. p. 490.

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STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) crise. 5ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2004, p. 310.

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OUTRAS CONSULTAS LEGISLATIVAS

  • Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem

  • Convenção Americana sobre Direitos Humanos

  • Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San Salvador)

  • Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência

  • Carta da Organização dos Estados Americanos

  • Carta Democrática Interamericana

  • Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão

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Notas

1 “Bem, quando você olha para o infinito, percebe que há coisas mais importantes do que o que as pessoas fazem o dia todo.” (Calvin e Hobbes).

2 Ignacy Sanchs, “Desenvolvimento, direitos humanos e cidadania”, in Direitos Humanos no Século XXI, 1998, p. 156.

3 Hannah Arendt, “A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt, Cia das Letras, São Paulo, 1988, p. 134.

4 DUPEYROUX, Jean Jacques. O Direito à Seguridade Social. Biblioteca do INSS. Artigo publicado em italiano, na Rivista degli infortuni e delle malattie professionali (Roma), fase n. 2, março/abril de 1961, págs. 201/233, p. 11.

5 Na segunda metade do século XIX, observou-se um crescimento no comércio, que cada vez mais se preocupava com o aumento da comercialização, esquecendo-se da justiça social frente à figura do consumidor. O século XX trouxe modificações importantíssimas na sociedade de consumo. O crescimento industrial e tecnológico (principalmente a partir da segunda metade do século XX), aliados a um mercado apto a consumir, despertou a necessidade de regulamentação das relações de consumo. Ademais, o desemprego passou por forte crescimento, acarretando profundas desigualdades sociais. O fato é que houve uma massificação dos contratos na economia. A livre concorrência obteve algumas limitações, o que foi extremamente acentuado no final do século XX. O desequilíbrio nas relações de consumo era cada vez mais alarmante. Justamente por isso, o artigo 170 da Carta Constitucional de 1988 estabelece, in verbis: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I – soberania nacional; II – propriedade privada; III – função social da propriedade; IV – livre concorrência; V – defesa do consumidor; VI – defesa do meio ambiente; VII – redução das desigualdades regionais e sociais; VIII – busca do pleno emprego; IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.”.

6 Hector Gros Espiel, Los derechos económicos, sociales y culturales em el sistema interamericano, San José, Libro libre, 1986, pp. 16-17.

7 Paul Farmer, Patologias do Poder, Universidade da Califórnia, 2003, p.50., disse: “De acordo com dados do relatório “Sinais Vitais”, do Worldwatch Institute, a desigualdade de renda se reflete nos indicadores de Saúde, mortalidade infantil nos países pobres é 13 vezes maior do que nos países ricos; a mortalidade materna é 150 vezes maior nos países de menor desenvolvimento em relação aos industrializados. A falta de água limpa e saneamento básico mata 1,7 milhão de pessoas por ano (90% Crianças), ao passo que 1,6 milhões de pessoas morrem de doenças da utilização de combustíveis fósseis para aquecimento e preparo de alimentos. O relatório ainda atenta para o fato de que a quase totalidade dos conflitos armados se concentra no mundo em desenvolvimento, que produziu 86% de refugiados na última década.

8 Paulo Bonavides. Curso de Direito Constitucional, São Paulo, Malheiros, 2000.

9 "desvio da finalidade da lei".

10 David Trubek. In human rigths in international law: legal and policy issues, Theodor Meron (Ed.) Oxford, Claredon Press, 1984, p. 207

11 José Joaquim Gomes Canotilho. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, Almedina, 1998.

12 STRECK, Lênio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) crise. 5ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2004, p. 310.

Sobre a autora
Tatiana Conceição Fiore de Almeida

Advogada (OAB/SP 271162), Doutorando Em Direito Constitucional pela Universidade de Buenos Aires (UBA), Coordenadora do Núcleo de Direito Previdenciário da ESA.OAB/SP; Relatora da 4ª Turma de Benefícios da CAASP; Membro Efetivo das Comissões de Direito do Trabalho, Direito Previdenciário, Perícias Médicas; Membro Convidada da Comissão de Direito Desportivo da OAB/DF; Articulista/Investigadora da equipe internacional Latin-Iuris (Instituto Latinoamericano deInvestigación Y Capacitación Jurídica); Articulista e Coordenadora de Obras Jurídicas; Coautora em diversas Obras Coletivas; Professora; Membro da Comunidad para la investigación y el estúdio laboral y ocupacional-CIELO; Coordenadora do Livro Previdenciário um olhar Crítico sobre Constitucionalidade e as Reformas (2016); Um Olhar Crise além dos Direitos Sociais (2019); e Previdenciário: Novas Tecnologias e Interações entre o Direito, a Saúde e a Sociedade; Participou como membro convidado da CPI da Previdência (ano 2017).︎

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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