Ações ordinárias e preferenciais das companhias abertas e fechadas: novos critérios legais para divisão de classes.

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O texto trata das ações ordinárias e preferenciais das companhias abertas e fechadas, com destaque para os novos critérios estabelecidos nos artigos 16, 16-A e 110-A da Lei nº 6.404/1976, recentemente alterada pela Lei nº 14.195/2021.

Assim como previsto na legislação anterior[1], a Lei nº 6.404/1976 (Lei das Sociedades por Ações – LSA), admite que as companhias tenham espécies distintas de ações[2], a depender dos direitos e obrigações atribuídas aos seus titulares.

Lembre-se que as ações são as unidades representativas do capital social da companhia. Além das ações as companhias emitem outros valores mobiliários como debêntures, partes beneficiárias, bônus de subscrição, notas comerciais etc.

Como se nota pela leitura do art. 15 da LSA, considerando os direitos ou vantagens conferidas aos seus titulares, as ações podem ser ordinárias, preferenciais, ou de fruição.

Em linhas gerais, as ações ordinárias são aquelas que atribuem direitos básicos ao acionista titular[3], sem concessão de vantagens ou privilégios. Esses títulos são frequentemente adquiridos por acionistas que tem mais interesse na gestão da companhia do que no retorno financeiro do investimento. Todas as companhias devem necessariamente emitir ações ordinárias, com direitos básicos[4], inclusive o direito de voto.

As ações preferenciais são aquelas que conferem privilégios ou vantagens patrimoniais aos seus acionistas, principalmente como meio de compensar restrições aos direitos de voto. Não se esqueça que o número de ações preferenciais sem direito a voto, ou sujeitas a restrição no exercício desse direito, não pode ultrapassar 50% (cinqüenta por cento) do total das ações emitidas. Como veremos detalhadamente em outra ocasião, nas ações preferenciais, além de outras vantagens políticas ou patrimoniais, é possível conceder direito ao recebimento prioritário de dividendos, com valores fixos ou mínimos, e até mesmo prioridade no reembolso de capital, com ou sem prêmio.

Divisões em classes.

Segundo constava da redação originária do §1º do art. 15 da LSA, apenas as ações preferenciais, das companhias abertas ou fechadas, e as ações ordinárias, da companhia fechada, poderiam ser divididas em mais de uma classe, conforme determinados critérios indicados na LSA. As ações ordinárias das companhias abertas, como dito, não poderiam ser fracionadas em classes distintas.

Isso mudou com a recente alteração da redação do §1º do art. 15 da LSA, promovida pela Lei nº 14.195/2021.

De acordo com a nova redação do §1º do art. 15 da LSA, além das ações preferenciais (das companhias abertas ou fechadas) e das ações ordinárias das companhias fechadas, as ações ordinárias das companhias abertas também poderão ser fracionadas em mais de uma classe, conforme os critérios definidos na LSA. A divisão de ações ordinárias em classes deverá se submeter aos critérios indicados nos artigos 16, 16-A e 110-A da LSA.[5]

A possibilidade de criação de mais de uma classe de ações ordinárias, além de outras inúmeras vantagens, de acordo com a exposição de motivos da LSA, é favorável à “associação de diversas sociedades em empreendimento comum (joint venture), permitindo a composição ou conciliação de interesses e a proteção eficaz das condições contratuais acordadas. ”

Nas companhias fechadas, a divisão das ações ordinárias em classes pode ser amparada nos seguintes critérios.[6]

Primeiramente, é possível que a companhia crie uma classe específica de ações ordinárias conversíveis em ações preferenciais. Esse critério de conversibilidade de ações ordinárias em preferenciais está indicado no art. 16, I, da LSA.

Em segundo lugar, admite-se a criação de uma classe de ações cujos acionistas titulares devam ser brasileiros. O critério de exigência de nacionalidade brasileira do acionista está previsto no art. 16, II, da LSA.

Nas companhias fechadas também será possível a criação de classe de ações ordinárias que atribuam aos seus titulares o direito de votar e eleger separadamente membros de determinados cargos de órgãos administrativos. Esse critério está previsto no art. 16, III, da LSA.

Agora há uma nova hipótese para criação de classe, previsto no inciso IV do art. 16 da LSA, incluído pela Lei nº 14.195/2021.

De acordo com o inciso IV do art. 16 da LSA, podem ser criadas classes de ações ordinárias nas companhias fechadas pelo critério de atribuição de voto plural, conforme os limites e as condições estabelecidas no 110-A da LSA.

Embora o dispositivo se refira à companhia fechada, o art. 16-A da LSA, incluído pela Lei nº 14.195/2021 admite a criação de classes distintas de ações ordinárias nas companhias abertas, desde que a diversidade recaia sobre a adoção de voto plural, segundo os parâmetros do art. 110-A.[7] Nesse caso, seria admitida, por exemplo, uma classe de ações sem direito de voto plural e outra com direito ao voto plural.

Em resumo temos o seguinte: i) as ações preferenciais, nas companhias abertas e fechadas, podem ser divididas em inúmeras classes, independentemente da observância dos critérios do art. 16 da LSA; ii) as ações ordinárias das companhias fechadas podem ter classes distintas, desde que fundadas nos critérios estabelecidos nos incisos I a IV do art. 16 da LSA; iii) as ações ordinárias das companhias abertas só podem ser divididas em classes se a divisão for fundada na adoção de voto plural, nos termos do art. 16, IV, do art. 16-A, e do art. 110-A da LSA.

A despeito dessas regras, a alteração de normas estatutárias que versem sobre classes de ações, inexistindo previsão expressa, dependerá da concordância de todos os titulares das ações atingidas. Essa é a orientação estabelecida no art. 16, parágrafo único, da LSA, com redação alterada pela Lei nº 14.195/2021.[8] 

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[1] Decreto-lei nº 2.627/1940.

[2] As ações são as unidades representativas do capital social da companhia. Além das ações as companhias emitem outros valores mobiliários como debêntures, partes beneficiárias, bônus de subscrição, notas comerciais etc.

[3] Art. 109. Nem o estatuto social nem a assembléia-geral poderão privar o acionista dos direitos de: I - participar dos lucros sociais; II - participar do acervo da companhia, em caso de liquidação; III - fiscalizar, na forma prevista nesta Lei, a gestão dos negócios sociais; IV - preferência para a subscrição de ações, partes beneficiárias conversíveis em ações, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição, observado o disposto nos artigos 171 e 172; V - retirar-se da sociedade nos casos previstos nesta Lei. § 1º As ações de cada classe conferirão iguais direitos aos seus titulares. § 2º Os meios, processos ou ações que a lei confere ao acionista para assegurar os seus direitos não podem ser elididos pelo estatuto ou pela assembléia-geral. § 3o O estatuto da sociedade pode estabelecer que as divergências entre os acionistas e a companhia, ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários, poderão ser solucionadas mediante arbitragem, nos termos em que especificar.

[4] Art. 109. Nem o estatuto social nem a assembléia-geral poderão privar o acionista dos direitos de: I - participar dos lucros sociais; II - participar do acervo da companhia, em caso de liquidação; III - fiscalizar, na forma prevista nesta Lei, a gestão dos negócios sociais; IV - preferência para a subscrição de ações, partes beneficiárias conversíveis em ações, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição, observado o disposto nos artigos 171 e 172; V - retirar-se da sociedade nos casos previstos nesta Lei.

[5] Art. 15. As ações, conforme a natureza dos direitos ou vantagens que confiram a seus titulares, são ordinárias, preferenciais, ou de fruição. § 1º As ações ordinárias e preferenciais poderão ser de uma ou mais classes, observado, no caso das ordinárias, o disposto nos arts. 16, 16-A e 110-A desta Lei.    (Redação dada pela Lei nº 14.195, de 2021)

[6] A redação atual do art. 16, com a inclusão do inciso IV e a alteração do parágrafo único, é a seguinte: Art. 16. As ações ordinárias de companhia fechada poderão ser de classes diversas, em função de:  I - conversibilidade em ações preferenciais;  II - exigência de nacionalidade brasileira do acionista; o III - direito de voto em separado para o preenchimento de determinados cargos de órgãos administrativos.  IV - atribuição de voto plural a uma ou mais classes de ações, observados o limite e as condições dispostos no art. 110-A desta Lei.    (Redação dada pela Lei nº 14.195, de 2021) Parágrafo único. A alteração do estatuto na parte em que regula a diversidade de classes, se não for expressamente prevista e regulada, requererá a concordância de todos os titulares das ações atingidas.   (Redação dada pela Lei nº 14.195, de 2021)

[7] Art. 16-A. Na companhia aberta, é vedada a manutenção de mais de uma classe de ações ordinárias, ressalvada a adoção do voto plural nos termos e nas condições dispostos no art. 110-A desta Lei.    (Incluído pela Lei nº 14.195, de 2021)

[8] Art. 16. [...] Parágrafo único. A alteração do estatuto na parte em que regula a diversidade de classes, se não for expressamente prevista e regulada, requererá a concordância de todos os titulares das ações atingidas.   (Redação dada pela Lei nº 14.195, de 2021).

Sobre o autor
Antonio Evangelista de Souza Netto

Juiz de Direito de Entrância Final do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Pós-doutor em Direito pela Universidade de Salamanca - Espanha. Pós-doutor em Direito pela Universitá degli Studi di Messina - Itália. Doutor em Filosofia do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2014). Mestre em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP (2008). Coordenador do Núcleo de EAD da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná - EMAP. Professor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM. Professor da Escola da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo - EMES. Professor da Escola da Magistratura do TJ/PR - EMAP.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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