RESUMO
A relação estabelecida entre uma empregada doméstica e seus patrões vem sido retratada na história, nos livros, nas novelas de forma diferente, muitas vezes as palavras minímas de simpatia são usadas como mecanismo de poder, afinal assim como em qualquer relacionamento problemático, as vítimas sempre se culparam, porque “a bondade” que lhe foi oferecida pesava em seu julgamento, mas diferente da consciência, ou dos patrões o direito as empregadas é garantido na Lei Complementar 150/2015.
PALAVRAS-CHAVE: Lei Complementar nº 150/2015. Empregados domésticos. Direito do Trabalho.
1. INTRODUÇÃO
O filme nacional “Que Horas Ela Volta?”, de 2015, é sem dúvida marcante, porque a maioria dos brasileiros tem, é ou conhece alguém que exerce a profissão de empregada doméstica. No longa-metragem, dirigido por Anna Muylaert, fica nítido que o termo “quase da família” é o que denúncia a diferenças sociais e a distinção com trabalhadores da classe, porque “quase” não torna a empregada parte da família. Mas esse é um termo muito utilizado por patrões com seus empregados domésticos para estabelecer um vínculo, mesmo sendo “quase da família” essas profissionais não têm suas carteiras assinadas, muito menos seu INSS recolhido.
2. CONTEXTO
A profissão que hoje, em 2021, após seis anos da Lei Complementar 150/2015 que regulamenta o exercício da profissão, ainda tem cerca de 70% de seus profissionais trabalhando informalmente. Ao pensar que nessa categoria, de acordo como o jornal Estadão, existem, no Brasil, cerca de 6.352 milhões de trabalhadores a exercendo e só cerca de 30% tem sua carteira assinada é realmente lamentável. Porém, indo além, pode se constatar que existem cerca de dois Uruguais trabalhando de empregada doméstica no Brasil — visto que a população do Uruguai, em 2019, era de 3,462 milhões —, e que 4 milhões dessas pessoas são trabalhadores informais, o que seria mais de um Uruguai.
Muitos patrões justificam a irregularidade dizendo que não acham justo arcarem com o ônus de tratar um trabalhador doméstico como um trabalhador, até porque a casa deles não é uma empresa e, sendo assim, não existe lucro. Com esse mesmo pensamento a “socialite” e advogada, Regina Manssur, em uma entrevista para o portal IG em 2013, quando a PEC das domésticas foi aprovada, declarou:
“A gente precisa ficar bem atento quanto a essa diferença entre o empregado doméstico e o trabalhador. Essa lei nova é uma lei dirigida ao empregado doméstico, mas ela está dando ao empregado doméstico as mesmas vantagens do trabalhador. Porque para mim, falar trabalhador doméstico não está tecnicamente correto. Para mim, tem o trabalhador e tem o doméstico. O trabalhador doméstico é a confusão que está sendo criada agora.”
Ainda em 2013, para o jornal O Globo, o jornalista Guilherme Fiúza escreve em repúdio da PEC das domésticas:
"Se o prezado leitor escravocrata enjoou da comida de sua empregada, melhor consultar seu advogado. O socialismo chegou à cozinha – e o tempero agora é assunto de Estado."
3. APROFUNDAMENTO
Como ficou claro, existem muitos patrões que não enxergam seus empregados domésticos como trabalhadores, dessa forma é preciso esclarecer o porquê as domésticas são trabalhadores. Partindo do princípio da palavra, trabalhador é aquele que vive de seu trabalho, consequentemente não importa qual especie de trabalho esse profissional faça ao exercê-lo torna-se um trabalhador. O ponto que escandaliza sobre os trabalhadores domésticos é que até 2015 não existia lei que regularizasse ou garantisse direito de trabalhadores a essa categoria, pois a CLT, Consolidação das Leis do Trabalho, de 1943, não se aplicava para as empregadas domésticas, visto que esses profissionais prestam serviços ditos como de natureza não-econômicas.
CLT - Decreto Lei nº 5.452 de 01 de Maio de 1943
Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho.
Art. 7º Os preceitos constantes da presente Consolidação salvo quando fôr em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam : (Redação dada pelo Decreto-lei nº 8.079, 11.10.1945)
a) aos empregados domésticos, assim considerados, de um modo geral, os que prestam serviços de natureza não-econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas;
Desse modo, em 2015, quando a Lei Complementar 150/2015 começou a vigorar as empregadas domésticas começaram a exercer um direito que as outras classes de trabalhadores já exerciam desde os anos 40. Ou seja, os direitos mínimos dos trabalhadores, como jornada de trabalho, banco de horas e horas extras não eram leis para a categoria, valendo apenas se fosse acordado e estabelecido em contrato. E, ainda hoje, essas profissionais muitas vezes não conseguem obter seus direitos básicos de trabalho, porque o pensamento que se propaga é o serviço doméstico feito por outro alguém não é trabalho.
Alguns direitos obtido com a aprovação da Lei complementar 150/2015:
Salário mínimo, Jornada de Trabalho, Hora extra, Banco de Horas, Remuneração de horas trabalhadas em viagem a serviço, Intervalo para refeição e/ou descanso, Adicional noturno, Repouso semanal remunerado, Feriados Civis e Religiosos, Férias, 13º salário, Licença-maternidade, Vale-Transporte, Estabilidade em razão da gravidez, FGTS, Seguro-desemprego, Aviso prévio, Relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa (GOVERNO FEDERAL, 2017).
A pandêmica é uma prova viva, inúmeras foram as reportagens sobre as decisões equivocadas de alguns estados brasileiros que tomaram o serviço doméstico como essencial, sendo que as empregadas domésticas eram as que tinham o maior risco de contágio. Transitando dos bairros de classe média alta para os bairros periféricos, horas de condução em aglomerações que poderiam ser evitadas. Esse momento histórico diz muito da nossa sociedade, suas necessidades essenciais são basicamente não colocar a mão em uma vassoura e varrer a própria casa.
4. CONCLUSÃO
A Lei n. 5.859, de 11 de dezembro de 1972, afirma que empregado doméstico é "aquele que presta serviços de natureza contínua e finalidade não lucrativa à pessoa ou família, no âmbito residencial destas" (art. 1º). Ou seja, alguém que trabalha em casa para que a outra pessoa possa trabalhar, pois, pensando honestamente, o trabalho doméstico é oneroso, pesado e leva tempo dependendo da residência, sendo assim ao contratar alguém que faça esse serviço se livra de uma carga de trabalho.
Nessa linha de raciocínio é primordial destacar que a carência que esses profissionais vivem em decorrência de pensamentos antiquados, que se utilizam da reforma trabalhista de 2017, que entrou em vigor dois anos depois da Lei Complementar 150/2015, para perpetuar a desigualdade. Fazendo com que todas as boas intenções trazidas pela Lei Complementar fossem reduzidas pela conveniência monetárias da reforma, que ao invés de ajudar os trabalhadores em geral apenas facilitou serviços irregulares.
Infere-se, portanto, a necessidade de conciliar os interesses do patrão e os direitos dos empregados domésticos para que nenhum dos lados sejam fragilizados, assim evitando que as reações de poder interfiram na vida digna do lado mais frágil da relação. É preciso que os patrões vejam seus empregados como pessoa, agindo com eles como seus patrões agem, na grande maioria das vezes, para que os empregados domésticos também possam exercer seus direitos.
REFERÊNCIA
CARMELO, Bruno. CRÍTICAS ADOROCINEMA: que horas ela volta? Brasil dividido. Que Horas Ela Volta? Brasil dividido. 2015. Disponível em: https://www.adorocinema.com/filmes/filme-231230/criticas-adorocinema/. Acesso em: 10 set. 2021.
SEIS anos após a PEC das Domésticas, 70% das empregadas estão informais. 2019. Disponível em: https://www.domesticalegal.com.br/seis-anos-apos-pec-das-domesticas-70-das-empregadas-estao-informais/. Acesso em: 10 set. 2021.
PEC das domésticas completa 7 anos. 2020. Disponível em: https://simplypag.com.br/blog/pec-das-domesticas/#:~:text=PEC%20das%20dom%C3%A9sticas.-,O%20que%20%C3%A9%20a%20PEC%20das%20dom%C3%A9sticas,direitos%20trabalhistas%20dos%20empregados%20dom%C3%A9sticos.. Acesso em: 10 set. 2021.
SOCIALITE Regina Manssur fala sobre PEC das domésticas. Realização de Ig. [S.I], 2013. (10 min.), P&B. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=URsKrTQl7mg. Acesso em: 15 set. 2021.
FIÚZA, Guilherme. A revolução das empregadas. 2013. Disponível em: https://oglobo.globo.com/opiniao/a-revolucao-da-empregada-8101857. Acesso em: 14 set. 2021.
BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-lei nº 5452, de 1º de maio de 1943. Aprova a consolidação das leis do trabalho. Acesso em: 12 set. 2021.
Governo Federal. Direitos do Trabalhador Doméstico, mar. 2017. Disponível em: https://www.gov.br/esocial/pt-br/empregador-domestico/orientacoes/direitos-do-trabalhador-domestico. Acesso em: 8 setembro 2021.
Lei n° 5.859, de 11 de dezembro de 1972. Profissão de empregado doméstico. Disponível em: http://planalto.gov.br/ccivil_03/leis/15859.htm. Acesso em: 15 setembro 2021.