A posição legal das convenções da OIT no ordenamento jurídico brasileiro

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Convenção nada mais é do que tratados internacionais os quais, uma vez ratificados por seus Estados membros, passam a vigorar no ordenamento pátrio de cada país.

Diante do rápido processo de globalização que se estendeu e ainda se estende mundo afora, podemos afirmar que as convenções internacionais ganharam força, principalmente depois do enorme crescimento do sistema onusiano, o qual fez expandir, com deveras rapidez, a universalização dos direitos do homem.

A título de informação o sistema onusiano foi o que criou a terceira geração dos direitos humanos, universalizando-o por meio da famosa Declaração Universal dos Direitos Humanos e também por meio de seus dois Pactos Internacionais, são eles os de Direitos Civis e Políticos e os de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

Assim, as Convenções da Organização Internacional do Trabalho – OIT trazem consigo diretrizes e princípios globais que se adequam a toda situação laboral, servindo, neste caso, para todo e qualquer tipo de trabalhador, já que a universalidade impera em suas normas.

Todavia, quando uma Convenção da OIT é ratificada pelo Brasil, em que posição legal esta se enquadra levando em conta o nosso ordenamento jurídico?

O Supremo Tribunal Federal – STF adotava o entendimento de que qualquer tratado internacionalizado no sistema normativo brasileiro teria status de lei federal ordinária, sendo que tal posicionamento está posto na decisão do Recurso Extraordinário de nº 80.004, vejamos:3

Neste caso específico, ratificado um tratado internacional pelo Estado brasileiro, este tinha apenas força de lei federal, ou seja, as Convenções da OIT, de acordo com o Recurso Extraordinário de nº 80.004 estava no mesmo patamar da legislação ordinária pátria.

Tal posicionamento teve opiniões contrárias dentro do Supremo Tribunal Federal - STF, como por exemplo, a do Ex Ministro Sepúlveda Pertence, a voz mais forte da corrente minoritária da época, o qual dizia que: “seria esvaziar de muito do seu sentido útil de inovação, que, malgrado os termos equívocos do seu enunciado, traduziu uma abertura significativa ao movimento de internacionalização dos direitos humanos”4

Hoje, tal entendimento está superado, já que no julgamento da ADI nº 3937 o ex Ministro do Supremo Tribunal Federal – STF Joaquim Barbosa deu status supralegal e infraconstitucional a Convenção de nº 162 da OIT a qual trata sobra a utilização do amianto com segurança.

No julgamento, segundo o Ministro, a Convenção da OIT é uma norma supralegal, com força normativa maior que a norma federal. Não faria sentido que a União assumisse compromissos internacionais que não tivessem eficácia para os estados membros. Não acredito que a União possa ter duas caras: uma comprometida com outros Estados e organizações internacionais e outra descompromissada para as legislações com os estados-membros, disse Barbosa ao citar estudo acadêmico5.

Em outro julgado (Recurso Extraordinário nº 466.343- SP)6, o Ministro Gilmar Mendes, ao tratar sobre a prisão civil do depositário infiel entendeu que os tratados internacionais que versem sobre direitos humanos possuem status supralegal, ou seja, estão acima da legislação ordinária e abaixo da Constituição Federal.

No referido julgado, o Banco Bradesco – S/A interpôs Recurso Extraordinário contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que indeferiu Recurso de Apelação de nº 791031-0/7 consignando entendimento contrário a prisão civil por dívida do devedor fiduciante.em contrato de alienação fiduciária em garantia.

Segundo o Ministro, o parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição Federal é norma constitucional que permite a internalização dos tratados internacionais que versem sobre direitos humanos, devendo tais normativos se posicionarem entre a Constituição Federal e a legislação ordinária.

Neste caso o artigo 7º, Parágrafo 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) estabelece que é proibida qualquer tipo de prisão por dívida, exceto obrigações alimentares7, e como o mesmo está acima das normas ordinárias que tratam sobre prisão civil, tal tratado paralisa a aplicabilidade destas, permitindo apenas as prisões de devedores de alimentos.

É bom explicar também neste texto que quando qualquer tratado internacional sobre direitos humanos for aprovado por nosso ordenamento por três quintos de votação nas duas casas legislativas em dois turnos, este tratado terá status de norma constitucional, já que fora ratificado nos termos do Parágrafo 3º do artigo 5º da Constituição Federal8

Bom, já entendemos que hoje no Brasil se aplica o princípio da supralegalidade nos tratados internacionais de direitos humanos aprovados nos termos do Parágrafo 2º do artigo 5º da Constituição Federal; Agora, com relação às convenções da OIT, podemos dizer que suas normas versam sobre direitos humanos?

Certamente sim, já que a dignidade da pessoa humana está intrinsicamente ligada ao seu trabalho, sendo que o trabalho dignifica a pessoa, sendo um direito de todo cidadão, conforme reza o artigo 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos9

Portanto, as normas contidas em toda e qualquer Convenção da Organização Internacional do Trabalho – OIT possui status de direito humanos, inclusive fazendo parte da segunda geração destes direitos, quais sejam, os direitos econômicos, sociais e culturais.

Por fim, podemos concluir que toda norma emanada da Organização Internacional do Trabalho – OIT ratificada pelo Brasil, por versar sobre direitos humanos e por se tratar de convenção internacional possui esta, dentro do nosso ordenamento jurídico, status supralegal.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

Disponível em <https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/703884/recurso-extraordinario-re-80004-se> Acesso em 27 de setembro de 2021.

Disponível em <https://www.oas.org/es/sadye/inclusion-social/protocolo-ssv/docs/piovesan-tratados.pdf> Acesso em 27 de setembro de 2021.

Disponível em <https://alfonsin.com.br/stf-mantem-lei-paulista-que-proibe-uso-do-amianto-no-estado/> Acesso em 27 de setembro de 2021.

Disponível em <https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-constitucional/a-evolucao-da-prisao-civil-do-depositario-infiel-na-jurisprudencia-do-stf/> Acesso em 27 de setembro de 2021.

Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm> Acesso em 27 de setembro de 2021.

Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 27 de setembro de 2021.

Disponível em <https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos> Acesso em 27 de setembro de 2021.


Notas

3 CONVENÇÃO DE GENÉBRA, LEI UNIFORME SOBRE LETRAS DE CAMBIO E NOTAS PROMISSORIAS, AVAL APOSTO A NOTA PROMISSORIA NÃO REGISTRADA NO PRAZO LEGAL, IMPOSSIBILIDADE DE SER O AVALISTA ACIONADO, MESMO PELAS VIAS ORDINÁRIAS. VALIDADE DO DECRETO-LEI N. 427, DE 22.01.1969. EMBORA A CONVENÇÃO DE GENÉBRA QUE PREVIU UMA LEI UNIFORME SOBRE LETRAS DE CAMBIO E NOTAS PROMISSORIAS TENHA APLICABILIDADE NO DIREITO INTERNO BRASILEIRO, NÃO SE SOBREPOE ELA AS LEIS DO PAÍS, DISSO DECORRENDO A CONSTITUCIONALIDADE E CONSEQUENTE VALIDADE DO DEC. LEI Nº 427/69, QUE INSTITUI O REGISTRO OBRIGATORIO DA NOTA PROMISSORIA EM REPARTIÇÃO FAZENDARIA, SOB PENA DE NULIDADE DO TÍTULO. SENDO O AVAL UM INSTITUTO DO DIREITO CAMBIARIO, INEXISTENTE SERÁ ELE SE RECONHECIDA A NULIDADE DO TÍTULO CAMBIAL A QUE FOI APOSTO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO.(STF - RE: 80004 SE, Relator: XAVIER DE ALBUQUERQUE, Data de Julgamento: 01/06/1977, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: DJ 29-12-1977 PP-09433 DJ 19-05-1978 PP-03468 EMENT VOL-01083-02 PP-00915 RTJ VOL-00083-03 PP-00809). (Grifo nosso).

4 RHC 79.785-RJ, publicado em 29/03/2000

5 https://alfonsin.com.br/stf-mantem-lei-paulista-que-proibe-uso-do-amianto-no-estado/

6 Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação da medida coercitiva. Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão constitucional e das normas subalternas. Interpretação do art. 5º, inc. LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do art. 7º, § 7, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE nº 349.703 e dos HCs nº 87.585 e nº 92.566. É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito.

7 7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.

8 "os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais"." (CF, 1988).

9 Todo homem tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego; todo homem, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho; todo homem que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social; todo homem tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar, para proteção dos seus interesses

Sobre os autores
Amanda Cabral Fidalgo

Orientadora, formação acadêmica: Bacharelado em Direito. FACI- Faculdade Ideal, conclusão em 2010, Especialista em Processo Civil, Trabalhista, Penal, Administrativo e Constitucional - Uninassau, concluído em Junho de 2013., Mestra em Direito Processual Constitucional- Universidade Nacional Lomas de Zamora concluído em Dezembro de 2014, Defesa realizada em 12/07/2017, e Revalidado pela UFRN PPG Nº 000471, Assessora Fazendária da SEFA/ PARÁ Até 08/01/19, Organizadora de Eventos, Palestras, Seminários, Workshop, Congressos, Simpósios e afins. EXPERIÊNCIAS PROFISSIONAIS: 2005 até 2016 - A Grello Advocacia e Imobiliário / Cargo: Assessora Jurídica. Principais atividades: Analise e realização de processos, acompanhamento de processos on line e no fórum, nas áreas comercial, cível, tributária, trabalhista. Em 2006 á 2008- Trabalhou no Fundo Ver-o-Sol como Estágiária no Jurídico, desenvolvia o acompanhamento de Contratos e Convênios, Trâmites Administrativos, feitura de documentos oficias, estudos de casos de munícipes. Em 2008 á 2009- Trabalhou ao Politica Partido PTB, no cargo de Assessora Jurídica, onde desenvolvia analise de processos, acompanhamento de julgamentos, atualização processual, protocolo e feitura de ações. Em 2009-2011,trabalhou na PMB BELÉM -Gabinete do Prefeito- Janeiro de 2009 á Dezembro de 2009 Setor: contratos e Convênios Principais e de 2009-2013 a PMB/SEHAB Setor: NAJ- Núcleo Jurídico, desenvolvendo emissão de pareceres singulares ou relato de pareceres coletivos, solicitados nos processos que lhe forem encaminhados. Em 2013 a Junho de 2014 Atuou como Docente ma UNIP - Universidade Paulista, ministrando aulas para os cursos de bacharelado em Administração, Ciências Contábeis e os Cursos Tecnológicos de Gestão Empresarial, Pedagogia, Processos Gerenciais. Em 2013 a 2017, atuou como Docente da Escola de Governança do Estado do Pará como Prestadora de Serviços, na capacitação de funcionários públicos municipais e estaduais, mediante mini cursos, com disciplinas da área jurídica, com duração de 60h. Em 2014 a 2018, atuou como Docente na Faculdade Mauricio de Nassau - Belém, onde ministrava aula para os Cursos de Gestão de Recursos Humanos, Gestão Comercial, Ciências Contábeis, Administração, Serviço Social e Direito, com carga horária de 20h semanais, nas disciplinas de Direito Previdenciário, Direito Trabalhista, Direito e Legislação Tributária, Direito Empresarial , Direito Empresarial III,Direito Empresarial I e III. Direito do Consumidor, Hermenêutica Jurídica, Empreendedorismo, Introdução ao Estudo de Direito, Filosofia, ética e Cidadania,Direito e Legislação Social,bem como atuou ao Cursos de Pós Graduação na UNINASSAU nas disciplinas: Metodologia Científica e Mediação e Arbitragem. Atualmente é Advogada OAB/PA 28.158, atuante nas Áreas do Consumidor, Civil, D.Público, Trabalhista, Empresarial, Eleitoral, Administrativo, e Coaching Profissional e para Exame de Ordem, bem como orientadora de mestrado.

Alan Bezerra Oliveira Lima

Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Leão Sampaio - Ceará; mestrando em Direito Processual Constitucional pela Universidad Nacional de Lomas de Zamora – UNLZ.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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