O Direito das Famílias e a guarda de animais em breves considerações jurídicas.
É sabido que o Brasil até o advento da Lei 13.058, de 22 de dezembro de 2014 mantinha a guarda unilateral como sendo a regra, ou seja, o menor ficava domiciliado com um dos genitores e ao outro cabia o dever de pagar a pensão alimentícia e o direito de ter o filho em sua companhia, sendo observado em cada caso concreto, a questão dos dias e horários das visitas ou buscas para passeio, com dia e hora para o retorno do menor ao seu lar com o outro que detinha a guarda unilateral.
A referida lei, no entanto estipulou que ambos genitores deveriam para o bem do menor ter direitos e deveres exercidos de forma igualitária e consequentemente também para evitar outras práticas moralmente criminosas, tal qual a da alienação parental.
A guarda compartilhada não exime nenhum dos genitores da contribuição da pensão alimentícia, muito pelo contrário, observa-se nesse caso uma proporcionalidade em relação ao mesmo e também no que concerne à convivência e responsabilidade dos genitores em questão, situação essa na maioria das vezes não vista na guarda unilateral, em que o outro paga a pensão e por extensão divorcia-se também dos filhos incorrendo inclusive em abandono afetivo.
Com a ruptura do casamento ou da união estável onde existam filhos,inegavelmente, ocorre um processo de readaptação e reorganização das idéias,da formação de novas opiniões e acima de tudo de uma realidade quase sempre inesperada.Acredita-se que não seja fácil lidar com uma nova forma de viver,haja vista e infelizmente ser comum muitos filhos alegarem que seus pais divorciaram também deles,que em um mês ou outro deixaram de pagar a pensão,enfim inúmeros casos que ao invés de serem exceção estão por ser transformarem em regra.
A guarda compartilhada é confundida com uma outra espécie de guarda, a alternada, no entanto nessa última há que se notar igualdade de prazos em relação à moradia dos pupilos com seus genitores, exemplificamos da seguinte forma: filho menor que mora quinze dias na casa do pai e os outros quinze na casa da mãe, mensalmente.
O compartilhamento da guarda,a que nossa legislação civilista dispõe ocorre quando mesmo o menor sendo domiciliado com um dos genitores,o outro pode visitá-lo mais vezes durante a semana,buscá-lo na escola,decidir em conjunto com o outro genitor a matrícula na escola,os passeios,as idas ao médico e ao dentista,enfim,a convivência é igualitária e a responsabilidade também,porque ser pai e ser mãe não consiste em apenas pagar pensão alimentícia,isso é ser tão somente genitor(a).Pais devem,precisam conviver com os filhos,educá-los,preparando-lhes para o mundo,incentivando-lhes,dialogando e explicando-lhes o melhor caminho,as consequências de uma decisão não pensada e repensada.É participar por amor,doar,contribuir,acrescentar,fazer a diferença não por obrigatoriedade,mas por amor.
No Brasil não se adota a guarda alternada,mas sim a compartilhada.
Nos dias atuais estamos deparando-nos com discussões em que o assunto tem sido o animalzinho de estimação que até outrora pertencia ao casal que está divorciando-se ou rompendo os laços de sua união estável.
Fato é que muito animal tem sido visto como um ente familiar e não como objeto ou coisa e realmente seria estranho dizer que um ser vivo, tão companheiro e carinhoso tivesse que ser tratado como objeto.Há muito tempo não podemos mais afirmar que o animal é visto como coisa móvel ou como semovente para o Direito e muito menos para seus donos ou guardiões.
Muitos bichinhos inclusive já possuem documentos tais quais os seres humanos, como o Rg, porém para eles a denominação é o “Rg Pet”.
Objetos são vendidos após o processo de divórcio, caso pertençam a um casal que não chega a um acordo sobre o mesmo.Aluguéis de imóveis do casal podem ser divididos entre os dois, mas o animal fisicamente não.
Obviamente o bichinho de estimação não pode ser vendido para acabar com a briga e assim haver a divisão do lucro da venda.Não temos na legislação familiarista uma lei que disponha sobre a convivência do animal com os donos divorciados,mas para que não houvesse injustiça, insensibilidade com todas as partes envolvidas,ingressa nesse cenário de tantas dúvidas e divergências o Direito de Família acalmando os ânimos e buscando solucionar lides existentes envolvendo casais em processo de divórcio ou de união estável e a convivência nela inserida direitos e deveres com o animal de estimação.
Logo a guarda compartilhada também vem sendo aplicada na situação acima descrita.Não é possível fecharmos os olhos e acreditar erroneamente que o animal não tenha sentimentos, que não sentirá falta do outro dono, do seu cheiro, das brincadeiras. Ora, cada guardião tem seus hábitos, sua forma de tratar o animalzinho.
Animais sofrem, adoecem inclusive emocionalmente, são seres vivos, gostam de carinho, de afago, de atenção.Defendem seus donos e são de fato seus melhores amigos.
Os animais são geradores de afeto e também carentes do mesmo e tendo-se por base e respeito toda a situação que envolve os “pets”, uma das Varas de Família de São Paulo há um tempo atrás decidiu sobre a posse, regulamentação de visitas pertinentes ao ex casal e o animal do mesmo.Em casos onde não há lei específica devem ser observados a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
Outras decisões em várias localidades também foram observadas nesse sentido em diversas Varas de Família.
A guarda compartilhada tem sido aplicada a situações conflituosas e gera discussões envolvendo opiniões diversificadas sobre a forma de amar o animal ao compará-lo com o amor dispensado a outro ser humano.Muitos comentários a favor outros não, mas o que deve ser levado em consideração é o bem-estar também do animal que se habituou ao outro “dono”, que desenvolveu afeto na convivência que até então era habitual, sem excetuarmos as outras partes envolvidas nesse processo de ruptura.
O animal não pode ser tratado como se simplesmente fosse uma “coisa”, até porque não é.Objetos geram sentimentos, mas não os possuem e isso é inquestionável.
O Direito tem procurado ser justo e coerente em suas decisões, sem jamais dizer que o animal é pessoa e muito menos “fechar os olhos”para o fato de que o mesmo também não é objeto.A reciprocidade de sentimentos envolvendo animais e seus donos é notória.
Cada magistrado tem buscado aplicar a melhor solução sempre analisando o caso concreto, podendo aplicar a guarda compartilhada ou ainda a guarda unilateral se esse for o melhor caminho.
Em caso de aplicabilidade da guarda unilateral, o outro terá que colaborar com as despesas do animal e ter seu direito de visita/convivência assegurados; já na guarda compartilhada direitos, deveres, enfim despesas acabam por ser igualitários.
A anterior rotina do animal deve ser observada, o maior tempo e a forma de convivência com seus guardiões devem levados em conta para que a decisão adotada seja a mais cabível.
Outro fato que chama a atenção da sociedade é que o Brasil é um país onde a população tem carinho por animais de estimação, que nas redes sociais existem vídeos que encantam seguidores sobre bichinhos usando roupinhas da moda e até zelando por crianças recém-nascidas que estão a dormir em carrinhos, de brincadeiras e ajuda emocional a pessoas idosas e adoentadas pelo companheirismo que é exercido por esses animais diante de seus donos.Muitos são chamados amorosamente de “filhos de pêlos”. A Associação Brasileira da Indústria de Produtos de Animais de Estimação (ABINPET) afirma que o Brasil é a quarta maior população de animais de estimação do mundo.Diante de tantas famílias criando seus animais, o Direito tem que aplicar soluções extensivas aos mesmos quando existirem conflitos.
Manifestações positivas ou negativas sobre a guarda devem ser respeitadas, porém antes de qualquer argumento, sentimentos merecem destaque no rol da boa convivência.
Muitas doenças inclusive as de natureza emocional tem sido constatadas nos animais, ganhando muita repercussão e refletindo no mundo. Pessoas são tratadas de doenças, de problemas de saúde com a convivência animal, que gera-lhes por sua vez senso de responsabilidade, carinho e companheirismo.
O animal tem o poder de estabelecer vínculos com seu guardião e um deles é o da proteção e o do apego por afinidade.São seres que agem por instinto, mas são dotados de habilidades e de inteligência peculiar.
Quando tratamos sobre a guarda de animais vale ressaltar que a mesma engloba todas as espécies de animais não somente o cachorro ou o gato.
Toda a questão pertinente a guarda seja unilateral ou compartilhada, com a contribuição de pagamento das despesas veterinárias, da alimentação serão analisadas sob a égide e a analogia do Direito das Famílias.
O pagamento de despesas médico-hospitalares com o animal integram o que nós chamamos de pensão alimentícia ou contribuição,que é dever para ambos guardiães,assim como o direito que ambos possuem em relação a visitas e companhia de seus amados bichinhos ou “filhinhos de pelos”.
Se o animalzinho é afastado da convivência de um de seus guardiães esse fato pode acarretar-lhe danos de natureza emocional e psicológico,podendo ainda apresentar sintomas como agressividade,isolamento,tristeza,falta de apetite,queda de pêlos.
Autora:Kelly Moura Oliveira Lisita.Advogada.Membro da Comissão de Direito de Família e Sucessões da OAB GO.Docente Universitária nas áreas de Direito Penal e Direito Civil.Tutora em EAD.