O imposto de importação é um tributo o qual a doutrina e a jurisprudência tem remetido para o pensamento de que o imposto aduaneiro está sob a égide do lançamento por homologação, uma vez que o contribuinte antecipa, por disposição da legislação específica, o pagamento do referido tributo e, posteriormente, a autoridade realiza o ato homologatório do pagamento do citado gravame. Nessa premissa, ao registrar a Declaração Aduaneira junto ao SISCOMEX, (Sistema Integrado de Comércio Exterior), ocorre então o respectivo pagamento antecipado de tributos, sem exame por parte do Fisco no procedimento administrativo de despacho aduaneiro. [1]
O procedimento de despacho por sua vez tem início com o registro da declaração de importação junto ao SISCOMEX (Sistema Integrado de Comércio Exterior). No momento do registro da declaração de importação, como frisado precedentemente é efetuado o pagamento dos tributos aduaneiros. Concluída a fase da conferência aduaneira, sem exigência, surge o desembaraço aduaneiro, ou liberação das mercadorias ao importador. [2]
Um caso clássico que geralmente ocorre a interrupção do despacho aduaneiro de importação é evidenciado no momento que são prestadas informações equivocadas quanto a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM). Havendo por parte do AFRFB entendimento que a NCM adotada pelo importador está equivocada, a autoridade administrativa procede a retenção das mercadorias e exige a correção, isto é, nova NCM, logo em face a reclassificação fiscal, via de regra, há necessidade de exigência de obrigações aduaneiras tributárias, ou seja, a diferença de tributos e multas.
No curso da conferência aduaneira, a autoridade administrativa pode ainda interromper o procedimento de importação para fins de afastar a validade do Certificado de Origem preferencial, (documento que reduz o valor do imposto de importação de forma parcial ou total), se houver por caso erro material do documento então passa a ser cabível a exigência do imposto de importação e seus sucedâneos.[3]
Podemos sublinhar também que há possibilidade de interrupção do procedimento de despacho aduaneiro nos casos de não reconhecimento do ex-tarifário, (instrumento legal que redução do imposto de importação de bens de capital, Informática e telecomunicações), passando assim com a desqualificação do tratamento a ser exigível o imposto de importação de forma integral.
Nesse compasso, considerando as hipóteses acima narradas o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil por meio de intimação junto ao SISCOMEX (Sistema Integrado de Comércio Exterior), exige a diferença de tributos não pagos e seus reflexos, por consequência, surge assim a imposição da penalidade pecuniária por não pagamento do tributo no prazo de vencimento, sendo por sua vez imposta multa tributária. Porém, destaca-se que se o importador, antes da intimação do Fisco local, tome a iniciativa de efetuar voluntariamente o pagamento do crédito tributário-aduaneiro pendente, isso não ampara o contribuinte no que tange a denúncia espontânea da infração para eximir-se da multa haja vista o que prevê o artigo 102 do Decreto Lei 37, de 1966.[4]
Numa primeira visada, depreende-se que nos termos da legislação de regência, observando inclusive o Regulamento Aduaneiro, a penalidade cabível seria, in verbis:
Art. 746. Os débitos decorrentes dos tributos e contribuições de que trata este Decreto, não pagos nos prazos previstos na legislação específica, serão acrescidos de multa de mora, calculada à taxa de trinta e três centésimos por cento, por dia de atraso (Lei nº 9.430, de 1996, art. 61, caput).
Por outro lado, surge em tese ainda pela mesma conduta, a possibilidade de atrair uma multa mais gravosa em substituição a anterior, denominada de multa de ofício, prevista no artigo 725 do Regulamento Aduaneiro (Inciso I do artigo 44 da Lei 9.430/96):
Art. 725. Nos casos de lançamentos de ofício, relativos a operações de importação ou de exportação, serão aplicadas as seguintes multas, calculadas sobre a totalidade ou a diferença dos impostos ou contribuições de que trata este Decreto (Lei nº 9.430, de 1996, art. 44, inciso I, e § 1º, com a redação dada pela Lei no 11.488, de 2007, art. 14):
I - de setenta e cinco por cento, nos casos de falta de pagamento, de falta de declaração e nos de declaração inexata, excetuada a hipótese do inciso II; e
Assim sendo, sobrevém a necessidade de se examinar aqui qual multa tributária seria aplicável ao caso em debate, ou seja, a multa de mora ou a multa de ofício, uma vez que as referidas penalidades são impostas posteriormente a ocorrência do fato gerador do tributo que no caso concreto é o registro da declaração de importação, todavia, ambas são aplicadas nos termos da legislação de regência em forma e momentos distintos.
No que tange as multas tributárias acima destacadas, a multa de mora e a multa de ofício, materializam-se em face o não recolhimento do tributo no momento de seu vencimento. A primeira de trinta e três centésimos por cento, por dia de atraso, a qual tem o limite máximo de 20%. A segunda, por sua vez, tem o patamar específico de 75%. As multas são calculadas sobre o valor principal a ser pago, as quais são aplicadas pelo Fisco conforme o momento de pagamento do imposto devido.
Nessa quadra, a questão é que as jurisdições aduaneiras na prática entendem que deve ser aplicado ao importador a multa de ofício de 75% sobre o montante do principal e somente admitem o afastamento desta multa em casos específicos previstos no Ato Declaratório RFB nº 6, de 23 de dezembro de 2018. [5]
Essa imposição da multa de ofício no curso do despacho aduaneiro de importação, ocorre primeiramente por mera informação junto ao SISCOMEX, não sendo formalizada em lançamento de ofício nos termos da lei.
No magistério de Liziane Angelloti Meira, quando aborda acerca do lançamento de ofício em procedimento de importação temporária, ensina que:
Pois multa de ofício significa multa lançada de oficio pela autoridade em razão de falta de adimplemento voluntário da obrigação. Ademais ressalta-se que o Decreto 70.235/72, tem hierarquia de lei e não pode ser alterado excepcionalmente por outro decreto. [6]
O entendimento adotado pelas autoridades alfandegárias parece-nos que não encontra amparo legal na legislação aduaneira e tributária, pois forçoso concluir que se não foi lavrado pelo Auditor-Fiscal da RFB o lançamento de ofício, logo não há que se falar em multa de ofício. Tanto é verdade que deveria se atentar para o que reza o Ato Declaratório Normativo COSIT nº 13, de 21 de janeiro de 1997[7]. Desse modo, o referido ato administrativo da COSIT orienta que seria cabível a multa de mora.
Em suma, conclui-se que se durante o procedimento de despacho aduaneiro o importador for intimado por meio de informação junto ao SISCOMEX para fins de complementar pagamento de crédito tributário, o importador então está sujeito a multa menos gravosa, isto é, a multa de mora, pois não sofreu na oportunidade o lançamento de ofício (auto de infração). Na verdade, o que houve foi uma exigência fiscal sem efeito de lançamento de crédito tributário no software estatal. Contudo, por outro lado, caso o AFRFB lavre o auto de infração, então, a multa aplicável é a multa de ofício.
BIBLIOGRAFIA:
FERNANDES. Rodrigo Mineiro. Revisão Aduaneira. São Paulo: Intelecto. 2016.
FERNANDES. José Fernandes do Nascimento. Despacho Aduaneiro de Importação. In.
PEIXOTO, Marcelo Magalhaes; SARTORI. Angela. DOMINGO, Luiz Roberto (Coord). Tributação aduaneira na Jurisprudência do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. São Paulo: MP. APET.2013.
MANFRINATO. Paulino. Imposto de Importação: Uma análise do lançamento e fundamentos. São Paulo: Aduaneiras, 2002.
MEIRA. Liziane Angeloti. Regimes Aduaneiros Especiais. Ed. Aduaneiras. São Paulo. 2002.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2000.
MELO. José Eduardo Soares de Melo. A importação e a exportação no direito brasileiro. Impostos Taxas Contribuições. Ed. São Paulo. RT. 2003.
MOURA, Caio Roberto Souto de. Processo Administrativo e Recursos no Despacho aduaneiro. In. FREITAS. Vladmir Passos de. (Org.) Importação e Exportação no Direito Brasileiro. São Paulo: RT, 2004. Pag. 226-270.
PAUSEN. Leandro. Constituição e Código Tributário Comentados. Ed. 18ª . Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2017.
[1] MANFRINATO. Paulino. Imposto de Importação: Uma análise do lançamento e fundamentos. São Paulo: Aduaneiras, 2002. Pag. 104.
[2] IN SRF nº 680/2006. Disciplina o procedimento administrativo de despacho aduaneiro.
[3] IN RFB nº 1984/2018.
[4] Art.102 - A denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do imposto e dos acréscimos, excluirá a imposição da correspondente penalidade.
§ 1º - Não se considera espontânea a denúncia apresentada:
a) no curso do despacho aduaneiro, até o desembaraço da mercadoria;
b) após o início de qualquer outro procedimento fiscal, mediante ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, tendente a apurar a infração.
[5] “Art. 1º Não constitui infração punível com a multa prevista no art. 44 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, a solicitação, feita no despacho de importação, de reconhecimento de imunidade tributária, isenção ou redução de tributos incidentes na importação e preferência percentual negociada em acordo internacional, quando incabíveis, bem assim a indicação indevida de destaque ex, desde que o produto esteja corretamente descrito, com todos os elementos necessários à sua identificação e ao enquadramento tarifário pleiteado, e que não se constate, em qualquer dos casos, intuito doloso ou má fé por parte do declarante.”
[6] MEIRA. Liziane Angeloti. Regimes Aduaneiros Especiais. Ed Aduaneiras. São Paulo. 2002. Pag. 327.
[7] “Declara em caráter Normativo, às Superintendências Regionais da Receita Federal, às Delegacias da Receita Federal de Julgamento e aos demais interessados, que o pagamento do imposto de importação efetuado em data posterior àquela do registro da declaração de importação no Sistema Integrado de Comércio Exterior – Siscomex sem os acréscimos moratórios de infração punível com a multa prevista no art. 44, inciso I, dessa mesma Lei, excluídas as hipóteses de que trata o Ato Declaratório (Normativo) nº 10, de 16 de janeiro de 1997.”