CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

13/09/2021 às 16:48

Resumo:


  • O controle de constitucionalidade é o mecanismo que verifica a compatibilidade das leis e atos normativos com a Constituição, podendo ser preventivo, realizado antes da norma entrar em vigor, ou repressivo, após sua vigência.

  • Realizado pelos três poderes, o controle de constitucionalidade envolve o Poder Legislativo (por meio de comissões como a CCJ), o Poder Executivo (através do veto presidencial), e o Poder Judiciário (via decisões judiciais que podem declarar uma norma inconstitucional).

  • No Brasil, adota-se um sistema misto de controle de constitucionalidade, com a possibilidade de controle difuso, por qualquer juiz ou tribunal, e controle concentrado, realizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

DIREITO CONSTITUCIONAL - CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Controle de Constitucionalidade é a verificação de compatibilidade das leis e demais atos ou omissões normativas com a Constituição.

Realiza-se, também, o controle de constitucionalidade das omissões dos poderes públicos quando eles deixam de regulamentar as normas constitucionais de eficácia limitada.

Portanto, o objeto do controle é abrangente, incide sobre as leis, outros atos normativos (exemplo: medida provisória) e comportamentos omissos das autoridades públicas.

Na verdade, em sentido amplo, todo ato ou negócio jurídico submete-se ao controle de constitucionalidade à medida que deve observar às normas constitucionais.

O fundamento do controle de constitucionalidade é a estrutura piramidal dos ordenamentos jurídicos que adotam o modelo de Constituição rígida e, por consequência, a supremacia formal das normas constitucionais em relação às demais leis.

Dessa forma, o controle de constitucionalidade caracteriza-se como sendo o mecanismo da proteção da supremacia constitucional.

As finalidades do controle de constitucionalidade são:

a) Fiscalizar a observância do princípio da supremacia formal da Constituição;

b) Declarar a nulidade das leis, espécies normativas e comportamentos contrários à Constituição.

São duas as formas de controle de constitucionalidade:

a) Controle preventivo: é o que evita o ingresso no ordenamento jurídico do ato normativo inconstitucional. É, pois, feito antes da entrada em vigor da lei.

b) Controle repressivo: é o que visa retirar do ordenamento jurídico o ato normativo que entrou em vigor, mas padece de inconstitucionalidade.

O controle preventivo é exercido pelo Poder Legislativo e Poder Executivo e, excepcionalmente, pelo Poder Judiciário.

O controle repressivo, por sua vez, é função do Poder Judiciário, mas, em caráter excepcional, é também realizado pelo Poder Legislativo e Poder Executivo.

Vê-se assim que compete aos três poderes da República zelar pela supremacia da Constituição Federal, realizando o controle de constitucionalidade.

CONTROLE PREVENTIVO PELO PODER LEGISLATIVO

O Poder Legislativo é o encarregado de elaborar as leis e, por isso, realiza o controle preventivo por excelência.

Este controle é exercido pelo parlamentar, quando elabora o projeto de lei, outrossim, durante os exames e debates acerca desse projeto.

Na Câmara dos Deputados, todo e qualquer projeto de lei é obrigatoriamente analisado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que tem a função típica de examinar se o projeto de lei é ou não compatível com a Constituição Federal, podendo proferir decisão terminativa, isto é, de arquivamento do projeto de lei inconstitucional, sem exame do mérito, nesse caso, o projeto não será sequer remetido ao plenário. Dessa decisão cabe recurso subscrito por pelo menos 1/10 (um décimo) dos membros dessa Casa Legislativa, cujo julgamento competirá ao plenário da Câmara dos Deputados.

No Senado Federal, nem todos os projetos passam pela Comissão de Constituição e Justiça, esta comissão só atua em situações específicas, como, por exemplo, requisição do Presidente da Casa. Aliás, o regimento interno autoriza o Presidente do Senado a arquivar de ofício projetos de leis manifestamente inconstitucionais e, quando assim o faz, está exercendo o controle preventivo de constitucionalidade.

As comissões permanentes temáticas ou técnicas da Câmara dos Deputados e do Senado, como, por exemplo, Comissão de Saúde, de Educação, etc., quando examinam o mérito do projeto também podem apontar as inconstitucionalidades.

Em suma, no âmbito do Poder Legislativo, o controle preventivo de constitucionalidade é exercido em vários momentos do processo de elaboração das leis. Na verdade, é dever de todo parlamentar verificar essas inconstitucionalidades.

CONTROLE PREVENTIVO PELO PODER EXECUTIVO

O Presidente de República, através do chamado veto jurídico, tem o poder de barrar os projetos de leis inconstitucionais que foram aprovados pelo Congresso Nacional, exercendo, destarte, o controle preventivo de constitucionalidade.

Este modelo, que permite a fiscalização de um poder pelo outro e é uma das características da separação de poderes, denomina-se mecanismo de freios e contrapesos.

O veto presidencial, no entanto, é relativo e poderá ser derrubado pelo Congresso Nacional. Nesse caso, diante da entrada em vigor da lei, restará apenas o controle repressivo de constitucionalidade.

CONTROLE PREVENTIVO PELO PODER JUDICIÁRIO

No Brasil, o controle preventivo de constitucionalidade é exercido tipicamente pelos poderes democráticos, que são os eleitos pelo voto popular, isto é, o Poder Legislativo e o Poder Executivo, mas o Poder Judiciário numa situação específica, desde que provocado, pode também declarar a inconstitucionalidade de um projeto de lei, exercendo, destarte, o controle preventivo de constitucionalidade.

Para tanto, é preciso os seguintes requisitos:

a) Que haja violação constitucional dos aspectos formais do processo legislativo ou então a afronta a alguma cláusula pétrea do §4º do art. 60 da CF. Exemplo: um projeto de lei rejeitado é apresentado novamente na mesma sessão legislativa, sem que tenha sido subscrito pela maioria absoluta dos Deputados ou Senadores, fato que infringe o art. 67 da CF.

b) Impetração de mandado de segurança. A legitimidade ativa para a impetração é exclusiva dos parlamentares. Trata-se, pois, de direito líquido e certo do parlamentar ao regular processo legislativo. No âmbito federal, é direito público subjetivo de qualquer deputado ou senador apresentar esse remédio constitucional. A competência é originária do Supremo Tribunal Federal. Não cabe, no entanto, o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade para questionar a validade de um mero projeto de lei. No âmbito dos projetos de leis estaduais ou municipais, a legitimidade para a impetração do mandado de segurança é dos deputados estaduais ou vereadores, respectivamente, e a competência é originária do Tribunal de Justiça.

Quando o projeto da lei afrontar apenas os regimentos internos do Poder Legislativo, o Poder Judiciário não poderá intervir, trata-se de questão “interna corporis”, nesse caso, não há violação direta da Constituição e, portanto, para preservar o princípio da separação dos poderes, veda-se o controle judicial preventivo e até mesmo o repressivo.

CONTROLE REPRESSIVO PELO PODER JUDICIÁRIO

O controle de constitucionalidade repressivo é o exercido após a ultimação do processo legislativo.

É o controle feito depois da publicação da lei ou ato normativo, ainda que no período da “vacatio legis”. Todos os juízes, na análise do caso concreto, realizam esse controle. E, no plano abstrato, é ainda cabível, perante o Supremo Tribunal Federal, a propositura de ação para se discutir tão somente a questão da inconstitucionalidade dos atos normativos e omissões legislativas.

CONTROLE REPRESSIVO PELO PODER LEGISLATIVO

O Poder Legislativo só pode exercer o controle de constitucionalidade repressivo, em caráter excepcional, nas seguintes hipóteses:

a) Para sustar, através de decreto legislativo, os atos do Poder Executivo que extrapolarem o poder regulamentar (art. 49, V, da CF). Com efeito, promulgada a lei, caso ela dependa de regulamentação para a sua fiel execução, competirá ao Presidente da República editar decreto regulamentar, ato administrativo que fornece os pormenores que viabilizam a aplicação da lei. Se esse decreto extrapolar os limites da lei, desviar-se dos seus fins, o Congresso Nacional poderá editar decreto legislativo para neutralizar os seus efeitos, exercendo, destarte, o controle repressivo de constitucionalidade.

b) Para sustar, através de decreto legislativo, a lei delegada que extrapolou os limites da delegação legislativa (art. 49, V, da CF). A lei delegada editada pelo Presidente da República, que ultrapassa os limites que o Congresso Nacional lhe havia autorizado previamente, reveste-se de inconstitucionalidade. Nesse caso, o Congresso Nacional pode baixar um decreto legislativo para sustar a sua aplicação, sem que haja necessidade de se valer do Poder Judiciário.

c) Para rejeitar medida provisória por motivo de inconstitucionalidade (art. 62 da CF). A medida provisória, como se sabe, é baixada pelo Presidente da República e entra em vigor com a sua publicação, todavia, o Congresso Nacional deverá apreciá-la posteriormente e, caso a rejeite, por motivo de inconstitucionalidade, estará fazendo o controle repressivo de constitucionalidade.

CONTROLE REPRESSIVO PELO PODER EXECUTIVO

O Poder Executivo só pode realizar o controle repressivo de constitucionalidade numa única hipótese, ou seja, anulando, por inconstitucionalidade, os seus próprios atos administrativos.

Antes da Constituição de 1.988, havia uma segunda hipótese, hoje polêmica. O Poder Executivo podia deixar de cumprir as leis que reputasse inconstitucionais. Era uma prática tão arraizada que configurava um verdadeiro costume constitucional de controle repressivo de constitucionalidade. Com o advento da Constituição de 1.988, alguns autores passaram a sustentar, com base no novo modelo de separação dos poderes, que isso não é mais possível.

SISTEMAS DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

Quanto aos órgãos incumbidos de realizar o controle de constitucionalidade, a doutrina apresenta a seguinte classificação:

a) Sistema de Controle Judicial: é o feito por um órgão integrante da estrutura do Poder Judiciário. Este sistema, que desde a proclamação da República é adotado no Brasil, surgiu nos Estados Unidos da América, em 1.803, no julgamento de um mandado de segurança chamado “Marbury X Madson”, ocasião em que a Suprema Corte dos EUA reconheceu a existência do “judicial review”, isto é, o controle judicial de constitucionalidade, a possibilidade de o Poder Judiciário invalidar os atos constitucionais dos outros Poderes.

b) Sistema de Controle Político ou Sistema de Matriz Austríaca: é o feito por órgãos que não integram a estrutura de nenhum dos três poderes. Na Itália, este órgão é a “Corte Constitucional”, e, na França, o “Conselho Constitucional”. Este sistema, idealizado por Hans Kelsen e adotado pela primeira vez na Áustria, em 1.920, hoje é seguido pela maioria dos países europeus. O controle de constitucionalidade é, pois, atribuído a um Tribunal Constitucional autônomo, desvinculado dos outros Poderes.

c) Sistema de Controle Misto: é o feito por órgãos não judiciais e por órgãos judiciais, conforme o tipo de situação. É adotado na Suíça. Com efeito, o controle de constitucionalidade das leis federais suíças é realizado por um Tribunal Constitucional autônomo e o das leis cantonais (que equivalem às nossas leis estaduais) pelo Poder Judiciário.

No Brasil, como vimos, adota-se o sistema de controle judicial. Ainda que o litígio seja entre os Poderes Executivo ou Legislativo e o Poder Judiciário, o julgamento será feito pelo Poder Judiciário.

CONTROLE JUDICIAL DE CONSTITUCIONALIDADE

Quanto ao órgão jurisdicional incumbido de exercê-lo, o controle judicial de constitucionalidade pode ser:

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

a) Controle Concentrado: é o exercido pelo Supremo Tribunal Federal.

b) Controle Difuso: é o exercido por qualquer juiz ou tribunal.

Em relação à natureza da discussão promovida em juízo, o controle de constitucionalidade desdobra-se em:

a) Controle Abstrato: quando o objeto da ação é tão somente o questionamento da inconstitucionalidade da lei ou ato normativo, sem que haja um conflito concreto.

b) Controle Concreto: quando o pedido principal da ação não é a declaração de inconstitucionalidade, e sim um outro relacionado à discussão de um caso concreto, mas incidentalmente se suscita a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo. Exemplo: numa ação de cobrança de débito tributário que a Fazenda Pública move em face de Pedro, a defesa alega a inconstitucionalidade da lei que instituiu esse tributo.

O STF, no entanto, funde as quatro hipóteses acima em apenas duas, adotando a seguinte classificação:

a) Controle concentrado ou abstrato ou principal ou direto ou objetivo ou fechado;

b) Controle difuso ou concreto ou incidental ou subjetivo ou aberto.

Portanto, são sinônimas as expressões controle concentrado ou abstrato, outrossim, controle difuso ou concreto.

O Brasil, portanto, adotou um sistema misto, porque há duas vias através das quais se faz o controle de constitucionalidade:

a) Via de ação direta de inconstitucionalidade (controle concentrado);

b) Via de exceção (controle difuso).

HISTÓRICO DO CONTROLE JUDICIAL NO BRASIL

a) Constituição do Império de 1.824: era semirrígida, quase todas as normas constitucionais podiam ser alteradas por simples leis ordinárias, e, portanto, diante da falta de supremacia formal da Constituição, não havia controle de constitucionalidade. O equilíbrio entre os três poderes, nessa época, era exercido por um quarto poder, denominado Poder Moderador, titularizado pelo imperador Dom Pedro II que, com eficiência, sempre garantiu que os outros três poderes permanecessem no exercício de suas atribuições constitucionais.

b) Constituição de 1.891 (primeira Constituição de República): inspirada no modelo dos EUA, reconheceu o controle judicial difuso.

c) Constituição de 1.934: manteve o controle difuso e apresentou duas inovações, isto é, a resolução do Senado como instrumento normativo apto a suspender a eficácia de leis ou atos normativos declarados inconstitucionais pelo STF, bem como a figura da representação interventiva, proposta para autorizar o Presidente da República a decretar a intervenção federal nos Estados-Membros.

d) Constituição de 1.937: manteve o controle difuso, mas extinguiu as duas inovações da Constituição anterior. Acrescentou algo abusivo, a possibilidade de o Poder Legislativo cassar as decisões judiciais, que declarassem a inconstitucionalidade das leis.

e) Constituição de 1.946: manteve o controle difuso e restaurou as duas inovações da Constituição de 1.934 (resolução do Senado para suspender as normas declaradas inconstitucionais pelo STF e representação interventiva). Ainda na sua vigência, em 1.965, uma Emenda Constitucional, inspirada no modelo europeu, instituiu o controle abstrato de constitucionalidade, consubstanciando na ação direta de inconstitucionalidade (chamada de representação de inconstitucionalidade), que só poderia ser proposta, junto ao STF, pelo Procurador Geral da República.

f) Constituição de 1.967: manteve, em matéria de controle de constitucionalidade, o sistema da Constituição de 1.946. Igualmente, a Emenda Constitucional nº 1 de 1.969.

CONTROLE DIFUSO OU INCIDENTAL OU INDIRETO OU CONCRETO OU ABERTO OU VIA DE EXCEÇÃO OU DEFESA

O controle difuso autoriza que a inconstitucionalidade seja decretada por qualquer juiz ou tribunal em ações judiciais de qualquer área do Direito (trabalhista, penal, cível, tributária, etc).

A inconstitucionalidade, no controle difuso, pode recair sobre leis ou atos normativos federais, estaduais ou municipais.

No controle difuso, o pedido principal não é a inconstitucionalidade e sim outro pedido baseado num caso concreto cuja lei que o respalda reveste-se de inconstitucionalidade. A questão da inconstitucionalidade figura como causa de pedir (exemplo: petição inicial da ação de inexigibilidade de débito tributário fundamentada na inconstitucionalidade de determinada lei) ou fundamento de defesa (exemplo: o réu, na ação de cobrança, sustenta, na contestação, que a lei que respalda o débito é inconstitucional).

A declaração de inconstitucionalidade é apenas incidental (“incidenter tantum”), pois, no referido processo, existem partes e lide, isto é, uma pretensão resistida, cuja solução, num ou outro sentido, está condicionada à análise da questão da inconstitucionalidade.

É claro que o juiz, de ofício, pode decretar a inconstitucionalidade de uma lei, porquanto a questão é de ordem pública.

Na sentença ou acórdão, a questão da inconstitucionalidade aparece na motivação ou fundamentação e não nos capítulos (tópicos da sentença ou acórdão que julgam o pedido).

O efeito de decisão judicial, que reconhece a inconstitucionalidade da lei, é apenas entre as partes (“inter partes”), isto é, a lei não será aplicada ao caso concreto. A lei não é, portanto, invalidada, pois o que ocorre é apenas uma “declaração incidental de inconstitucionalidade”, expressão usada para designar a inconstitucionalidade pronunciada na motivação da sentença ou acórdão. Se, no entanto, a inconstitucionalidade incidental, através de recurso extraordinário, for decretada pelo STF, a lei será invalidada e não poderá ser aplicada às partes e a nenhum outro caso, tendo, pois, efeito expansivo, conforme veremos mais adiante.

É declaratória a natureza jurídica da decisão judicial que reconhece a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo e, por consequência, tem, em regra, eficácia “ex tunc”, isto é, retroativa.

O STF, no entanto, por razões de segurança jurídica, pode, em caráter excepcional, modular os efeitos da decisão e estabelecer efeitos “ex nunc”, vale dizer, não retroativos ou fixar o efeito “pro futuro”, estipulando que a decisão judicial só valerá a partir de determinada data.

Acrescente-se ainda que a sentença que julga procedente a ação civil pública tem efeitos “erga omnes”, mas através da referida ação só se pode questionar a inconstitucionalidade de leis ou atos normativos como fundamentação jurídica, isto é, causa de pedir. Não se pode inserir no pedido da ação civil pública a declaração de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos, sob pena de ela se transfigurar numa disfarçada ação direta de inconstitucionalidade.

Conforme já salientado, no controle difuso, qualquer juiz ou tribunal, na motivação da sentença ou acórdão, pode declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo para viabilizar o julgamento do pedido. O art. 97 da CF dispõe, no entanto, que “somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.”

Enquanto o juiz de primeiro grau sozinho tem jurisdição para declarar a inconstitucionalidade de leis ou atos normativos, justamente porque suas decisões não formam jurisprudência, o Magistrado de Segundo Grau (desembargadores e ministros) não desfrutam dessa competência. Trata-se do princípio “full bench”, que significa bancada completa, oriundo do direito norte-americano, que proíbe aos órgãos fracionários dos tribunais (turmas, câmaras e sessões) declararem a inconstitucionalidade de uma lei.

Para preservar a estabilidade da ordem ou segurança jurídica e evitar decisões conflitantes, a Constituição veda que os órgãos fracionários dos Tribunais (turmas, câmaras e grupos de câmaras) pronunciem sobre a inconstitucionalidade, ainda que em caráter meramente incidental, reservando a competência ao plenário do Tribunal ou a seu Órgão Especial, exigindo ainda o quórum de maioria absoluta. É a chamada reserva de plenário ou de seu órgão especial.

O órgão especial do Tribunal exerce as mesmas funções administrativas e jurisdicionais do Tribunal Pleno. Só é possível a criação de órgão especial nos tribunais com mais de 25 (vinte e cinco) desembargadores, sendo metade escolhida pelo critério de antiguidade e a outra metade por eleição.

Com efeito, dispõe o art. 93, XI, da CF:

“Nos tribunais com número superior a vinte e cinco julgadores, poderá ser constituído órgão especial, com o mínimo de onze e o máximo de vinte e cinco membros, para o exercício das atribuições administrativas e jurisdicionais delegadas da competência do tribunal pleno, provendo-se metade das vagas por antiguidade e a outra metade por eleição pelo tribunal pleno”.

Acrescente-se que o STF é composto por duas turmas. Cada uma com 5 (cinco) membros. A 1ª ou 2ª Turma do STF não pode declarar a inconstitucionalidade de leis, a competência é exclusiva do plenário e ainda assim exige-se maioria absoluta, isto é, 6 (seis) votos, tendo em vista que no STF há 11 (onze) ministros.

Surgindo no julgamento do órgão fracionário a questão da inconstitucionalidade de uma determinada lei, duas hipóteses podem ocorrer:

1ª) o órgão fracionário entende que a lei é constitucional. Nesse caso, o próprio órgão fracionário tem jurisdição para o julgamento, declarando a validade da lei, porquanto a reserva de plenário é apenas para se declarar a inconstitucionalidade.

2ª) o órgão fracionário entende que a lei é inconstitucional. Em tal situação, o órgão fracionário deve lavrar o chamado “acórdão de encaminhamento”, consignando, nesse acórdão, que considerou a lei inconstitucional e, por isso, suscita a manifestação do Tribunal Pleno ou Órgão Especial (se houver). Trata-se, na verdade, do denominado “incidente” de inconstitucionalidade, que gera a cisão do julgamento, uma competência “per saltum”, no dizer de Pontes de Miranda. Trata-se de um critério funcional de competência.

Esta segunda situação gerará, portanto, três acórdãos sucessivos:

1º) acórdão do encaminhamento lavrado pelo órgão fracionário;

2º) acórdão do Tribunal Pleno ou Órgão Especial reconhecendo a inconstitucionalidade ou constitucionalidade da lei;

3º) acórdão de complemento do órgão fracionário, que julgará as demais questões não relacionadas à inconstitucionalidade das leis. Sobre o assunto, dispõe a Súmula 513 do STF: A decisão que enseja a interposição de recurso ordinário ou extraordinário não é a do plenário, que resolve o incidente de inconstitucionalidade, mas a do órgão (câmaras, grupos ou turmas) que completa o julgamento do feito. No STF, o pleno no próprio julgamento do acórdão de encaminhamento, decide também o restante das questões, por força da isonomia.

Por outro lado, a reserva do plenário é dispensada quando, no exercício do controle difuso o Tribunal Pleno ou Órgão Especial, ou então o plenário do Supremo Tribunal Federal, já houver declarado a lei inconstitucional (parágrafo único do art. 481 do CPC). Nesse caso, o órgão fracionário declara a lei inconstitucional reportando-se ao acórdão anterior.

Quanto às leis editadas antes da Constituição de 1.988, que sejam materialmente incompatíveis com ela, podem ser afastadas pelo órgão fracionário do tribunal, porquanto a questão refere-se à não recepção, isto é, revogação, e não propriamente à inconstitucionalidade. Não há, de acordo com a Excelsa Corte, a figura da inconstitucionalidade superveniente. Portanto, afasta-se, também nessa hipótese, a reserva de plenário.

Fora dessa hipótese de não recepção, os órgãos fracionários não podem, para driblarem a incidência da reserva de plenário, afastar a incidência da lei, sem declará-la expressamente inconstitucional, pois, esse artifício, por via oblíqua, surte o mesmo efeito da declaração de inconstitucionalidade.

A propósito, dispõe a Súmula Vinculante nº 10 do STF:

“Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.”

Finalmente, o Supremo Tribunal Federal, nos julgamentos de recursos extraordinários ou ações de sua competência originária, declara a inconstitucionalidade incidental, por via de exceção, de determinada lei, tem a faculdade de comunicar sua decisão ao Senado Federal. Este, por sua vez, caso queira, pode baixar uma resolução, suspendendo a execução da norma declarada inconstitucional (art. 52, X, da CF).

Trata-se de mera faculdade do Senado editar ou não essa resolução, mas se o fizer deverá atentar-se exclusivamente ao decidido pelo STF, isto é, suspender apenas a aplicação dos dispositivos legais declarados inconstitucionais pela Excelsa Corte.

É possível essa resolução do Senado ainda que se trate de leis estaduais ou municipais ou de outros atos normativos (exemplo: medidas provisórias).

É a chamada extensão subjetiva, que é a maneira de a decisão do STF entender-se a todas as pessoas. Por outro lado, ainda que o STF não faça a comunicação da sua decisão, o Senado pode expedir de ofício a resolução, conforme dispõe seu regimento interno.

Tradicionalmente, a decisão do STF que declara a inconstitucionalidade, por via de exceção, isto é, incidentalmente, só produz efeitos entre as partes do processo, de modo que a lei, conquanto inconstitucional, poderia ser aplicada em outros processos até que sobreviesse a resolução do Senado, cujo efeito seria “ex nunc”, isto é, a proibição de aplicação da lei só ocorreria a partir da dita resolução, embora alguns autores defendam que o efeito seria “ex tunc”, retroativo.

Atualmente, no entanto, prevalece no Supremo Tribunal Federal a tese, encabeçada pelo Ministro Gilmar Mendes, que a simples decisão da Excelsa Corte, que declara incidentalmente a inconstitucionalidade de determinada lei ou ato normativo, já é suficiente para, por si só, e, automaticamente, suspender-lhe a eficácia, com efeito erga omnes, para todos, e não apenas ao caso concreto. A mutação constitucional foi o argumento utilizado para a nova interpretação do art. 52, X, da CF, passando a resolução do senado a ter apenas a função de dar publicidade às decisões do STF. A doutrina tem chamado essa nova exegese de eficácia expansiva das decisões do STF. Noutras palavras, igualou-se os efeitos da decisão de inconstitucionalidade proferidas pelo STF, tanto no controle abstrato quanto no controle difuso, à medida que ambas, além de efeitos “erga omnes”, ainda dispensam, para que a eficácia da lei ou ato normativo inconstitucional seja suspenso, a resolução do Senado.

De fato, instaurado o incidente de inconstitucionalidade, através do acórdão de encaminhamento da 1ª ou 2ª turma do STF, poderão manifestar-se, nos termos do art. 482 do CPC:

a) O Ministério Público, através do Procurador Geral da República;

b) A União, que é a pessoa jurídica de direito público responsável pela edição da lei federal questionada;

c) Os legitimados para a propositura da ADI (ação direta de inconstitucionalidade), mencionados no art. 103 da CF. Esta possibilidade, trazida pela lei 9.868/99, foi o ponta pé inicial para a objetivação do controle difuso que, até então, se limitava a um processo estritamente subjetivo, isto é, entre as partes envolvidas no caso concreto.

d) “Amicus Curiae”, isto é, órgãos ou entidades que o relator admitir por entender que tem representatividade, isto é, alguma ligação com o tema em discussão.

Depois de toda essa gama de intervenção, a decisão do STF, declarando a lei inconstitucional, aplicava-se somente às partes. O efeito erga omnes, isto é, a suspensão da eficácia da lei dependeria de resolução do Senado.

Inicialmente, o STF, para conferir o efeito “erga omnes” à sua decisão, tomava-a por base para editar uma súmula vinculante, contornando, destarte, a falta de vontade do Senado em baixar a resolução, igualando-se, destarte, os efeitos da decisão de inconstitucionalidade dos controles concentrado e difuso.

Dessa mutação do processo subjetivo para o objetivo, o STF passou a entender que, no controle difuso, a decisão do pleno, que declara a lei inconstitucional, tem efeito “erga omnes” e ainda suspende automaticamente a eficácia da lei ou ato normativo, tornando-se desnecessária a edição de uma súmula vinculante para que haja essa extensão subjetiva dos efeitos do julgado.

Referências bibliográficas

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

BAHIA, Flávia. Direito Constitucional. Recife: Armador, 2017.

DUTRA, Luciano. Direito Constitucional Essencial. 3ªed. São Paulo. Forense, 2016.

FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. Salvador. Juspodium, 2017.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 19ªed. São Paulo. Saraiva, 2015.

MENDES, Gilmar F.; BRANCO, Paulo G. G., Curso de direito constitucional, 5. ed. São Paulo. Saraiva, 2012.

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 16ªed. São Paulo. Forense, 2017.

TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2008.

Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos