A adoção no Brasil - Aspectos gerais

28/09/2021 às 13:39
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O instituto da adoção vai além de ser o acolhimento de uma criança ou adolescente, ela é interpretada como um ato de amor e proteção ao próximo.

1. INTRODUÇÃO

O instituto da adoção vai além de ser o acolhimento de uma criança ou adolescente, ela é interpretada como um ato de amor e proteção ao próximo que, em boa parte das ocasiões não possuem laços sanguíneos ou mesmo uma paridade referente ao ambiente familiar.

Com a adoção ocorre o desligamento dos laços estabelecidos anteriormente dando início a uma nova constituição de vínculos, como o jurídico e o afetivo iniciando-se com a colocação destes em família substituta.

No Brasil a adoção sofreu várias alterações relevantes nos últimos anos. Anteriormente, por volta de 1980, a adoção era interpretada como um ato de caridade do adotante para com o adotado. Atualmente, o principal objetivo da adoção é dar garantia à criança e ao adolescente de que seus direitos serão preservados, dentre eles o de acesso à educação e o convívio comunitário e familiar.

Com a Constituição Federal de 1988 os filhos que se deram por meio de adoção tem o mesmo direito daqueles que possuem laços sanguíneos presentes. Isto é, a Constituição desfez a distinção entre os filhos passando-se assim a equiparação dos mesmos.

 Após isto, o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069 de 13 de julho de 1990, corroborou com a implementação de mais direitos no que se refere à filiação por adoção.

Em 2009, com a Lei 12.010, ocorreu um aperfeiçoamento da garantia do direito à convivência familiar alterando-se assim muitos artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Código Civil Brasileiro. Ficou estabelecido que o processo de adoção deveria obedecer às regras constantes no Estatuto, bem como utilizando-se de novas para a adoção de pessoas maiores de idade.

Outra grande alteração se deu por meio da Lei 13.509 de 2017, onde modificou, também, diversos artigos do Estatuto e outras leis, sendo esta o objeto de estudo deste trabalho de conclusão de curso.

A lei em questão instituiu novos parâmetros e prazos ao processo de adoção, criando regras que oportunizaram a abreviação da adoção no Brasil e com isso trouxe celeridade aos processos de despedimento do poder familiar originário, bem como priorizou a adoção de irmãos que encontram-se no sistema e de crianças e adolescentes que possuem alguma necessidade de acompanhamento de saúde mais específicos, dentre outras alterações.

Uma das alterações com destaque importante se dá quanto à habilitação dos pretendentes, onde, de acordo com a nova lei eles devem ser habilitados no prazo de 120 dias, podendo ser prorrogado, e reavaliados a cada três anos para que se verifique se houve alguma mudança quanto a possibilidade de alteração do perfil que tenha pretensão de adotar, que atualmente é a principal barreira quanto a efetivação da adoção.

Quanto à adoção internacional a lei deixou mais claro que essa modalidade é aquele em que o pretendente deva possuir residência habitual em pais que aceitaram a Convenção de Haia e que o adotando seja encaminhado para este tipo de adoção após verificação de pretensão ou habilitados no seu país de origem.

No que refere-se às "devoluções" a nova lei previu que caso ocorra devolução após o ingresso do pedido ou até mesmo depois do trânsito em julgado da sentença que concedeu a adoção o nome dos pretendentes serão excluídos do Cadastros Nacional de Adoção e será vetado nova habilitação, dentre outras sanções.

Nota-se que o legislador brasileiro tem se preocupado quanto a temática da adoção e com isso ela vem recebendo maior destaque, deste modo pode-se observar diversos avanços quanto a proteção das crianças e adolescentes que se encontram nessa condição.

Por outro lado, percebe-se que as crianças e adolescentes que necessitam usar este sistema encontram um sistema que não se aproxima daquela que o legislador idealiza ser o ideal no texto constitucional.

O presente trabalho visa discutir essa temática, analisando as nuances e consequências dela decorrente, respondendo-a sempre que possível.

A presente monografia foi analisada sob a ótica da pesquisa qualitativa, utilizando como forma metodológica a pesquisa bibliográfica. O objetivo da monografia foi descrever o assunto, utilizando o método dedutivo e  fenomenológico para apresentar dados e esclarecê-los.

Dessa maneira, o segundo capítulo será concentrado em uma abordagem histórica e conceitual da adoção, trazendo a tona todas as modificações que o instituto teve no decorrer dos anos, onde o legislador passou a se preocupar mais com as crianças e adolescentes,criando alguns requisitos para que se possa  colocar o interesse destes em primeiro lugar.

Além disso, será destacado a função social da adoção, visando demonstrar a sua grande importância e como isso impactou o conceito de adoção ao longo dos anos e trouxe uma óptica mais sensibilizada para este instituto.

O capítulo três consiste na apresentação das modalidades de adoção e suas peculiaridades com a intenção de demonstrar que cada adoção é única e deve ser feito a partir de um processo em que será analisado as reais vantagens ao adotado, levando assim ao deferimento da adoção.

Ademais, no capítulo quatro será demonstrado na pesquisa as mudanças que a lei 13.509/2017 trouxe para a adoção no ordenamento jurídico brasileiro, e o quanto essa nova lei impactou nos processos de adoção. Por outro lado também será abordado a grande problemática das crianças reais que vivem em abrigo, que não condizem com as crianças imaginadas pelos pretendentes ao processo de adoção, com isso pretendendo destacar o preconceito enraizado na sociedade.

A pesquisa desde o seu início ocorrerá de forma multidisciplinar percorrendo as áreas de abrangência do Direito Civil e Direito Constitucional, e no que couber de lei específica mediante a sua aplicabilidade.

2. ANÁLISE HISTÓRICA E CONCEITUAL DA ADOÇÃO: UMA ABORDAGEM NECESSÁRIA

A palavra adoção deriva do latim adoptare, tendo como significado o ato de acolher, dar nome a alguém, a opção de escolher um filho.

É um modo artificial de família que busca se igualar a concepção natural de um filho. Adoção, segundo Sérgio Sérvulo da Cunha, “ato ou efeito de adotar, que é aceitar, assumir; forma pela qual se estabelece relação de filiação sem laço natural”

Tendo um caráter humanitário e sendo um meio de proteger as crianças, dando a elas uma melhor condição  melhor, tanto emocional quanto material, ao mesmo tempo em que dá filhos para aqueles que desejam por um. A humanidade desde os seus primórdios praticou o instituto da adoção, acolhendo crianças no ambiente familiar. No capítulo 2 de Êxodo, a  Bíblia relata o nascimento e adoção de Moisés pela filha do Faraó, no Egito.  O Código de Hamurabi, na Babilônia, disciplinou detalhadamente em oito artigos a adoção, inclusive severas punições para aquele que afrontasse a autoridade do pai adotivo.

As pessoas viam como necessidade e sendo uma obrigação à existência de um filho no seio familiar, vendo o instituto da adoção como um meio alternativo de constituir família e impedir a sua extinção.

Em Roma, a adoção foi usada pelos Imperadores como uma forma de garantir seus sucessores, sendo que idade mínima para praticar tal ato, era de no mínimo 60 anos. Nos tempos medievais, por causa dos princípios religiosos existentes do período, a adoção não era mais tão aceita, ressurgindo na França, com  a vigência do Código Napoleônico, que permitia a adoção ser praticada por pessoas maiores de 50 anos.

Até o ano de 1851, nos países ocidentais as crianças e jovens entre 7 e 21 anos iam para lares adotivos e podiam ser enviados para outras casas temporariamente e de modo informal, onde ajudavam nos afazeres domésticos, em troca de abrigo, comida e algumas vezes poderiam receber algum tipo de educação. E para os pais de criação era uma alternativa para mão-de-obra gratuita e fazer caridade, como eram ensinados pela Igreja. Ainda assim, essas crianças e jovens, legalmente permaneciam ligados a sua família original.

No Brasil Colônia, a adoção foi implementada através do direito português, mas sem nenhuma garantia, não havendo transferência do pátrio poder ao adotante, com exceção de alguns casos em que o adotado perdia o progenitor, devendo a autorização ocorrer por meio de um decreto real.

Com o aparecimento do Código Civil de 1916, foi que a adoção ganhou as primeiras regras oficiais no país. Todavia, a legislação quase não favorecia o processo, exemplo disso era a limitação de autorização apenas para pessoas superior a 50 anos, sem prole legítima ou legitimada, devendo o adotante ter, pelo menos, 18 anos a mais  que o infante adotado, e duas pessoas não poderiam adotar a mesma criança, salvo se fossem marido e mulher.

É possível observar que para ser possível a adoção, o adotante não poderia ter filhos legítimos ou legitimados, fica demonstrado que a finalidade da adoção naquela época, era puramente para satisfazer a vontade de casais estéreis terem filhos, ficando em segundo plano os direitos da criança ou adolescente.

No Código Civil brasileiro de 1916, o instituto da adoção tinha caráter contratual, em que ditava que o adotante e adotado poderiam fazer uma escritura pública para formalizar a adoção, sem nenhum tipo de mediação do Estado, limitando a relação somente entre o adotado e adotante, não tendo o adotado direito sucessório.

 Mesmo sendo o pioneiro em estabelecer regras para o instituto da adoção, esse sistema do Código Civil de 1916 ainda poderia se considerar arcaico, pois o adotado mesmo sendo equiparado ao filho legítimo, não era tratado da mesmo forma quando se tratava de herança, pois o filho biológico tinha direito a receber metade da parte que era deixada ao filho adotivo.

Após 41 anos, com o nascimento da Lei n. 3.133/57[1] a adoção tornou-se irrevogável e poderiam ser feitas por casais que já tinham filhos legítimos ou legitimados, ou reconhecidos. Porém a lei limitava o ato de adotar alguém, apenas para casais que tivessem mais de 5 anos de união, ou pessoas com idade superior a 30 anos, haver uma diferença de idade entre o adotado e o pretendente a adoção de pelo menos 16 anos, o que anteriormente era de 18 anos.

Para alguns doutrinadores como Sílvio de Salvo Venosa[2] essa nova lei poderia ser considerada um divisor de águas na legislação e também para o instituto da adoção, trazendo um grande marco quando extinguiu o requisito de inexistência de prole, para que alguém pudesse se candidatar a adoção, e também diminuiu a idade mínima do adotante.

Com isso, o início da vigência da Lei n° 3.122, de 8 de maio de 1957, foi permitida a adoção por pessoas a partir de 30 anos de idade, independente de terem filhos naturais ou não, a adoção passa por uma grande evolução e se molda por um  caráter filantrópico, voltado para o lado humanitário, com o intuito não apenas de dar um filho ao casal que desejavam mas que naturalmente não podiam, mas também dar a chance para os menores desamparados terem um lar seguro.

Mesmo com esse novo código, a legislação ainda discriminava os adotados, dos filhos legítimos, pois os adotantes que viessem a ter filhos biológicos após a adoção poderiam afastar o adotado da sucessão legítima.

O legislador fez uma mudança no art. 227, §6º da Constituição Federal de 1988, acabando com a distinção entre os filhos naturais e adotados, afirmando que os filhos que surgiram ou não do casamento, ou aqueles que eram adotados, teríamos mesmos direitos, e as mesmas qualificações, sendo vedado qualquer tipo de discriminação, finalmente acabando com a segregação dos filhos adotados.

Com essa mudança os filhos adotivos passaram a ser equiparados aos filhos legítimos, legitimados ou reconhecidos.

A adoção passa a ser considerada de interesse público, como a finalidade de tirar o infante de um ambiente de risco, e dar para esta criança e adolescente um lar amoroso, carinhoso, e seguro como se fosse um filho natural daquele seio familiar sem nenhum tipo de distinção.  

Portanto, a adoção começou a ser olhada de um modo humanitário, visando também o interesse do infante adotado, não sendo usada apenas como uma maneira de satisfazer a vontade de pessoas estéreis em ter uma prole.

2.1. REQUISITOS DA ADOÇÃO

Mesmo a adoção devendo ser fundada no amor, o instituto da adoção é um ato jurídico, que deve obedecer a requisitos legais e formalidades, estabelecendo entre duas ou mais pessoas uma filiação, independente da relação parental. Dessa forma, trazendo para a família, alguém que antes não era conhecido mas se tornou filho.

Para o Direito de Família, alguns autores como Murilo Sechieri Costa Neves consideram a relação existente em primeiro grau como sendo a mais importante, sendo estas as filiações materna e paterna com seus filhos.

 Fábio Ulhoa Coelho[3] escreve sobre os requisitos apropriados a adoção:

Os requisitos para a adoção nacional de criança ou adolescente são cinco: a) inviabilidade da manutenção na família natural ou extensa;

b) vantagens para o adotado e legitimidade dos motivos do adotante;

c) consentimento dos pais do adotando e, sendo adolescente, também o dele; d) sentença deferindo a adoção, proferida em processo judicial, após o obrigatório estágio de convivência do requerente e o menor; e) capacidade e legitimidade do adotante.

2.1.1. Inviabilidade da manutenção da criança e adolescente na família natural ou extensa

Esse requisito aponta que não é mais possível a continuidade da permanência da criança ou adolescente com os pais, ou parentes próximos com o qual já se tem algum laço e vínculo afetivo, levando-se em consideração que o melhor para o infante seja conviver com a família natural, e demonstrando não ser viável a convivência dessa criança ou adolescente no seio familiar biológico, é que pode ser aceita a sua adoção por uma família substituta.

É dever dos pais naturais, que são habilitados e instituídos pela lei, ensinarem os filhos sobre as responsabilidades e limites diante da sociedade e protegê-los, garantindo assim, sua dignidade humana. Isso necessita acontecer através da convivência, para que os laços afetivos e morais possam crescer, dentro do âmbito familiar tendo como base o respeito e carinho.

Esse cuidado e carinho são fundamentais para criação de um novo ser, sendo a família a essência de todo ser humano, onde este terá suas primeiras relações sociais e será ensinado a exteriorizar seus sentimentos e experiências vividas.

O ser humano nasce sendo totalmente dependente fisicamente e emocionalmente dos pais, precisando da ajuda de ambos para a sua vida extrauterina. Dessa forma, é imprescindível que os pais estejam preparados emocionalmente para a chegada dessa criança desde a gestação, devendo os cuidados e carinho acontecer desde esta época, estreitando os laços afetivos no decorrer da criança e adolescência.

Tanto a mãe quanto o pai contribuem para a formação física, moral e ética dos filhos, pertencendo culturalmente a mãe um papel maior em passar afetividade e segurança para a prole, enquanto ao pai tem a  função de formação de caráter, tendo a personalidade contribuição de ambos, pai e mãe.

A participação dos pais deve ser constante, não devendo ser cessada na adolescência, sendo que a falta de carinho e laço afetivo com um dos genitores pode acarretar problemas de personalidade.

Todavia, nem sempre a família consegue cumprir o seu papel na vida das crianças e adolescentes, transformando relações e fazendo com que esses infantes sofram algum tipo de abuso ou omissão.

Nestes casos, é obrigação do Estado intervir e punir o abuso ou omissão sofrida pela criança e adolescente. O Código Civil prevê penas que vão desde a suspensão até a destituição de poder familiar.

A destituição de poder familiar deverá ocorrer através do devido processo legal, sendo a adoção uma medida excepcional sendo determinada quando se esgotarem todos os recursos para a manutenção desse infante no seio familiar natural ou extenso.

2.1.2. Vantagens da adoção para o infante

A partir do instante em que se fala de adoção, o primeiro pensamento, seja ele afetivo ou moral, é direcionado para a criança e adolescente, ou seja, aquele que irá ser adotado.

A criança e adolescente passou a ser o protagonista da adoção, devendo este se beneficiar com a adoção, precisando haver vantagens para ele, melhorando a sua vida, sendo este requisito considerado o mais importante da adoção.

Para ter decisão favorável, é preciso ficar comprovado no decorrer do processo que a adoção trará vantagens reais para vida do infante, e permitindo que a criança ou adolescente adotado passem ter a partir desse ato a possibilidade de desenvolvimento pleno como seres humanos e cidadãos.

Fábio Ulhoa Coelho[4], escreve:

O requisito mais importante da adoção diz respeito às vantagens para o adotado e legitimidade dos motivos do adotante (ECA, art.43). A criança ou adolescente deve experimentar, com a adoção uma mudança substancial de vida e para melhor. A mudança pode não ser econômica e patrimonial, mas desde que seja palpável, justifica- se a medida. Se o menor continuar desamparado ou piorar sua condição material, a adoção não poderá ser concedida.

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Dessa forma, o Estado garante que com a adoção, o infante desamparado passe a viver melhor do que na sua condição atual, tendo a garantia do cumprimento dos seus direitos essenciais, como moradia, educação e saúde.

2.1.3. Idade mínima e adoção de descendentes

Com relação à idade, o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 42 dispõe sobre os legitimados para adotar:

Art. 42.  Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil.

§ 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.

§ 2º Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.

§ 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando.

§ 4º Os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão.

§ 5° Nos casos do § 4 o deste artigo, desde que demonstrado efetivo benefício ao adotando, será assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da Lei n o 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil . § 6 o A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.

É importante destacar que mesmo com a idade do adotante diminuindo para 18 anos, a diferença de idade entre adotante e adotado deverá ser de pelo menos 16 anos, com o intuito de aproximar a adoção de um parentesco civil. Além disso, no caso de cônjuges ou companheiros, também deverá ser comprovada a estabilidade familiar.

Sobre isto, Silvio Rodrigues[5] escreve:

Como a adoção cria um parentesco, em linha reta, de primeiro grau, a lei estabelece essa diferença de dezesseis anos, que, ordinariamente, seria a menor concebível, no caso de parentesco consangüíneo. Com efeito, essa regra se inspira na ideia de que a adoção procura imitar a natureza e, assim, mister se faz estabelecer entre as partes, que vão assumir as posições de pai e filho, uma diferença que as situe em gerações diversas.

Apesar de a lei ter fixado uma idade mínima para o adotante, a regra não estabeleceu uma idade máxima para aquele que deseja ingressar com um processo de adoção.

Portanto, só poderá ingressar no processo de adoção, aqueles maiores de 18 anos, devendo ser demonstrada a estabilidade familiar.

Com a previsão no art.42, §1° fica vedada a adoção por ascendentes, ou seja, a adoção dos netos pelos avós. Muitas crianças e adolescentes são indiretamente criados pelos avós. Que se mostram presentes desde o nascimento, fazendo com que se criem laços afetivos, e passando os avôs a ensinarem os valores éticos e morais carregados ao longo dos anos pela família. Além disso, os avós se esforçam para garantir os direitos básicos que essa criança e adolescente deve ter, como educação e saúde.

Apesar dessa proibição, o STJ entende que é possível a adoção pelos avós, quando justificado pelo princípio do melhor interesse para o menor. Seguindo este entendimento, a Quarta Turma julgou um Recurso Especial da seguinte forma:

RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO DE MENOR PLEITEADA PELA AVÓ PATERNA E SEU COMPANHEIRO (AVÔ POR AFINIDADE). MITIGAÇÃO DA VEDAÇÃO PREVISTA NO § 1º DO ARTIGO 42 DO ECA. POSSIBILIDADE. 1. A Constituição da República de 1988 consagrou a doutrina da proteção integral e prioritária das crianças e dos adolescentes, segundo a qual tais "pessoas em desenvolvimento" devem receber total amparo e proteção das normas jurídicas, da doutrina, jurisprudência, enfim de todo o sistema jurídico. 2. Em cumprimento ao comando constitucional, sobreveio a Lei 8.069/90 - reconhecida internacionalmente como um dos textos normativos mais avançados do mundo -, que adotou a doutrina da proteção integral e prioritária como vetor hermenêutico para aplicação de suas normas jurídicas, a qual, sabidamente, guarda relação com o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, que significa a opção por medidas que, concretamente, venham a preservar sua saúde mental, estrutura emocional e convívio social. 3. O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente tem por escopo salvaguardar "uma decisão judicial do maniqueísmo ou do dogmatismo da regra, que traz sempre consigo a ideia do tudo ou nada" (PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Dicionário de direito de família e sucessões. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 588/589). 4. É certo que o § 1º do artigo 42 do ECA estabeleceu, como regra, a impossibilidade da adoção dos netos pelos avós, a fim de evitar inversões e confusões (tumulto) nas relações familiares - em decorrência da alteração dos graus de parentesco -, bem como a utilização do instituto com finalidade meramente patrimonial. 5. Nada obstante, sem descurar do relevante escopo social da norma proibitiva da chamada adoção avoenga, revela-se cabida sua mitigação excepcional quando: (i) o pretenso adotando seja menor de idade; (ii) os avós (pretensos adotantes) exerçam, com exclusividade, as funções de mãe e pai do neto desde o seu nascimento; (iii) a parentalidade socioafetiva tenha sido devidamente atestada por estudo psicossocial; (iv) o adotando reconheça os - adotantes como seus genitores e seu pai (ou sua mãe) como irmão; (v) inexista conflito familiar a respeito da adoção; (vi) não se constate perigo de confusão mental e emocional a ser gerada no adotando; (vii) não se funde a pretensão de adoção em motivos ilegítimos, a exemplo da predominância de interesses econômicos; e (viii) a adoção apresente reais vantagens para o adotando. Precedentes da Terceira Turma. 6. Na hipótese dos autos, consoante devidamente delineado pelo Tribunal de origem: (i) cuida-se de pedido de adoção de criança nascida em 17.3.2012, contando, atualmente, com sete anos de idade; (ii) a pretensão é deduzida por sua avó paterna e seu avô por afinidade (companheiro da avó há mais de trinta anos); (iii) os adotantes detém a guarda do adotando desde o seu décimo dia de vida, exercendo, com exclusividade, as funções de mãe e pai da criança; (iv) a mãe biológica padece com o vício de drogas, encontrando-se presa em razão da prática do crime de tráfico de entorpecentes, não tendo contato com o filho desde sua tenra idade; (v) há estudo psicossocial nos autos, atestando a parentalidade socioafetiva entre os adotantes e o adotando; (vi) o lar construído pelos adotantes reúne as condições necessárias ao pleno desenvolvimento do menor; (vii) o adotando reconhece os autores como seus genitores e seu pai (filho da avó/adotante) como irmão; (viii) inexiste conflito familiar a respeito da adoção, contra qual se insurge apenas o Ministério Público estadual (ora recorrente); (ix) o menor encontra-se perfeitamente adaptado à relação de filiação de fato com seus avós; (x) a pretensão de adoção funda-se em motivo mais que legítimo, qual seja, desvincular a criança da família materna, notoriamente envolvida em criminalidade na comarca apontada, o que já resultou nos homicídios de seu irmão biológico de apenas nove anos de idade e de primos adolescentes na guerra do tráfico de entorpecentes; e (xi) a adoção apresenta reais vantagens para o adotando, que poderá se ver livre de crimes de delinquentes rivais de seus parentes maternos. 7. Recurso especial a que se nega provimento.

(STJ - REsp: 1587477 SC 2016/0051218-8, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 10/03/2020, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/08/2020)

O relator destacou que a quebra da regra estabelecida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente é medida excepcional, pois os avós exerciam papel de pai e mãe da criança desde o seu nascimento, e que não havia nenhum conflito familiar diante da situação, além de trazer reais vantagens para a criança.

O colegiado teve como base as decisões prolatadas pela Terceira Turma nos anos de 2014 e 2018 que já haviam permitido esse tipo de adoção, com o objetivo de proteger o melhor interesse da criança e adolescente.

2.1.4. Processo judicial indispensável

O instituto da adoção é um ato jurídico formal, sendo feito por meio judicial, assim, a pessoa maior de 18 anos que deseja adotar uma criança ou adolescente deverá buscar tal pretensão por meio de um processo judicial.

Nesse sentido Fábio Ulhoa Coelho[6] afirma:

Quem pretende adotar certa pessoa, assim, deve propor a ação judicial correspondente, requerendo a adoção. O processo judicial é indispensável, segundo o direito brasileiro, para a constituição do vínculo de filiação entre adotante e adotado. Nele, os adotantes não poderão fazer-se representar por procurador, por ser vedada a adoção por mandatário (ECA, art. 39, §2º), devendo praticar os atos que lhes cabe pessoalmente.

O processo é gratuito e precisa ser iniciado na Vara da Infância e Juventude, sendo possível realizar um pré-cadastro com todos os dados do candidato, como informações familiares e o perfil de criança ou adolescente desejado.

 É indispensável para o processo de adoção à ação judicial, sendo a partir da sentença favorável que se dá a constituição do vínculo de filiação entre o adotante e o adotado, não podendo tal ato ser feito mediante procurador, sendo proibida a adoção através de mandatário, devendo o adotante praticar pessoalmente os atos essenciais para o processo de adoção.

Dessa forma, sendo favorável a sentença, a partir do seu trânsito em julgado, os nomes dos adotantes e de seus ascendentes passarão a constar na certidão de nascimento do adotado, e o documento original será cancelado.

2.1.5. Estágio de convivência

Outro requisito necessário para o processo de adoção é o estágio de convivência entre o adotante e o adotado, fase que observa-se a interação social e familiar entre o adotado e a família, com o intuito de garantir que o infante irá adquirir vantagens por meio da adoção e não terá nenhum risco à sua segurança.

Silvio Rodrigues [7]escreve sobre o objetivo desse requisito:

A finalidade do estágio de convivência é comprovar a compatibilidade entre as partes e a probabilidade de sucesso da adoção. Dai determinar a lei sua dispensa em duas hipóteses: a) quando o adotando for infante de menos de um ano, pois nesse caso é extremamente provável o ajuste do menor com seu novo progenitor;

b) qualquer que seja a idade do adotando, quando este já estiver na companhia do adotante durante tempo suficiente para se poder avaliar a convivência da constituição do vínculo.

Com isso, pode-se concluir que o tempo de convivência tem como finalidade, identificar se o infante se adaptou e se encaixou no âmbito familiar adotivo, para que ele possa se desenvolver com total plenitude e que a adoção seja acertada.

Importante destacar que esse estágio de convivência é dispensável caso o adotado já esteja convivendo com o adotante, não sendo essa fase necessária já que o objetivo final desse tempo de contato, já foi concluído.

Além disso, o autor Fábio Ulhoa Coelho[8] destaca que depois do relatório do estágio de convivência ficar pronto, e tendo sido ouvida todas as partes, sendo elas o pretendente à adoção, o infante a ser adotado, caso este tenha 12 anos ou mais, os pais ou representantes legais do adotado, o juízo convencido que essa adoção trata melhorias para a vida do infante e que a pretensão do adotante é boa, deverá proferir sentença constituindo o vínculo de filiação entre adotante e adotado. E a partir de transitado em julgado a sentença, a adoção passa a gerar efeitos.

2.1.6. Adoção por casal

A adoção poderá ser requerida por duas pessoas, e neste caso é preciso que se cumpram alguns requisitos específicos que a lei prevê. O artigo 42 do ECA, parágrafo 2º, destaca que para a adoção por casal, é imprescindível que os adotantes tenham se casado civilmente ou mantenham uma união estável, sendo necessária a comprovação da estabilidade familiar.

 Arnoldo Wald e Priscila M. P. Corrêa da Fonseca[9] discorrem sobre este tema:

Ninguém poderá ser adotado por duas pessoas, salvo se forem estas casadas, separadas, divorciadas ou conviventes. Os divorciados, as pessoas judicialmente separadas e, por analogia, os ex-conviventes somente poderão adotar, em conjunto se estiverem concordes sobre a guarda e regime de visitas, e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do casamento.

É imprescindível a estabilidade na família, devendo ser comprovada através de elementos, como por exemplo, depoimentos testemunhais que o juiz possa ter como uma base segura para deferir a adoção, visando garantir a segurança integral do infante e o melhor interesse do menor para esta criança ou adolescente.

Neste sentido Adauto Tomaszewski apud Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho[10] discorre:

A estabilidade da família, a ambiência onde o adotando será criado – elementos que podem ser colhidos, não apenas mediante depoimentos testemunhais para que o juiz possa, com segurança, deferir a adoção, na perspectiva da proteção integral da criança e do adolescente.

A necessidade dessa estabilidade familiar, é para garantir que a criança ou adolescente adotado seja protegido, garantido que prevaleça o melhor interesse do infante.

2.1.7. Consentimento

Mais um requisito que deve ser observado no processo de adoção é o consentimento, sendo este a concordância do infante, e em algumas situações, também dos pais ou representante legal, para que seja possível a adoção. O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 45, §2° estipula que o consentimento do infante deverá ser obrigatório quando este tiver mais de 12 anos de idade, sendo de suma importância a vontade do infante para a constituição de vínculo através da adoção.

Fábio Ulhoa [11]discorre sobre o tema da seguinte maneira:

Se for o adotando adolescente (tiver mais de 12 anos), o seu consentimento também será obrigatório (ECA, art.45, §2º). A partir  da adolescência, a vontade do menor passa a ser decisiva para a constituição do vínculo de filiação por adoção.

Nos casos em que o adotado seja maior de idade, o consentimento do pai poderá ser dispensável. A Terceira Turma do STJ manteve a adoção de um jovem pelo padrasto, mesmo sem o consentimento do pai biológico, pois existia um vínculo afetivo estabelecido entre o adotado e o padrasto que o criava desde os 2 anos de idade. Além disso, de acordo com a decisão colegiada, a adoção não poderia ser recusada pelo pai sem justa causa, ainda mais na existência de manifestação de vontade de quem pretendia ser adotado.

Deste modo, para que haja dos infantes com idade superior à 12 anos é obrigatório o consentimento do mesmo, e para menores dessa idade se faz indispensável o consentimento dos pais, com exceção daqueles casos em que ocorre a destituição do poder familiar, ou quando os pais forem desconhecidos.

2.2.  EFEITOS DA ADOÇÃO

Superado o assunto referente aos requisitos da adoção, também é de grande importância destacar o tema, no que tange os efeitos da adoção regular. Com o Estatuto da Criança e do Adolescente, que veio com a pretensão de colocar a criança ou adolescente na família de um adotante que trouxesse vantagens reais para o adotado.

Passando para essa condição de filho, a criança ou adolescente garante o seu direito de usufruir de tudo aquilo que a lei confere aos descendentes biológicos, podendo destacar o âmbito econômico, direitos de sucessão e alimentícios. Destarte, o vínculo filial da adoção também é gerado com todos os parentes do adotante, inclusive até referente a sucessão.

Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho[12] também discorre sobre o assunto:

[...] a adoção atribui ao adotado a condição de filho, para todos os efeitos de direito, pessoais e patrimoniais, inclusive sucessórios, em regime de absoluta isonomia em face dos filhos biológicos, desligando-o dos seus pais naturais, tão somente, as restrições decorrentes dos impedimentos matrimoniais.

Pelo fato de a adoção apenas produzir os seus efeitos a partir do trânsito em julgado da sentença constitutiva – ressalvada, claro, a hipótese da adoção póstuma [...] – é forçoso concluir que os pais, os representantes legais ou mesmo o adotando poderão se arrepender, revogando o consentimento dado, e prejudicando a medida, no curso do processo.

E assim, é possível observar que a adoção produz efeitos somente após o trânsito em julgado da sentença, gerando dois efeitos, sendo um aquele que anula o  vínculo do adotado com sua família natural e a partir disso surge o outro efeito que é a criação do novo vínculo da criança ou adolescente com o adotante.

2.3.   CADASTRO NACIONAL DA ADOÇÃO

A Constituição Federal 1988 assegura às crianças e adolescentes vários direitos que são muito importantes para criação com dignidade e respeito. Em seu artigo 227 ela elencou os deveres da família, da sociedade e do Estado, consagrando o direito de convivência familiar, sendo esta de suma importância é considerada um direito fundamental.

O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 19 assegura o direito de ser educado na convivência familiar para as crianças e adolescentes, e excepcionalmente em uma família substituta.

Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente ainda exige que o judiciário em cada comarca e foro regional mantenha um registro atualizado de crianças e adolescentes que se encaixam no perfil de adotados, e outro registro de pessoas que estejam interessadas em adotar.

Maria Berenice [13]em seu artigo Adoção e a espera de um amor, afirma sobre a importância dessa lista de inscrição para a adoção:

A finalidade das listas é agilizar o processo de adoção. Isto porque, se, primeiro, fosse necessário esperar a destituição do poder familiar para inserir a criança no rol dos adotáveis e, depois, se partisse em busca de alguém que a quisesse, para só então proceder à habilitação do candidato à adoção, muito tempo passaria, deixando- se de atender ao melhor interesse da criança.

A finalidade dos registros é dar celeridade ao processo de adoção, pois se fosse esperar a destituição do poder familiar, e depois inserir o infante no rol de adoção, para somente então partir em busca de alguém interessado para adoção, o processo demoraria mais, colocando em risco o melhor interesse do infante.

Para uma melhor organização dos dados, o Conselho Nacional de Justiça através da Resolução 54/2008 criou o Cadastro Nacional de Adoção (CNA). Com a criação e funcionamento desse cadastro, é possível que pretendentes de outro estado tenham acesso ao perfil da criança e adolescente, e assim dando uma maior chance dessa criança ser adotada.

O Cadastro Nacional de Adoção foi criado com intuito de ajudar os juízes das varas da infância e juventude a cruzar dados para localizar os pretendentes de adoção e as crianças e adolescentes aptas, funcionando como um banco de dados e informações. Pode-se retirar da Cartilha do Cadastro Nacional de Adoção[14]:

A partir da edição do Estatuto da Criança e do Adolescente, implementaram-se, em caráter local ou regional, sistemas de informações que reúnem, de um lado, pretendentes a adoção e, de outro, crianças e adolescentes em condições de serem adotados.

O Conselho Nacional de Justiça, diante da missão conferida pelo artigo 103-B da Constituição Federal, desenvolveu o Cadastro Nacional de Adoção - CNA, banco de dados, único e nacional, composto de informações sobre crianças e adolescentes aptos a serem adotados e pretendentes a adoção.

Dessa maneira, é possível concluir que o CNA ajuda com o andamento dos processos de adoção, pois facilita a busca dos perfis de crianças e adolescentes disponíveis para adoção em tempo hábil, visando atender o melhor interesse do menor.

2.4.  IRREVOGABILIDADE DA ADOÇÃO

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, a adoção é uma medida excepcional devendo recorrer a ela quando acaba todos os recursos para manter este infante no seu seio familiar natural, sendo também irrevogável, pois o objetivo é evitar que o adotante tenha algum tipo de arrependimento, visando o melhor interesse do infante. Sobre este tema,  Maria Berenice Dias[15] escreve:

A morte dos adotantes não restabelece o poder familiar dos pais naturais (ECA 49). Como a adoção é irrevogável (ECA 39, §1º), rompe todos os laços com a família biológica. Ainda assim, com certa freqüência simplesmente os adotantes evolvem as crianças que adotaram. Tal situação não está prevista na lei, mas infelizmente é algo que existe e há a necessidade de disponibilizar a criança novamente à adoção. Nesses casos, vem a jurisprudência impondo aos adotantes o dever de pagar alimentos, ao menos para subsidiar o acompanhamento psicológico de quem teve maus uma perda, até ser novamente adotado. De qualquer forma, há a possibilidade de haver a suspensão ou a destituição do poder familiar do adotante (CC 1.635 e 1.638).

Além disso, a revogação da adoção pode ocorrer em alguns casos, devendo-se ter o cuidado de resolver a situação de forma ponderada, sendo esta excepcional, dendo olhar sempre para o melhor interesse da criança e adolescente. Nesse sentido Hildeliza Lacerda Tinoco Boechat Cabral e Nilda Siqueira Andrade [16]discorrem sobre a irrevogabilidade da adoção:

A irrevogabilidade da adoção fundamenta-se na necessidade de se resolver uma questão que se mostra insustentável, expondo a criança ou adolescente a riscos emocionais, psicológicos e do ponto de vista do próprio direito. Salienta-se que deverá ser sempre resolvido de acordo com a técnica de ponderação de interesses, sendo excepcionalíssima e segundo os princípios do melhor interesse da criança, da proteção integral, respeito, liberdade (art. 15 do ECA) e da dignidade da pessoa humana, direitos indisponíveis, na qualidade de pessoas em desenvolvimento que são.

 Dessa forma é possível se deparar com situações em que os adotantes devolvem as crianças adotadas, sendo nestes casos não previstos em lei a jurisprudência vem impondo indenizações aos adotados, recentemente uma matéria [17]chamou atenção para este tema:

Um casal foi condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) a pagar R$ 150 mil por danos morais a um garoto, hoje com 11 anos, por devolvê-lo depois da adoção.

O caso foi parar na Justiça por meio do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), que moveu uma ação contra o casal sob a alegação de que a desistência da adoção, após o garoto passar mais de um ano e meio com a família, causou danos psicológicos à criança.

Destarte, pode haver suspensão ou a destituição do poder familiar do adotante, entendendo-se sobre esta possibilidade que a partir do desligamento de vínculo filial gerado pela adoção, entre o infante o adotante, deverá ocorrer pela destituição do poder familiar, que são aqueles previstos em lei, e respeitando o devido processo legal.

Recentemente a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça aceitou a possibilidade da revogação da adoção de um adolescente de 13 anos de idade, diante de provas de que o adotado não desejava realmente participar do processo de adoção. Deste modo, considerando o melhor interesse do menor e o princípio da proteção integral, o colegiado deu provimento ao recurso especial para revogar a sentença concessiva da adoção do adolescente e permitir a mudança do registro civil do mesmo.

A decisão foi prolatada nos seguintes termos:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. INFÂNCIA E JUVENTUDE. OMISSÃO AUSÊNCIA. IRREVOGABILIDADE DA ADOÇÃO. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E TEOLÓGICA. FINALIDADE PROTETIVA. PRINCÍPIOS DA PROTEÇÃO INTEGRAL E DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. SENTENÇA CONCESSIVA DA ADOÇÃO. AÇÃO RESCISÓRIA. POSSIBILIDADE. PROVA NOVA. CARACTERIZAÇÃO. PROVA FALSA. CARACTERIZAÇÃO. 1- Ação ajuizada em 27/11/2014. Recurso especial interposto em 13/5/2020 e concluso ao gabinete em 20/10/2020. 2- O propósito recursal consiste em definir: a) se houve omissão da Corte de origem ao apreciar a tese relativa à caracterização de falsidade ideológica, notadamente a própria declaração do adotado no sentido de que não desejava a adoção; e b) se é possível, ante a regra da irrevogabilidade da adoção, a rescisão de sentença concessiva dessa espécie de colocação em família substitua ao fundamento de que o adotado, à época da adoção, não a desejava verdadeiramente e de que, após atingir a maioridade, manifestou-se pela procedência do pedido. 3- No que diz respeito à apontada omissão, verifica-se que os recorrentes não indicam quais os dispositivos legais teriam sido violados pelo acórdão hostilizado, tornando patente a falta de fundamentação do apelo especial, circunstância que atrai a incidência, por analogia, do Enunciado de Súmula nº 284 do Supremo Tribunal Federal. Ademais, não houve negativa de prestação jurisdicional, porquanto a Corte de origem analisou a questão deduzida pelos recorrentes. 4- A interpretação sistemática e teleológica do disposto no § 1º do art. 39 do ECA conduz à conclusão de que a irrevogabilidade da adoção não é regra absoluta, podendo ser afastada sempre que, no caso concreto, verificar-se que a manutenção da medida não apresenta reais vantagens para o adotado, tampouco é apta a satisfazer os princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança e do adolescente. 5- A sentença concessiva de adoção, ainda quando proferida em procedimento de jurisdição voluntária, pode ser encoberta pelo manto protetor da coisa julgada material e, como consectário lógico, figurar como objeto de ação rescisória. Precedentes. 6- Está caracterizada a "prova nova" apta justificar a sentença concessiva de adoção, porquanto se extrai do Relatório Psicológico que não houve, de fato, consentimento do adotando com relação à adoção, conforme exige o § 2º do art. 45 do ECA. Não se trata de vedada alegação de fato novo, mas sim de prova pericial nova que se refere à existência ou inexistência de ato jurídico anterior à sentença, qual seja, o consentimento do adolescente. 7- Subsume-se a hipótese ao previsto no inciso VI do art. 966 do CPC, porquanto admitiu o magistrado singular, ao deferir a adoção, que houve o consentimento do adotando, conforme exigido pelo § 2º do art. 45 do ECA, o que, posteriormente, revelou-se falso. 8- Passando ao largo de qualquer objetivo de estimular a revogabilidade das adoções, situações como a vivenciada pelos adotantes e pelo adotado demonstram que nem sempre as presunções estabelecidas dogmaticamente, suportam o crivo da realidade, razão pela qual, em caráter excepcional, é dado ao julgador demover entraves legais à plena aplicação do direito e à tutela da dignidade da pessoa humana. 9- A hipótese dos autos representa situação sui generis na qual inexiste qualquer utilidade prática ou reais vantagens ao adotado na manutenção da adoção, medida que sequer atende ao seu melhor interesse. Ao revés, a manutenção dos laços de filiação com os recorrentes representaria, para o adotado, verdadeiro obstáculo ao pleno desenvolvimento de sua personalidade, notadamente porque impediria o evolver e o aprofundamento das relações estabelecidas com os atuais guardiões, representando interpretação do § 1º do art. 39 do ECA descolada de sua finalidade protetiva. 10- Levando-se em consideração (a) os princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança e do adolescente, (b) a inexistência de contestação ao pleito dos adotantes e (c) que a regra da irrevogabilidade da adoção não possui caráter absoluto, mas sim protetivo, devem, excepcionalmente, ser julgados procedentes os pedidos formulados na presente ação rescisória com a consequente rescisão da sentença concessiva da adoção e retificação do registro civil do adotado. 11- Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido.

(STJ - REsp: 1892782 PR 2020/0222398-3, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 06/04/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/04/2021)

A Ministra Nancy Andrighi destacou que a interpretação do artigo 39, parágrafo 1°, do Estatuto da Criança e do Adolescente, leva ao entendimento de que a irrevogabilidade da adoção não seria uma regra absoluta, devendo ser afastada sempre que observado que a manutenção da adoção não estaria trazendo vantagens significativas para o menor e nem suprindo a necessidade do atendimento aos princípios da proteção integral e melhor interesse do menor.

É essencial priorizar a dignidade do infante, devendo sempre antepor o melhor interesse da criança, sendo a adoção anulada somente em casos de ofensa ao princípio da proteção integral do menor, e jamais apenas por demanda dos adotantes, o que neste caso acarretaria a destituição de pátrio poder, mantendo-se todos os direitos resultantes da adoção, incluindo pensão alimentícia e herança.

2.5. A FUNÇÃO SOCIAL DA ADOÇÃO

A função social da adoção é o propósito que este instituto tem dentro da sociedade, com a sua responsabilidade de dar um lar para o adotado. Antigamente o ato de adotar alguém servia apenas para dar filhos para aqueles que não podiam ter de forma natural, mas com o passar dos anos, o interesse maior passou a ser do infante.

A adoção tem como finalidade garantir o gozo da criança e adolescente de todos os direitos fundamentais que estão presentes na Constituição Federal de 1988, que se referem à dignidade humana, à saúde, à alimentação, à educação, à convivência familiar e na comunidade.

A partir dessa ideia, Murilo Sechieri Costa Neves[18] escreve:

Hoje a adoção tem a finalidade de satisfazer o instinto paternal, além de representar um instituto ligado ao sentimento de solidariedade humana. De qualquer forma, só pode ser admitida quando representar efetivo benefício para o adotado (art. 1.625).

Destarte, atualmente o processo de adoção não é focado no interesse de quem irá adotar tendo para o adotante a finalidade satisfazer o instinto paternal, e passando a adoção a ter como objetivo social a promoção do melhor interesse da criança e adolescente, fazendo com que estes sejam colocados em lares dispostos a garantir o bem estar dos mesmos, e sendo admitida apenas quando for demonstrado o benefício para o adotado.

A função social da adoção tem como base a solidariedade humana, sempre prevalecendo o melhor interesse do menor.

Arnaldo Rizzardo[19], resume a evolução social:

Basicamente, o instituto da adoção evoluiu, nos últimos tempos, no sentido de amparar as crianças abandonadas, ou cujos pais não possuem condições de criá-las e educá-las. Principalmente está sendo dirigido o instituto a atender os reclamos de uma infância surgida de classes sociais onde a tendência é a marginalização, sem as condições mínimas de uma criação e formação psicológica razoáveis [...].

Portanto, a adoção não é apenas um instituto para amparar crianças e adolescentes abandonados ou que de alguma forma não tiveram condições de permanecer na família natural, mas também deve ser vista como uma forma de promover uma infância digna para essas.

3. CONCLUSÃO

Infelizmente ainda existe no Brasil uma estrutura preconceituosa no instituto da adoção, sendo ela composta por práticas interpessoais, culturais e históricas. Inicialmente, este instituto era usado apenas para satisfazer as vontades dos adotantes, seja essa vontade, a de ter um filho para chamar de seu, ou alguém para ajudar nos afazeres da família, não havendo a destituição do poder familiar original e o adotado não tendo nenhum direito na família afetiva, sendo que por um tempo o instituto da adoção não era visto com bons olhos perante a Igreja.

Atualmente, mesmo se passando muitos anos desde o inicio da prática de adoção e existindo alguns marcos importantes para o instituto, algumas famílias ao fazerem o cadastro, impõem características especificas que gostariam nas crianças que faz com que seja percebido o preconceito em relação ao sexo, raça e idade da criança. Ficando explícito também, o preconceito com relação a crianças e adolescentes com alguma deficiência.

Esses tipos de exigência acabam tornando mais demorado a chegada do dia em que será realizado o grande sonho de ser pai e mãe, além de deixar várias crianças e adolescentes desamparados, demonstrando um verdadeiro fracasso social quando uma criança é escolhida pela cor de seus olhos ou de sua pele, ou por não ter nenhuma deficiência.

A sociedade perde moralmente quando alguém escolhe o outro definindo uma idade máxima, e se esquecendo de que por trás daquela criança ou adolescente, existe um ser humano que precisa de um lar seguro, de uma família para que o ensine a viver em sociedade e lhe dê a oportunidade de garantir todos os seus direitos básicos, como o acesso a saúde, a educação e ao lazer.

Ainda há algumas melhorias a serem feitas no processo de adoção, mas as mudanças essenciais devem ocorrer primeiramente na sociedade, deixando de lado os preconceitos existentes, e olhando aquelas crianças e adolescentes como seres em formação que precisam de acolhimento e carinho.

A decisão de adotar alguém deve ser baseada em afeto, carinho, respeito e amor, por querer ver o bem do adotado, e querer fazer parte da vida deste, e pensar apenas na grande felicidade que esta atitude solidária pode trazer. De querer viver plenamente a maternidade e paternidade, com os seus desafios e suas maravilhas. Portanto, a adoção deve sempre ser encarada pelo lado humanitário, buscando o melhor interesse do menor.


[1] Lei n. 3.133/57, de 8 de março de 1957, atualizando o instituto da adoção prescrita no Código Civil de 1916.

[2] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família. 9.ed.São Paulo: Saraiva, 2009.p.275.v.6.

[3] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: família- sucessões. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p.181.v.5.

[4] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: família- sucessões. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p.182.v.5.

[5] RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. 28.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.p.344.

[6] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: família- sucessões. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p.183.v.5.

[7] RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito de família. 28.ed. São Paulo: Saraiva, 2007.p.345.

[8] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: família- sucessões. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p.183.v.5.

[9] WALD, Arnoldo; FONSECA, Priscila M. P. Corrêa. Direito civil: direito de família. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.p. 323.v.5.

[10]GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Pamplona Rodolfo.Novo curso de direito civil: direito de família. 2.ed.São Paulo: Saraiva, 2012. p.672.v.6.

[11] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil: família- sucessões. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p.182.v.5.

[12] GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Pamplona Rodolfo. Novo curso de direito civil: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2011.p.666-667.v.6.

[13]Maria          Berenice.                      Adoção            e          a          espera             de        amor.  Disponível        em: http://berenicedias.com.br/uploads/1_-_ado%E7%E3o_e_a_espera_do_amor.pdf. Acesso em: 11 de junho de 2021.

[14] Cartilha do Cadastro Nacional de Adoção. Disponível em: https://sistemas.tjam.jus.br/coij/wp-content/uploads/2014/07/guia-usuario-adocao.pdf. Acesso em 01 de novembro de 2020.

[15] DIAS, Maria Berenice. Manual de direitos das famílias. 7.ed. São Paulo: Revistas do tribunais, 2010.p.473-474.

[16] CABRAL, Hildeliza Lacerda Tinoco Boechat; ANDRADE, Nilda Siqueira. Ponderação de interesses           e                    (irrevogabilidade)        da        adoção. Disponível em: http://tmp.mpce.mp.br/orgaos/CAOCC/dirFamila/artigos/Pond.Interesses.e.Irrevog.Adocao.pdf. Acesso em: 21 de julho de 2021.

[17] LEMOS, Vinicius, BBC - São Paulo. Casal de SP é condenado a pagar R$ 150 mil a garoto por devolvê-lo após adoção. Disponivel em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/07/10/casal-de-sp-e-condenado-a-pagar-r-150-mil-a-garoto-por-devolve-lo-apos-adocao.ghtml. Acesso em 01 de novembro de 2020.

[18] NEVES, Murilo Sechieri Costa. Direito civil 5: direito de família. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.p.108.

[19] RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 8.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011.p. 505.

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